Economia

  • Uploaded by: Francisco Junior
  • 0
  • 0
  • February 2021
  • PDF

This document was uploaded by user and they confirmed that they have the permission to share it. If you are author or own the copyright of this book, please report to us by using this DMCA report form. Report DMCA


Overview

Download & View Economia as PDF for free.

More details

  • Words: 47,034
  • Pages: 139
Loading documents preview...
ECONOMIA, MERCADO E GESTÃO

autor

ANDRE LUIS DA CUNHA MARTINS

1ª edição SESES rio de janeiro  2016

Conselho editorial  jose dario menezes, roberto paes e paola gil de almeida Autor do original  andre luis da cunha martins Projeto editorial  roberto paes Coordenação de produção  paola gil de almeida, paula r. de a. machado e aline karina rabello Projeto gráfico  paulo vitor bastos Diagramação  bfs media Revisão linguística  bfs media Revisão de conteúdo  josé machado carregosa Imagem de capa  violetkaipa | shutterstock.com

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora. Copyright seses, 2016.

Diretoria de Ensino — Fábrica de Conhecimento Rua do Bispo, 83, bloco F, Campus João Uchôa Rio Comprido — Rio de Janeiro — rj — cep 20261-063

Sumário Prefácio 7 1. Estado, Sociedade e Economia 1.1  As ciências sociais e os conceitos de Estado 1.1.1  Organizações Econômicas, uma perspectiva 1.1.2  Organizações e as Pessoas 1.1.3  Stakeholders 1.2  As Funções do Estado 1.2.1  Conceito de Estado 1.2.2  Conceito de Nação 1.2.3  Composição do Estado 1.2.4 Poderes 1.2.5 Organização 1.2.6  Governo 1.2.7  Administração Pública 1.3  Política de Estado e Política de Governo 1.4  Estado e Sociedade Civil

9 10 10 13 15 16 16 17 17 18 19 21 22 23 25

2. A Teoria das Finanças Públicas

29

2.1  A Teoria Econômica e o Setor Público 2.1.1  Economia do Setor Público 2.1.2  Bem-estar Social 2.2  Falhas de mercado 2.3  Funções do setor público 2.4  Bens públicos, semi-públicos e privados 2.5  Políticas Macroeconômicas 2.5.1 Introdução 2.5.2  Taxa de Juros, câmbio e Inflação 2.5.3  Crescimento Econômico

30 30 31 31 33 34 35 35 35 41

2.5.4  Distribuição de renda 2.5.5  Mercado Externo 2.5.6  Políticas Alternativas

3. Gastos Públicos 3.1  Teoria da Tributação 3.1.1 Introdução 3.1.2  Neutralidade e Eficiência 3.1.3 Equidade 3.2  Gastos Públicos 3.2.1 Introdução 3.2.2  Despesas conforme a categoria econômica 3.3  Curva de Laffer 3.3.1  Gestão Tributária 3.4  Déficit e Dívida Pública 3.5  Instrumentos de Política Fiscal 3.5.1  Gastos do Governo 3.5.2  Arrecadação Tributária 3.5.3  Sistema Tributário Brasileiro 3.6  Política Fiscal e Objetivos de Política Econômica

4. Finanças Públicas no Brasil

45 46 47

51 52 52 53 54 58 58 60 61 63 64 72 73 75 77 78

81

4.1  O período anterior a 1980 82 4.1.1  As reformas de 1964/67: 82 4.1.2  O comportamento das contas públicas nos anos 70: 83 4.2  As Finanças Públicas no regime de Alta Inflação: 1981/1994 84 4.2.1  Panorama das Contas Públicas 85 4.2.2  As NFSP: 1981/1994 86 4.2.3  Medição do Déficit: 1981/1984 87 4.2.4  A Redemocratização e o Aumento de Déficit Público: 1985/1989 88 4.2.5  O Problema da análise fiscal 89

4.2.6  Política Governamental 4.2.7  Efeitos Institucionais 4.2.8  Situação Fiscal entre 1984 e 1989 4.2.9  Política Econômica de 1990 a 1994 4.2.10  A Indexação da Receita 4.2.11  Inflação e Gasto Público 4.2.12  Qualificações Necessárias 4.3  Plano Real 4.4  Finanças Públicas após 1999

5. A Reforma do Estado

90 92 93 94 95 96 97 98 103

109

5.1  O processo de privatização no Brasil 5.1.1 Introdução 5.1.2  Avaliação das Privatizações no Brasil 5.1.3  Resultados Obtidos 5.1.4  Impactos da Privatização Sobre a Dívida Pública 5.1.5  Alterações no Programa 5.1.6  Privatizações após 1994 5.2  O papel regulador do Estado 5.2.1  Intervenção do Estado na Economia 5.2.2  Órgãos Administrativos Econômicos 5.2.3  O Estado como explorador da atividade econômica

110 110 111 113 114 116 119 124 124 124 125

5.2.4  O Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica 5.2.5  Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE. 5.2.6  Secretaria de Direito Econômico - SDE. 5.2.7  Agência Nacional de Telecomunicação - ANATEL. 5.2.8  Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL. 5.2.9  Agência Nacional de Águas - ANA. 5.2.10  AGÊNCIA Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. 5.2.11  Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS. 5.2.12  A Agência Nacional de Petróleo - ANP 5.2.13  Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT 5.2.14  Agência de Desenvolvimento da Amazônia - ADA

126 127 128 128 129 130 131 131 132 133 133

5.3  A parceria público-privada 5.3.1 Introdução 5.3.2  Regulamentação da Lei de PPP 5.3.3  Premissas de uma PPP

134 134 135 135

Prefácio Prezados(as) alunos(as), Este livro denominado Economia, Mercado e Gestão trata de possibilitar aos leitores uma noção geral sobre a economia desde sua concepção, passando pela evolução da ciência econômica e chegando a sua aplicação em uma economia de mercado. Desta forma, o objetivo deste trabalho é desenvolver o conhecimento dos fundamentos da economia e das finanças públicas aplicada a realidade brasileira de uma forma ampla. No início do texto procuramos relacionar tópicos fundamentais como a visão do Estado, da Sociedade, do Governo e da Economia, com o propósito de solidificar conhecimentos importantes para a compreensão das teorias e exemplos abordados nos capítulos seguintes. O texto apresenta em seguida uma evolução da economia e das finanças no Brasil, segundo as mais importantes fontes disponíveis, passando pelas passagens mais importantes de nossa história econômica recente, sempre procurando abordar a teoria econômica necessária para a compreensão dos fenômenos observados. Tivemos a preocupação de mostrar os fracassos e as conquistas da série de tentativas da economia brasileira para vencer a inflação gigantesca que existia no país. As inúmeras dificuldades e complexidades da economia brasileira é mostrada neste trabalho de uma forma realista, visando a compreensão dos importantes avanços obtidos por nossos economistas desde os anos 60/70 até o início do século XXI. Por fim, apresentamos outros aspectos econômicos presentes em inúmeras discussões econômicas que continuam em evidencia como a privatização, o papel regulador do estado na economia e as parcerias público-privadas. Sabemos que este trabalho, está longe de conter todo o assunto relativo a economia e mercado, todavia esperamos que este seja uma importante ponte para o desenvolvimento dos conhecimentos a serem adquiridos por vocês ao longo desta jornada de estudos e aprendizagem. Bons estudos!

7

1 Estado, Sociedade e Economia

1.  Estado, Sociedade e Economia 1.1  As ciências sociais e os conceitos de Estado 1.1.1  Organizações Econômicas, uma perspectiva O sistema econômico consiste de uma rede de pessoas e organizações, e suas inter-relações. A principal característica das clássicas formas de organização é sua identidade legal independente, que a torna apta a formar contratos, e em seu próprio nome, separa-lo dos indivíduos que pertencem às mesmas. Esta habilidade de formar contratos é um dos mais importantes aspectos da análise econômica das organizações. Desse modo, uma organização é considerada como um conjunto de contratos, relacionamentos e entendimentos sobre os membros individuais da organização, sendo uma empresa uma entidade legal capaz de formar, de modo relativamente simples, contratos bilaterais com seus fornecedores, funcionários, investidores, executivos e clientes. Embora os aspectos legais de uma organização sejam importantes, uma descrição completa da arquitetura organizacional envolve muitos elementos, que devem ser reunidos com o objetivo de formar um padrão coerente. Tais elementos podem ser compostos por diversos itens como: •  Padrões de recursos e fluxos de informação, •  Relações entre pessoas, •  Alocação de responsabilidades e poderes de decisão, •  Rotinas organizacionais e processos de tomadas de decisão, •  Métodos para obter e reter pessoas e recursos, •  Métodos pelos quais novas ideias e conhecimento são gerados e difundidos, •  Adaptações das rotinas da organização para refletir e implementar o aprendizado organizacional, •  Objetivos da organização, suas estratégias e táticas, •  Comportamento de seus membros individuais. Definir a organização simplesmente pela capacidade de formar contratos, pode se tornar bastante inapropriada pois pode negligenciar a identidade dos contornos e fronteiras da organização. Dentro de uma empresa, por exemplo, aqueles que possuem poderes de decisão, geralmente os executivos, adquirem

10 •

capítulo 1

poderes legais para solicitar que atividades sejam conduzidas da forma desejada, e que suas diretrizes sejam seguidas. Esta característica faz com que as empresas possuam uma única identidade, mesmo que sejam separadas por diversas filiais. A mais importante unidade de análise na teoria econômica das organizações é a transação, em outras palavras, a transferência de bens ou serviços de um indivíduo para outro. Como os principais participantes destas transações são pessoas, seus comportamentos e interesses são de fundamental importância para o entendimento das organizações. Desta forma, as ações dos indivíduos determinam o comportamento e a performance das organizações. Analisando como as organizações emergem, como são estruturadas, como funcionam, e como a atividade econômica é dividida, concluímos que as pessoas que fazem parte destas organizações procuram alcançar eficiência na condução de suas atividades. Eficiência também deve existir em um nível sistêmico, na organização das atividades das pessoas e na estrutura, gestão e direção das instituições que elas criam. Uma organização é um conjunto de indivíduos que atuam juntos em uma criteriosa partição de trabalho para alcançar um propósito comum. As organizações são ferramentas sociais por meio das quais muitos seres combinam seus esforços e trabalham juntos para atingir intenções que isoladamente jamais poderiam fazê-lo. No fundo as organizações são um sistema cooperativo racional. As pessoas se dispõem a apoiar entre si de maneira racional e proposital, para alcançar objetivos e proporcionar soluções que individualmente não teriam nenhuma condição de realizar. Essa razão permite que os empenhos individuais e grupais sejam conjugados e integrados no sentido de produzir resultados ampliados e expandidos. Daí o mérito do papel das pessoas e grupos no comportamento das organizações, que invadem e atravessam tanto a sociedade como a vida particular de cada indivíduo. Diariamente estamos em contato com organizações. Se não participamos delas como membros, somos afetados como clientes, clientela, consumidores ou cidadãos. Nossos experimentos nas organizações podem ser bons ou maus. Algumas vezes, as organizações podem parecer adequadas ou ajustadas às nossas demandas e, outras vezes, nosso tato com elas pode provocar irritação e desilusão. Elas podem até tornar-se um martírio para nós. Mas são imprescindíveis para a qualidade de nossas vidas e para o nosso triunfo pessoal.

capítulo 1

• 11

As organizações dependem das atividades e cuidados de muitas pessoas que colaboram para o sucesso corporativo. Desse modo, as pessoas são os chamados recursos humanos das organizações e fazem contribuições que tornam a organização habilitada de servir um propósito particular. Mas, para que as pessoas possam gerar resultados e proporcionar sucesso e bonança às organizações, elas também requerem fundos físicos e materiais, que são operados e processados por meio do serviço das pessoas. Todos esses meios, são obrigatórios para a produção de bens ou de serviços e, assim, para o sucesso organizacional. As organizações constituem o recurso do desenvolvimento econômico e social. Os atos que ocorrem na sociedade moderna são somente possíveis dado ao fato de que as pessoas agrupadas em organizações se envolvem em planos comuns. Realmente, a sociedade moderna desenvolveu-se graças a formação de organizações especializadas que fornecem os bens e serviços de que ela necessita. É duvidoso que o empenho de uma pessoa isolada pudesse fazer muita coisa dentro de nossa sociedade. Na verdade, vivemos em uma comunidade organizacional, na qual as organizações são as primordiais realizadoras e impulsionadoras da revolução e progresso. A sociedade moderna desenvolveu-se através da geração de organizações especializadas aptas a fornecer os bens e serviços que ela necessita. O estágio de desenvolvimento de uma nação, e a qualidade de vida de seu habitante dependem fundamentalmente da qualidade e hegemonia de suas organizações. Além da importância para as nações, não devemos esquecer o valor das organizações para as pessoas. São nelas que as pessoas passam a maior parte de suas vidas cotidianas. A primeira explicação para a reprodução de organizações é de que certas finalidades somente podem ser alcançadas mediante a ação concorrente de grupos de pessoas. Qualquer que seja a meta - obtenção de benefício, educação, religião, saúde, diversão, resultaram em enormes aumentos do padrão de vida da sociedade. No entanto, as organizações são muito mais do que meros utensílios para a produção de bens e serviços. Elas também criam o ecossistema em que a maioria das pessoas passa a vida e, nesse significado, tem uma grande influência sobre o comportamento humano. A clareza do comportamento das pessoas nas organizações é o objeto básico do conceito de organização. O estudo do conceito de organização deve iniciar com as organizações, pois estas representam a situação em que ele se desenrola. As organizações funcionam como sistemas abertos, ou seja, em contínua comunicação com seu ambiente externo, fazendo trocas e intercâmbios. Como sistemas abertos, as

12 •

capítulo 1

organizações, não são métodos determinísticos do tipo de causa e efeito linear. Pelo contrário, as organizações, são sistemas probabilísticos cuja conduta não pode ser explicada apenas por ângulos separados ou relações casuais simples e diretas. A diversidade organizacional não pode ser explicada simplesmente por blocos de construção, mas por uma visão sistêmica e holística. Além disso as organizações não são estáticas, nem inertes. Elas têm vida própria. Nascem, crescem, vivem e morrem. Na verdade, as organizações não são simplesmente prédios ou conjuntos de salas e de maquinários. A infraestrutura física serve apenas para que a organização tenha um palco para funcionar, ou seja, para transformar em resultados, como produtos ou serviços. Em outras palavras, as organizações são organismos vivos e inteligentes que se ajustam e se adaptam continua e constantemente ao contexto ambiental em que vivem. Porém, não são as organizações que são inteligentes, mas sim os indivíduos que nelas trabalham. 1.1.2  Organizações e as Pessoas Uma organização é um conjunto de pessoas trabalhando juntas em uma separação de trabalho para alcançar um propósito comum. As organizações são entidades por meio dos quais muitas pessoas combinam seus empenhos e trabalham juntas para alcançar objetivos que sozinhas jamais conseguiriam alcançar. É essa ampliação de esforços conjugados e coordenados que permite a construção de edifícios, fabricação de automóveis, prestação de serviços etc., além de um indeterminado número de produtos e atividades especializadas. As organizações constituem a invenção mais complexa e sofisticada do ser humano. As organizações se baseiam na colaboração e solidariedade das pessoas. Na verdade, elas surgiram em função das deficiências individuais das pessoas. Juntando esforços, as pessoas conseguem ultrapassar suas deficiências individuais e alcançar resultados que sozinhas jamais poderiam alcançar. Assim o motivo das organizações é a colaboração e a cooperação das pessoas envolvidas no sentido de alcançar metas comuns. Na verdade, o resultado desse efeito coletivo não é uma soma, mas a multiplicação dos empenhos individuais. Por essa razão, o instrumento de comando hierárquico e regras burocráticas para chegar ao compromisso pessoal e à responsabilidade solidária através do trabalho em equipe. Desta forma, a logística de pessoas, hoje, se faz em toda a organização. As unidades de RH funcionam como consultores internos, criando

capítulo 1

• 13

e oferecendo recursos e condições para um definitivo gerenciamento do talento, conhecimento e do capital humano por meio dos gerentes que trabalham como gestores de pessoas. As organizações necessitam de capital para funcionar. Na verdade, elas funcionam como métodos abertos que apresentam uma incrível reiteração de etapas: importam recursos, fazem o processamento ao longo de seus processos produtivos e exportam capital, na forma de produtos, atividades ou informação. As organizações são instituições sociais que visam para alcançar metas comuns. Assim poderíamos dizer que as organizações são geradas de edificações, tecnologias, sistemas, processos de trabalho, recursos como dinheiro e matérias primas etc. Todas essas coisas formam a infraestrutura das organizações, ou seja, os meios físicos e reais que elas contam para poderem funcionar. Na realidade, essas coisas físicas e tocáveis são as que mais marcam a existência das organizações habituais, mas não são elas que as formam. A essência das organizações está nos indivíduos. As organizações são formadas por uma globalização de diferentes recursos. Elas são dotadas de bens materiais (prédios, edifícios, instalações, equipamentos, aparelhos, matérias primas), e caracterizam-se como sistemas fechados, parados e sujeitos a decomposição, deterioração, perdas e desvalorização. As organizações também são dotadas de meios financeiros - como capital, financiamento, empréstimos, investimentos etc. O capital sob a forma desses recursos fazendários está sujeito a inflação, deflação, mercado de capitais e pode variar em função desses fenômenos. Os recursos materiais e financeiros formam a essência da contabilidade tradicional. São avaliados quantitativamente e em moeda corrente, referindo-se aos ativos concretos da organização. Durante o período Industrial, as organizações tinham o seu valor de mercado por causa desses recursos organizacionais palpáveis. Além disso, no período industrial, indivíduos que constituíam uma organização eram chamados de recursos humanos. Na Era da Informação, estes foram alçados à categoria de aliados da organização. Eles não são mais "domínio" da organização, mas sim colaboradores internos ou externos que contribuem para o êxito organizacional. Atualmente, não se fala em controlar as pessoas, mas sim em administrar com elas. As pessoas são as responsáveis em conduzir os recursos organizacionais.

14 •

capítulo 1

1.1.3  Stakeholders Antigamente, eram considerados como componente das organizações apenas os acionistas ou donos, administradores - diretores e gerentes - e os empregados. Os primeiros contribuíam com o recurso financeiro, créditos e ativos da organização, enquanto os segundos tinham a tarefa de dirigi-la, e os terceiros de executar as funções e operações por meio de seu trabalho. Esse antigo e restrito ponto de vista foi trocado por uma visão mais contemporânea e abrangente, ou seja, a visão dos stakeholders. Stakeholders são pessoas ou um grupo, que legitima as ações de uma organização e que tem um papel direto ou indireto na gestão e resultados dessa mesma organização. É formado pelos funcionários da empresa, gestores, gerentes, proprietários, fornecedores, concorrentes, ONGs, clientes, o Estado, credores, sindicatos e diversas outras pessoas ou empresas que estejam relacionadas com uma determinada ação ou projeto. Apurou-se que, para poderem funcionar e atingir o triunfo em suas operações, as organizações precisam da ajuda conjugada e conjuntamente de vários parceiros. Para obter e melhorar essa contribuição, as organizações necessitam fazer com que ela valha a pena: a organização precisa premiar adequadamente cada contribuição com numerário igual ou maior. Nem todos esses componentes atuam necessariamente dentro da organização. Alguns membros podem estar fora da organização (acionistas, os abastecedores e os consumidores), ou estar dentro da organização (diretores, gerentes, empregados e cooperadores). Em algumas circunstâncias, alguns desses componentes podem assumir um papel dominante para a estabilidade da organização, mas todos eles mantêm relações de proporções com a mesma: proporcionam contribuições em troca de estímulos, enquanto a organização proporciona estímulos em troca de subsídio. Entre os membros e a organização existe uma forte relação de mutualidade: a organização espera que os membros tragam contribuições e concede-lhes estímulos e recompensas para incentivá-los a aumentar suas contribuições. Do lado contrário, os membros proporcionam contribuições e esperam estímulos e recompensas em troca. Cada parte faz aplicações na outra com a esperança de obter retornos mediatos ou rápidos. Cada parte toma decisões sobre a ininterrupção de seus investimentos na dependência dos resultados alcançados. Se os

capítulo 1

• 15

resultados forem satisfatórios, a resolução final será manter e continuar os investimentos. Esse processo de mutualidade é importante para o entendimento das permutas que ocorrem dentro e fora da organização De um lado, as organizações estão colocadas a dar estímulos e incentivos para seus membros, desde que estes deem um resultado satisfatório em termo de contribuições, trabalho, conquistas de objetivos e resultados. Em contrapartida, as pessoas estão dispostas a fazer contribuições logo que estas produzam um resultado em termos de estímulos e incentivos, trabalho, remuneração, benefícios, incentivos, possibilidades e qualidade de vida. Essas relações de troca entre organizações e pessoas devem ser relativamente estabilizadas, indicando que ambas as partes devem ter algum resultado satisfatório nesse relacionamento. O denominado equilíbrio organizacional decorre exatamente disso. Assim, indivíduos e organizações estão envolvidos em um particular e prolongado inter-relacionamento, uma espécie de acordo. Os indivíduos necessitam das organizações para labutar, colaborar, participar e ganhar a vida ou para conseguir produtos, atividades, diversão e comodidades. Entretanto, as organizações precisam de pessoas para poderem atuar e funcionar satisfatoriamente e comercializar seus produtos e serviços.

1.2  As Funções do Estado 1.2.1  Conceito de Estado A definição de Estado surgiu do conceito antigo de cidade, da cidade-estado da Grécia antiga e da cidadania romana. No século XVI a expressão Estado passou a ser usado com o significado moderno de força, poder e direito, sendo um dos assuntos tratados pela literatura científica. Duguit interpretou o Estado como a força a serviço do Direito e citou não haver Direito Público sem demarcação do poder de Estado. Atualmente o Estado é definido como um grupamento de pessoas que convivem em um mesmo território com divisas definidas, organizada de maneira que apenas algumas pessoas são escolhidas para controlar, direta ou indiretamente, uma série de serviços do grupo, com suporte em valores reais ou socialmente identificados e, quando necessário, com suporte na força. Em resumo, por Estado entende-se um grupamento de pessoas definidas ou fixadas em um determinado território expostas à autoridade de um poder soberano. Na linguagem jurídica, o Estado é uma sociedade, pessoa jurídica de

16 •

capítulo 1

Direito Público interno, civilmente consciente por ações dos seus representantes que nessa qualidade não causem prejuízos a terceiros, procedendo de modo inverso ao Direito ou faltando o dever ditado por lei. 1.2.2  Conceito de Nação Por nação compreende-se a mais ampla sociedade de pessoas, unidas por um pensamento e cultura comuns. Mesmo que esta sociedade de pessoas ocupe uma mesma área, levando seus componentes a terem uma identidade de proveitos sobre a terra e o lugar, sua unidade essencial é procedente de um envolvimento profundo de sua história, de sua religião ou de sua cultura. Por essa razão, uma nação pode existir como população histórica e cultural, livre de autonomia política ou soberania estatal. Desta forma, a nação é um grupamento de pessoas unidas por uma compatibilidade de tradição, idioma, costumes e religião, fundamentado na consciência de uma nacionalidade. A definição de nação não pode ser confundida com a definição de Estado. Enquanto Estado é a nação politicamente disciplinada, Nação nada mais é do que um grupamento humano preso por vínculos culturais, históricos, linguísticos e religiosos. Vale a pena mencionar que um Estado pode ser formado por mais de uma nação. 1.2.3  Composição do Estado A definição de Estado anteriormente citada aponta para a existência de três elementos típicos: povo, território e poder. Estes componentes caracterizam os pressupostos ou condições para a existência do Estado. Porém, alguns autores não os consideram como componentes essenciais, preferindo a nomenclatura “condições necessárias”. Isto, contudo, é apenas uma questão de pensamento e de palavras, pois componentes e condições são acontecimentos inseparáveis do Estado e a ele essenciais. Assim, os componentes constitutivos do Estado são: •  Povo: Conjunto de indivíduos que se unem para criar o Estado, firmando com este um vínculo jurídico de caráter perpétuo, atuando na criação da vontade do Estado e na função do poder soberano. População é o componente humano do Estado e assim como o mesmo é uma sociedade que se faz essencial a presença de pessoas; não existe Estado sem população. •  Território: Sustentação física do Estado à qual se estabelece limite de sua jurisdição. Não temos Estado sem território, uma vez que este determina os

capítulo 1

• 17

limites físicos da ação da autoridade do Estado. O território é, em diferentes palavras, o componente geográfico do Estado, ou seja, a parte do globo terrestre por ele ocupada, que define o espaço da sua jurisdição. •  Poder: Consiste na chance de o Estado impor os indivíduos a fazer ou não alguma coisa conforme o seu motivo, que é o bem habitual, o bem da coletividade, nas divisas do seu território. Dessa maneira, o poder do Estado não depende de qualquer outro tipo de poder social no campo da sua jurisdição territorial. O poder do Estado se faz existir através do governo, que é a autoridade máxima ou o órgão político do Estado, favorecido de poder soberano. O Estado, enquanto grupo de pessoas politicamente coordenado e geograficamente demarcado que possui o direito de utilizar o poder para designar os seus valores, tem de contar com ferramentas através das quais possa executar. O governo faz parte do rol dessas ferramentas e é formado de pessoas e órgãos nomeados para executar os objetivos do Estado. Todas as pessoas de um Estado não fazem parte do governo, embora, frequentemente, têm o direito de escolher ou de serem escutadas na decisão sobre como o Estado será comandado e sobre quem irá comandá-lo. Os trabalhos prioritários do Estado contemporâneo são a gerência, a direção, o exercício, a execução e a prestação de serviços públicos. Podemos até atestar, a grosso modo, que o Estado é uma verdadeira fábrica de serviços de caráter público e que governar é, antes de tudo, administrar estes serviços. 1.2.4  Poderes A tese da separação dos poderes do Estado, igualmente conhecida como teoria das funções do Estado, causou divergências entre os escritores de direito público. O poder do estado é uno e indivisível. Feita esta colocação a respeito da indivisibilidade do poder do Estado, é necessário distinguir as três formas ou espécies de funções que se percebe no Estado moderno. A primeira é aquela em que o poder se mostra sob a forma de condutas gerais e compulsórias para os cidadãos. Em outras palavras, é a função ou poder legislativo. Da mesma maneira como nos organismos vivos em que cada atividade é praticada por um órgão, no Estado a função própria de fazer as leis é praticada por um órgão peculiar, o órgão legislativo: é o Parlamento, Assembleia Nacional, Congresso. Esta designação varia segundo as várias Constituições. A

18 •

capítulo 1

segunda não diz respeito à publicação da lei que regula a vida social, mas sim as ações individuais, visando objetivos reais, particulares, como a nomeação de funcionários, a realização de serviços públicos, cobrança de impostos. A esta função estatal dá-se a denominação de Poder Executivo ou, mesmo, função administrativa, e é executada pelo órgão executivo. A terceira surge quando o Estado anula as discórdias surgidas entre os cidadãos por motivo do cumprimento das leis, quando julga e fere os infratores destas leis, quando, em síntese, ele utiliza o Direito, utiliza as leis nos casos particulares, faz imperar a justiça nas relações sociais, garante os direitos privativos. Esta é a função judiciária, constituída pelos tribunais e juízes, o Poder Judiciário. A versão mais antiga da teoria da separação dos poderes do Estado é encontrada em Aristóteles, ao mostrar a sua apreensão em atribuir a um só indivíduo a execução do poder e, acima de tudo, com a falta de capacidade prática de que um só homem antevisse tudo o que nem a lei pode classificar. Segundo Aristóteles, na composição do Estado há três divisões, que devem ser dignas de especial cuidado: a assembleia dos cidadãos, que é o corpo deliberante, o autêntico soberano; a magistratura, que são os funcionários nomeados pela assembleia para desempenhar certas funções, e corpo judiciário. Porém, a criação moderna da separação dos poderes não tem como estímulo os escritos de Aristóteles, sendo, pois, formada com o crescimento histórico do Estado até o aparecimento da obra de L’esprit des lois, publicada por Montesquieu, em 1748. Segundo Montesquieu, o habitual seria que o Estado se estruturasse com três poderes: um Legislativo, um Executivo e um Judiciário. A imposição da separação dos poderes fica incontestada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada na França em 1789. A teoria da separação dos poderes, seguida nas constituições da quase todos os países, está coligada à ideia de estado democrático, sendo uma embaraçada construção doutrinária chamada sistema de freios e contrapesos. 1.2.5  Organização O Estado federal surgiu em 1787, nos Estados Unidos da América, com o acordo da cidade de Filadélfia, momento em que houve a transformação da Confederação dos Estados Americanos planejada com a declaração de independência de 1776. No que se refere a ideologia, este sempre apresentou dificuldades quanto ao argumento de Estado federal, e mesmo quanto ao regime federativo. Contudo, hoje temos que o Estado federal é consequência de um acordo regulamen-

capítulo 1

• 19

tar, abandonando-se a ideia de uma globalização de Estados sob um contrato. Na organização do Estado brasileiro temos que ressaltar: •  Forma de Estado (federação): Ideia que se compara a Estado Unitário. A definição da forma de Estado está relacionada à ideia de distribuição física de território. •  Forma de Governo: No Brasil é a República. Está comparada com a ideia de entidade do Poder e a ligação entre governantes e governados. A forma contrária à República é a Monarquia. •  Regime de Governo (presidencialista): No presidencialismo o Presidente da República é o líder do Estado e do Governo. Outro modo de governo é o Parlamentarismo onde o líder de Governo é o 1º Ministro e o líder de Estado é o Presidente da República ou o Monarca. Vê-se, pois, que o Parlamentarismo é permitido nos modelos de governo República e Monarquia. •  Regime político democrático: Podemos conceituar democracia pela frase mais renomável: O poder emana do povo, exercido pelo povo e em proveito do próprio povo. A democracia pode ser direta, inviável diante da grande integração populacional; indireta, também nomeada representativa, onde o povo elege aqueles que vão representá-lo e semidireta, formada de três institutos: plebiscito, referendum e iniciativa popular. Podemos salientar alguns aspectos vantajosos à forma de Estado federal, tais como: •  Proibir ou ao menos dificultar a criação de governos totalitários uma vez que defende o acúmulo do poder em somente um órgão, isto é, torna difícil a concentração do poder. •  Permitir a proteção da democracia. Ao aproximar os governantes e governados pela cooperação do povo nos órgãos do poder territorial e, por meio deles, influenciar no Governo central. •  Proteger as particularidades locais e regionais. Ao passo que provoca a globalização, reserva uma esfera de ação independente a cada Estado elemento, ou seja, o Estado que incorpora a federação preserva os seus valores e suas características suis generis. •  Crescer o poder dos Estados. A união de esforços fomentada pela sociedade propicia a globalização dos estados em elementos que são espontaneamente mais fortes. Estas perspectivas do Estado federal têm determinado o rumo vigente para a organização federativa.

20 •

capítulo 1

O Estado, como hoje entendido, constitui-se dos seguintes elementos: território, povo organizado, poder e objetivos. O território é o limite espacial onde o povo se arruma determinando poderes e objetivos. Da ideia de território, de organização política e objetivos surgem as definições de forma de Estado, forma de Governo, modo de Governo e regime político. É de se ressaltar que as definições de soberania, cidadania e pluralismo político são os que mais tecnicamente podem ser compreendidos como princípios do Estado, já a grandeza e os valores criam as finalidades que o Estado busca atingir. Os três primeiros (soberania, cidadania e pluralismo político) se equiparam com a ideia de organização do Estado sob sua forma política, os outros (dignidade e os valores) implicam na ideia de metas morais e éticas a alcançar. A Administração Pública é o mecanismo de que dispõe o Estado para alcançar os seus objetivos. E são objetivos do Estado nutrir o desenvolvimento econômico-social do país e a segurança nacional. As tarefas da Administração Federal e, sobretudo, a realização dos planos e programas de governo serão objeto de infinita coordenação. A coordenação será empregada em todos os registros da administração mediante o desempenho das chefias individuais, a realização de reuniões e o andamento de comissões de coordenação em cada setor administrativo. Quando subordinados ao Presidente da República, os temas deverão ter sido antecipadamente coordenados com todos os setores neles motivados. Os órgãos que atuam na mesma área geográfica devem sujeitar-se à coordenação de maneira a assegurar programação e realização integrada dos serviços federais. 1.2.6  Governo Governo pode ser entendido como o grupo passageiro de pessoas conscientes pela realização do contrato social, isto é, simboliza o projeto de Estado, em suas convicções nacionais. Nesse significado, levando-se em consideração a variedade de aspectos, pode existir dois tipos essenciais de regimes de governo: os regimes liberais e autoritários. É necessário destacar que inúmeras vezes se utiliza a expressão totalitário como sinônimo de autoritário, o que não é certo. O totalitarismo dá a entender uma unidade de pensamento, um pensamento tomado como verdade plena e derradeira. Não ocorre totalitarismo sem autoritarismo, mas a recíproca não é verdadeira.

capítulo 1

• 21

A composição do Governo está ligada à ideia de organização da Administração Pública que engloba: Administração Direta, Administração Indireta e a Fundacional. A intenção do Governo é o fornecimento dos serviços públicos com competência, visando à satisfação das carências coletivas. O Governo desempenha uma função política que resulta uma atividade de ordem elevada divulgada à direção máxima e completa do Estado em seu conjunto e em sua unidade, voltada a determinar os motivos da ação do Estado, a indicar as orientações para as outras funções, procurando a unidade da soberania estatal. 1.2.7  Administração Pública Administração Pública é a ação que o Estado progride por meio de atos reais e confeccionados, para a aquisição, direta, ininterrupta e imediata dos benefícios públicos. Nem todas ações praticadas pelos poderes são características de administração pública. É o fato da atividade jurisdicional, ou seja, o uso do Direito pelo Poder Judiciário. O gerenciamento público pode ser direto ou indireto. Ele é direto quando a ação administrativa é feita diretamente pelo próprio Estado, pelos órgãos hierarquizados do Poder Executivo. Ela é indireta quando a ação administrativa é feita por meio de outras organizações ou pessoas, que tanto pode ser de mando público, como de mando privado. Sob esse ponto de vista é que se costuma diferenciar a prestação direta ou indireta da atividade. Os elementos da Administração Pública são os indivíduos jurídicos de direito público e de direito privado por comissão, órgãos e fatores públicos que fazem a função administrativa. São poderes da Administração Pública: ligado ou metódico, ilimitado, hierárquico, disciplinar, presidir e o de polícia. A organização da Administração Pública está focada para a estrutura da Administração Pública: Direta, Indireta e Fundacional. A Administração Pública tem como natureza cumprir fielmente as instruções do Direito e da ideologia administrativa que conduzem o seu desempenho. Ao ser adotada em função ou cargo público, todo encarregado atribui-se para a coletividade a palavra de bem servi-la, porque outra não é a vontade da população, como legítima destinatária dos bens, serviços e interesses governados pelo Estado. As intenções da Administração Pública são permanentemente o interesse público ou o bem da sociedade. A prática administrativa obedecerá aos outros princípios: legalidade, impessoalidade, moralidade e probidade, publicidade, eficiência, licitação pública, razoabilidade, igualdade e motivação.

22 •

capítulo 1

Existe uma ótica de que a administração pública se considera como uma profissão, semelhante ao direito ou à medicina, se valendo de múltiplas perspectivas teóricas. Desse modo, poder-se-ia argumentar que a formação para as áreas na administração pública deveria seguir uma estratégia semelhante, com os profissionais de educação se preocupando menos com o fundamento disciplinar de certas técnicas e ideias do que com sua aplicabilidade aos problemas que os profissionais de administração enfrentam na realidade. A afirmação de que os profissionais da administração pública devam se valer apenas de perspectivas teóricas criadas no contexto de uma disciplina acadêmica tradicional, como a análise das organizações ou a ciência política, se propõe a dizer que os administradores públicos devem buscar orientação em teorias não diretamente ajustadas aos seus propósitos. Para que seja possível continuar a examinar o contexto das teorias das organizações públicas, é fundamental observar duas outras tendências, na teoria da administração pública, que restringiram o alcance das questões tratadas no campo. Em primeiro lugar, em sua maioria, os teóricos da administração pública priorizaram as organizações complexas e grandes, as definições dadas ao termo organização giraram em torno de características claramente relacionadas às estruturas burocráticas tradicionais. Embora a maior parte das teorias se refiram a organizações grandes e complexas, a vasta gama de órgãos públicos recomenda que permaneçamos abertos a uma definição menos restritiva de nosso objeto. Adicionalmente, devemos estar cientes de que, se assumirmos ou tomarmos as características das grandes empresas para definir as características das organizações públicas, poderemos, inconscientemente, estar mantendo a continuação dessas estruturas. Na maior parte dos casos, os teóricos de administração pública compararam, de forma ampla, a administração pública à administração governamental, ou seja, à realização de mandatos de governo. Os principais autores da administração pública se concentraram sobre as organizações que normalmente fazem parte do governo: repartições, conselhos e comissões de nível local.

1.3  Política de Estado e Política de Governo Políticas de governo são aquelas em que o Poder Executivo determina num processo bem mais básico de formulação e implantação de determinadas medidas para responder às demandas posicionadas na própria agenda política interna,

capítulo 1

• 23

ou vindos de fora, como consequência de eventos internacionais com algum abalo doméstico. Tais políticas podem até envolver escolhas complicadas, mas pode-se dizer que o caminho entre a exposição do problema e a definição de uma política de governo estipulada é bem mais curto e simples, ficando frequentemente no plano administrativo, ou no poder dos próprios ministérios setoriais. Políticas de Estado, são aquelas que abrangem as burocracias de mais de uma agência do estado, e acabam passando pelo parlamento ou por diferentes instâncias de discussão, depois que sua tramitação dentro de um âmbito da máquina do estado envolveu análises técnicas, simulações, estudos de impacto horizontal e vertical, resultados econômicos ou orçamentários, quando não um cálculo de custo-benefício levando em conta o curso completo da política que se pretende implantar. O trabalho da burocracia pode levar meses, bem como o casual exame e debate no Parlamento, pois políticas de estado, que respondem de fato a essa designação, frequentemente envolvem mudanças de outras normas ou distribuições pré-existentes, com incidência em setores mais extensos da sociedade. Em outras palavras, Política de Estado é a decisão de lutar por um método de integração regional, a assinatura de um tratado de livre comércio, a conclusão de um acordo de colaboração científica e tecnológica num determinado setor e coisas do gênero. Política de governo seria a determinação de alíquotas tarifárias para uma área definida, a eliminação de produtos ou ramos econômicos da conquista do tratado de livre comércio, ou a assinatura de um protocolo complementar, estabelecendo modalidades para a colaboração científica e tecnológica no setor já contemplado no acordo. Por isso, não se pode planejar que as políticas de Estado possam ser usadas somente pelo ministro da área, ou mesmo pelo presidente, ao sabor de uma ideia de um assessor, pois esporadicamente o trabalho técnico terá sido exaustivo ou aprofundado o bastante para justificar legitimamente essa designação. Isso se reproduz, ou seja, na própria estrutura do estado, quando se pensa em como são formuladas e implantadas essas políticas de estado. Pense se por exemplo, em políticas de defesa, de relações exteriores, de economia e finanças, em seus aspectos mais teóricos do que operacionais, de meio ambiente ou de educação e tecnologia. Estas frequentemente envolvem um corpo de funcionários qualificados, dedicados profissionalmente ao estudo, acompanhamento e organização das grandes orientações das políticas ligadas às suas respectivas áreas. Ou opina-se, então, medidas de natureza conjuntural, ou voltadas para uma clientela mais limitada, quando não ações de caráter mais reativo ou

24 •

capítulo 1

operacional do que propriamente sistêmicas ou estruturais: estas podem ser ditas de governo, aquelas não. Logo, quando alguém disser que está seguindo políticas de estado, pare um pouco e analise os procedimentos, a cadeia decisória, as consequências para o país e certifique se isso é verdade, ou se a tal política corresponde somente a uma iniciativa individual do chefe de estado ou do ministro que assim se manifestou. Nem todo presidente se dedica somente à políticas de estado, e nem toda política de estado é indispensavelmente formulada pelo presidente ou decidida somente na esfera do Executivo.

1.4  Estado e Sociedade Civil Durante formação social própria e relativamente autônoma, o Brasil emerge no período do predomínio do capital mercantil, acontecendo, na época, uma subordinação formal da nossa economia, que mantinha basicamente intocado o modo de produção do povo colonizado, ao capital metropolitano. Marca determinante do início da nossa formação histórica é o escravismo, com resultados tanto para a economia, quanto para a estrutura de classes. A passagem da subordinação formal ao de subordinação real ao capitalismo, que aconteceu tardiamente, seguiu a chamada “via prussiana”. Esta associação, da “modernização” tardia com a marca de dependência da nossa economia, fez com que o desenvolvimento veloz da economia não viesse seguido pelo desenvolvimento da sociedade civil, o que apurou as contradições sociais, próprias do capitalismo, e, ao mesmo tempo, tornou a burguesia sem força para lançar mão de recursos, usados nas economias mais desenvolvidas, que tornassem menos intensos tais conflitos. A burguesia nacional não consegue fazer as reformas sociais que o próprio desenvolvimento capitalista geralmente impõe. Em decorrência disso, esta prepara um aparato bastante modernizado, em que as forças policiais e militares são fundamentais para a garantia da lei e da ordem. Desta forma o estado e a economia apresentam evolução, enquanto as questões sociais e as conquistas políticas revelam-se defasados. Ou seja, é necessário que a sociedade não se civilize, para que não questione a distribuição das riquezas adquiridas pelo desenvolvimento econômico acelerado. O máximo que se permite é a relação entre partes da burguesia. Ao mesmo tempo, teme-se a explosão social, a violação das tensões represadas por meio de um regime que regula os conflitos fora e acima dos meios oficiais de relações civis entre as classes. A burguesia tem o

capítulo 1

• 25

receio de que as classes populares, ao não se sentirem privilegiadas nesta “democracia de vitrine”, demostrem profunda insatisfação levando a sociedade ao desequilíbrio, como já acontecera no passado em alguns países. Por isso, reage até mesmo contra as reformas e só as efetua se arrastada a praticá-las, tentando sempre uma maneira de refreá-las. Esta falta de capacidade não é específica à burguesia, mas nasce das suas relações com o caráter subordinado do desenvolvimento capitalista, em decorrência de que a classe predominante brasileira não construiu um projeto de cunho predominante, porque não interpreta as vantagens das outras classes e muito menos da sociedade como um todo. Desta maneira, a elite relaciona-se com as frações de sua classe a base de acordos pontuais e de arranjos restritos e, ao mesmo tempo, teme a força política das classes subordinadas, procurando mantê-las fora do jogo democrático. Esta conciliação por cima é certa nos países mais capitalistas pela administração do estado, que se torna a ferramenta para garantir a coesão das classes dominantes. O governo decorrente desta conjunção de fatores, ao mesmo tempo que precisa se consolidar para impedir que a sociedade civil ponha em risco o desenvolvimento capitalista, se abate devido ao choque de interesses políticos das frações de uma burguesia sem aderência. Verifica-se um fortalecimento da sociedade política em detrimento da sociedade civil. O estado se relaciona com os trabalhadores da mesma maneira como o senhor se relaciona com o escravo, e com as camadas médias por meio das políticas de favor. Em outras palavras, o relacionamento político, seguindo a lógica do pluralismo atomista liberal, ocorria entre o estado e os indivíduos isolados e não com as organizações da sociedade civil, colaborando para a maior importância do estado em relação a sociedade civil. Some-se a isso, o acontecimento de que, no plano econômico, o Brasil quase não conheceu uma fase de capitalismo concorrencial, como todos os países de industrialização hipertardia e, ao contrário, restou um processo de monopolização precoce, com o método a mecanismos de acumulação forçada sob a proteção da intervenção estatal, o que colaborou ainda mais para reforçar decisivamente o Estado e reduzir a ação controladora da sociedade civil sobre ele. Fica claro assim que a coexistência livre das classes se impõe como uma realidade cada vez mais forte e inegável. As classes oprimidas reivindicam a sua participação na sociedade civil e no estado. Assim a conciliação entre os semelhantes se vê intimidada pela classe trabalhadora que, lentamente, torna-se um parceiro com o qual é preciso

26 •

capítulo 1

dividir, ainda que desigualmente, as honras da civilização. Resta para as classes mais elevadas recorrer para outros recursos de autoproteção, procurando retardar as políticas igualitárias. O desafio a seguir é o de levar adiante o método de socialização da política, fazendo com que a sociedade civil assuma peso crescente no controle da vida nacional a partir da conquista da supremacia das forças democráticas, baseada prioritariamente no acordo. Esse processo já havia iniciado no início dos anos de 1960, com o progresso de uma sociedade civil mais rica e articulada. É necessário que o processo de fortalecimento democrático proceda de baixo para cima, estabelecendo e ampliando suas conquistas através da crescente incorporação dos novos sujeitos políticos coletivos, a fim de que possa adquirir o consenso majoritário fundamental à sua realização consequente e colaborar para transformar as camadas trabalhadoras em sujeitos ativos da administração pública da sociedade. A extensa incorporação organizada das enormes massas à vida política nacional, além da socialização crescente da política, é o único antídoto de êxito duradouro para o alcance do equilíbrio social. E essa socialização, no Brasil, já não é mais uma mera vontade subjetiva. Embora duramente sufocada, a sociedade civil brasileira tem evoluído e se tornado mais complexa. Multiplicaram-se, principalmente a partir dos anos 80, organismos da democracia direta, sujeitos políticos coletivos de novo tipo (comissões de empresa, associação de moradores, comunidades religiosas de base etc.), juntando-se a antigos organismos de massa, como alguns dos principais sindicatos do país, ou influentes aparelhos privados de supremacia como a OAB, CNBB, a ABI, e a significativos movimentos setoriais contra opressões específicas (em particular o movimento feminista) , ou em defesa da ecologia e da qualidade de vida, cujos protestos - de caráter basicamente democrático – são hoje parte integrante da luta pela renovação política e cultural.

capítulo 1

• 27

28 •

capítulo 1

2 A Teoria das Finanças Públicas

2.  A teoria das finanças públicas 2.1  A Teoria Econômica e o Setor Público 2.1.1  Economia do Setor Público O setor público compreende as instituições governamentais propriamente ditas como, por exemplo, os Ministérios e Secretarias da União, Estados e Municípios, os Tribunais e o Congresso Nacional (Executivo, Legislativo e Judiciário) e as firmas públicas tais como o Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Petrobrás, Correios, o INSS etc. Atualmente, é muito difícil entender o andamento da economia sem considerar o papel do domínio público. As funcionalidades do setor público na atividade econômica cresceram basicamente no século XX, devido à evolução da respectiva sociedade. Em épocas anteriores bastava o exercício do Estado, assegurando Justiça e Segurança, para potencializar o bem-estar social, cabendo ao setor privado a oferta dos excessivos bens e serviços necessitados pela sociedade. Após a Grande Depressão, principalmente, surgiram novas funções para o Estado, não exclusivamente no que diz respeito à normalização da economia, ofertando recursos públicos, como educação, saúde e segurança, como também recursos privados, como produtos siderúrgicos, energia, transportes e telecomunicação. Nos anos posteriores, a economia do setor público continuou sofrendo modificações, principalmente após a Segunda Guerra Mundial, com novas serventias atribuídas ao Estado. Com a urgência de reconstrução da Europa acabada pela Guerra, o Estado aparece como o grande responsável de fomento do desenvolvimento econômico, elaborando ideias de desenvolvimento, planejando investimentos em ramos estratégicos e criando empresas estatais. Na visão da economia clássica, o Estado deveria fazer um mínimo de funções, restringindo-se às mais básicas, como educação, saúde e segurança. Pertencia aos indivíduos a busca do agrado de suas necessidades particulares, de forma que, cada um, atue segundo seus próprios interesses, acabaria oferecendo o interesse geral, mediante o livre funcionamento do mercado. Dessa maneira, quando o empresário busca o seu benefício próprio, que é o lucro supremo, ele mobiliza capitais, adquire edifícios, máquinas e matérias-primas, contrata serviços de diferentes agentes econômicos, aos quais paga proventos, juros, aluguéis e rendas. Os trabalhadores buscam os melhores salários e procuram melhorar em suas atividades, de sorte a aperfeiçoar seu rendimento e atingir seus objetivos. Quando

30 •

capítulo 2

todos os fatores agem do mesmo modo, o produto global aumenta, produzindo maior riqueza para todos, de modo que a procura do bem-estar individual acaba gerando o bem-estar coletivo. Pela ótica clássica, ao Estado cabe apenas regular o livre funcionamento dos mercados e possibilitar a segurança nos negócios ao garantir o respeito às leis e à ordem. 2.1.2  Bem-estar Social A economia clássica prevê um mundo de concorrência ideal, com os mercados apresentando um enorme número de compradores e vendedores, que determinam preços de equilíbrio seguro. Os produtos finais eram homogêneos, sem distinção. Imperava a suposição da livre entrada e saída de empresas nas indústrias e os preços e práticas eram bem conhecidos. Desse modo, a estabilidade nos mercados assegurava a alocação eficaz dos recursos. Assim, havia aplicação ótima de recursos: a estabilidade com maximização de lucro equivale à agregação dos equilíbrios incompletos das firmas; existia perfeita mobilidade de motivos produtivos e de bens no ambiente, sempre que houvesse alterações no preço de equilíbrio na indústria. Contudo, na presença de uma falha de mercado que ameace a livre concorrência mercadológica, a sociedade não consegue o máximo bem-estar. A disputa imperfeita resulta em preços mais avantajados, com menores quantidades dos produtos sendo oferecidos e demandados no mercado. Os mecanismos de mercado frustraram em elevar a produção ao nível formidável de equilíbrio e o Estado precisa interferir para evitar maiores perdas do bem-estar social e erguer o equilíbrio macroeconômico.

2.2  Falhas de mercado A incapacidade de atingir os objetivos de produção, por imperfeições da concorrência, é chamada de falha de mercado, resultante de indivisibilidade do produto, externalidades, despesas resultantes de queda de produção, mercados imperfeitos e ameaças e indefinições na oferta dos bens. Para bens únicos, não se pode estabelecer preços por meio do mercado. É o caso da defesa nacional: as pessoas necessitam de segurança contra iniciativas militares de países estrangeiros e sofrem por isso, indiretamente, por meio de impostos. Porém, não se sabe quanto cada um pagará e qual a quantidade do tesouro da segurança nacional que cada indivíduo irá utilizar. Assim, um bem coletivo só pode ser

capítulo 2

• 31

concedido pelo setor público, pelo impedimento de serem fixados os preços e as quantidades desmedidas. Cada cidadão paga pela segurança nacional, pela totalidade de sua contribuição tributária, e irá favorecer-se da oferta pública desse bem, da quantidade de sua contribuição financeira. Esses bens únicos ou bens públicos são bens não rivais, causando que o consumo de uma pessoa não implicará em menor consumo de outra; da mesma maneira, o aumento da população não implicará na diminuição das quantidades ofertadas desse bem, já que não exigirá necessariamente crescimento dos gastos militares. Os efeitos ajudam quando os privilégios e custos privados, medidos pelos custos de mercado, diferem dos privilégios e custos públicos. Os efeitos podem ser negativos ou positivos. Os efeitos são negativos quando os custos sociais são maiores do que os custos particulares. Por exemplo, quando um curtume suja um rio, ele causa um efeito negativo. Para obter ganhos maiores, a empresa não realiza gastos para impedir a poluição. Como resultado da poluição, o poder público desembolsará mais com o tratamento da água, o rio terá bem menos peixe e a população não poderá usar suas águas com objetivo de lazer. Outros exemplos de efeitos negativos: produção de fumo e seus resultantes; o tráfico de drogas; poluição e engarrafamento de rodovias provocadas pela indústria automobilística; indústria de papel e celulose; fábricas petroquímicas etc. Como exemplo de efeitos positivos, pode ser citado o caso da ação de reflorestamento. A companhia de reflorestamento tem suas despesas e benefícios privados, que se tornam inferior do que as despesas e benefícios sociais que gera ao concederem um número maior de árvores em sua localidade. As árvores até este momento produzem flores, que podem ser proveitosas pelas abelhas dos apicultores locais, que terão suas vantagens aumentadas sem a necessidade de replantio. Da mesma maneira, há uma vantagem para a fauna, a qualidade do ar, ao sistema de chuvas etc. Outro exemplo de efeitos positivos são a atividade educacional e as despesas em pesquisas e desenvolvimento de novos produtos e novos princípios de produção. Investimentos particulares nessas áreas produzem vantagens sociais maiores do que os gastos. Outros fatos de falhas de mercado são os do consumo de produção descendente e mercados incorretos. Esse é o caso de amplas unidades lucrativas que o setor privado não é capaz de produzir. Como exemplo, no Brasil, temos as siderurgias no começo dos anos 50, as usinas hidrelétricas até os anos 80. Se o Estado não entrasse nesse setor, as unidades permaneceriam com pequena dimensão, por ausência de capital; os gastos médios e marginais seriam mais altos, assim como os preços de

32 •

capítulo 2

mercado, causando também em oferta menor da mercadoria. Mais um exemplo: telecomunicações; distribuição de combustíveis etc. Por último, pode haver erro de mercado pelas ameaças e indefinições na oferta de certos bens. Os fatores econômicos não possuem uma confiança absoluta sobre o equilíbrio dos preços e custos, o que lhes faz botar uma gratificação de risco (ou sobre preço) aos preços que desenvolvem reduzindo-se as quantidades ofertadas e demandadas. De outra parte, pela dúvida e risco, muitos bens deixaram de ser feitos, ficando a responsabilidade do setor público. Por exemplo, devido aos perigos de nacionalização de firmas estrangeiras em países subdesenvolvidos, as aplicações privadas estrangeiras deixam de ser efetuadas em setores de rentabilidade mais desvalorizada. Outro exemplo: Petróleo no Brasil (monopólio da Petrobrás).

2.3  Funções do setor público O dever do Estado na economia tem se mudado no passar do tempo. Modernamente, destacam-se os seguintes encargos do Estado, além dos serviços públicos “específicos" ou clássicos referente à segurança e à justiça: a. Função alocativa: engloba a oferta competente de bens públicos, através de produção pessoal ou por empresas privadas. A dinâmica de preços assegura a oferta da larga maioria de bens e serviços de que a comunidade necessita. Todavia, se em razão de erros de mercado ou por outra razão alguns bens e serviços deixarem de ser cedidos, o governo intervém estabelece “o quê e quanto produzir”, livre do mercado. b. Função redistributiva: engloba a realização de adaptações na distribuição da renda e do patrimônio entre as pessoas. Ela comprova pelo fato de que o mercado nem sempre atua na rota socialmente desejada. As ferramentas que o governo possui para isso são os impostos de renda progressivo, estímulos fiscais para as regiões menos favorecidas, transferência direta de renda para os indivíduos e para Estados ou municípios mais pobres etc. c. Função estabilizadora: engloba a intervenção do governo para erguer o nível de emprego, manutenção dos preços e da moeda, diminuir a taxa de inflação, estabilidade no balanço de pagamentos, aumentar a taxa de crescimento econômico etc. As ferramentas que se dispõe são os seguintes: políticas tributárias, políticas monetárias, execução de gastos e de tributação etc.

capítulo 2

• 33

Para fazer frente às novas atribuições do setor público, tem prosperado o número de cobranças e taxas a serem pagos pela população. Com o aumento do número de companhias estatais, especialmente nos países subdesenvolvidos, tem-se agigantado o tamanho do Estado, com a ampliação das despesas públicas. A maior cooperação do governo na economia também, deve-se ao aumento demográfico, ao crescimento dos serviços administrativos do setor público, ao maior estágio de urbanização do país, à necessidade de oferecer bens públicos para o progresso etc.

2.4  Bens públicos, semi-públicos e privados Bens públicos são aqueles ofertados pelo governo; o custo desse bem por uma pessoa não afeta seu acesso a outro ser. O bem público é aproveitado por todos, razão da não-exclusão. A imperfeição de mercado acontece diretamente porque, como todos desfrutam do bem, não há como o governo calcular o quanto cada indivíduo usa o bem e dessa maneira, taxá-lo. Mas todos usam, até quem não é taxado. Bem privado é aquele que não pode ser público por todos. Há adversários entre os indivíduos e o direito de posse não permite que todos tenham permissão ao bem. Bem semi público é aquele que pode ser ofertado tanto pelo governo quanto pelo domínio privado. O governo o oferece para tentar diminuir as desigualdades de possibilidade. E, em alguns casos, há uma opção para possibilitar o alcance ao bem. Bens semi públicos (saúde, educação etc.) atendem ao começo da exclusão porque podem ser concedidos por particulares. Estes na prestação, acertadamente eliminam aqueles que não pagam, isto e só quem paga usa. Os investimentos semi públicos, como as atividades de educação e saúde, apresentam gasto rival e exclusivo, mas apresentam também efeitos. Ou seja, o benefício social é maior que o benefício privado, o que da mesma forma justifica a interferência governamental. Temos vocação a pensar que recursos públicos podem ser fornecidos unicamente pelo setor público. Essa avaliação é oriunda da aceitação pelo público do abastecimento desses bens pelo estado, junto com o desconhecimento de permissíveis alternativas para esses bens. No significado amplo bens públicos são todas as economias, corpóreas ou incorpóreas, imóveis, móveis e que se move por si mesmo, créditos, direitos e ações, que cumpram, a qualquer título, às empresas estatais, autônomas, fundacionais e empresas governamentais. De

34 •

capítulo 2

acordo com a ótica do direito, o abastecimento de bens públicos pelo mercado é irreal. Todos os bens têm diversas peculiaridades, mas vou me ater as essenciais para nossa discussão. Bens podem ser excluíveis, não excluíveis, concorrente no consumo e não-concorrente no consumo. Um bem é excluível quando o abastecedor deste bem pode prejudicar o seu gasto caso as pessoas não o paguem. Um bem não excluível é um bem que o abastecedor não pode impedir seu gasto por não pagadores ou devedores. Um bem concorrente no consumo é um bem com aspecto de não poder ser usado ao mesmo tempo por mais de um indivíduo, já um bem não concorrente pode ser usado por mais de um indivíduo ao mesmo tempo, como um programa de TV. Combinando esses aspectos temos os bens privados, que são excluíveis e concorrente no consumo; bens públicos, que são não-excluíveis e não-concorrentes no consumo; e os bens artificialmente raros, que são excluíveis, mas não concorrentes no consumo. Na veracidade, os bens privados e os bens artificialmente raros podem ser facilmente abastecidos pelo mercado. A adversidade primordial alegada pelos defensores do impedimento de o mercado abastecer os bens públicos é o aspecto desses bens de serem não-excluíveis.

2.5  Políticas Macroeconômicas 2.5.1  Introdução A estrutura da política macroeconômica no Brasil é praticamente a mesma há cerca de 15 anos. Tal estrutura se baseia em uma política de metas claras de inflação, um regime de câmbio variável e metas específicas para a relação superávit primário sobre o PIB. Todavia, a despeito dos elementos de continuidade da estrutura da política macroeconômica, a performance da economia brasileira entre 2000 e 2005 não foi muito elevada, mas teve uma melhora significativa após 2006. 2.5.2  Taxa de Juros, câmbio e Inflação O Sistema de Metas de Inflação no Brasil foi estabelecido em meados de 1999 e determina que a Autoridade Monetária deva perseguir uma única meta, o controle da inflação, que deve durar dentro de um período pré-definido no ano calendário. No Brasil, o objetivo de inflação não foi alcançado nos anos de 2001

capítulo 2

• 35

a 2003, e foi culminada em 1999 e 2004 somente depois de haver uma quebra da meta no decurso do ano. Mas desde de 2004 o governo tem sustentado a inflação dentro da meta com êxito, mesmo no ano agitado de 2008, quando a inflação atingiu bem próxima do limite superior do rumo aceitável. Para entender o funcionamento do Sistema de Metas Inflacionarias brasileiro é imprescindível entender que, por uma sucessão de motivos, a taxa de inflação no Brasil não configura ter uma relação regular e definida com imposições da demanda agregada e a inclinação da inflação parece estar unida a fatores de custo. Iremos mostrar quatro motivos adicionais para tal. Primeiro, existe um número de preços "monitorados" enorme para trabalhos públicos e trabalhos privados de utilidade pública, muitos dos quais, independentemente de serem não negociáveis, são indexados contratualmente por um índice de valores em particular que é fortemente contaminado pela taxa de câmbio. Conforme, no caso dos bens negociáveis, o Brasil é uma economia cada vez mais aberta onde os produtores são, na grande, superioridade “tomadores de preço" em associação ao preço mundial em dólares, que são exógenos em associação ao nível do funcionamento da economia brasileira. Terceiro, a taxa de desenvolvimento dos salários nominais médios e dos funcionários da indústria foi bem limitada desde 1999 e configura ser levemente pró-cíclica, enquanto o desenvolvimento da produtividade configura ser vigorosamente prócíclico. Isso indica que o custo unitário da atividade tende a não ser pró-cíclico e sua inclinação geralmente tem aumentado menos que a inflação, pelo menos na área industrial. O quarto e último motivo é que ocorre certeza de “mark-ups” anticíclicos que crescem quando a taxa de juros sobe, uma vez que crescem os custos financeiros e de ocasião favorável do capital. Por todas essas causas a taxa de inflação não é muito atingida pelo grau de utilização da eficiência estabelecida ou pela taxa de desemprego, pelo menos de forma sistemática. Isso indica, portanto, o desapontamento do tipo de teoria que os comentaristas ou mesmo os “policy makers” creem, e mesmo que haja um contestável sucesso em predizer e fiscalizar o crescimento da demanda agregada associado ao da eficácia produtiva, no fim das contas a inclinação efetiva da inflação no Brasil depende muito das pressões de custos dos valores dos bens importados e exportáveis em dólares e da taxa de câmbio nominal, das oscilações nas regras dos preços controlados, do impacto do veloz crescimento do salário mínimo em medidas nominais e concretos sobre alguns setores não negociáveis e intensos em atividades e não muito mais do que isso.

36 •

capítulo 2

Quando olhamos para a transformação da taxa de câmbio nominal no Brasil, notamos que existe uma inclinação de baixa para os anos de 1999 a 2003 e desde então uma inclinação para uma análise quase contínua até 2011. Essa tendência foi inesperadamente interrompida pela impressionante desvalorização no ano turbulento de 2008, contudo, foi logo apressadamente e mais do que revertida prontamente em seguida. Os níveis de valores dos produtos brasileiros importados e exportáveis em dólares são suficientemente afetados pelo crescimento dos valores internacionais das commodities em dólares, visto que o Brasil é um enorme importador e exportador de commodities. Desse modo, valores dos produtos brasileiros importados e dos exportáveis em dólares despencaram de 1999 a 2003, quando passaram a aumentar de maneira rápida até atingirem o pico de 2008. Esses preços caíram rapidamente até início de 2009, quando voltaram a crescer novamente. Parece que a queda acentuada dos preços internacionais das commodities após a metade de 2008 segurou a elevação dos preços em Reais das exportações e importações, fazendo a inflação ficar dentro do intervalo da meta estabelecida para aquele ano. Durante todo o período de rápida elevação dos preços das commodities no mercado internacional, após 2003, parece evidente que a tendência de manutenção da taxa de câmbio nominal foi fundamental para o sucesso do Sistema de Metas de Inflação no país. A evolução da inflação dos bens exportados e importados, medidos em dólares e reais, e a apreciação nominal do Real transformaram uma série de impactos negativos de oferta depois de 2003 em uma sequência de impactos positivos em moeda local até 2008. É importante observar que os choques de custos negativos, em virtude de uma desvalorização ou aumento dos preços em dólares dos produtos exportados e importados, ocorreram justamente nos anos em que o objetivo de inflação não foi realmente atingido, como em 1999 e 2008. Desde o início de 1999 é possível observar a evolução do nível de três índices de preços: o IGP-M, que é usado na maior parte dos contratos de reajuste dos preços, o IPCA, que é o Índice de preço usado para a meta inflacionária importunada pelo BC; o Índice de Preços Monitorados. Até meios de 2005, o Índice de Preços Monitorados parecia, no agregado, seguir bem de perto o IGP-M. Esse índice é contaminado pelos valores do atacado e dos produtores, e dessa maneira por preços negociáveis no mercado. Este é mais veloz que o IPCA,

capítulo 2

• 37

ampliando os resultados inflacionários das oscilações dos valores internacionais das commodities em dólares e da cotação do dólar. Depois de meados de 2005, existe uma locomoção entre os dois últimos índices e o primeiro. Além do que, o Índice de Preços Monitorados desenvolve mais rápido que o IGP-M. Por um instante, até meios de 2006 e logo depois, o Índice de Preços dos Monitorados passa crescer, em completo, mais lento que o IGP-M. Essa tendência configura ser a consequência de uma série de mudanças ocasionadas em 2005 e 2006 nos instrumentos de indexação de alguns valores administrados ou monitorados. Em contrapartida, a Petrobras garantiu uma política de preservação de valores nominais domésticos seguro da Gasolina e do Diesel a princípio por conta própria, mas após quando não era mais permitido manter os preços seguro em razão ao acelerado aumento do preço internacional do petróleo. Em 2008 o Tesouro cooperou a moderar o aumento do preço doméstico ao minimizar temporariamente os impostos indiretos em relação aos combustíveis. Houve também uma enorme mudança na estrutura regulatória na área de geração e distribuição de energia elétrica em 2004. Os impactos de longo prazo destas alterações foram de desvalorizar o mark-up de agentes e distribuidores de energia elétrica e uma transformação, desde o final de 2004, para mudança da indexação dos reajustes do IGP-M para o IPCA. Ambas as oscilações contribuíram para diminuir o compasso dos aumentos nos valores de energia elétrica. Em 2006, novos acordos que regulavam o preço dos telefonemas de companhias privadas que davam início a serem indexadas por um índice relativo ao preço do setor, com uma variável "x por cento" de fator de atenuação para levar em conta os rendimentos com aumentos da produtividade. Todas essas mudanças de início levaram infortunadamente ao resultado temporário de evitar uma queda ainda maior dos preços controlados junto com o IGP-M, quando a taxa de câmbio iniciou a considerar rapidamente, contudo, ao longo prazo, isso deve ser mais do que recuperado pelo menor crescimento dos preços controlados durante o ano agitado de 2008, que planejou um aumento dos preços internacionais dos importados em dólar no primeiro semestre com uma baixa massiva da taxa de câmbio nominal no segundo semestre do ano. Desse modo, é nítido que após 2006, o grau de indexação dos preços controlados em geral, e com ligação aos preços controlados, em particular, minimizaram, e as margens de ganho de monopólio desses setores parecem ter diminuído, ou pelo menos, interromperam o crescimento. A conduta tanto dos preços em dólar dos importados e exportáveis e da taxa de câmbio nominal no Brasil foram

38 •

capítulo 2

suficientemente atingidos pela volta do rápido aumento da economia mundial após 2003. A rápida ampliação do comércio internacional subsequente, ao restabelecimento do preço internacional das commodities em dólares, o crescimento dos fluxos de capitais para os países emergentes e uma redução dos spreads das taxas de juros de déficit soberano dos países emergentes colaboraram para uma considerável melhora no Balanço de Pagamentos de um amplo número de países em progresso, sobretudo, em associação aos períodos difíceis das repetidas crises e desequilíbrio dos meados dos 90 até 2002. No Brasil, em 2002, as políticas internas estabeleceram comunicação com a situação internacional na indicação da taxa de câmbio nominal. Em 2002, logo depois do default argentino, que diminuiu as linhas de crédito e ampliou os spreads para todos os países emergentes que tinham dívidas externas em soma relevante, o Brasil foi mais atingido proporcionalmente, em que a maior parte dos analistas responsabilizou exclusivamente ao pavor do mercado de defaults externos e internos no caso do candidato lula vencer as eleições em outubro, independentemente da repetida alegação do contrário. Mas o BCB precisaria receber algum crédito para a possibilidade de instabilidade e por levar a uma fuga de capitais quando colocou uma "mark to market rule" para recursos que tratavam antecipadamente dívida pública como "capital certo", ocasionando perda aos investidores. O BC também de forma surpreendente não tentou impedir a fuga de capitais e a brusca desvalorização da moeda ampliando a taxa de juros nominal até que o segundo turno das eleições tivesse acabado. De qualquer forma, o efeito acordado da restauração de uma diferença de juros positivos e significante e uma forte redução fiscal, que levou uma depressão no início de 2003, e o efeito ultrapassado positivo desta baixa sobre as exportações líquidas favoreceram rapidamente as contas externas brasileiras, mesmo que com um enorme custo em formas de produtos e salários. Essas políticas em grupo com a aceleração do desenvolvimento da economia mundial, do comércio mundial e da redução das taxas de juros internacionais e dos spreads dos países emergentes aprimorou consideravelmente as possibilidades de solvência e liquidez das atribuições externas da economia brasileira. O saldo devedor em conta corrente que atingiu um pico de quase 100% das maneiras de exportações no começo da crise cambial de 1999, rapidamente se modificaram em superávits em conta corrente no final de 2003 e esses superávits foram se desgastando apenas depois de alguns anos, pelo efeito combinado do veloz crescimento doméstico com uma avaliação continua do Real. As excelentes

capítulo 2

• 39

condições da conta corrente e o retorno dos fluxos de capitais concederam com que o governo apressadamente pagasse em sua totalidade e tornasse livre dos empréstimos junto do FMI e suas imposições no fim de 2005, que diminuísse a dívida externa Total e ampliasse uma quantidade incontável de reservas internacionais logo depois. A política de acúmulo de reservas autorizou que as autoridades, semelhante em um contexto de atração de influxos de capital abstrato de curto prazo em enorme montante, aprimorassem a posição de liquidez internacional do país. Na verdade, houve uma redução drástica da ligação entre dívida externa de reduzido prazo e as reservas internacionais, que tinha atingido a marca de mais de 90% na crise cambial de 1999, e que despencou para cerca de 20% em 2008. Apesar de oficialmente o Brasil operar em um sistema de câmbio oscilante, é mais que evidente ao olhar para o acúmulo massivo de reservas internacionais e da mesma forma para a política de juros do Banco Central que a oscilação cambial é excessivamente "sujo" e que o processo de análise cambial quase constante foi afetado demasiadamente pelos altos diferenciais de juros aplicados pelo Banco Central do Brasil. Dessa maneira, o SMI (Sistema de Metas de Inflação) no Brasil funciona do seguinte modo: se a inflação é prevista subir além do limite superior da meta devida, existe um aumento dos preços internacionais das commodities que possibilite uma pressão de custo nos preços domésticos, o BC amplia a taxa de juros declarando haver evidências "excesso de procura" e / ou "degradação das expectativas inflacionárias". Se de fato o BC está de fato vendo isso ou crer nisso, ou não, é algo abstrato. O que interessa é que o BC amplia a taxa de juros nominal. A taxa de juros nominal mais alta amplia o diferencial de juros e amplia a velocidade de análise da taxa de câmbio, e nesse caso transforma o que era um impacto negativo em dólares americanos em um impacto positivo em reais. De modo ainda mais geral, qualquer que seja a motivação do crescimento inicial da inflação, como péssimas colheitas domésticas ou algum crescimento em impostos indiretos, um crescimento nos juros levará apressadamente a uma análise cambial, compensando com uma colisão anti-inflacionária. É importante perceber que, ao invés de certeza empírica, existe um amplo consenso no Brasil que crer que o que de fato acontece é que um acréscimo dos juros após um impacto de oferta inflacionário, doméstico ou internacional, provoca um choque de demanda negativo que evite as firmas de repassarem o acréscimo nos custos para seus preços. Esta análise comum não pode ser certa

40 •

capítulo 2

por três razões. Primeiro, no caso de um impacto externo, o choque da taxa de juros sobre o câmbio frequentemente reverte o choque, então no fim das contas não há nenhum impacto negativo para ser repassado para os preços. Em segundo lugar, no caso de um impacto doméstico, como uma péssima colheita ou acréscimo de impostos indiretos, de novo a análise cambial após o aumento na taxa de juros produzindo um choque positivo ao mesmo tempo e reduzirá o preço dos bens negociáveis na moeda doméstica. De novo, não haverá nenhum impacto líquido para ser comedido pelo encolhimento da demanda. Por fim, mesmo quando por alguma causa que cresce para fora, a taxa de juros mais alta não provoque uma análise cambial, a ideia de amenizar o “atravessar” dos choques de oferta requer o andamento de um canal fundamental. Para que o repasse dos custos seja controlado, é claro que o custo unitário do trabalho e / ou os limites de lucro devem ser suficiente pró-cíclicas, de modo que a condição que nós não achamos nos dados brasileiros. Eventualmente não seja uma eventualidade que quando, em virtude, por exemplo, a uma forte diminuição no fluxo internacional de recursos para os países emergentes, o acréscimo na taxa de juros brasileira não vem unido com uma análise nominal do câmbio, não é possível alcançar a meta estabelecida de inflação. Dessa maneira, o SMI (Sistema de Metas de Inflação) brasileiro, em que a taxa de juros é utilizada para monitorar a inflação, funciona realmente indiretamente pela via do canal de custo da taxa de câmbio. 2.5.3  Crescimento Econômico Quando notamos o desenvolvimento econômico dos anos de 2000, observamos nitidamente que englobando o ano de 2003 as taxas de crescimento eram muito enfraquecidas, e logo após estas taxas começaram a crescer. A expansão foi conduzida pelo boom de exportações e as taxas de crescimento do PIB não subiram tanto, mas a partir de 2006 o crescimento das exportações sofre interferência e o mercado interno inicia o crescimento mais rápido, em virtude de uma política macroeconômica com objetivos expansionistas. A economia é atingida pela crise mundial de 2008 e passa três trimestres com aumento negativo, mas se restabelece rapidamente no fim de 2009, o que leva a uma queda modesta de 0,65% do PIB nesse ano. O rápido aumento do PIB em 2010 tende a ficar em torno de 7,6%. Isso dá um resultado em média de crescimento do PIB em 4,4% entre os anos de 2004 - 2010, mais do que o dobro dos 1,9% para os anos de 1999 - 2003. Desse

capítulo 2

• 41

modo, nota-se que não somente as metas de inflação foram alcançadas em todos os anos a partir de 2004, mas também o PIB aumentou muito no segundo período. Em 2005, muitos analisadores dentro e fora do governo protegiam a ideia de que o produto em potencial, ou a habilidade produtiva brasileira, era basicamente formada para fora e não poderia aumentar mais do que 3 - 3,5% por ano. Dado essa convicção, alguns “policy makers” e analisadores sugeriram que a condição externa mais apropriada deveria ser utilizada não para acelerar o desenvolvimento, mas sim para diminuir progressivamente as metas inflacionárias. Alegava-se que era imprescindível para um crescimento mais rápido no longo prazo, um aumento radical da associação superávit primário sobre o PIB de no mínimo 3 pontos percentuais. Isso acarretaria presumivelmente, ao abaixar especialmente a relação Dívida / PIB, a uma diminuição constante dos spreads da dívida externa e das taxas de juros menores no longo prazo, o que induziria a um aumento imponente do investimento privado. Em relação a contra alegação imediata de que era fundamental aumentar o nível de investimento público, que tinha caído para o constrangedor nível de 0,3% do PIB. Em 2003 para os investimentos do governo federal, alegava-se que a única maneira de alcançar isso seria via cortes significativos no gasto do governo e nas mudanças sociais, incluindo aposentadorias. Desta forma, em virtude ao aumento no compasso de crescimento dos preços internacionais das commodities e dólares, o acréscimo na taxa de juros minimizou a inflação ao contemplar a taxa de câmbio de modo mais rápido do que antes. A taxa de juros mais elevada também diminui o aumento do crédito ao cliente e do PIB, mas por sorte os argumentos mais radicais de acerto fiscal não conseguiram ser implementadas. Desse modo, a visão de que alguma coisa deveria ser feita para consertar o crescimento do mercado doméstico afinal prevaleceu. Devido ao efeito estável de graus de aplicação da capacidade e crescimento atual da demanda sobre o investimento privado, somente uma expansão mantida do mercado interno brasileiro pode somar tanto as taxas de desenvolvimento do produto efetivo e do produto potencial. Com ligação ao investimento público, uma diminuição progressiva das metas de superávit primário terminou por acontecer e conseguiram abrir espaço no orçamento para uma recuperação inicialmente modesta do investimento público pelo governo e pelas empresas estatais, sobretudo a Petrobras, após 2007. Essa nova prioridade em promover o crescimento econômico estava obviamente em contradição com a

42 •

capítulo 2

manutenção de um regime de metas de inflação em um período de rápido crescimento dos preços internacionais das commodities, entretanto as melhores condições externas resolveram as contradições para o governo. A melhora nas condições externas após 2003, em termos tanto de fluxos comerciais quando de capitais, veio juntamente com uma taxa de juros muito menor nos EUA e spreads significativamente menores para os "mercados emergentes" em geral, e também para o Brasil. Dessa maneira, podemos verificar que um diferencial de juros extremamente alto foi mantido mesmo com a queda progressiva da taxa real de juros ao longo do tempo, especialmente após 2006. Além da menor taxa básica de juros, diversas medidas foram tomadas para aumentar a disponibilidade de crédito para o consumo e mais tarde para a compra de residências. Deve-se mencionar também o importante papel dos bancos públicos aumentando a disponibilidade de crédito para consumo, para o setor imobiliário e também para o investimento em geral e especialmente por evitar uma contração de crédito mais séria e uma possível crise bancária após o final de 2008. Em termo de política fiscal, o governo perseguiu altos superávits primários para a maior parte do período. Após 2007 houve uma redução das metas com o objetivo de permitir uma recuperação do investimento do governo federal e das empresas estatais, porém o rápido crescimento da economia e das receitas de impostos nos três primeiros trimestres de 2008, fez com que o superávit primário voltasse a crescer. Os efeitos da crise internacional finalmente fizeram com que o governo mudasse uma política fortemente anticíclica e permitisse o aumento do superávit primário nos trimestres subsequentes, até que se recuperasse no final de 2009. Por outro lado, o superávit primário efetivo não é um bom indicador da política fiscal em termos de impacto dos gastos e impostos do governo sobre a demanda agregada. Ainda que muitos economistas acreditem que uma relação positiva do superávit primário / PIB reduza necessariamente a demanda agregada, o efeito sobre a demanda agregada e produto, pode ser positivo se o nível dos gastos do governo crescesse suficientemente e o superávit primário não fosse muito alto. Isso ocorre porque qualquer aumento do gasto do governo tem um impacto direto e total sobre a demanda agregada e aumenta a renda agregada. O aumento nos impostos, por sua vez, simplesmente previne uma nova expansão via efeito multiplicador privado. Se houve um superávit primário positivo, isso significa que os impostos foram maiores que o aumento inicial

capítulo 2

• 43

da renda causado pelo gasto extra do governo. Isso então reduzirá a renda disponível do setor privado e o consumo privado em um montante que será maior quanto mais alta for a propensão marginal a consumir e o superávit primário. O impacto total na demanda agregada dependerá da medida em que o efeito expansionista do aumento primário dos gastos seja maior ou menor que a queda do consumo privado. Estimativas recentes para o caso brasileiro mostram que o choque do setor público sobre a demanda agregada foi frequentemente negativo ou zero até 2005, quando se torna positivo depois de 2006. Um elemento chave para o rápido crescimento dos gastos e das mudanças governamentais foi o acréscimo na taxa de aumento dos salários mínimos reais, que teve um forte efeito nos honorários do setor público e fundamentalmente nos benefícios de pensões para aposentados no sistema de repartição brasileiro. O monitoramento desses altos superávits primários com a inclinação de diminuição da taxa real de juros e um aumento mais rápido do PIB no decorrer do tempo, levou a uma diminuição contínua da relação dívida liquida do setor público, interna mais externa sobre o PIB. É interessante notar que a diminuição aconteceu mesmo com o acúmulo de reservas com um elevado custo fiscal devido a significante diferença de juros praticados no Brasil e nos EUA, pois a maior parte das reservas é em dólares e tem rendimentos baixos. Outro fator importante a ser notado é que na metade de 2006 o Brasil passou a ter uma dívida externa pública liquida negativa, na proporção em que as reservas internacionais acumuladas passaram a ultrapassar a soma de dívida externa pública. Então, podemos ver dois resultados diferentes e fortes de uma baixa cambial: em 2001-2003, a baixa cambial leva a um crescimento na relação dívida pública líquida / PIB; mas em 2008 uma baixa cambial leva a uma diminuição na relação Dívida / PIB. Desse modo, o rápido crescimento da relação dívida / PIB em 2009 é em parte devido à próxima análise do câmbio. Além do choque do acréscimo nos gastos governamentais e das transferências sobre a demanda agregada, houve um restabelecimento simples, porém excessivamente necessário do investimento público, especialmente em infraestrutura, tanto pelo governo federal como também pelas empresas estatais, especialmente pela Petrobras, desde de 2007. Essas alterações moderadas na política macroeconômica mostram porque a taxa de crescimento da economia brasileira, afinal começou a crescer durante o meio do ano 2000 depois de quase duas décadas de desenvolvimento. Primeiramente, a taxa de crescimento cresceu em 2004, conduzido pelo veloz

44 •

capítulo 2

crescimento das exportações, que com algum atraso levou a uma recuperação do gasto induzido e posteriormente do investimento privado solicitado, a maior parte ligada ao setor exportador. Após alguma dúvida, o governo enfim decidiu elaborar uma política fiscal mais expansionista a partir de 2006. Isso liberou um rápido crescimento da demanda em um todo e do gasto privado em particular, que depois de um tempo conduziu um boom do investimento privado mais veloz e sustentável. Essa nova direção também surgiu como uma resposta tardia à crise mundial no final do ano de 2008. Essa direção da política ajudou o Brasil a reduzir a economia relativamente, menos em 2009, e se restabelecer mais rapidamente que vários países que seguiram rigorosamente o mesmo regime geral de política. Vale a pena notar que a ampliação não foi abolida pelo Banco Central do Brasil, não por mudança de direção política, mas especialmente devido ao acontecimento que uma queda nas taxas de juros internacionais e nos spreads concederam ao BC alcançar a meta da inflação anual com uma desvalorização da taxa de juros nominal e real, visto que a taxa de juros em queda foi adaptável com, e a maior responsável, da continua análise do Real brasileiro em relação ao dólar. Na mesmo tipo, ao longo do período de crise do ano 2008, a política fiscal anticíclica somente foi possível devido à forte desvalorização cambial que aconteceu no meio da crise, que foi primeiramente compensada em termos de inflação doméstica pela crise simultânea dos preços internacionais em dólares dos commodities. A queda em seguida foi rapidamente revertida quando os spreads dos mercados emergentes retornaram a cair aos seus níveis antes da crise. 2.5.4  Distribuição de renda O coeficiente de Gini (ou índice de Gini) é um cálculo usado para medir a desigualdade social, desenvolvido pelo estatístico italiano Corrado Gini, em 1912. Apresenta dados entre o número 0 e o número 1, onde zero corresponde a uma completa igualdade na renda (onde todos detêm a mesma renda per capta) e um que corresponde a uma completa desigualdade entre as rendas (onde um indivíduo, ou uma pequena parcela de uma população, detêm toda a renda e os demais nada têm). Em termos de distribuição de renda, notamos uma redução contínua do índice de Gini durante todo o período. Essa visível redução da desigualdade, porém, até 2004 deve ser distinguida do que aconteceu no período subsequente. Em primeiro lugar, durante o tempo que o índice de Gini caía constantemente, a parcela

capítulo 2

• 45

salarial na renda despencou até 2004 e se recuperou vagarosamente a partir de 2005. Para compreender essa aparente incoerência, notamos que o índice de Gini é estimado por pesquisas familiares que capturam exclusivamente as rendas do trabalho (tanto formal quanto informal), menosprezando drasticamente a renda ganha da propriedade e desprezando a renda retida dentro do setor empresarial. Dessa maneira, uma parte da diminuição do índice de Gini até 2004 deve ser esclarecida pelo fato que, em virtude ao baixo crescimento da economia e das chances de emprego e da redução da parcela salarial, a renda média total do trabalho medida pela renda familiar estava despencando, em contrapartida, o salário mínimo real estava aumentando. Desta forma, parece que até 2004 a diminuição da desigualdade vinha em ampla medida de uma caída dos salários mais elevados do que do aumento dos honorários dos trabalhadores mais pobres. Depois de 2005 a renda familiar média inicia o crescimento em virtude de salários reais médios mais altos, desenvolvimento mais rápido da economia e crescimento dos empregos formais, e o salário mínimo real aumenta de modo ainda mais rápido, com crescimento da mesma maneira da parcela salarial na renda. O índice de Gini continua despencando, mas não é de se admirar que a taxa de pobreza tenha tido uma queda mais brusca no segundo período. Vemos também o papel essencial da evolução nas condições financeiras e de comércio internacional para o restabelecimento dos salários reais e da parcela salarial nos rendimentos, que parecem ser bastante persuadidos pela análise da taxa real de câmbio e pelas taxas reais de juros mais baixos. Em suma, o resultado em termos de diminuição, nos mostra que tanto a parcela dos pobres quanto dos excessivamente pobres na população eram estáveis, também crescendo um pouco na crise de 2003. A partir do ano 2004 as duas parcelas iniciam a queda, mesmo na crise de 2009. 2.5.5  Mercado Externo Independentemente dos resultados muito favoráveis em termos de crescimento do produto e da distribuição da renda desde 2006, a estrutura da política econômica moderna parece enfrentar-se com problemas estruturais. A melhoria na execução da economia brasileira foi consequência da união de uma boa melhora nas circunstâncias externas com que a economia enfrentava, com uma alteração pequena, contudo, útil, na direção de uma orientação de política macroeconômica expansionista mais funcional. Agora ambos os aspectos es-

46 •

capítulo 2

tão em perigo. Com relação à limitação externa, o principal problema consiste no fato de que a taxa de câmbio é a única ferramenta de controle inflacionário, via análise sistemática, e isso começa a atingir a conta corrente e a concorrência da indústria, principalmente nos setores de tecnologia mais requintados. A análise real da taxa de câmbio, que desde 2007 está aquém do nível de meados de 1994, quando o plano Real foi realizado e a alta inflação foi enfim controlada. Com relação à concorrência externa, cálculos mostram que o coeficiente importado cresceu na indústria manufatureira em 8.1 pontos percentuais de 1996 a 2008. O caso ainda mais violento é o das indústrias tecnologicamente mais investidas, como os setores "Equipamentos de Comunicação e Eletrônicos" e "Equipamentos Médicos e de Hospital, Automação Industrial e Precisão", os quais tiveram um acréscimo no coeficiente importado no mesmo intervalo de 32.7 % e 35.1 % respectivamente. O último, por exemplo, atingiu um coeficiente importado de 65% em 2008. Isso demonstra que a indústria brasileira está trocando a produção doméstica de trabalho por importados de maneira rápida. Apesar destas inclinações, a indústria brasileira não enfrentou efeitos ainda mais severos porque o mercado interno subiu muito rápido, igualmente como as exportações de bens manufaturados, também bens de capital, para mercados emergentes como os países participantes do Mercosul e de bens da indústria extrativa e mineração, que diminuíram o coeficiente importado, para o mercado mundial. Alguns críticos minimizam os riscos do acréscimo do déficit em conta corrente devido à prévia concentração de reservas internacionais e a esperança que o Brasil em poucos anos se tornará um enorme exportador de petróleo, estudando as reservas recentemente achadas das camadas profundas do "Pré Sal". Mas o fato é que desde o fim de 2009, o influxo de investimento estrangeiro direto não tem sido suficiente para equilibrar o déficit em conta corrente, e a continua concentração de reservas vem dependendo do ingresso de fluxos de capitais de curto prazo. 2.5.6  Políticas Alternativas Poucos, mas certamente nem todos, desses problemas de concorrência poderiam ser suavizados por uma forte desvalorização cambial. Isso certamente traria um choque inflacionário, pelo menos de curto prazo, e conseguiria levar a um declínio permanente no salário real. Esse resultado distributivo negati-

capítulo 2

• 47

vo traria ainda efeitos ruins para o crescimento do gasto e da demanda efetiva como um todo, apesar de seus prováveis efeitos em reduzir consideravelmente o ritmo das importações, assim como conduzir a uma melhora na atuação do exportador de alguns setores. As exigências objetivas da piora da posição externa são sobrecarregadas pelo estado corrente da polêmica de políticas públicas no Brasil, tanto dentro quanto fora do governo. A pluralidade dos economistas brasileiros, abrangendo a maioria daqueles que se dizem heterodoxos, Keynesianos, ou até "progressistas", não somente estão prescrevendo uma grande depreciação cambial sem preocupação com os choques distributivos como também martelam no caminho de baixar a taxa de juros real doméstica, que é essencial para pelo menos frear a inclinação de contínua análise cambial, novamente, com uma grande redução fiscal. Isso possivelmente poderia permitir o comando do governo sobre a taxa de evolução da demanda agregada apesar de conservar uma taxa real de juros mais baixa e comandar a inflação. Um problema com essa impressão popular é que, a inflação brasileira é ocasionada essencialmente pelos motivos de pressão de custo e, em particular, pelo acréscimo de preço das commodities importadas e exportáveis. Uma diminuição fiscal certamente minimiza o ritmo de crescimento da demanda agregada, mas exatamente porque isso não gera uma análise cambial não devemos repetir nenhum choque direto e metódico na tendência inflacionária. Apesar disso, para monitorar o crescimento da demanda agregada seria muito mais eficaz e socialmente mais cobiçado controlar o crescimento dos gastos privados, ao contrário dos públicos. Afinal, não é difícil trocar rapidamente o desimpedimento do crédito ao consumidor no Brasil ao alterar os spreads dos bancos estatais comerciais, ampliando os depósitos compulsórios de reserva, que atuem como um imposto sobre os bancos e ampliem seus spreads e suas taxas de empréstimos, e principalmente diminua o número de prestações de certos tipos de operação de crédito, como o financiamento de bens duráveis. Essas normas são socialmente mais coerentes do que o corte de investimento público, de pensões de aposentadoria, outras transições sociais ou salário mínimo, ou salários dos servidores públicos em geral. E o monitoramento do crédito de fato é muito mais imediato e verdadeiro em termos de controle do crescimento da demanda do que o acréscimo da taxa básica de juros, embora a última seja muito mais eficaz no controle da inflação em razão dos seus efeitos sobre o câmbio nominal. O modo mais seguro de tentar minimizar a tendência

48 •

capítulo 2

de análise da taxa de câmbio é reduzindo a taxa básica de juros e / ou taxando o acesso de fluxos de capitais, sendo que a primeira é muito mais modesta e eficiente que a última, embora um diferencial de juros igual a zero anularia também o custo fiscal de aglomerar uma grande quantidade de reservas. Se o governo quiser também não depender tanto da taxa de câmbio para monitorar a inflação, poderia ser mais empático em fazer mais progressos reduzindo o grau de indexação e / ou margens de lucros essenciais dos serviços de utilidade pública privatizados, assim como fazer mais uso de ferramentas fiscais para encarar a inflação de custo das commodities importadas e exportáveis. Essa última oferta poderia ser feita ao reduzir temporariamente os impostos de importações dos bens essenciais cujos preços são muito volúveis e que estejam visualmente crescendo excessivamente, como o Brasil já fez com a gasolina, o óleo diesel e com os preços do trigo em 2008. Simultaneamente, as exportações de alguns bens essenciais poderiam ser taxadas quando seu preço em dólares crescesse muito em um intervalo curto de tempo, para precaver com que esses acréscimos fossem repassados para os produtos domésticos. Se for essencial uma forte desvalorização cambial para restaurar a concorrência externa, a redução seletiva de impostos de importação e acréscimos nos de exportação, devem ser elevados. Isso teria a consequência positiva de tranquilizar o impacto negativo do prejuízo cambial sobre os salários reais. De modo ideal, poderia ocorrer junto com uma diminuição das margens de lucros e da indexação dos preços controlados, assim mesmo que os salários reais diminuam um pouco em termos dos bens negociáveis, isso poderia ser reembolsado com um crescimento em relação a alguns serviços não negociáveis. Um imposto elevado para a exportação de alguns commodities da mesma forma poderia prevenir a baixa cambial de aumentar ainda mais os lucros relativo ao setor exportador de commodities. Isso poderia ajudar na alteração na pauta de exportações para distante da dependência excessiva das commodities e simultaneamente proteger o setor industrial das importações demasiadamente baratas. Uma baixa real da taxa de câmbio, porém, ainda que útil, sem dúvida não é suficiente para recuperar a concorrência industrial. O Brasil precisa de mais investimento público em infraestrutura para recuperar sua logística e diminuir os custos de exportação e praticar uma política industrial de evolução tecnológica em alguns setores, preferencialmente usando o poder de compra do governo para garantir esses resultados, uma vez que a indústria brasileira necessita bastante fazer alguma mudança de importações nos setores industriais

capítulo 2

• 49

tecnologicamente mais desenvolvidos de maneira a diminuir a tendência de crescimento do coeficiente de penetração. Essas políticas parecem ter mais externalidades positivas em medidas de melhora da concorrência e da produtividade da economia do que um simples incentivo fiscal ou diminuição da carga tributária para firmas que são beneficiadas por aqueles que propõem enormes cortes fiscais. Essas questões de políticas indiscutivelmente são duvidosas e complicadas na prática, mas uma referência simples de alternativas aqui tem apenas o propósito limitado de mostrar que são obscuras nas diferentes propostas de política econômica existem não apenas óticas diferentes de como a economia funciona, mas também claras discordâncias em questões que dizem respeito a distribuição da renda. As exigências externas com que a economia brasileira estava se defrontando melhorou repentinamente e consideravelmente desde 2004. As autoridades brasileiras foram um pouco morosas para perceber isso e iniciar a usar o grande espaço político que foi aberto para o desenvolvimento por essas mudanças até mesmo nos países em que o governo não estava pronto para mudar o livre movimento dos fluxos de capitais de curto prazo e desejava manter o suporte convencional de política macroeconômica de metas de inflação, câmbio inconstante e elevadas metas de superávit primário. Mas afinal o pragmatismo predominou e, após 2006, a economia se moveu para uma inclinação mais alta de crescimento econômico. A manutenção desse compasso mais rápido de crescimento dentro do âmbito de uma rápida piora da conta corrente demandará um rumo da política ainda mais pragmática. O regresso ao debate brasileiro atual de propostas de políticas de forte redução fiscal, sugerido originalmente em 2005 e cuja a derrota afinal permitiu ao Brasil regressar ao crescimento após 2006, é provavelmente um mal prenúncio.

50 •

capítulo 2

3 Gastos Públicos

3.  Gastos Públicos 3.1  Teoria da Tributação 3.1.1  Introdução A teoria da tributação tem como base duas doutrinas fundamentais: Neutralidade e Equidade. O princípio da Neutralidade é alusivo a não intervenção sobre as decisões de destinos de recursos tomados com base no instrumento de mercado. Se as sentenças se baseiam nos preços relativos decididos pelo mercado, a neutralidade do sistema tributário seria alcançada quando a maneira de captação de recursos pelo governo não alterasse esses preços. Qualquer modificação nos preços relativos, provocada por mudanças na tributação, contribuiria para tornar menos competentes as decisões econômicas, implicando uma diminuição no nível comum de bem-estar, que poderia ser atingido com tais recursos. A neutralidade, sob a perspectiva da alocação de recursos, deveria ser acrescentada pela equidade na divisão da carga tributária. Isto é, além de neutro, o imposto deveria ainda ser justo na orientação de garantir uma distribuição equitativa do ônus tributário pelas pessoas. A equidade, no caso, poderia ser examinada sob duas óticas principais: uma recomenda que o ônus seja dividido entre os indivíduos, a outra aconselha que essa divisão seja feita com base na aptidão individual de contribuição. A primeira opção é conhecida como o Princípio do Benefício, e a segunda, como o Princípio da Capacidade de Contribuição. Além desses, outras referências importantes devem fazer parte de análise tributária. Um é relativo ao rendimento do tributo da perspectiva de sua contribuição para a receita federal. Essa pode ser estimada com base no reconhecimento de coeficientes de elasticidade da receita em relação à renda para diversas alternativas de tributação. O desenvolvimento dos gastos públicos tem-se mostrado, em regra geral, num ritmo de expansão mais marcante do que o crescimento da Renda Nacional, estabelecendo um crescimento harmonizável nos recursos mobilizados para seu financiamento. Tributos com declínio da produtividade da receita seriam, nesse fato, incompatíveis com as condições de financiamento das obrigações governamentais. Por outro lado, o emprego do princípio da neutralidade imagina que a situação atual no instante anterior à exigência do tributo configure uma solução competente do ponto de vista

52 •

capítulo 3

do critério de eficiência de Pareto (Uma situação econômica é ótima no sentido de Pareto se não for possível melhorar a situação, ou, mais genericamente, a utilidade de um agente, sem degradar a situação ou utilidade de qualquer outro agente econômico). Um dos motivos para a crescente interferência governamental da economia é a ocorrência dos defeitos na alocação de recursos acarretadas por defeitos de mercado, sobretudo se levar em conta o intuito de promoção do crescimento. Nessa situação, os tributos teriam que ser analisados da mesma forma de sua adaptação aos objetivos mais abrangentes da política fiscal, principalmente no que diz respeito ao acerto de desequilíbrios conjunturais e à aquisição de taxas satisfatórias de crescimento. 3.1.2  Neutralidade e Eficiência Segundo o critério de eficiência de Pareto, consideramos que dada alocação de recursos na economia é eficaz quando é impossível modificá-la, de maneira a melhorar o nível de bem-estar de uma pessoa, sem piorar a situação de outra qualquer. Na nomenclatura da análise microeconômica, uma solução eficaz é representada pelo tópico em que a taxa marginal de substituição no consumo iguala a mesma taxa referente a possibilidades de produção. Considere-se agora a obrigação alternativa de diversos tipos de tributos. Primeiro, um imposto constante per capita, isto é, aquele que o ônus da tributação fosse dividido igualmente pelo número de consumidores, livremente de suas características socioeconômicas. Sob a visão individual, um imposto dessa característica representaria uma diminuição na renda, que seria da mesma forma que a linha de orçamento para o consumidor. Do lado da produção, a transição de recursos financeiros da área privada para a área pública via tributação implica diminuir a quantidade de recursos para gerar os produtos em questão. No caso de um imposto sobre a renda, a diminuição na renda disponível do consumidor diminuiria igualmente suas expectativas de consumo sem prejudicar a escala de preferências. Da mesma maneira, um imposto geral e idêntico sobre o consumo diminuiria na mesma proporção as expectativas do consumidor quanto ao consumo dos produtos, dadas suas limitações de receita. A competência nas definições sobre alocações de recursos para produção e consumo de mercadorias e serviços não seria prejudicado por impostos desse tipo a mesma conclusão, porém, não se usa ao caso de impostos seletivos sobre consumo.

capítulo 3

• 53

3.1.3  Equidade O segundo princípio essencial da tributação é o da equidade. A apreensão, no fato, consiste em dar um mesmo tratamento, em maneiras de contribuição, aos indivíduos classificados iguais - um critério de "equidade horizontal" - garantindo, simultaneamente, que os desiguais são diferenciados segundo algum modo a ser estabelecido, uma apreensão com a "equidade vertical". Uma primeira questão, na observação da equidade é, portanto, qual a regra a ser utilizada para a classificação dos que são conceituados iguais e para o estabelecimento de diretrizes adequadas de distinção. Dois critérios têm sido colocados com essa finalidade: o Critério do Benefício, que sugere atribuir a cada indivíduo um ônus semelhante aos benefícios que ele desfruta dos programas governamentais; e o Critério da Capacidade de Contribuição, que defende a divisão do ônus tributário em função das respectivas competências individuais de contribuição. O primeiro determina um critério de igualdade com sustentação nas preferências individuais pelo consumo de bens e serviços gerados pelo governo, enquanto o segundo se refere às expectativas de pagamento. Ambas as táticas apresentam obstáculos de ordem prática com relação a intenção de identificar os iguais, identificando e quantificando benefícios, num acontecimento, ou capacidade de contribuição, no outro. Se bem que a experiência mais atual tenha atribuído maior destaque ao uso da capacidade de contribuição, o critério do benefício pode ser uma maneira mais apropriada de tributação, quando aumenta o grau de interferência do governo na produção de bens e serviços de características equivalentes aos produzidos pelo setor privado. O critério do benefício determina que cada indivíduo deve contribuir para a realização de serviços governamentais, de forma a empatar o preço unitário do serviço ao benefício marginal que ele ganha com sua produção. A análise do benefício marginal para cada indivíduo consiste na identificação de curvas de demanda para as distintas espécies de bens produzidos pelo governo. Vimos a preferência de diversos indivíduos por um bem público qualquer, seria permitido determinar ao mesmo tempo a quantidade a ser produzida, a totalidade de recursos indispensáveis ao financiamento da produção e a distribuição desse ônus pelas pessoas, de acordo com as respectivas escolhas. O preço unitário que cada indivíduo pagaria seria idêntico ao correspondente benefício marginal, satisfazendo, portanto, à exigência a que ser refere o denominado critério de benefício.

54 •

capítulo 3

Algumas restrições de ordem prática ao uso genérico do critério do benefício na tributação são frequentemente mencionadas. A primeira atribui-se à dificuldade de conseguir versões quantitativas de curvas de demanda individual por bens públicos para seguinte identificação dos benefícios que cada indivíduo concedeu ao consumo de diferentes quantidades do bem em questão. A segunda consiste em chamar a atenção para o caso de que, mesmo que se pudesse adquirir curvas de demanda com apoio na identificação de predileções individuais, não é possível unir essas preferências, as quais representem padrões essencialmente abstratos de avaliação. De acordo com a terceira, se o gasto é coletivo, não haveria qualquer estímulo para que os indivíduos revelassem acertadamente suas preferências, se isso, mais tarde, fosse servir de base para especificar o montante individual de contribuição. Tais problemas sugerem que, se o uso do critério do benefício é praticamente inverossímil no caso do financiamento de bens públicos, o mesmo não seria autêntico quanto a bens privados realizado pelo governo. Como já deve ter sido notado, o uso do critério do benefício determina ao mesmo tempo a totalidade da tributação e a distribuição da carga tributária, discordando basicamente do critério da capacidade de contribuição, que trata as duas coisas à parte. Esse aspecto do critério do benefício é algumas vezes voltado como um dos proveitos do método que imporia como que um artifício automático de verificação da expansão dos gastos governamentais, principalmente no que diz respeito à produção de bens que hipoteticamente poderiam ter um preço decidido pelo mercado. O uso parcial do critério do benefício encontra um terreno mais fértil nos setores de serviços públicos, onde se registram um uso contínuo de taxas específicas para seu financiamento. Sob essa temática, a prática de estabelecer tributos especialmente ligados a determinados programas pode ser uma importante forma indireta de coletar do usuário o financiamento do programa. Os modelos mais comuns a esse respeito são a arrecadação de um imposto sobre combustíveis, para financiar a construção de rodovias, e o recebimento de um imposto sobre o gasto de energia elétrica, para financiar os investimentos no setor. Segundo o critério da capacidade de contribuição, os indivíduos deveriam, no grau de suas capacidades, cooperar para o financiamento dos custos governamentais. Dessa maneira, se a capacidade de contribuição é medida em termos de renda, a "equidade horizontal", seria conquistada quando indivíduos com um idêntico nível de renda anual contribuíssem com a idêntica

capítulo 3

• 55

quantidade. Conforme o caso, os efeitos obtidos são absolutamente opostos. Se o aumento na contribuição for mais baixo que o proporcional ao ocorrido na renda, a relação entre o imposto a pagar e a renda diminui com o aumento no nível de renda, representando uma distribuição retroativa da carga tributária. Por outro lado, se o aumento na contribuição é proporcional ao aumento na renda, a relação imposto / renda continuará constante para, seja qual for, o nível de renda, caso em que a distribuição da carga tributária é conceituada proporcional. Finalmente, se o aumento na contribuição for mais que o proporcional ao aumento na renda, a relação imposto / renda aumenta com o nível de renda, gerando uma distribuição progressiva da carga tributária. Claramente, a inclinação seria concluir que a distribuição progressiva da carga tributária é aquela que mais bem se ajusta aos conceitos da equidade vertical. De um ponto de vista hipotético, entretanto, há algumas ressalvas que podem ser feitas a essa conclusão. Da visão dos indivíduos, o pagamento de tributos ao governo é visto como um sacrifício, a equidade na tributação seria conquistada quando esse sacrifício fosse idêntico para todos os contribuintes. A análise da capacidade de contribuição passa, dessa maneira, subordinar-se a um conceito abstrato de igual sacrifício. Em contrapartida, a opinião individual do sacrifício tributário depende, do que parece, do respectivo nível de renda, e de uma opinião, também subjetiva, de seu uso. Quanto maior o contentamento que o consumidor derivasse de um complemento no consumo, que resulta de um aumento em sua renda, seria superior o sacrifício dos deveres do governo. Se, de acordo com a dedução tradicional, o uso marginal da renda diminui à medida que a renda aumenta, a análise do sacrifício tributário deveria, portanto, relacionar-se contrariamente com o nível de renda individual. Nessas situações, o princípio de "igual sacrifício", seria satisfatório à medida que a contribuição individual fosse maior para níveis de renda mais altos. O correto significado da frase "igual sacrifício" necessita, ainda, ser devidamente explícito. Existem três formas de analisar essa igualdade: absoluta, proporcional ou marginal. Imaginando que os indivíduos têm gostos iguais, de tal forma que uma mesma curva de utilidade (total e marginal) pode ser usada a todos os contribuintes. Admitindo, portanto, que o uso marginal de renda é decrescente, o uso de um critério de idêntico sacrifício marginal resulta numa progressão máxima, ou seja, iguala a renda disponível dos contribuintes. Se a igualdade de sacrifício é completa, o resultado é uma

56 •

capítulo 3

distribuição proporcional da carga tributária, contanto que a taxa de decréscimo no uso marginal seja igual à taxa de acréscimo na renda. Afinal, o critério de proporcionalidade na aferição de um idêntico nível de sacrifício propõe um imposto progressivo, à medida que o uso marginal da renda decresce mais rapidamente que a utilidade média, alternando o grau de progressividade de acordo com a diferença entre as respectivas taxas. A alegação de que a equidade na tributação se relaciona a uma distribuição progressiva da carga tributária pressupõe, portanto, não só aceitar que o uso marginal da renda é decrescente, assim como a respectiva taxa de decréscimo se comporta de acordo com as exigências referentes a diferentes fatores de igualdade de sacrifício. Na realidade ambas as conjecturas são difíceis de serem expostas à comprovação. Como a definição de utilidade refere-se a uma avaliação individual e abstrata, um idêntico nível de renda deve equiparar-se a diferentes medidas de utilidade para diversas categorias de indivíduos, da mesma maneira que um igual sacrifício seria conquistado com diferentes níveis de contribuição. Deve se evitar a discussão a respeito das dificuldades por desigualdades individuais na análise subjetiva de utilidade, mediante a modificação do conceito subjetivo do uso em um conceito mais completo de utilidade social da renda. Tal alteração pode eliminar um ponto de polêmicas, mas não soma muita coisa em termos de um critério em funcionamento, uma vez que a utilidade social deveria ser o resultado de algum critério de conjunto das preferências individuais. Desse modo vale a pena ressaltar duas observações adicionais. A primeira atribui-se à origem da proposta de que a utilidade marginal da renda é decrescente. Como a ideia de utilidade marginal vincula-se ao contentamento provocado por um acréscimo no gasto em virtude de aumento na renda, uma análise social tende naturalmente a dar ênfase aos limites físicos, ao aumento do consumo de produtos fundamentais, de modo a justificar um aumento progressivo na tributação. Superada a etapa em que o complemento de renda seria totalmente usado para aumento no gasto de produtos essenciais, a definição de hipóteses a respeito da conduta da utilidade da renda já não é tão clara, tendo em vista principalmente que o próprio conhecimento de essencialidade dos produtos altera-se ao longo do tempo. O próprio processo de crescimento econômico encarrega-se de englobar novas necessidades à medida que altera padrões de habitação, alimentação, recreação etc. A junção de novos bens na

capítulo 3

• 57

categoria de produtos fundamentais durante o processo de desenvolvimento causaria um deslocamento das curvas de utilidade da renda, no decorrer do tempo, de maneira que um aumento de renda que possibilitasse ao indivíduo aumentar seus padrões de consumo de acordo com sua nova posição relativa na sociedade o estabeleceria em uma nova posição em termos de análise da utilidade marginal da renda. A longo prazo, a utilidade marginal da renda seria capaz então apresentar-se constante, se considerássemos os pontos médios das diversas curvas que se referem a análise das preferências individuais em diferentes pontos do tempo. É necessário observar que a análise da essencialidade dos produtos seria identicamente afetada pela posição relativa do indivíduo na sociedade. Nessa lógica, a utilidade da renda não seria livre de comparações interpessoais de modelos de consumo. A suposição de que a utilidade marginal da renda seja decrescente, eventualmente, se ajusta com mais propriedade a um contexto de imobilidade, no qual a característica dos bens essenciais e as preferências individuais e coletivas não sofrem mudanças importantes. Em situação definida por sucessivas mudanças econômicas e sociais, como aquela formada por um rápido processo de desenvolvimento, tal suposição já não pode ser aceita com o mesmo nível de confiança. É importante notar, também, se o método de desenvolvimento se caracteriza não só por um aumento no nível de renda, mas também por um melhoramento cultural e intelectual, a própria possibilidade trabalho / lazer assume nova grandeza, isto é, a satisfação ligada ao lazer não é conseguida gratuitamente, mas envolve também progressivas necessidades de gasto sob forma de participação em atividades recreativas, culturais etc.

3.2  Gastos Públicos 3.2.1  Introdução Os gastos públicos podem ser denominados sob três visões principais: Da utilidade do gasto, da natureza do custo e do responsável encarregado da execução do gasto. Quanto à utilidade, os gastos são normalmente denominados em funções, programas e subprogramas, dependendo do estágio adotado. Vale a pena notar que a denominação das despesas por funções é essencial para a efetiva implantação da experiência do orçamento, que objetiva ampliar a eficiência e

58 •

capítulo 3

o êxito na programação dos gastos governamentais. Quanto a natureza do custo, costuma-se reconhecer quatro principais categorias econômicas de custos: Custeio, Investimento, Transferências e Inversões Financeiras. A denominação das despesas por ordem econômica inspira-se no esquema especificado na Contabilidade Nacional e objetiva mensurar a participação do gasto governamental nos princípios associados da análise macroeconômica. Vale a pena ver que a distribuição dos custos por categoria já fica parcialmente classificada pela finalidade da despesa. Cada forma de programa requer maior destaque em determinada modalidade de custo. Programas de Segurança Pública, por exemplo, sujeitam-se basicamente do uso de mão de obra, apresentando uma alta de custos com pessoal, no total dos custos do programa, por seu turno. Planos ligados à melhoria da infraestrutura de transportes, consistem essencialmente na realização de custos de aplicação, enquanto as transferências assumem papel preponderante em projetos de previdência social. A distribuição por categoria de custo, depende, assim, da divisão funcional das despesas. Em princípio, quanto mais alta a parcela das despesas públicas, mais alta é a participação de despesas com pessoal no total do orçamento, enquanto uma participação mais alta das aplicações fica associada a um destaque em programas de melhoria e ampliação da infraestrutura econômica. Vale a pena constatar, porém, que esse resultado pode ser alterado pelo modo de concretização dos programas e pela organização administrativa do governo. As sociedades governamentais acumulam-se em dois tipos básicos. O primeiro é a Administração Direta, ou Central que é a que e estabelece os serviços incorporados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios. O segundo é a Administração Indireta ou Descentralizada que é a que engloba empresas dotadas de personalidade jurídica próprias e organizadas sob a forma de Autarquias, Fundações, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista. Dessa maneira, na falta de largo trabalho de consolidação, é possível, ocorrer algumas falhas de dados a respeito da distribuição dos fundos públicos por classe econômica de despesas. Considere-se, por exemplo, a sentença de criar uma Autarquia ou Empresa, para praticar um programa que vinha sendo executado pela Administração Direta. No orçamento da mesma, a parcela de riqueza anteriormente alocada a esse planejamento, passaria a constar como custos de transferência, diminuindo as despesas com pessoal, consumo e aplicações.

capítulo 3

• 59

Assim, uma análise parcial da melhoria da despesa da Administração Direta poderia mostrar alterações em sua composição, devidas puramente a oscilações na estrutura administrativa, sem nenhuma modificação real na estrutura do gasto governamental. Outras oscilações podem ser devidas a variações na forma de executar dado plano: se direta ou indiretamente, devido a admissão de empresas privadas. Cita-se, como exemplo, o caso da Saúde. A estrutura dos gastos na assistência médica da previdência social depende principalmente da maneira utilizada para prestação de trabalho. Se a preferência recair sobre a prestação direta dos trabalhos, isto é, a preservação de ambulatórios e hospitais próprios, o resultado será a alta participação de despesas de pessoal, e a compra de material de compra no total do orçamento do programa. Se a escolha for a de prestar o trabalho indiretamente via contratação ou credenciamento de empresas particulares, a maior fração do custo será representada pelo pagamento de trabalhos prestados por terceiros, mudando radicalmente a estrutura dos gastos em medidas de participação percentual de cada item no total do orçamento. 3.2.2  Despesas conforme a categoria econômica A análise da composição dos custos, segundo as principais classes econômicas, permite qualificar a conquista das metas governamentais de promoção do desenvolvimento econômico e de redistribuição da Renda Nacional. Essa denominação tem suas restrições, pois muitos custos que são denominados como custeio nos orçamentos, dizem respeito a funções às vezes mais importantes para o desenvolvimento econômico e para a divisão da renda do que outras despesas de aplicação ou transferências. Tal seria a ocorrência, por exemplo, do custo associado à preservação dos serviços de Educação e Saúde, que tem, significativas repercussões tanto no que se cita ao crescimento econômico, quanto no que se cita à divisão de renda. A Portaria número 42/99 do Ministério do Orçamento e Gestão, extinguiu a denominação funcional programática da despesa. Essa portaria teve a meta de possibilitar à União, aos estados e aos Municípios a aplicação de um programa mais ajustado aos verdadeiros princípios de orçamento e gestão, direcionando a administração pública do "padrão burocrático" para o "padrão gerencial"

60 •

capítulo 3

O reconhecimento do governo é que a denominação funcional programática, tornava inviável uma estimativa com resultados aferíveis e dirigido à população. Havia a junção de duas denominações, a funcional e a programática, em que a primeira teria como meta definir as áreas privilegiadas pelo gasto público e a segunda, a meta do gasto. Como metas não são facilmente igualáveis, a tarefa de denominação caberia à classificação funcional. Na execução da funcional programática, entretanto, dominou o caráter meramente classificatório, perdendo-se a razão do orçamento do programa, em que a preferência é a necessidade dos objetivos estarem muito bem determinados. Na ótica do Ministério do Orçamento e Gestão, a denominação funcional programática passou a representar um aglomerado de caixas onde as ações são juntadas, sem maiores preocupações com o modo de transação que está sendo denominado. Ao mesmo tempo que extinguiu a denominação funcional programática a denominação funcional foi mudada, se subdividindo em sub funções. Os planos perdem as características de classificadores, com cada setor de governo tendo sua própria denominação, de acordo com suas metas de política. Outras duas alterações foram a apresentação do conceito de produto na classe programática "atividade" e a criação da classe "operações especiais", que são os custos que não ajudam para a continuidade das ações de governo, das quais não resulta um produto e não concebem contraprestação direta sob a figura de bens ou serviços.

3.3  Curva de Laffer A curva de Laffer é, em economia, uma exibição teórica, como podemos ver pelo gráfico da figura 1, da associação entre o valor conseguido em impostos pelo governo e todas as suas suposições de taxação. Esta definição é usada para estampar a definição de “elasticidade da receita taxável”. Para se construir a curva, calcula-se o valor alcançado com as taxas de 0% a 100%. É evidente que uma taxa de 0% não traz receita tributária, mas a suposição desta curva também diz que para uma taxa de 100% não traz receita alguma. Se ambas estas taxas não criam receitas tributáveis, podemos deduzir que haverá uma taxa que permita alcançar um valor máximo. A dificuldade de cada economia, segundo Laffer, é achar o ponto de equilíbrio, a tal taxa que maximiza as receitas tributárias, sem atingir o bom funcionamento da economia.

capítulo 3

• 61

Curva de Laffer

R1 R2

R1

O que o governo arrecada

t1

t2

t3 O que a população paga

Figura 3.1  –  Curva de Laffer

O economista Arthur Laffer desenvolveu este gráfico para apresentar como os níveis das alíquotas prejudicam a receita tributária (Fig.1). Segundo o economista, as alíquotas dos EUA eram tão altas que, se houvesse uma diminuição, poder-se-ia obter um aumento na arrecadação. A Curva de Laffer provoca um pensamento sobre as deficiências e a perda de estímulos que as alíquotas dos impostos acarretam na economia, podendo essas alíquotas, à medida que são aumentadas, diminuir a receita tributária. De acordo com esta teoria, em um primeiro instante, uma pequena alta da carga tributária gera um aumento no total do recolhimento de tributos por parte do setor público. Porém, depois de atingir um ponto mais alto de arrecadação, a curva sofre uma inclinação e a relação passa a ser contrária. Se o governo tenta aumentar ainda mais essa carga tributária já muito elevada, ele começa a perder recebimentos, ao invés de aumentar sua receita. Laffer destaca como justificativa central para esclarecer o episódio de tal fenômeno o fato de que uma carga tributária, quando muito alta, provoca a evasão fiscal e incentiva as atividades informais e ilegais. Isso acarreta, por sua vez, desencorajamento sobre os negócios em geral da economia formal, reduzindo assim a base de incidência da tributação. Os resultados da diminuição de alíquotas promovida nos EUA por Ronald Reagan não corroboraram com o conceito de Laffer, ocorrendo diminuição da receita tributária. Embora uma diminuição geral nas alíquotas favoreça uma diminuição de receita, há certezas de que alguns contribuintes estavam do lado incorreto da curva de Laffer. A receita tributária recolhida na década de 80 com os americanos mais abastados, aumentou quando essas alíquotas foram diminuídas.

62 •

capítulo 3

As alegações de Laffer, além de ocasionar o debate sobre a carga tributária, podem ser mais aprovados quando usados em países onde a carga tributária e mais alta do que nos EUA. Na Suécia, por exemplo, no começo da década de 80, o trabalhador era tributado em 80% sobre os seus rendimentos, mostrando um desestímulo ao trabalho. Estudos mostram que, caso a Suécia promovesse diminuição na alíquota dos trabalhadores, poderia atingir aumento na arrecadação. No caso do Brasil, por conta da sonegação, com dificuldade o governo estaria operando no lado decrescente da Curva de Laffer e uma diminuição de alíquota causaria aumento da receita. 3.3.1  Gestão Tributária Nos últimos tempos a administração tributária tornou-se uma ferramenta cada vez mais imprescindível às instituições em geral. Os administradores buscam implantar a administração tributária nas organizações como forma de diminuição de custos e ganho de competitividade. A palavra gestão, do latim gestione, significa gerir, gerência, administração. Nesse sentido, faz-se indispensável buscar um entendimento sobre as ferramentas de gestão. A fim de alcançar seus objetivos e potencializar os resultados, as instituições devem gerenciar seus processos de maneira eficiente e racional. Sobre essa questão, destacam-se três pontos fundamentais para o gestor que busca um gerenciamento administrativo arrojado; respostas rápidas, serviços eficientes e desburocratização dos processos. Todos esses sob o alicerce de dados e números eficientes para as tomadas de decisão de cunho empresarial. Dentre as metas da contabilidade está o de oferecer informações proveitosas para a tomada de decisões. A área financeira de uma empresa deve oferecer informações sobre os bens econômicos, os direitos sobre esses bens, bem como os efeitos de transações, acontecimentos e circunstâncias que mudem seus recursos e os direitos sobre estes. O sistema de informações contábeis “é o subsistema de informações dentro de uma organização que acumula informações de vários subsistemas da empresa e comunica-as ao subsistema de processamento de informações”. O sistema contábil deve interagir com todos os departamentos da instituição, procurando atender às necessidades de cada departamento da empresa, para fins de planejamento, realização e controle. A presença do planejamento no funcionamento empresarial pode, muitas vezes, impossibilitar ou reduzir a ocorrência de situações indesejadas. O objetivo não é excluir o perigo da decisão, mas sim lidar com o perigo na tomada de

capítulo 3

• 63

decisão. O cumprimento é realizado à parte do processo no qual as ações ocorrem, sendo que as ações devem a todo momento estar em acordo com o planejamento. A etapa do controle analisa os processos e confronta o planejado com o realizado, estuda os desvios, procura reconhecer as causas e conduzir as ações corretivas. Por isso, a gestão tributária inclui as etapas de planejamento, execução e monitoramento das obrigações tributárias. Podemos afirmar que o conjunto de problemas envolvidos na questão dos tributos no Brasil vai além do fato elementar do encargo causado às empresas. Os tributos, sejam eles quais forem, incidem na vida das empresas como um limitador de crescimento, um obstáculo aos novos investimentos, além de diminuir a geração de lucros nas instituições. Também prejudicam a vida das pessoas físicas, que acabam por resistir a todo ônus tributário, através do pagamento de tributos diretamente ou indiretamente, por causa de efeitos nos preços finais das mercadorias e serviços instigados pelos valores dos vários tributos embutidos no faturamento final. O mercado ordena tanto produtos e serviços de qualidade, quanto preços menores, forçando as empresas a utilizar estratégias para melhorar sua lucratividade, manter a concorrência e assim assegurar a continuidade. Portanto a gestão tributária é uma das muitas ferramentas que podem contribuir para as instituições atingirem seus objetivos, obtendo melhores resultados. Para serem competentes, as organizações deverão identificar e julgar as alternativas disponíveis e agirem rapidamente nas escolhas de decisões. Em tal circunstâncias, a contabilidade apresenta-se como uma forte ferramenta, auxiliando os gestores na escolha de decisão e contribuindo, dessa maneira, para a escolha daquela opção que lhe ofereça o melhor resultado econômico, considerando os aspectos legais.

3.4  Déficit e Dívida Pública O crescimento da dívida pública ao longo do tempo, em função de níveis desiguais de superávit ou déficit primário, pode ser mais bem entendida com o auxílio de algumas equações muito simples. Estabelecida a dívida líquida do setor público - externa e interna - como B, neste caso sem apoio monetário, e deixando de lado, para facilitar, certas tecnicalidades resultantes do fato de que a dívida por completo se refere ao final do período, enquanto o PIB é apresentado em preços médios do período, o valor de B no período s é

64 •

capítulo 3

Bs = Bs – 1 + Ps – RAs – Rs (1) P é a despesa de juros nominais, RA é o valor do superávit primário, R é a coleta de senhoriagem e (s – 1) expressa defasagem de um período. A taxa de juros é igual a: Pt = Bs – 1 · i

(2)

em que i é uma taxa nominal média ponderada, incidente sobre a dívida. Trocando a equação (1) pela equação (2) e dividindo B pelo PIB nominal, estabelecido em função das taxas de crescimento real (n) e da taxa de inflação (Z) ambas, por suposição, permanentes, para qualquer período de tempo - concluise que a relação dívida pública / PIB (b), a cada período de tempo, é dada por bs = bs – 1 · (1 + i) / [(1 + n) · (1 + Z)] – x – r em que x e r significam as relações superávit primário / PIB e senhoriagem / PIB, respectivamente, ambas, também por suposição, constantes. A equação permite compreender claramente porque postergar o ajustamento tende a torná-lo cada vez mais difícil, pois o adiamento das medidas destinadas a conseguir esse ajuste implica a insistência de déficits, que por sua vez produzem um aumento da dívida pública, que inclina a realimentar, por meio da conta de juros os déficits em períodos seguintes, tornando o ajustamento solicitado progressivamente maior. Podemos, portanto, ter melhores condições de alegar para questionar a tese alusiva ao "caráter financeiro do déficit". O que significa isso? Em geral costuma se equiparar o valor da taxa de juros com o déficit e deduzir que, sendo a razão entre àquela e este alta, "o déficit é financeiro", no sentido de que, se não tivesse dívida, o déficit poderia, no limite, sumir. O argumento parece ter fundamento e tem constantemente convencido parte dos meios de comunicação e do setor governamental e político, mas deve ser devidamente classificado. Há três pontos que é indispensável considerar. Primeiro, em uma execução orçamentária na qual há diversos itens importantes, qualquer uma dessas despesas próprias, se comparada com o déficit, tende a estabelecer um coeficiente que pode ser próximo ou até maior do que um. Da mesma maneira que o fato de o déficit ser de por exemplo, 5% do PIB,

capítulo 3

• 65

quando a taxa de juros tem esse destaque, pode se dizer que o déficit é "financeiro", por semelhança, se o custo previdenciário ou a conta de transferência a estados e municípios forem da mesma ordem. Segundo, a dívida existe. De pouco adianta comprovar que, se não existisse uma dívida, não haveria déficit, se a suposição não faz sentido. Além disso, esse é uma maneira de discurso que tende em geral a estar relacionada à denúncia do sistema financeiro como o maior beneficiário desses pagamentos. A rigor, contudo, o sistema financeiro é um representante entre administradores com posições credoras e devedoras. Nessa lógica, o que nas contas públicas é uma taxa de juros, tem como compensação uma receita de quem tem títulos públicos na sua carteira. Diversas vezes, portanto, a pessoa que abre um jornal e lê uma manchete como "Juros voltam a agravar o déficit", pode gostar, como leigo, com qualquer forma de moratória da dívida interna, "para acabar com a ganância dos bancos". Porém, se isso acontecesse, provavelmente ele seria um dos prejudicados, se tiver investimentos financeiros, já que estes podem estar lastreadas em títulos públicos. Finalmente, a taxa de juros é uma expressão de variações primárias anteriores, que originaram a dívida inicial. A culpa da existência de uma taxa de juros deverá ser o agravamento do resultado primário. O que queremos enfatizar com isso é que existe uma ligação entre a taxa de juros e o resultado primário e que uma melhora - ou piora - deste tende a se repercutir, mais cedo ou mais tarde, num sentido ou no outro, na conta de juros, mesmo que a taxa de juros seja constante. A inexistência dos ajustes indispensáveis no lado primário, para não ter que assumir com os ônus disso decorrentes, tende a fazer com que os sacrifícios que estão por vir, sejam maiores, já que, em algum momento, o governo é obrigado a se acertar, com uma dívida maior do que a inicial e, contudo, tendo que alcançar um resultado primário maior, para uma dada taxa de juros. O setor público como algum outro agente econômico, uma empresa ou um empregado assalariado se depara com uma restrição orçamentária. Para manter-se em estabilidade ao longo do tempo, o fluxo de gastos deve ser igual ao de entrada de capital. Caso contrário, estará originando um superávit ou um déficit no orçamento. No primeiro caso, o governo aumentará a poupança e poderá ceder recursos para o setor privado. No segundo caso, ocorre o contrário, com o governo gastando mais do que recebe e originando uma necessidade de financiamento ligado ao setor privado e / ou Banco Central. Dessa maneira obtém-se a primeira grandeza de déficit:

66 •

capítulo 3

As = Co – Do (1) onde A é o déficit público Co são os gastos públicos em determinado período o Do são as receitas públicas em determinado período o Há dois importantes comentários a serem feitos no que diz respeito a essa medida. Em primeiro lugar, sua dimensão. Como não se qualificou a questão do déficit público, este é compreendido como todos os gastos ou custos menos todas as receitas (financeiras e não financeiras). Logo, essa medida atribui-se ao déficit em conta corrente da gestão pública. Em segundo lugar, o déficit público é uma medida de fluxo, em outras palavras, a medição deve ser realizada em determinado período de tempo (mês, trimestre e ano). Logo, quando os jornais anunciam os resultados do déficit público, estes vão sempre estar ligados a uma referência temporal. A medida que mais fica perto da equação 1 é a apresentada pelo Banco Central. São as Necessidades de Financiamento do Setor Público (NFSP), que começaram a ser apresentadas no início da década de 80, em razão do trato com o FMI que objetivava acompanhar o funcionamento global do setor público. Hoje em dia, as NFSP englobam a área pública não financeira e o Banco Central. Estas são medidas pela visão do financiamento, ou como chamam os profissionais da área, pelo método "abaixo da linha". Para uma melhor compreensão de como são apuradas as NFSP, temos que desenvolver a equação 1 mostrando de um lado a origem do déficit público, e de outro lado suas formas de financiamento: (Jhc – Qhc) + to Fo + t* o so Mo + th No = ∆Fo + s∆Mo + ∆No

(2)

No lado esquerdo estão as fontes de origem do déficit público. O primeiro termo entre parênteses indica a diferença entre gastos não financeiros (Jhc) e receitas não financeiras (Qhc). Os outros termos referem-se aos custos financeiros líquidos que recaem sobre os estoques de dívida pública: a dívida interna obtida em moeda nacional (Fo), a dívida contratada em moeda externa (Mo) e a dívida adquirida no Banco Central (No), com suas devidas taxas de juros (to, t* o e th). A variável s simboliza a taxa de câmbio, que por suas mudanças afeta o estoque da dívida em moeda estrangeira. Logo, aumentar as despesas públicas acima das receitas irão levar os depósitos acima da dívida pública (representada no

capítulo 3

• 67

lado direito da equação 2). Isso, pode acontecer por motivos exclusivamente fiscais ou por alterações na condução da política monetária e cambial, que podem modificar as taxas de juros e câmbios. No lado direito da equação 2, estão as fontes de financiamento que dispõe a área pública, a emissão de títulos públicos domésticos, externos, e ligados ao Banco Central. Este último é o mutuante da última instância do Tesouro e do sistema financeiro. Para o primeiro, o Banco Central cobre eventuais carências de financiamento, em geral, aumentando a base monetária. Para o segundo, os empréstimos visam evitar crises de liquidez e problemas no sistema bancário. As operações de empréstimos do Banco Central para o Tesouro Nacional que equivalem a aumentos da base monetária podem acontecer também de maneira indireta por meio das compras em mercado aberto de títulos da dívida em posse do setor privado. Logo, para captar as NFSP do setor público é preciso agregar as operações fiscais deste setor às mudanças que ocorreram no âmbito do balanço do Banco Central. Em geral, são conceituadas como operações "quase-fiscais". As mais comuns podem ser assim representadas: No = Ao + soLo – χo (3) onde: N é a base monetária L é o estoque de reservas estrangeiras χ representa os lucros ou prejuízos resultantes das operações do Banco Central. No lado esquerdo da equação 3 temos o importante passivo do Banco Central, que é o estoque do suporte monetário (papel-moeda em poder do público mais os encaixes dos bancos comerciais no Banco Central). Os fundamentais ativos estão do lado direito da equação 3: títulos públicos e as reservas internacionais. Diferentes tipos de ativos podem ingressar nessa equação, como os créditos do Banco Central com as entidades financeiras. É o caso dos créditos do Programa de Reestruturação do Sistema Financeiro (PROER) elaborado após o Plano Real com propósito de estimular fusões, incorporações e saneamento de entidades financeiras. χ irá determinar os ganhos ou perdas provenientes das operações do Banco Central. Se as operações de seus ativos rendem um honorário acima daqueles dos passivos, o Banco Central estará aumentando seu patrimônio líquido e colaborando, assim, para diminuir a dívida do setor público consolidado. Essa variação pode ser dada por:

68 •

capítulo 3

Dχo = t* osoLo + thNo + ∆soLo (4) A equação (4) indica que a variação patrimonial do Banco Central é uma função direta das reservas internacionais em seu poder (que para simplificar possui a mesma taxa de juros da dívida em moeda externa), do rendimento de juros dos títulos públicos e da incerteza da taxa de câmbio. Um exemplo das operações "quase-fiscais" no Brasil sobre a dívida pública foi o processo ocorrido no país entre 1995 e 1997. A fusão de uma política cambial do tipo “crawling-peg”, em que o câmbio real fixo era mantido inalterável ou em suave declínio com uma política monetária de juros altos, atraíram capitais externos e forçaram o Banco Central a concentrar reservas internacionais em trocas de envio de títulos públicos. Porém, o diferencial de remuneração era prejudicial ao setor público, já que os juros pagos pelo envio da dívida mobiliária eram bem maiores que os recebidos pelo investimento das reservas internacionais. Para acrescentar a restrição orçamentária do setor público, diminui-se do seu passivo (lado direito da equação 2) a variação patrimonial do Banco Central: (Jhc – Qhc) + toFo + t* oso (Mo – Lo) + ∆soLo = ∆Fo + s∆Mo + ∆No –∆χo

(5)

A variação dos títulos públicos da dívida interna na equação 5 é dada por: ∆No = ∆Vo – s∆Lo – ∆sLo + ∆χo (6) Trocando a equação (6) pela equação (5) e rearrumando os termos localiza-se a restrição orçamentária do setor público não financeiro mais o Banco Central. Esta equação demonstra como são calculadas as NFSP; o resultado das oscilações da base monetária e das dívidas interna e externa. Esta última líquida do aumento das reservas internacionais: (Jhc – Qhc) + to Fo + t* o so (Mo - Lo) + ∆soLo = ∆Vo + ∆Fo + s(∆Mo – ∆No)

(7)

O lado direito da equação (7) mostra a oscilação do estoque de dívida líquida do setor público (DLSP) no meio de dois períodos de tempo. O termo líquido aparece com propriedade para mostrar que representa uma diferença entre passivos e ativos:

capítulo 3

• 69

NFSP = ∆ALSP = ∆Vo + ∆Fo + s(∆Mo – ∆No) (8) Em circunstâncias normais a equação (8) representaria o cálculo das NFSP verificadas pelo Banco Central sob a visão do financiamento. Porém, a intensificação do processo de privatização acontecido a partir de meados da década de 90, unido com o reconhecimento de dívidas passadas não contabilizadas está levando a um ajuste patrimonial considerável nas contas públicas. O cálculo das NFSP fica distorcido à medida que inclui os valores do ajuste patrimonial. Suponha uma estabilidade nas contas públicas durante um período determinado. Na suposição de uma privatização nesse período, o Banco Central calcula seu valor diminuindo a DLSP e causando uma NFSP negativa, equivalente a um superávit. Então este estaria anunciando um superávit quando na verdade ocorreu uma situação de equilíbrio. Com objetivo de impedir este tipo de distorção é que o Banco Central passou a livrar os efeitos do ajuste patrimonial (AP) no cálculo das NFSP e introduziu a definição de Dívida fiscal líquida (DFL): DFL = DLSP – APo = DLSP – ("Esqueletos" - Privatizações) (9) Vale notar que as privatizações e os "esqueletos são libertados da DLSP com os sinais inversos à sua entrada no cálculo. Logo, compõe-se a Dívida Fiscal Líquida e sua variação acarreta as NFSP ajustadas, que aproveita os movimentos exclusivamente fiscais: NFSP = ∆DFL (10) É evidente que, quando termina o processo de privatização e de reconhecimento de "esqueletos", a DFL irá igualar com a DLSP, passando a ser dispensável o cálculo da primeira. Outra definição importante para se medir o funcionamento fiscal é o déficit primário, que é dado pela diferença entre custos e receitas não financeiras. Na equação 7 da restrição orçamentária da área pública, o déficit primário é oferecido pelo primeiro termo entre parênteses: DPo = (Jhc – Qhc) (11) Essa medida é fundamental por duas razões principais. Primeiro, porque este retrata a origem e a fonte de alimentação dos déficits totais e da dívida

70 •

capítulo 3

pública, por isso o termo primário. Suponha um município com uma dívida nula, que iniciou suas atividades em 1998. Essa esfera de governo somente poderá gerar uma dívida no ano seguinte a partir de um desequilíbrio das suas contas primárias. Até então esse município não tinha compromisso com pagamentos de juros e passará a ter se precisar rolar sua dívida. Por outro lado, o acúmulo de superávits primários garante a solvência intertemporal do setor público. Por isso, a exigência do cumprimento da meta de superávit primário em torno de 3% do PIB no acordo com o FMI. Assim, corta-se o principal elo de realimentação da dívida pública, já que há reduções nas necessidades de financiamento e nas taxas de juros associadas à captação desses recursos. O segundo motivo é a identificação dos focos de desequilíbrio, por meio da discriminação dos fluxos de receitas e despesas. Essa metodologia é denominada "acima da linha". Com isso pode-se responder às seguintes questões: Quais os itens da despesa que crescem inercialmente? Quais as despesas que são mais suscetíveis a cortes, na hipótese de um ajuste fiscal? Qual a situação das contas previdenciárias? Quais os impostos mais sensíveis a variações na atividade econômica? Para implementar um programa de ajuste fiscal é fundamental conhecer o comportamento e a lei de formação das despesas e receitas primárias, que em última instância irão determinar a trajetória da relação dívida / PIB. O déficit total ou nominal é calculado quando se agrega ao déficit primário o pagamento de juros. É importante ressaltar que se pode calcular o déficit total pelos dois métodos: "acima e abaixo da linha", que correspondem aos dois lados da restrição orçamentária do setor público (equação 7). Eles representam a origem e o financiamento do déficit público. O primeiro tem a vantagem de identificação dos eventuais focos de desequilíbrios e o espaço de manobra reservado ao ajuste fiscal. O segundo mostra o impacto do setor público sobre a disponibilidade de recursos. O déficit público exige a mobilização de poupanças interna e externa para financiá-lo. Essas poupanças poderiam ser direcionadas para outros fins, como aumento dos investimentos privados. Além disso, há uma pressão sobre a taxa de juros, quando o setor público disputa recursos limitados com o setor privado. Esse impacto é tão mais elevado quanto maior for a restrição de liquidez. Países com mercado de capitais pouco desenvolvido e elevados spreads bancários tornam a disputa por recursos mais acirrada. O déficit operacional é uma medida bastante requisitada em períodos de inflação alta. Este é calculado retirando-se das NFSP nominais a parte referente à atualização monetária. Com isso conserta-se os efeitos inflacionários

capítulo 3

• 71

que incidem sobre o déficit público. De fato, perde-se a consciência de que em determinadas situações a remuneração dos títulos públicos em termos reais pode ser negativa em função da velocidade inflacionária. Nesse caso, a inflação estará contribuindo para diminuir a dívida pública. Com a diminuição da inflação, a tendência é de proximidade das medidas, já que se espera que haja baque na volatilidade da taxa de inflação. Com a execução do Plano Real e a queda da inflação, os déficits nominal e operacional dirigiram-se a um ponto comum. Existem dois tipos de conceitos relativos ao déficit público: o de caixa e o de competência. O primeiro calcula o déficit com base nos fluxos de pagamentos e recebimentos acontecidos no caixa do governo. As receitas são contabilizadas no momento de seu recolhimento à rede bancária ou diretamente aos órgãos. Nos dois casos os recursos são registrados na conta única do Tesouro. O critério de competência apura os custos no momento da sua liquidação, isto é, quando se efetuou um direito adquirido pelo credor, livre de o pagamento ocorrer naquela data. O critério de caixa tem o privilégio de medir com maior exatidão o impacto monetário do desempenho do governo. Esse critério, todavia, pode gerar distorções na mensuração da real situação das contas públicas. Por exemplo, no momento que o governo posterga a data de pagamento dos servidores de um mês para o outro, o critério de caixa não estará contabilizando essa despesa devido à ausência de um desembolso financeiro. Isso pode originar um superávit artificial naquele mês e um enorme déficit no mês seguinte. Pelo critério de competência este problema não ocorre. No Brasil, as NFSP e a DLSP são verificadas pelo critério de competência com objetivo de impedir grandes flutuações nos indicadores. A contabilização de novos envios é registrada na data em que acontecem, apesar de não haver o pagamento efetivo. Com isso podese amenizar os efeitos dos pagamentos de juros e casuais prejuízos cambiais, por meio de um fundo de provisões. Pelo critério de caixa, o agrupamento de um pagamento de juros e do principal associado a uma desvalorização cambial poderia originar um crescimento excepcional da dívida pública em reduzido espaço de tempo. Já o resultado primário do governo central medido "acima da linha" pela Secretaria do Tesouro Nacional é verificado pelo critério de caixa.

3.5  Instrumentos de Política Fiscal Em muitos estudos econômicos, é comum a utilização do termo "tripé fiscalmonetário cambial", que nada mais é do que a forma como o governo está con-

72 •

capítulo 3

duzindo a política econômica. Um dos integrantes desse "tripé" é exatamente a política fiscal, que, como já se viu, relata as ações do governo tanto do lado das despesas públicas, como do lado da arrecadação tributária. O conjunto de gastos e arrecadação leva a definição de déficit público. Os tópicos abaixo discutem esses conceitos. A política fiscal pode ser separada em duas grandes partes: a política tributária e a política de gastos públicos. Como sabemos, o governo efetua despesas na economia com salário de funcionários, construção e conservação de escolas, hospitais, pagamento de juros da dívida interna etc. Quando o governo aumenta essas despesas, diz-se que a política fiscal é expansionista; caso contrário, tem-se uma política fiscal contracionista. A política fiscal será expansionista ou contracionista dependendo do que o governo está desejando atingir com a política de gastos. No outro lado da política fiscal, o governo pode agir sobre o sistema tributário de forma a modificar as despesas do setor privado, a estimular determinados segmentos produtivos, e assim por diante. A união de despesas e receitas encaminha ao conceito do déficit público, um dos temas de maior discussão na economia brasileira nos últimos anos. 3.5.1  Gastos do Governo Os gastos do governo podem ser repartidos em dois grandes grupos: as despesas correntes e as de investimento. Conforme o próprio nome, as despesas correntes dizem respeito às despesas realizadas com o objetivo de sustentar a máquina governamental funcionando, bem como às despesas exigidas pela legislação. As despesas correntes, por sua vez, podem ser repartidas em quatro outros grupos, a saber: •  Consumo do governo: tem a ver com o pagamento dos funcionários públicos, e outras despesas fundamentais à manutenção do instrumento público (energia elétrica, materiais etc.); •  Transferências: refere-se às despesas que são realizadas pelo setor público e destinadas ao setor privado, sem a contraprestação de tarefas ou abastecimento de bens, como é o caso da Assistência e Previdência Social; •  Juros: englobam tanto pagamento de juros da dívida interna como externa; vale notar, porém, que, embora se faça menção à "dívida externa brasileira", grande parcela dessa dívida refere-se ao setor privado; os juros de compromisso

capítulo 3

• 73

do governo referem-se somente àqueles cabidos pelo endividamento do setor público; •  Subsídios: correspondem as despesas do governo com o objetivo de assegurar ao consumidor preços inferiores ao preço de produção; na verdade, o produtor recebe o valor total, sendo uma parcela desse valor paga pelo governo e o resto, pelo consumidor; um subsídio muito significativo no passado foi dirigido ao trigo, para que alguns bens primordiais (como pão, macarrão e outros derivados do trigo) não apertassem os orçamentos das famílias de menor renda, mesmo que todos os consumidores (independentemente da classe de renda) fossem beneficiados. Os gastos de investimento referem-se aos investimentos que o governo realiza para incrementar a capacidade de produção de bens e serviços no país (investimento em energia, transporte, saúde, educação etc.). A tabela 3.1 mostra a composição dos gastos públicos no Brasil em 2003 (como porcentagem do PIB), em que se pode notar: a reduzida participação dos lentos (1%), o alto percentual dos juros da dívida (5%) e a grande pressão utilizada pelas despesas com pessoal (consumo) e previdência (transferências). É importante ressaltar que nesse total não estão incorporadas as despesas com a monetária e cambial da dívida. ITEM

PARTICIPAÇÃO

2. Despesas de investimento

36,0 12,0 13,0 5,0 0,5 5,5 37,0

3. Total (1 + 2)

37,0

1. Despesas correntes • Pessoal • Assistência e previdência • Juros reais • Subsídios • Outros

Tabela 3.1  –  Participação do gasto público no PIB (2003) - Fonte: Banco Central, FGV.

Uma análise mais minuciosa acerca da evolução do gasto público no Brasil retrata uma série de aspectos interessantes. Em primeiro lugar, analisa-se que o gasto público tem sido progressivo ao longo dos últimos anos; na década de 70, o total do gasto público foi de 23% do PIB, passando a 27,1% na década de 80,33,0%, no início dos anos 90, para alcançar 36,0% do PIB no período de 19982003 (ver tabela abaixo).

74 •

capítulo 3

PERÍODOS 1970-1979

1980-1989

1990-1994

1995-1998

1998-2003

2. Despesas de investimento

19,5 7,3 7,2 0,6 1,5 2,9 3,5

24,5 7,5 8,2 2,9 2,2 3,7 2,6

29,7 9,8 9,9 2,0 1,4 6,6 3,3

30,8 10,7 10,2 4,3 1,0 4,6 2,3

35,0 12,0 11,0 6,0 0,5 5,0 1,0

3. Total (1 + 2)

23,0

27,1

33,0

33,1

36,0

ITENS 1. Despesas correntes • Pessoal • Assistência e previdência • Juros reais • Subsídios • Outros

Tabela 3.2  – 

Como se pode notar, a pressão para o crescimento das despesas públicas advém de três fontes. A primeira é o item individual e encargos, que passou de 7,3% do PIB no período 1970-1979 para 12,0% no período 1998-2003. Esse crescimento pode ser esclarecido pela junção de dois fatores: de um a presença de promoções automáticas no setor público, que arrocham a folha dos servidores, e, de outro, a própria consolidação, que não permite consumir esses rendimentos mediante a inflação. A segunda fonte de aperto são as despesas com auxílio e previdência, as quais passaram de 7,2% do PIB no período 1970-1979 para 11,0% no período 1998-2003. Entre os motivos explicativos desse crescimento, pode-se ressaltar a própria Constituição de 1988, que elaborou maiores facilidades para a aposentadoria; e o aumento da expectativa de vida do povo brasileiro. Por fim, vale destacar os gastos com juros, que saíram de 0,6% do PIB (1970-1979) para alcançar 6,0% no período 1998-2003. Como se verá, essa conduta é explicada pela própria estratégia do Plano Real, definido pela prática de juros reais extremamente elevados. Uma análise mais minuciosa acerca do gasto público no Brasil mostra alguns aspectos importantes: a exagerada rigidez do gasto público federal, a parcela não insignificante do gasto na área social e a inutilidade desse mesmo gasto social. O gasto público gerou uma importante ferramenta à disposição dos governos para monitorar a atividade econômica. É comum, em diversos países, notar-se períodos de expansão e redução dos gastos públicos, em face das reivindicações da política econômica, fato esse que não acontece no Brasil. Da arrecadação que precisa ser dirigida a programas de alimentação etc. 3.5.2  Arrecadação Tributária

capítulo 3

• 75

Antes de se passar a analisar a política tributária no Brasil, convém debater algumas divisões fundamentais dos impostos. A primeira delas menciona-se à forma de ocorrência, a partir da qual os impostos podem ser diretos ou indiretos. Os diretos são aqueles que refletem diretamente sobre a renda e a propriedade, como é o caso do Imposto de Renda (IR), do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), do Imposto sobre a Propriedade Territorial e Urbana (IPTU) e do Imposto sobre a Propriedade Rural (ITR). Já os impostos indiretos estão embutidos na produção, vendas e consumo de mercadorias, acrescentando-se aí o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Finsocial), o Programa de Integração Social (PIS) etc. Outra divisão fundamental, ainda em termos de base de incidência, menciona-se aos impostos sobre valor adicional e aos impostos em sequência. Os iniciais (entre os quais se incluem o IPI e o ICMS) são impostos cuja base de incidência é o valor adicional, ou seja, o que cada etapa soma ao valor do produto. Logo, quando uma empresa adquire matéria-prima e paga o ICMS, esse valor será usado como um crédito para ser reduzido do ICMS que a empresa terá que arrecadar sobre o faturamento referente a venda de seu produto. Por outro lado, encontram-se os chamados impostos em sequência, que recaem sobre o faturamento, não existindo, logo, o crédito. Se, de um lado, os impostos em sequência mostram simplicidade de arrecadação, de outro lado, retiram rivalidade da produção nacional. Sabemos que, os países não exportam impostos, dado que os mesmos são tirados na exportação; no Brasil, a exportação perde concorrência, porque não há como tirar todos os impostos em sequência das vendas externas, até mesmo pela incapacidade de sua quantificação. A produção nacional também é prejudicada na disputa com produtos importados, que chegam ao Brasil totalmente livre de impostos, ocasionando a incidência dos impostos em sequência somente na última etapa de comercialização. Diferente do que ocorre com a da produção nacional, que é sujeita a tributação em todas as fases do processo produtivo. Os impostos também podem ser classificados de acordo com seu efeito sobre a renda da população. Esta classificação pode ser dividida em impostos progressivos, regressivos ou proporcionais. Os impostos são conceituados como progressivos quando as pessoas com um maior nível de renda pagam proporcionalmente mais impostos, como é o caso do Imposto de Renda, que aumenta

76 •

capítulo 3

proporcionalmente mais que o nível de renda. Os impostos regressivos são aqueles em que as famílias com um menor nível de renda pagam proporcionalmente mais. Frequentemente, os impostos indiretos mostram essa característica regressiva, dado que, como a alíquota é a mesma (IPI, por exemplo), a soma de imposto por produto consumido será a mesma, proporcionalmente maior para as classes de menor poder aquisitivo. 3.5.3  Sistema Tributário Brasileiro Muitos analistas visam o sistema tributário exclusivamente como uma maneira de gerar a arrecadação pretendida pelo governo, compreendendo que, quanto mais eficaz em termos de arrecadação, melhor será o sistema utilizado. Essa é uma visão excessivamente limitada do papel de um sistema tributário, dado que, contudo, a arrecadação seja uma de suas metas, o sistema tributário tem que ser olhado como um instrumento considerável de desenvolvimento econômico e de redistribuição de renda no país. No que se relaciona à questão distributiva, nota-se que a estrutura tributária brasileira é fortemente retrógrada, em função do predomínio de impostos indiretos, ao contrário do que acontece em outros países. A distorção notada no Brasil é típica de países onde a competência de arrecadação é frágil, fazendo com que o sistema se torne repleto de impostos indiretos, que não são declarados. Somente países com vigilância mais rígida conseguem tirar do contribuinte uma porcentagem maior de arrecadação através impostos declaratórios, como é o caso do Imposto de Renda, por exemplo. Outra deficiência do sistema tributário brasileiro cita a sua limitação como ferramenta do desenvolvimento econômico, limitação, essa, reforçada com a chegada do Plano Real. Vale lembrar que o sistema tributário em vigor foi "esboçado" em 1968, período no qual o Brasil era um país excessivamente fechado à comunidade internacional. Em mercados altamente protegidos, a inutilidade do sistema tributário é levada para o consumidor sob a forma de aumento de preços. Numa economia mais aberta ao mundo, a situação é diferente, uma vez que a existência de impostos em sequência tira a concorrência da produção nacional, tanto na exportação como na competitividade com o produto importado. Além do mais, os impostos em sequência acabam sobretaxando os bens de capital, na medida que não é possível livrar tais produtos na cadeia produtiva de máquinas e equipamentos. Além disso, a diversidade do sistema impõe

capítulo 3

• 77

excessiva carga tributária para as empresas que precisam dispor de estrutura apropriada para atender a todas as necessidades impostas pelo fisco. Essa mesma diversidade, aliada à abundante concentração da base de incidência, acaba por se constituir em um fundamental incentivo à sonegação.

3.6  Política Fiscal e Objetivos de Política Econômica Como se analisou, os objetivos de política econômica são principalmente quatro: crescimento do PIB, controle da inflação, equilíbrio externo e distribuição de renda. A política fiscal é uma ferramenta importante que tem a tendência de afetar esses quatro objetivos. •  Crescimento da produção e do emprego: A curto prazo, a política fiscal afeta o nível de produção da economia tanto através da ação direta da despesa pública, como indiretamente, via tributação. Aceitando a presença de ociosidade, o nível de produção será definido pela demanda total da economia. Um dos elementos dessa demanda é o gasto do governo, visto que o setor público compra bens e serviços na economia. Dessa maneira, todas as vezes que o governo amplia suas despesas, estará aumentando a demanda, e, por decorrência, a produção. A longo prazo, a política fiscal é fundamental no sentido de liberar recursos para investimentos, que tanto podem ser públicos como privados. Na realidade, o governo é um dos geradores que podem dispor de patrimônios, que nada mais é do que uma poupança, para a realização de investimentos; os outros geradores são famílias, as empresas e o setor externo. Quanto maior for a soma de poupança originada no setor público, maior será a eficiência do o país investir e, desta forma, maior será o crescimento produtivo. •  Controle da inflação: A política fiscal também pode se compor em elemento fundamental na estratégia anti-inflacionária de um país. Quando há exagero de demanda na economia, essa mesma demanda pode ser encolhida com redução de despesas públicas e/ou aumento da carga tributária, a qual contribuiria indiretamente para reduzir o consumo através da diminuição da renda disponível. •  Equilíbrio externo: Na proporção que as importações de um país são estipuladas pelo nível de demanda interna, a política fiscal intromete-se no equilíbrio externo, atuando

78 •

capítulo 3

diretamente sobre o nível de demanda. Ou seja, quanto maior a despesa pública e menor a tributação, maior será a demanda da economia, e, logo, maior o volume de importações. Ainda em relação a estabilidade externa, não se pode deixar de ressaltar o papel do sistema tributário em termos de criação de resultados na balança comercial. Isso porque alguns sistemas tributários tendem a castigar as exportações, à medida que "carregam" a arrecadação em impostos em sequência. •  Distribuição de renda A política fiscal pode prejudicar a distribuição de renda do país de duas maneiras. Do lado do gasto público, dirigindo-o principalmente às classes de menor renda e do lado da arrecadação, por meio de um sistema tributário crescente.

capítulo 3

• 79

80 •

capítulo 3

4 Finanças Públicas no Brasil

4.  Finanças Públicas no Brasil 4.1  O período anterior a 1980 4.1.1  As reformas de 1964/67: No princípio da década de 60 contávamos com elevados déficits públicos, consideráveis níveis de inflação, e um sistema que dificultava a intermediação financeira a ponto de reprimir práticas de correção monetária e de taxas de jurossuperiores a 12% ao ano. Nessa esfera, o governo foi imposto a realizar um conjunto de transformações a partir da metade da década, onde damos destaque ao Programa de Ação Econômica do Governo lançado no fim de 1964. O programa buscava a estabilidade e o desenvolvimento econômico entre outros diversos objetivos. As metas mais voltadas às finanças públicas referiam-se, especialmente, à política de redução do déficit fiscal, às alterações na política tributária, ao sistema bancário e creditício, aos investimentos públicos e à restauração do crédito externo. Nota-se que, ao impor limites nas taxas de juros e não consentir a correção monetária, o sistema financeiro estabelecia o fascínio dos títulos lançados pelo governo, as Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN). Esses títulos foram colocados no começo de modo compulsório, passando a serem demandados voluntariamente em um segundo momento. O lançamento das ORTN tornou possível a aquisição de recursos adicionais para a garantia do déficit além de estimular a poupança, por ter executado a correção monetária. Eles reproduziram também um novo modo de endividamento do Estado, e um caminho à indexação da economia. Em dez/94 foi promulgada a lei 4595 que fechou a Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), e originou o Conselho Monetário Nacional (CMN), como órgão criador de políticas econômicas, além do Banco Central do Brasil como o órgão cumpridor e fiscalizador dessas políticas. Contudo, a manutenção do Banco do Brasil (BB) como proprietário das reservas voluntárias dos bancos comerciais, prestador de serviços de compensação de cheques e titular da "conta movimento" para equilíbrio das reservas com o Banco Central, acabou gerando a coexistência de duas autoridades monetárias. Desse modo, o governo não tinha um perfeito controle da política monetária. Notase ainda que foram inseridas ao Banco Central algumas funções incomuns de uma autoridade monetária como a colaboração agrícola, de comércio exterior,

82 •

capítulo 4

habitação, levando-o inclusive a tornar-se algoz da política da dívida do tesouro nacional. Na verdade, a "conta movimento" apresentada no parágrafo anterior era um passivo do Banco do Brasil em associação ao Banco Central, que foi elaborado em virtude da ausência de infraestrutura da nova autoridade monetária para ser capaz de desempenhar seu papel. A Constituição de 1967 previa uma política de emissão de títulos públicos a ser oficializada em lei própria. Na ausência da regulamentação o governo usou de Decretos Leis até 1971, quando foi finalmente promulgada a Lei Complementar número 12. Por meio dessa lei, criouse o endividamento via envio de títulos, tirando o poder do Congresso Nacional de determinar sobre questões financeiras. A lei dava pleno poder ao Conselho Monetário Nacional para governar a dívida mobiliária, sem que as negociações circulassem pelo Orçamento Geral da União (OGU). Desse modo, deu início a uma nova fase da política da dívida pública no Brasil. 4.1.2  O comportamento das contas públicas nos anos 70: No transcorrer da década de 70 as finanças do setor público eram conduzidas por uma grande disparidade orçamentária. Existia o Orçamento Geral da União, o orçamento das empresas estatais, o orçamento monetário e a conta da dívida. Até o final da década as receitas e gastos das empresas estatais não tinham sido reunidas em um orçamento estável. Na verdade, apenas com a criação da Secretaria de Controle das Empresas Estatais, em 1979, é que o governo pôde ter um conceito preciso do número total de empresas estatais e fazer um orçamento global para o ano seguinte. O orçamento monetário funcionava como uma ferramenta de controle do passivo monetário e não monetário que era utilizado para política cambial, subsídios, linhas de crédito, entre outros programas. Cada orçamento era permitido por uma autoridade pública distinta e em oportunidades também diferentes, o que causava a total desarticulação entre as políticas econômicas exercidas pelo governo. Como se não bastasse, havia da mesma forma, a conta da dívida que funcionou de modo autônomo, assegurando a garantia dos juros e amortizações (serviço da dívida), sempre por meio do envio de novos títulos. Esse procedimento ficou conhecido como o "giro da dívida interna". Era impraticável realizar um controle eficaz da política monetária e do endividamento público sem que antes fosse exercida uma reforma que fortalecesse o Banco Central a arrumar o controle financeiro do governo.

capítulo 4

• 83

A dívida foi crescendo em função de diversos fatores, também, em função de si mesma e do financiamento de despesas extra orçamentária. Obviamente não se soube o quanto do crescimento da dívida foi adequado a cada fator. Por fim, nota-se que a tática usada pelo governo, ao longo da década de 70, foi de utilização das autoridades monetárias como bancos de auxílio, no método de desenvolvimento econômico, como modo de atender o objetivo de "crescimento com endividamento". Volumes significativos de recursos eram elevados sem aumentos na carga tributária, ou seja, sem desestabilizar o regime militar corrente. A contrapartida era sempre o aumento monetário ou elevação da dívida mobiliária. Com a segunda queda do petróleo em 1979, nos defrontamos com uma crise que forçou um acerto na economia brasileira e, logo, nas finanças públicas.

4.2  As Finanças Públicas no regime de Alta Inflação: 1981/1994 De fato, quando surgiu a crise da dívida externa, em 1982, o crédito externo virtualmente sumiu e o Brasil teve que pedir auxílio financeiro ao Fundo Monetário Internacional, envolvendo uma série de condicionalidades características das negociações em torno de um empréstimo dessa instituição. O painel fiscal encontrado pelos negociadores do FMI era muito desolador, incluindo, entre outros problemas: (I) um déficit público extremamente alto, (II) uma grande indefinição acerca do valor exato desse déficit, em virtude das dificuldades de medidas e à ausência de estatísticas fiscais compatíveis com as boas práticas internacionais, (III) um debate local no qual nem mesmo a própria necessidade de atacar o déficit era consensual, (IV) a falta de instrumentos efetivos de controle da despesa pública, que dessem o consentimento de ter uma pronta resposta às iniciativas da política econômica. Mesmo assim, houve muitos progressos. Vimos que a política fiscal dos anos de 1970 se deu um contexto institucional em que as ferramentas utilizadas estavam longe de serem cobiçadas, tanto em termos de eficácia como de clareza. Ao longo da segunda metade dos anos de 1980, um encadeamento de mudanças institucionais fundamentais poderia ter permitido uma maior fiscalização das dívidas públicas. Por outro lado, os problemas de suporte político do governo da época e a aprovação da Constituição de 1988 representaram um agravo das condições que a política fiscal era adotada, principalmente da perspectiva das autoridades federais.

84 •

capítulo 4

4.2.1  Panorama das Contas Públicas No começo dos anos de 1980, o debate econômico no Brasil se dava entre os economistas chamados "ortodoxos" e os seguidores da escola estruturalista, os "heterodoxos". A posição ortodoxa a respeito da política fiscal e a ligação desta com a política econômica era evidente. Esta afirmava que o declínio do déficit público era condição fundamental e suficiente para a fiscalização da inflação. A inflação era vista como um acontecimento associado ao tamanho da instabilidade fiscal e causada pelo envio monetário solicitado pelo financiamento desse déficit. O posicionamento dos estruturalistas era a princípio pouco claro em relação às causas da inflação, em geral exposta por eles como fruto de pontos de estreitamento do processo produtivo ou da política cambial. Com o decorrer do tempo, o debate fundamental na discussão econômica passou a se dar entre a ortodoxa e os que defendiam a teoria chamada "inercialista" da inflação. Mas, no que tange à política fiscal e à sua associação com o crescimento econômico, os estruturalistas opunham-se aos cortes de consumos, mostrando dois pontos. Primeiro, que a chave para o progresso fiscal era a reconquista do crescimento, base para o aumento do rendimento. E segundo, que cortes casuais da despesa pública poderiam ser extintos pela redução da arrecadação alavancada pela contração da demanda resultante desses cortes. No início dos anos de 1980, houve uma vitória inicial da ortodoxia, cujos temas predominaram, originando uma queda das NFSP (Necessidades de Financiamento do Setor Público). O acontecimento dessa queda, foi visto em seguida como um fracasso das teorias ortodoxas. Foi nesse contexto que a heterodoxia se tornou predominante nos círculos decisivos da economia brasileira, em meios da década, o que se equiparou com o fim do período militar. Foi nesse conjunto de circunstâncias que a política de estabilização do governo inaugurado em 1985 foi voltada no sentido de atacar a inflação por meio de uma interferência no sistema de preços, sem maior preocupação com a redução das NFSP. A posterior decepção nos esforços de fiscalização de inflação da nova equipe resultou então uma nova inversão de papéis, chegando a vez de a heterodoxia perder o seu fascínio. Em função do conhecimento originado por esse conjunto de experiências inúteis de combate a inflação, com o tempo, iniciou a progredir entre os economistas a teoria de que um plano anti-inflacionário teria que agregar elementos tanto ortodoxos como heterodoxos. Essa tese, amadurecida ao longo de anos, levou, já na década de

capítulo 4

• 85

1990, à elaboração do Plano Real, inicialmente anunciado como um programa baseado na conciliação de uma âncora cambial. Há quase duas décadas do começo daquele debate, que remonta ao início dos anos de 1980 e com o benefício da passagem do tempo, é autorizado a realização de um balanço daquelas posições. Os ortodoxos estavam certos na necessidade de monitorar o déficit público, se o que almejavam era sustentar o endividamento público controlado. Isto porque ocorrendo um enquadramento para a elevação da dívida, um déficit alto tenderia a ser não compatível com a estabilidade de preços. Por outro lado, a análise ortodoxa do processo inflacionário era um tanto quanto ingênua, por não levar em consideração os resultados da indexação sobre a rigidez do método inflacionário brasileiro. Os heterodoxos, por sua vez, reconheceram como uma grande ideia, ao destacar a importância da estagnação para a explicação da inflação e, logo a necessidade de excluir esse componente, como condição fundamental do sucesso de uma política anti-inflacionária, nas condições do Brasil da época. 4.2.2  As NFSP: 1981 / 1994 Os resultados fiscais da fase de inflação elevada da economia brasileira, de 1980 a 1994, podem ser agrupados em dois períodos. O primeiro, definido pela existência de consideráveis déficits operacionais, referindo-se a toda década de 1980, enquanto o segundo vai de 1990 a 1994, com uma instabilidade fiscal muito inferior ao período preliminar, a ponto de, na média, as NFSP operacionais terem sido virtualmente nulas. Nos anos de 1980, podem ser reconhecidos dois subperíodos marcadamente desiguais entre si: 1981 / 1984, nos quais houve uma propensão a um certo ajustamento; e 1985 / 1989, nos quais a tendência foi exatamente oposta, deixando o resultado pior no final do subperíodo em relação ao início do mesmo. As razões dessa redução dos juros foram duas: Em primeiro lugar, a queda da dívida pública no decorrer de praticamente todo o período 1985 / 1994, levando a redução da taxa de juros. E, em segundo lugar, até 1988 a metodologia de contagem das NFSP "inchava" a conta de juros reais, por uma inconveniência técnica só corrigida em 1989. Essa inconveniência resultava do fato de que, ao tirar o elemento inflacionário do aumento da dívida pública, o Banco Central considerava como juros "reais" a parcela dos juros nominais que ultrapassasse a correção monetária institucionalmente determinada pelo governo. Como a correção monetária

86 •

capítulo 4

era inferior à inflação, parte do salário dito "real" dos títulos nada mais era do que uma vantagem pela modificação do real valor da dívida. Portanto, a cada ano, uma fração da dívida herdada do passado era "comida", sem que isso tivesse uma compensação na forma de superávits correspondentes "acima da linha". A partir de 1989, o Banco Central mudou a técnica de cálculo dos juros e passou a considerar o cálculo da correção monetária de forma correta. 4.2.3  Medição do Déficit: 1981 / 1984 O primeiro trabalho conjunto dos técnicos do FMI e dos ministérios da Fazenda e Planejamento, foi a de aparelhar o Banco Central para estar em condições de registrar as operações de endividamento do setor público estabilizado. Isto porque, com base no critério tradicional do FMI, a variação da posição de endividamento simbolizava o desequilíbrio fiscal. A segunda tarefa foi a de adaptar os critérios de apuração do déficit entre o FMI de um lado e o governo brasileiro de outro. O FMI era favorável a escolher o critério tradicional de medição do déficit, que era o cálculo das NFSP no conceito nominal. As autoridades brasileiras alegavam que uma vez que a inflação estava em aceleração, quaisquer que fossem os empenhos realisticamente possíveis, não conseguiram impedir um aumento do déficit nominal, associado às imposições altistas sobre a inflação. A adoção da definição operacional não conseguiu resolver todos os problemas práticos associados à necessidade de ter uma boa forma de medir a colaboração da política fiscal para a política anti-inflacionária do governo. Havia, ainda, quatro problemas metodológicos: a desigualdade das informações, a inconstância dos dados, a falta de confiança na precisão das estatísticas e a continuidade da interferência da inflação sobre o resultado fiscal. Com relação aos primeiros três aspectos, os dados eram divulgados com grande diferença, motivo pelo qual era árduo para as autoridades reagirem a tempo de tomar as medidas compensadoras eventualmente necessárias para encarar alguma situação fiscal indesejável. Nos anos de 1990 o Banco Central passou a publicar os dados do déficit de maneira mais confiável, sem que acontecessem revisões significativas, depois da publicação do dado inicial. Deixando de lado essas carências, os indicadores fiscais a disposição para o período de 1981 / 1984 indicaram uma diminuição importante do déficit operacional, depois que o acordo com o FMI passou a estar válido, durante 1983 /

capítulo 4

• 87

1984. Na verdade, neste último biênio as NFSP operacionais foram de 3,2% do PIB, em média, contra 6,8% do PIB no biênio anterior, 1981 / 1982. Essa evolução esteve relacionada a um outro contexto, caracterizado de "tensão fiscal", entendida como uma condição na qual o déficit é "reprimido" por meio de expedientes ad hoc de duração limitada no tempo, e que pendem a ser revertidos posteriormente, na falta de reformas estruturais que excluem a raiz do problema. Nesse caso, estaria a diminuição da despesa real com pessoal dos dois anos de duração do acordo com o FMI - 1983 e 1984 -, que, não tendo sido acompanhada de uma drenagem do quadro do funcionalismo, terminou sendo inválida pelo "efeito-mola" dos aumentos salariais compensatórios posteriores a 1984. 4.2.4  A Redemocratização e o Aumento de Déficit Público: 1985 / 1989 Em meados de 1982, o governo brasileiro anunciou seus objetivos de ajustamento externo, estes foram recebidos com grande dúvida, pela originalidade dos valores propostos para serem alcançados pela balança comercial. A transferência de recursos reais ao exterior foi viabilizada por meio da combinação de ajuste dos preços relativos e do amadurecimento dos programas de substituição de importações iniciados na segunda metade dos anos de 1970. O fato de o país ter se ajustado, praticamente estabilizando sua conta corrente, não resolvia todos os problemas dispostos pela nova situação de carência de recursos externos. Isso porque o integrante externo era somente uma das faces do "problema de transferência", sendo as outras duas o item macroeconômico e o item monetário /fiscal. O integrante externo da transferência estava relacionado ao equilíbrio do balanço de pagamentos, compreendido como o ajuste a uma situação na qual, à frente das ausências de financiamento externo, o Brasil tinha que passar a atuar com um resultado da conta corrente próximo de zero, em comparação com os elevados déficits verificados até então. No momento em que a fonte de recursos externos esgotou-se, após a moratória mexicana, o Brasil essencialmente passou a ter que pagar os juros da dívida externa por meio de superávits comerciais, ao invés de fazê-lo simplesmente por meio da aquisição de novos empréstimos. O superávit da balança comercial, que foi somente de US$1 bilhão em 1982, subiu então para U$6 bilhões em 1983, alcançando US$13 bilhões em 1984 e uma média de também de US$13 bilhões, nos cinco anos 1985

88 •

capítulo 4

/ 1989. Era a época dos chamados "mega superávits" comerciais. O integrante monetário / fiscal da solução da crise externa era representado pelo choque monetário e pela consequente necessidade de enviar títulos, que resultava da maneira em que o ajustamento externo tinha se dado no Brasil. Ao contrário de outros países endividados nos quais o Estado era simultaneamente produtor e exportador, o Brasil encarava-se com o fato de que a dívida externa era dominantemente pública, mas o superávit era privado. Em somente cinco anos, entre 1982 e 1987, a dívida externa líquida do setor público foi de US$48 para US$91 bilhões, passando de 61% da dívida externa líquida do país, em 1982, para 80% desse total em 1987. Cabe ressaltar que este aumento da dívida externa pública não se deveu somente ao déficit público registrado no período e sim ao fato de que o governo arcou com uma parte importante da dívida externa, que originalmente tinha sido privada, processo esse renomado no debate da época como "estatização da dívida externa". O Brasil tornara-se capaz de adquirir as divisas necessárias para assumir os seus compromissos financeiros com o exterior. Porém, a estabilidade em conta corrente do balanço de pagamentos era seguida de um desequilíbrio interno, uma vez que o setor público não produzia os recursos fiscais para nivelar a injeção monetária relacionada ao equilíbrio externo. Essa injeção monetária decorria da situação de que o Banco Central pagava aos exportadores em moeda doméstica, para adquirir as divisas com as quais poderia assumir com o ônus dos juros da dívida externa. Se esta fosse privada, outros encarregados pagariam ao Banco Central em moeda, de maneira que a este enviasse o pagamento de juros ao exterior em divisas. Na prática, essa compensação monetária não existia, já que a dívida externa era, em sua maior parte, do próprio governo. 4.2.5  O Problema da análise fiscal A adoção de uma política fiscal mais negativa por parte do governo que assumiu em 1985, no período denominado de "Nova República", enfrentou dois tipos de obstáculos. Por um lado, o resultado fiscal anterior a 1984 fora muito bom, o que contribuiu para tirar qualquer sentido de urgência no plano fiscal de 1985. Em contrapartida, o governo, por meio de algumas das suas principais autoridades, dava mostras de que a gravidade do problema fiscal não deveria ser maximizada. Em outras palavras, uma das maiores dificuldades para reduzir o déficit fiscal, era que, segundo a análise oficial da situação, o déficit

capítulo 4

• 89

público não era um problema significativo a ser atacado. Essa postura estava apoiada em dois tipos de justificativas. A primeira, de que mais relevante que o tamanho do déficit, eram as suas condições de financiamento; e a segunda, de que era fundamental diferenciar entre os componentes do déficit, antes de determinar prescrições concretas para a solução do mesmo. A primeira justificativa, a respeito das condições de financiamento, citada pela voz de algumas autoridades, informava ao fato de que, se há possibilidades de o setor público se financiar, um inesperado desequilíbrio entre oferta e despesa não teria por que provocar um aumento dos preços, uma vez que não haveria obrigação de aumentar a oferta monetária, diante da viabilidade de ampliar a colocação de títulos. A alegação baseava-se no exemplo de muitos países industrializados, que na época tinham déficits relativamente altos para os específicos padrões históricos e que apesar disso tinham uma inflação baixa. O fato, porém, é que na prática essas idealizações não se mostraram válidas. Primeiro, porque a consequência própria de um déficit elevado, na falta de financiamento monetário, é o aumento da relação dívida / PIB, com ameaças de gerar um processo de tipo "bola de neve" de endividamento público, semelhante ao que tinha acontecido nos anos de 1970 com a dívida externa. E segundo, porque mesmo que fosse verdade que determinados países industrializados tinham déficits relativamente altos, o fato é que déficits como aqueles que o Brasil exercia na época seriam apontados como altos, e seriam combatidos severamente em qualquer país do mundo. A segunda justificativa, ganhou um caráter oficial por meio do documento "Livro branco do déficit público", anunciado pela Secretaria de Planejamento da Presidência da República em 1986. Nesse documento, assegurava-se que era necessária cautela com as análises que incluíam o investimento público no cálculo do déficit público, que seria considerado o déficit corrente. Este então assumiria um valor, classificado como pequeno no documento, de cerca de 0,5% do PIB. Como o somatório do investimento das estatais com o investimento das excessivas esferas de governo, o raciocínio originava admitir que um nível de NFSP operacionais de 5% a 6% do PIB seria suportável e compatível com a estabilidade de preços. 4.2.6  Política Governamental Os anos de 1985 / 1989 podem ser definidos como um período sem rupturas, já que, a partir de março de 1985, o período se refere a um só mandato pre-

90 •

capítulo 4

sidencial. Embora, podemos diferenciar três fases no que diz observação à orientação das autoridades econômicas, a primeira em 1985, caracterizou-se pela concorrência interna entre aqueles propensos a uma postura nitidamente contencionista do ponto de vista fiscal, juntos em torno do ministro da Fazenda, Francisco Dornelles; e aqueles mais inclinados a enfrentar o caráter inercial da inflação, que resistiam aos cortes apresentados e se juntavam em torno do ministro de Planejamento, João Sayad. A segunda fase que abrangeu parte de 1985, todo o ano de 1986 e o início de 1987, iniciou com a demissão do ministro Dornelles e sua troca por Dílson Funaro, dando começo a uma clara predominância dos economistas até então ligados à Secretaria de Planejamento, sob cuja proteção foi implantando o Plano Cruzado. Emfim, a terceira fase, que tomou o resto do governo e foi mostrada pela primeira vez ao público, foi com a demissão do ministro Funaro, marcou uma certa reconquista da intenção oficial - pelo menos retórica - de derrotar o déficit público, sob a gestão dos ministros Bresser Pereira (1987) e Maílson da Nóbrega (1988 / 1989). Ao problema da análise de algumas das próprias autoridades, somou-se, como causa do agravamento fiscal notada no período em relação a 1984, a vulnerabilidade política do governo da época. Cabe recordar que, na eleição indireta para presidente da República, no Colégio Eleitoral então corrente, a oposição, encabeçada pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro, foi apoiada por uma cisão do partido que até então defendia o governo militar, cisão essa que criou a denominada Frente Liberal, dando à origem à candidatura Tancredo Neves (PMDB) / Sarney (Frente Liberal), aquele para a presidência e este para a vice-presidência da República. Três dias antes de assumir, contudo, o primeiro adoeceu gravemente, não chegando a nem mesmo tomar posse e vindo a falecer um mês depois. Isso criou uma situação rara, pois o partido, dominante na aliança eleitoral formada para pôr um fim ao governo militar, viu-se de repente privado do comando soberano da Nação e sem vínculos estreitos de solidariedade com o novo líder do Executivo. Tais acontecimentos motivaram uma série de disputas entre o presidente Sarney e o PMDB, que se estenderam por todo o seu governo. Portanto, mesmo quando houve o firme propósito de se ter uma política fiscal mais reduzida, as intenções terminaram quase sempre por se decepcionar, seja pela ausência de suporte do próprio presidente da República à sua equipe, ou pela ausência de condições políticas para adquirir o apoio fundamental do legislativo para a aprovação das medidas de ajuste. Esses argumentos explicam, por exemplo, porque o efeito primário de 1989 foi significativamente pior do que o de 1986, ano do plano Cruzado. capítulo 4

• 91

O fim do período militar no Brasil foi um caso típico de redemocratização, ligada ao aumento das demandas sociais, sem obstáculos suficientes colocados por parte das autoridades políticas. A troca de um governo militar por um civil foi compreendida pelas lideranças da época como estando relacionada à necessidade de trocar a política econômica em curso até então. É interessante apontar o contraste, por exemplo, com o que aconteceria alguns anos depois no Chile, onde a equipe econômica do governo, que sucedeu ao Pinochet, teve o zelo de preservar as linhas gerais da política econômica do governo anterior. No Brasil, as circunstâncias se agravaram devido às demandas naturais anteriormente sufocadas que tendiam a surgir com o fim de um governo de força. Além disso, a economia vinha de dois anos de ajuste fiscal, nos quais a despesa corrente do governo e o déficit público tinham se encolhido em relação a 1982, dano início a pressões em favor das notáveis "recomposições de gastos". 4.2.7  Efeitos Institucionais Nos períodos de 1985 a 1989, o marco institucional em que se efetuou a política fiscal esteve sujeito a duas alterações contraditórias. A primeira foi referente a avanços importantes do panorama gerencial, caracterizados pela exclusão de uma série de problemas e deformações herdadas dos anos de 1970 e que ainda existiam nos primeiros anos da década de 1980. A segunda foi referente a nova Constituição sancionada pela Assembleia Constituinte de 1988, que limitou de modo considerável a margem de artifício das autoridades econômicas. No que tange aos avanços obtidos, cabe ressaltar, os seguintes itens: (i) a junção sucessiva, a partir de 1985, das contas do orçamento monetário, votada pelo Congresso Nacional; (ii) a eliminação da conta movimento do Banco do Brasil, em 1986; (iii) a extinção das funções de ajuda do Banco Central; (iv) a criação da Secretaria do Tesouro Nacional, também em 1986, com objetivo de aglomerar a contabilização de pagamentos e recebimentos do governo federal; (v) a imposição de que, a partir do orçamento de 1988, todas os gastos públicos federais contassem com prévia aprovação legislativa; (vi) a mudança da administração da dívida pública para o Ministério da Fazenda e a inclusão ao OGU das despesas com o pagamento de juros da dívida pública. De uma maneira geral, com exceção do último item, que teve exclusivamente o efeito de aumentar o grau de clareza da contabilidade pública, esses indicadores, além de aumentar a clareza da política fiscal, tiveram o mérito de eliminar focos fundamentais

92 •

capítulo 4

de desperdício dos recursos públicos, seja pelo fim de certas brechas de financiamento da despesa, ou pelo aperfeiçoamento dos instrumentos de controle, por meio de uma centralização da gestão do caixa. O fato de que, além desses avanços, o desequilíbrio das contas públicas tenha piorado, deve-se aos fatores antes citados e as consequências da aprovação da nova Constituição, em 1988. Isso não tira, contudo, a importância das novidades introduzidas, representando um "painel de controle" da situação, por meio da criação de "botões que, devidamente apertados, poderiam originar uma melhora do resultado fiscal. Em oposição a esses empenhos das autoridades federais, a nova Constituição criou uma série de obstáculos para a gestão da política econômica, como a alta das alíquotas das transferências de receita para estados e municípios, a sobrecarga exigida ao sistema previdenciário, e o acréscimo da proporção dos recursos da União obrigatoriamente designada a certas assinaturas de gasto, tipicamente sociais. Em decorrência, a parcela de recursos livremente disponíveis do governo federal, reduziram drasticamente, por causa do aumento de gastos definidos pela nova Constituição e à maior importância relativa obtida pelas chamadas "receitas vinculadas". Essa limitação restringiu a capacidade do poder Executivo de alocar as despesas de uma maneira mais racional. Além disso, surgiu uma fonte adicional de pressão sobre o déficit público. Com isso, o governo federal foi forçado à criação de novos impostos, tecnicamente questionáveis, mais que tinham para ele o privilégio de não serem objeto de divisão com outras esferas da federação. 4.2.8  Situação Fiscal entre 1984 e 1989 A combinação de diferentes questões como o impacto da crise externa, a falta de esforço das autoridades em combater o déficit, em alguns períodos, a vulnerabilidade da política do governo e os resultados da nova Constituição, geraram uma significativa piora da situação fiscal entre 1984 e 1989, tendo o déficit operante passado de 3,2% do PIB, no decorrer de 1983 / 1984, para uma média de 5,9% do PIB, em 1988 / 1989. A análise das causas desse efeito foi afetada pela ausência de elementos "acima da linha" da execução fiscal para os primeiros meados da década e pelas diferenças metodológicas entre os dados das contas nacionais e a apuração do déficit feita pelo Banco Central.

capítulo 4

• 93

Na segunda metade da década houve um ajuste dos baixos níveis de arrecadação, com um aumento relevante do gasto público. A receita tributária se manteve relativamente constante quando a analogia é feita entre os dados de 1981 / 1985 e os de 1986 / 1990, devido aos elevados níveis de receita fornecidos pelo plano Collor I em 1990. Quando se equiparam os dados de receita das contas nacionais de 1983 / 1984 com os de 1988 / 1989, nota-se que tivemos uma queda da carga tributária, de 25,6% do PIB para 23,6% do PIB. Simultaneamente, o consumo corrente do governo, inclusive pelas contas nacionais, passou de 9,8% do PIB para 14,5% no mesmo espaço de tempo. Esse processo foi seguido de uma pequena queda no total das transferências de assistência e previdência e das despesas de recursos - que não formam parte do consumo do governo - de 11,1% do PIB para 9,6% do PIB, inclusive entre 1983 / 1984 e 1988 / 1989. Como resultados desse aglomerado de fatores, houve uma nítida tendência de agravamento de resultado primário do setor público consolidado, no decorrer da segunda metade da década. Após de ter sido superavitário em 2,2% do PIB em 1985 / 1986, nos três últimos anos do governo Sarney (1987 / 1989), houve um déficit primário médio de 0,4% do PIB. Isso aumentou o déficit exercido pelas NFSP operacionais, de 4,2% em 1985 / 1986 para 5,8% do PIB em 1987 / 1989, apesar do baque da despesa de juros reais de 6,3% para 5,4% do PIB no mesmo período. 4.2.9  Política Econômica de 1990 a 1994 O ano de 1990, que se começou a administração Collor de Mello, traduziu em um divisor de águas na história econômica brasileira da segunda metade do século. A partir de então começaram a ser oficialmente discutidos alguns dos pilares do modelo de desenvolvimento apoiado na combinação de alteração de importações, protecionismo e forte intervenção do Estado na economia, o que estabeleceu uma mudança de modelo, que acabou tendo seguimento sob a gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso, na segunda metade da década. Registramos que a partir de 1990, aconteceu um processo marcante de abertura da economia, com extinção das barreiras não tarifárias e queda considerável das tarifas de importação, seguido de um programa de desestatização que se modificou em uma política de governo, sucedendo às simples privatizações dos anos 1980. Nesse contexto, a guerra ao déficit público ganhou um destaque fundamental na agenda governamental e no discurso presidencial, em contraste com a

94 •

capítulo 4

conduta comparativa e mais ou menos tímida do governo anterior a esse respeito. Eliminar o déficit público, voltou a ser uma palavra de ordem na oratória oficial, relacionada ao propósito de lutar frontalmente contra a elevada inflação. Os efeitos dessa política, somados a uma considerável subindexação da dívida interna em 1990, permitiram por sua vez reduzir consideravelmente os gastos com juros da dívida pública. O governo Collor foi interrompido no fim de 1992, quando da aprovação do impeachment do presidente da República pelo Congresso Nacional. A predominância das políticas, então, em curso, não sofreu maior interrupção no mandato de Itamar Franco, que assumiu a presidência no decorrer do restante do mandato, até o final de 1994. No meio de 1994, por sua vez, foi anunciado o Plano Real de estabilização da economia. 4.2.10  A Indexação da Receita Já tivemos a oportunidade de debater a influência que um déficit alto pode ter sobre a inflação, quando financiado por maio da senhoriagem. Existe, também, uma relação contrária, isto é, da inflação sobre a dimensão do déficit. A literatura, em geral, determina que essa relação costuma ser direta, isto é, quanto mais inflação, maior seria o déficit, em razão à queda no valor da receita. Esse baque se dá pela defasagem de tempo entre o fato fornecedor de tributos e o seu permanente recolhimento aos cofres públicos, o que, em caso de elevação dos preços, implica em um desgaste do valor real correspondente. Um exemplo disso é o de recolhimento do imposto sobre o valor reunido de um produto, que é obtido por um indivíduo em um determinado mês, mas só é recolhido ao órgão encarregado pela arrecadação nos meses seguintes. Esse fenômeno é famoso no linguajar técnico como " efeito-Tanzi", em honra àquele que executou os estudos pioneiros sobre o tema. A perda de valor do faturamento, em termos de moeda permanente, é uma função direta do prazo de recolhimento dos impostos e da taxa de inflação. No nosso caso, contudo, esse efeito não assumiu dimensões tão significativas como em demais países de inflação elevada, devido ao requinte do sistema de indexação dos tributos. As unidades arrecadadoras enfrentaram a elevada inflação de duas maneiras. A primeira, reduzindo o intervalo de recolhimento dos impostos, para o mínimo tecnicamente possível. E a segunda, manifestando o valor a ser cobrado dos contribuintes não mais na moeda nacional e sim

capítulo 4

• 95

em itens de referência, cujo valor se alterava de acordo com a inflação. Isto suavizava significativamente as perdas recorrentes da alta dos preços. 4.2.11  Inflação e Gasto Público No debate brasileiro a respeito da relação entre a inflação e a política fiscal, alegava -se, em torno de 1993 / 1994, que essa ligação seria diferente em confronto com a maioria dos países, por dois motivos. Primeiro porque as particularidades do sistema tributário do Brasil estariam em boa medida defendendo a receita da existência do "efeito Tanzi". E segundo, porque muito mais fundamental do que a perda de valor real dos tributos, seria a "ajuda" proporcionada pela inflação ao governo para diminuir o valor real do gasto em relação aos valores envolvidos no orçamento. Quando pressionado por um governador ou por algum colega de ministério a disponibilizar uma verba, bastava ao ministro da Fazenda "empurrar" a disponibilização por um mês, para ocasionar uma perda real do valor disponibilizado. Com a despesa determinada em termos nominais e a receita indexada, a técnica de controlar o gasto público "na boca do caixa", revelou-se excessivamente eficaz para controlar a evolução do gasto. Isto foi denominado de "efeito Tanzi da despesa", ou "efeito Tanzi ao contrário" ou também "efeito-Bacha", pelo fato de o economista Edmar Bacha ter sido quem primeiro teorizou a respeito do assunto. Esse raciocínio tinha a vantagem de permitir a compreensão da queda das NFSP operacionais notadas no início dos anos de 1990 em comparação à década anterior e, simultaneamente, explicar a continuidade da elevadíssima inflação da época e justificar a imposição de novas medidas fiscais de caráter contencionista. A alegação era que o controle do déficit que o governo estaria adquirindo seria artificial e que, à medida que o déficit "potencial" continuasse alto, a queda do déficit não seria "crível", ou seja, não seria vista como permanente. Isto originaria expectativas negativas que esclareceriam, no campo teórico das expectativas racionais, a tendência sistematicamente crescente da inflação no período, em que pese a diminuição das NFSP. Um plano de consolidação teria, então, que estar baseado na acolhida de um ajuste fiscal que não mais dependesse da inflação para preservar a despesa real contida e que consentir ao setor público ter um déficit fiscal reduzido, com apoio em medidas de caráter fundamental, que implicassem uma solução definitiva do déficit público.

96 •

capítulo 4

4.2.12  Qualificações Necessárias Há três pontos que se cabem ressaltar que são importantes para qualificar o que aconteceu com a política fiscal depois de 1994, uma vez que a inflação caiu. Em primeiro lugar, o relevante para estes era a quantidade de recursos reais repassados pelo governo. Então, o governo deveria ter condições de uma vez realizada a estabilização, preservar o valor real do gasto. Observa-se que isto não envolveria um dano real, já que o gasto seguinte à queda da inflação não teria que ser reduzido, e sim apenas preservado em termos nominais. É claro, de qualquer maneira, que com o fim da inflação os problemas tornar-se-iam mais claros. Isso porque a inflação escondia o conflito entre as demandas sociais e a eficiência do governo de satisfazer a elas, já que quase todas as demandas eram atendidas, nominalmente. Logo, o custo político de dizer "não" às exigências orçamentárias, obviamente, aumentaria com a inflação baixa. Em segundo lugar, oferecida a regra de conversão dos salários usada no Plano Real, não haveria nenhum equipamento legal que obrigatoriamente levasse o governo a ter que elevar o valor real de suas despesas, como aconteceria, por exemplo, se a inflação caísse e se houvesse uma indexação de tipo “backward looking”. Logo, como as despesas não eram indexadas, o valor real das próprias dependeria fundamentalmente do acordo político do governo com o ajuste fiscal. Ou seja, o aumento real da despesa após a consolidação estava longe de ser inevitável. E em terceiro lugar, por melhor que fosse a indexação da receita, o valor real desta não poderia ficar absolutamente imune a uma inflação muito elevada. Não é difícil compreender o porquê. Toma-se o caso do imposto sobre produtos industrializados. Ainda que fosse feito mais de um recolhimento por mês à Receita Federal, não era permitido, por questões administrativas, fazer isso todos os dias. Portanto, no instante em que um produto era vendido, o valor, real do IPI nele embutido era de x, mas o recolhimento do mesmo, em termos reais, sendo feito com alguns dias inferior a esse x. Nessa lógica, o prejuízo de receita do governo, com 50% de inflação ao mês, como se chegou a ter antes do Plano Real, podia ser até mais elevado, em termos reais e apesar de toda a indexação dos impostos, do que a que se tinha no começo dos anos de 1970, quando a receita não era indexada e a diferença no recolhimento era considerável, mas a inflação era da ordem de 1% ao mês. Isso sugere que, quando a inflação caísse, a receita em termos reais aumentaria, como já havia ocorrido em 1986 com o Plano Cruzado e como, de fato, aconteceu com o Plano Real em 1994.

capítulo 4

• 97

4.3  Plano Real No Brasil, desde o final da década de 70 até meados dos anos 90, conviveu-se com altas taxas inflacionárias. No decorrer desse período, o País foi submetido a diversos planos econômicos, ortodoxos e heterodoxos, mas nenhum teve sucesso real no combate à inflação e na recuperação do crescimento econômico. A análise da economia brasileira na segunda metade da década de 80 indica que todos os esforços para terminar com a inflação foram abandonados pouco tempo depois de apresentados. O Plano Bresser durou somente seis meses, de julho a dezembro de1987, ao mesmo tempo que os Planos Cruzado, Verão e Collor duraram cerca de12 meses. Além da pequena duração, outros três pontos podem ser destacados. Primeiro, quando da realização das medidas propostas pelo Plano, o que se notava era uma imediata diminuição no crescimento das taxas inflacionárias. Segundo, dado o insucesso de um plano de ajustamento, este era imediatamente trocado por outro, gerando uma sequência de tentativas de consolidação. Terceiro, em cada plano novo, o Governo tentava forçar medidas mais severas, num empenho de convencer o público de sua promessa. Todos esses fatos podem ser julgados como uma indicação de falta de confiabilidade ou incapacidade de compromisso das autoridades econômicas brasileiras com uma política anti-inflacionária efetiva e consistente. No período entre janeiro de 1994 e julho de 1998, identifica -se nitidamente que a meta principal da política governamental foi a estabilização de preços, com a conservação das taxas de inflação em níveis reduzidos. Nesse sentido, o Governo usou uma política monetária altamente negativa, associada a uma regra de não depreciações cambiais. A concepção e a condução da política macroeconômica, mirando a esse objetivo, tornaram-se visíveis antes mesmo do anúncio do Plano Real, em julho de1994. Após o processo de impedimento do Presidente Fernando Collor e a resultante posse do Vice-Presidente Itamar Franco, algumas mudanças foram feitas na política econômica. Tais medidas beneficiaram a implantação do Plano Real, levando à criação de perspectivas favoráveis no que diz respeito ao controle da inflação. O Plano Real foi implementado em três etapas. A primeira delas é reconhecida pela criação do Fundo Social de Emergência em março de 1994. Numa segunda fase a equipe econômica, motivada pela semelhança que o processo inflacionário brasileiro apresentava com o processo alemão dos anos 20, determinou indexar todos os preços da economia por meio da criação da Unidade

98 •

capítulo 4

Real de Valor (URV). O resultado foi uma contração drástica do patamar inflacionário. Com a execução da terceira fase do Plano Real, em junho de 1994, determinou-se a transformação dos valores monetários da URV para reais. A política monetária utilizada implicou a prática de altas taxas de juros reais, além de outras atitudes pontuais de contenção ao crédito e ao consumo. Nesse período o Governo teve forte apoio popular, preocupando-se mais com a inflação do que com o desemprego. O fato de divulgar inflação baixa e adquirir esse resultado conferiu confiança às medidas e ao plano econômico do Governo. Com relação à política cambial, a mudança primordial foi a adoção do sistema de bandas cambiais, acertando limites inferior e superior, dentro dos quais a taxa de câmbio poderia alternar livremente. A vantagem desse sistema foi autorizar uma flexibilidade na taxa de câmbio nominal, para responder às alterações nas condições internas e externas do País, sendo, simultaneamente, capaz de consolidar as expectativas dos agentes, contribuindo positivamente para a confiança das políticas governamentais. As medidas usadas no âmbito das políticas monetária e cambial contribuíram para a conquista e a consolidação, por alguns anos, da principal meta do Plano Real, qual seja, a consolidação de preços. Porém a ocorrência de dois importantes acontecimentos no cenário internacional evidenciou sensibilidade da economia brasileira aos fatos externos, que, por sua vez, complicaram a conduta posterior da política macroeconômica. O primeiro fato, iniciado no segundo semestre de 1997 com a crise asiática, tomou proporções monstruosas, atingindo com maior relevância os países emergentes. Como consequência, a economia brasileira provou uma elevada fuga de capitais, acrescida de uma diminuição de suas reservas internacionais. O segundo episódio diz respeito a moratória da Rússia que, sem dúvida, piorou ainda mais a situação da economia brasileira no que diz respeito à progressiva fuga de capitais e à consequente redução constante das reservas . A crise financeira, que começou na Rússia, atingiu outra vez as Bolsas de Valores do resto do mundo, inclusive as brasileiras. Causando prejuízos em outros países, os investidores internacionais diminuíram suas aplicações em papéis brasileiros, num sucessivo processo de remessas de divisas para o Exterior. Desse modo como no segundo semestre de 1997, também em 1998, as reservas internacionais encolheram-se sensivelmente, como mostra o Gráfico 1. No período de julho a setembro de 1998, o País perdeu mais de US$20 bilhões em reservas internacionais.

capítulo 4

• 99

80 000 70 000 60 000 50 000 40 000 30 000 20 000 10 000

(US $ bilhões)

Jan Abr Jul Out 1993

Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul 1994

1995

1996

1997

1998

Figura 4.1  –  Reservas Internacionais Brasileiras - Jan./93 - jul. /98 (Fonte Bacen)

A crise financeira internacional também impactou os papéis da dívida externa brasileira, que sofreram fortes quedas no período. A sensibilidade da economia brasileira aos acontecimentos externos levou a uma desvalorização acentuada dos preços desses papéis, abaixando ao nível de 49% do valor de face no auge da crise. A falta de credibilidade dos investidores estrangeiros na eficiência do Governo de se defender contra possíveis ataques especulativos, bem como uma associação, talvez errada, entre a situação da economia brasileira e a dos demais países, fez com que os próprios buscassem aplicações mais seguras que os títulos dos países emergentes. Perda de confiança gerada por esse cenário levou o Governo a, novamente, usar a política monetária negativa com a forma de cativar o público, interno e externo, do seu compromisso com a consolidação macroeconômica. Mesmo em circunstâncias contrárias, não foram usadas medidas na área cambial, sustentando-se a regra de não desvalorizações. O Governo escolheu por uma elevação brutal da taxa de juros, não mudando a condução da política cambial. A contínua utilização de ferramentas monetárias altamente negativas, desgastou a convicção do público a respeito da sustentabilidade da estabilização de preços e da obtenção do equilíbrio macroeconômico, diante ao agravamento da crise externa. Apesar da enorme fraqueza da economia brasileira face a esfera internacional, nota-se, no gráfico 2, que os investimentos externos diretos mostram uma tendência progressiva desde janeiro de 1993, sugerindo um cenário otimista de longo prazo, por parte dos investidores estrangeiros, para a economia brasileira. A abertura econômica, junto ao processo de privatização, tem autorizado a entrada de recursos para o uso em infraestrutura, telecomunicações, energia elétrica, siderurgia, petroquímica, dentre outros segmentos de atividades. Além disso, esses fluxos de capitais externos têm ajudado, ainda que de forma simples, para equilibrar os déficits no balanço de pagamentos

100 •

capítulo 4

em transações correntes e os movimentos de capitais de curto prazo. Ainda com relação às contas externas, ressalta-se a condição deficitária da balança comercial brasileira. As exportações perderam disputa tanto em função dos custos internos de produção, como também pela política econômica de sobrevalorização cambial. Em contrapartida, a sobrevalorização favoreceu especialmente as importações, aumentando, portanto, disponibilidade de produtos para consumo, fora o fato de ter ajudado para a queda dos preços praticados internamente. (US $ bilhões) 7000 6000 5000 4000 3000 2000 1000 0 Jan Abr Jul Out

Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul

1993

1994

1995

1996

1997

1998

Figura 4.2  –  Investimentos externos brasileiros – jan/93 a jul/98 (Fonte: BACEN) (US $ bilhões) 300 000 250 000 200 000 150 000 100 000 50 000 200 Jan

Abr

Jul

1994

Out

Jan

Abr

Jul

1995

Out

Jan

Abr

Jul

1996

Out

Jan

Abr

Jul

1997

Out

Jan Abr 1998

Figura 4.3  –  Dívida mobiliária interna federal fora do Banco Central, jan/94 a mai/98 (Fonte: BACEN)

capítulo 4

• 101

Com o temporário avanço do cenário externo, muitas das medidas divulgadas não foram realizadas. O agravamento da crise no segundo semestre de1998 fez com que o Governo tomasse medidas mais severas, tais como a alta das taxas de juros a um patamar recorde de 49% ao mês e um corte orçamentário de R$4 bilhões. Os resultados adquiridos pelo Governo ainda são acanhados. O fato de ter anunciado, mas não ter executado, o pacote de 51 medidas no final de 1997 levou a uma perda confiança de por parte dos agentes privados, fazendo com que os próprios não creditassem que o Governo executaria as medidas mais rígidas anunciadas posteriormente. Fora essas consequências negativas do Plano Real, evidencia-se também o desemprego, que, relacionado ao baixo crescimento econômico, é o principal problema da economia brasileira atual. Após o lançamento do Plano Real, vê -se no Gráfico 4, uma queda gradual nessa taxa, que atinge 4% em fins de 1994, o que pode ser justificado pela melhoria inicial da atividade econômica, pela remonetização e pelo aumento do poder aquisitivo dos salários. Porém a manutenção da política monetária contracionista obrigada pelo Plano Real fez com que a taxa de desemprego voltasse a se elevar, alcançando 6% no começo de 1996 e 8% no primeiro semestre de 1998. (%) 9 8 7 6 5 4 3 Jan Abr Jul Out

Jan Abr Jul Out

1993

1994

Jan Abr Jul Out 1995

Jan Abr Jul Out Jan Abr Jul Out 1996

1997

Jan

Abr

1998

Figura 4.4  –  Taxa de desemprego mensal brasileira – jan/93 a Jun/94 (Fonte: IBGE)

O gráfico 4.5 mostra o crescimento da produção industrial com o proxy do crescimento da economia entre jan/93 a mar/98, exibindo que o nível de atividade econômica no primeiro trimestre do ano corrente foi compatível com o nível que prevaleceu no terceiro trimestre de 1993. Em suma, passados quatro anos da execução do Plano Real, nota-se que o Governo conseguiu atingir e manter a estabilização de preços e elaborar algumas medidas pontuais fundamentais,

102 •

capítulo 4

como as privatizações. No entanto, para assegurar uma consolidação de preços sustentável e alcançar um cenário de verdadeira estabilidade macroeconômica, há ainda muito por se fazer. Salvo a necessidade inevitável de uma enorme e eficaz reforma fiscal, acompanhada de reformas da Previdência e administrativa, há que se buscarem soluções definitivas para o desemprego e o crescimento econômico. 140.0 130.0 120.0 110.0 100.0 90.0 80.0 Jan Abr Jul Out 1993

Jan Abr Jul Out 1994

Jan Abr Jul Out 1995

Jan Abr Jul Out 1996

Jan Abr Jul Out 1997

Jan 1998

Figura 4.5  –  Índices da produção industrial no Brasil – Jan/93 a Mar/98 (Fonte: Bacen)

Apesar de a estabilização de preços ter sido atingida como Plano Real, de políticas monetária e cambial rígidas, o mesmo não se pode dizer sobre a constância macroeconômica. A estabilidade macroeconômica e a própria credibilidade do Plano, primeiramente elevada, ficaram comprometidas por problemas específicos à conduta do plano, dando ênfase a ausência de uma enorme e eficaz reforma fiscal, intensificados recentemente pela situação internacional desfavorável. O aumento considerável do custo de curto e médio prazos, em medidas de desemprego e queda de produção, é, sem dúvidas, o principal desafio enfrentado hoje pelo Plano Real.

4.4  Finanças Públicas após 1999 O Brasil não se manteve resistente a este processo, as alterações no papel da política fiscal também foram integradas pelo regime macroeconômico brasileiro. Vários planos de rigor foram introduzidos ao longo das décadas de 1980 e 1990, mas o símbolo da integração dessa “nova” gestão fiscal à política econômica brasileira ocorreu em 1999. A consagração do Regime de Metas de Inflação e o começo do regime de metas de superávit primário, nesse ano, bloquearam a polícapítulo 4

• 103

tica fiscal e restringiram o poder arbitrário das autoridades. A proposta brasileira também deu preferência ao corte dos espaços da atuação do setor público e das políticas de defesa do crescimento econômico. Adaptar os altos superávits primários, os elevados gastos financeiros do governo e a austeridade no tratamento dos gastos com o aumento dos investimentos tornou-se a enorme dificuldade da gestão da política fiscal nos primeiros anos do começo do novo regime. Portanto, a despeito do sucesso incontestável do controle inflacionário no governo FHC ante a situação anterior, as taxas de crescimento econômico não foram promissoras, entre 1999 e 2002 a média de crescimento foi de 2,1% a.a. Em 2003, o Governo Lula escolheu por dar continuidade à lógica do regime de superávit primário e reiterou o comprometimento do governo anterior com a conservação de uma determinada trajetória da dívida pública, compassada, que exigia ainda uma austeridade considerável, dada a alta carga de juros incorrida em função da política tradicionalista de controle inflacionário implantada pelo Banco Central. Entre 2003 e 2006, o superávit primário médio mensal em relação ao PIB foi de 3,6% (conceito abaixo da linha). A dívida pública, por sua vez, caiu meros 7,6 pontos percentuais entre 2003 e 2006, de 54,8% para 47,3%. Em paralelo, o investimento público, introduzindo estatais, ficou praticamente constante (em torno de 1,3% PIB entre 2003 e 2006, segundo dados do Ipea), bem como as despesas com o funcionalismo público e com os gastos correntes das gestões públicas com bens e serviços (escolas, hospitais etc.). Em paralelo, no período, a média da taxa de crescimento trimestral do PIB, em termos anualizados, foi de 3,6%, um pouco superior às taxas do período anterior, mas com uma trajetória de significativa irregularidade. Foi somente a partir da segunda metade da década de 2000, mais especificamente a partir de 2006, que a política fiscal se tornou mais flexível, gerando impactos sobre o consumo privado que, em última instância, induziram o investimento privado de forma mais relevante. Devido principalmente ao cenário externo muito favorável (valorização das commodities, crescimento na China e capital abundante no mundo), o crescimento real do PIB alcançou 6,1% em 2007 e 5,2% em 2008. Em que pese a apreensão de alguns economistas e de outros segmentos da sociedade com o desequilíbrio dos gastos públicos, o que se verificou foi a conservação, como proporção do PIB, das despesas com a remuneração de funcionários públicos e com a desvalorização do capital das administrações (em torno de 13% de 1995 a 2008). As despesas com a compra de bens e serviços públicos, essenciais a uma sociedade em desenvolvimento, como saúde, escola e educação, da mesma forma se mantiveram estáveis (em torno de 7% no mesmo período).

104 •

capítulo 4

O aumento das despesas públicas concentrou-se nas transferências de recurso e previdência (de 12 para 15% do PIB entre 1995 e 2006), que introduzem os gastos com o RGPS (Regime Geral de Previdência Privada), os benefícios pagos aos idosos protegidos pela Loas (Lei Orgânica de Assistência Social), seguro-desemprego, programas assistenciais (como o Bolsa Família) e as transferências a organizações sem fins lucrativos. Este elemento de gastos teve crescimento significativo, vale lembrar, pela política de valorização dos salários mínimos reais que impactaram diretamente a soma dos benefícios. Suas impressões no fortalecimento do mercado doméstico e na melhora da distribuição pessoal e funcional da renda, com o aumento da parcela salarial da renda do país, são incontestáveis. Além das despesas sociais, a ampliação fiscal foi também traçada numa expansão, ainda que simples, do investimento público, tanto pelo governo federal como pelas empresas estatais. Depois da preservação em torno de 1,3% do PIB entre 2003 e 2006, o investimento público alcançou 2,3% do PIB em 2008 e cresceu 17% a.a. de 2008 a 2010. Os resultados do crescimento econômico sobre as receitas do governo possibilitaram, a despeito da política fiscal mais versátil, a continuidade do curso de redução da dívida líquida do setor público estabilizado, que passou de 60,4% do PIB em dezembro de 2002 para o patamar de 45-50% entre 2006 e 2007. Portanto, de um modo geral, a política fiscal no período foi apta de assumir posição mais ativa na administração macroeconômica, sem, no entanto, desistir das metas de superávit primário. Foi possível concordar certa elevação da despesa com a perseguição dos objetivos justamente em função dos resultados positivos do gasto sobre o produto e a arrecadação. Porém, o predomínio desse método de geração do superávit criou vínculos para uma expansão mais ousada do investimento público, o que teria de fato garantido um progresso mais sustentado da economia brasileira e com mais espaço para a ocorrência de mudanças fundamentais. A crise financeira deflagrada a partir da falência do banco Lehman Brothers em setembro de 2008 teve impactos expressivos sobre a economia mundial, originando uma forte reversão do curso de crescimento econômico anteriormente corrente e, consequentemente, uma perda considerável de empregos e renda da população. O Brasil foi fortemente afetado, a respeito das declarações oficiais de seu governo. No quarto trimestre de 2008 o PIB apresentou uma queda de 14,7% na comparação trimestral anualizada. Nessas circunstâncias, criouse, em nível mundial, um espaço para o uso de políticas não-convencionais em diferentes áreas. Enquanto nos países centrais esse espaço acabou usado pelos capítulo 4

• 105

bancos centrais, que implantaram programas de compra de ativos, no Brasil foi a política fiscal que foi ligada de forma mais ajustável ao que vinha sendo posta em exercício. A reorientação da política fiscal no período e a flexibilização dos vínculos que a estrutura da política econômica usada desde 1999 lhe impunha foi flagrante. Do ponto de vista da administração fiscal, o governo retardou o recolhimento de impostos, como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), PIS/COFINS e imposto de renda retido na fonte, e apressou o processo de devolução de créditos tributários para as empresas. As despesas com o PAC e programas sociais foram sustentados e reforçados e se capitalizaram de maneira significativa, por meios de empréstimos do Tesouro, dos bancos públicos (em especial, BB e Caixa) e do BNDES. Nessas circunstâncias, como ilustrado no gráfico 6, o resultado primário do governo central caiu violentamente no decorrer de 2009, saindo de 4,1% em outubro de 2008 para 1,0% em outubro de 2009 – uma queda de 3,1 % num intervalo de 12 meses. Vale observar que, em nenhum momento, esse valor atravessou o marco zero e avançou para valores negativos; em nenhum instante houve um déficit primário do governo brasileiro, esteve-se longe desse cenário. De qualquer maneira, a reversão cíclica do curso da gestão fiscal teve resultado direto no restabelecimento da economia brasileira, que ocorreu de maneira relativamente rápida. Já no segundo trimestre de 2009 a economia retomava um ritmo de crescimento parecido ao analisado no primeiro/segundo trimestres de 2008, da ordem de 6% (valores trimestrais anualizados). 4,5 % 4,0 % 3,5 % 3,0 % 2,5 % 2,0 % 1,5 % 1,0 % 0,5 %

Mai/13

Jan/13

Set/12

Mai/12

Jan/12

Set/11

Mai/11

Jan/11

Set/10

Mai/10

Jan/10

Set/09

Mai/09

Jan/09

Set/08

Mai/08

Jan/08

0,0 %

Figura 4.6  –  Resultado Primário do Setor Público Consolidado (% PIB) – Fonte: BCB

106 •

capítulo 4

A conduta fiscal usada na crise apontava para uma possível transição para uma administração fiscal mais alinhada com as determinações efetivamente keynesianas, a partir da gestão anticíclica do orçamento corrente e da conservação, e possível ajuda dos investimentos públicos. Porém, essa perspectiva foi frustrada a partir das ações implantadas desde então. A reversão do curso fiscal expansionista aconteceu já ao final do ano de 2009. Iniciou -se uma política de expansão do superávit primário, reforçada ao longo de 2010 e acentuada em 2011. No final do primeiro semestre deste último ano, o esforço fiscal praticado pelo governo foi suficiente para que se voltasse a atingir a meta “cheia” de superávit primário (Gráfico 6). Também, os anúncios do Ministério da Fazenda ao longo do período sinalizaram nitidamente para esse objetivo, reafirmado em 2012. Deve-se recordar que a Lei de Diretrizes Orçamentárias de cada ano, desde 2009, proporciona o abatimento dos investimentos efetuados no âmbito do PAC e, mais recentemente, desonerações da meta de superávit primário. O objetivo “líquido”, que desconta esses valores, exige um estímulo fiscal muito menor do ponto de vista de contingenciamento de gastos e, portanto, auxilia o crescimento da demanda agregada a partir dos investimentos públicos. Mas, a despeito dessas possibilidades, a instrução do governo foi de elaborar um esforço fiscal extra e perseguir os objetivos de superávit primário para o biênio 2011-12. O agravamento da crise europeia e do ambiente da incerteza em nível internacional foi então seguido por uma desaceleração do consumo, induzida pela redução fiscal e do investimento, fruto da indefinição em nível local, das influências negativas externas, além da redução fiscal propriamente dita (o investimento público real se reduziu de 4,7% para 4,0% do PIB entre 2010 e 2011). Essa reversão da política fiscal afetou consideravelmente o crescimento econômico: a média de alteração trimestral anualizada do PIB caiu de 5,4% no biênio 2009-10 para 1,4%, tanto em 2011, como em 2012. A vagarosidade da economia brasileira entre 2010 e 2012 relaciona-se à forte “correção” da política fiscal ao longo do período 2010-11. Somando-se o panorama externo negativo, incluindo as pressões sobre os preços internacionais das commodities e a menor demanda externa sobre as exportações, o método de lentidão econômica tornouse irremediável, e seus desdobramentos são sentidos ainda em 2013. A relação essencial positiva entre a política fiscal e a dinâmica das economias monetárias, desordenada pela teoria e prescrição de política neoclássicas, representa encontrar no caso da economia brasileira uma importante imagem. Por um lado, a política rígida, de perseguição de superávits primários elevados,

capítulo 4

• 107

configura ter um papel expressivo no comprometimento da inclinação do crescimento da economia brasileira, como ilustrado por boa parte dos anos 2000 e, fundamentalmente, pelo período mais recente. Por outro lado, no período súbito após a crise, quando houve um desleixo do esforço fiscal, a economia reagiu apressadamente aos incentivos originados, o que também retrata a ligação proposta pela teoria keynesiana. Porém, a política fiscal brasileira no momento mais difícil da crise financeira internacional de 2008-9 nos parece ser exceção em relação à administração que vem sendo praticada desde o começo da década de 2000. A perspectiva de conservação de expedientes fiscais anticíclicos e, principalmente, do sustento do investimento público, durante a crise, foi dissipada de maneira quase imediata após sinais de recuperação da economia e houve a reabilitação da estrutura de rigidez que vigora desde 1999. Nesse contexto, é crucial recuperar a discussão a respeito do dever da política fiscal na determinação da dinâmica da demanda incorporada presente no debate keynesiano, que perdeu força e centralidade no debate econômico. E essa visão é importante não só para o Brasil, mas para outros países, em especial, os componentes da União Europeia. Lá, porém, ganha espaço o questionamento sobre a eficiência do ajuste fiscal em período de crise, enquanto aqui a perspectiva prevalecente parece ainda desprezar os resultados endógenos do próprio ajuste fiscal sobre o curso da dívida/PIB, uma vez que o ajuste colide diretamente com a demanda agregada e o crescimento econômico (o denominador desta relação). São muito importantes os impactos do consumo do governo, que engloba a manutenção de serviços fundamentais a uma sociedade em desenvolvimento como a brasileira. Igualmente fundamental é o efeito multiplicador do investimento público sobre o consumo e investimento privado e, portanto, sobre o crescimento econômico. A política fiscal deve ser baseada numa administração coerente do orçamento corrente e de capital. Especialmente, a política fiscal deve estar assentada no aumento do gasto e investimento público, que impulsionam o consumo e investimento privados e, simultaneamente, contribua para a introdução de mudanças fundamentais na economia. É fundamental, portanto, a revisão da estrutura de política fiscal posto em prática no Brasil para garantir o crescimento sustentado de nossa economia.

108 •

capítulo 4

5 A Reforma do Estado

5.  A Reforma do Estado 5.1  O processo de privatização no Brasil 5.1.1  Introdução Entre 1991 e 2001, o governo brasileiro encaminhou ao setor privado a administração de mais de cem empresas estatais e participações inferiores em diversas companhias. Estes leilões produziram US$67,9 bilhões em recursos, mais US$18,1 bilhões em dívidas transferidas aos compradores, estabelecendo um dos maiores programas de privatização do mundo. O governo vendeu US$6 bilhões em ações de companhias que ficaram como estatais, adquiriu US$10 bilhões em novas concessões de sistemas públicos ao setor privado, e US$1,1 bilhão por meio da venda de participações acionárias do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em empresas privadas. Apesar das suas proporções, o programa brasileiro de privatizações tem recebido pouca consideração da literatura acadêmica. Um levantamento recente, considerou que o programa brasileiro “deverá permanecer muito influente”, em virtude da sua escala e ao tamanho do país. Porém esse levantamento não faz menção a nenhum estudo exclusivo sobre o programa brasileiro de privatização. Na literatura nacional sobre privatização e funcionamento das estatais, ressaltamos três estudos. O primeiro mostrou uma avaliação total do desempenho das estatais federais no período 1981-94, antes da privatização. Esta análise mostra números decepcionantes, tanto em termos de lucratividade quanto de dividendos recebidos pelo Tesouro. No decorrer de todo o período, a taxa de lucros em referência ao patrimônio líquido foi negativa, −2, 5%, em média. Além do que, de 1988 a 1994, anos para os quais os dados estavam acessíveis, os dividendos foram de somente 0,4% do valor das ações de propriedade do governo federal. O segundo estudo destacou que uma das causas para o desempenho precário foi a política salarial das estatais. Seus dados incorporavam salários e outras particularidades individuais dos trabalhadores, conquistados de formulários preenchidos anualmente pelas firmas, conforme imposição legal. O autor comparou as remunerações dos trabalhadores em pares de empresas privadas e estatais, de tamanho aproximado e dentro de uma mesma área. Depois de eliminar os diferenciais o resultado das diferenças em educação, idade, gênero, experiência, encontrou desigualdades significantes em interesse dos trabalhadores das

110 •

capítulo 5

estatais. O terceiro estudo compara o funcionamento de 50 estatais antes e depois da privatização, utilizando dados até 1994. Os elementos de demonstrações financeiras foram complementados por questionários preenchidos pelas empresas a pedido do BNDES. O estudo envolveu oito variáveis: vendas líquidas, lucro líquido, patrimônio líquido, investimento, investimento fixo, número de empregados, endividamento e um índice de liquidez. Dessas variáveis, foram derivadas outras seis para medir competência: vendas e lucro por empregado, a taxa de retorno na forma de lucro sobre vendas e sobre patrimônio líquido, e a propensão ao a investir, tanto em associação às vendas como ao patrimônio. Nenhum monitoramento foi feito para as flutuações macroeconômicas, resultados de agências regulatórias e listagem em bolsa. A dedução é que a privatização amplia a produção, a competência, a lucratividade, a tendência a investir, e melhora os indicadores financeiros das firmas. 5.1.2  Avaliação das Privatizações no Brasil O método de privatização no Brasil, embora só tenha ganhado impulso real a partir do governo Collor, tem suas raízes no começo dos anos 80, com a elaboração, em 1981, da Comissão Especial de Desestatização. A era Pré-Collor (1981-89) foi marcada essencialmente pela "reprivatização" de empresas estatizadas involuntariamente, por causa da inadimplência do setor privado unido às instituições financeiras públicas. Para se restituir de parte dos recursos investidos no setor privado, na situação da política de fomento da década de 70, o Estado foi obrigado a contrair o controle de empresas dos mais diversos setores da economia. Assim, a privatização que se começou nos anos 80 objetivava retornar à iniciativa privada, firmas que passaram para as "mãos" do Estado de maneira quase que compulsória, em diferentes setores. A partir do Governo Sarney, observa-se uma tentativa de dilatar o propósito do Programa Nacional de Desestatização (PND), em especial com a criação do Programa Federal de Desestatização, em 1988. Foram realizadas mudanças no programa em nível operacional, como a transmissão do controle estatal por meios de leilões em bolsa e com possibilidade de financiamento do BNDES. Em contrapartida, o processo de privatização não foi para frente, principalmente em função da ausência de suporte político para tanto. Na verdade, não houve um conflito mínimo por parte da sociedade civil, nem um engajamento mais decisivo, tanto por parte do Executivo quanto do Legislativo. Dessa forma, no período 1981-89,

capítulo 5

• 111

foram vendidas 38 empresas, na sua maior parte de pequeno porte, tendo sido arrecadados fundos somando pouco mais de US$ 700milhões. Mesmo que o Governo Collor tenha herdado o modelo institucional de privatização dos anos 80, a nova etapa que se iniciou difere suficientemente da anterior. O Programa Nacional de Desestatização (PND) foi lançado como uma peça primordial de ajuste fiscal, num contexto mais extenso de reformas do Estado. Nessa lógica, o Programa passou a assumir particularidades muito mais extensas e a ter como mira a privatização de empresas tradicionais do setor produtivo estatal. Uma discussão no Congresso começou como emissão de medida provisória (MP) convertida na Lei n:8.031, de 12 de abril de 1990, que elaborou o PND, seguida de posteriores modificações através de projetos de lei e outras medidas provisórias emitidas ao Legislativo. A operacionalização do programa ficou ao encargo do BNDES, enquanto o administrador do mesmo ficou sob responsabilidade de uma comissão diretora. Diferente da fase anterior, os ministérios aos quais as empresas estatais contidas no Programa eram vinculadas ficaram fora do processo. Apoiado na venda bem-sucedida da USIMINAS, em outubro de 1991, o Programa passou a ter uma dinâmica particular, embora em ritmo muito mais demorado do que o esperado. As privatizações centralizaram-se nos setores livres de obstáculos de ordem legal e de menor força política, como siderurgia, petroquímica e fertilizantes. Com a chegada do Governo Itamar, o Programa passou por uma fase de questionamento e de incertezas, ficando praticamente estático entre outubro de 1992 e março de 1993. Algumas questões do Programa foram corrigidas através da edição de novos decretos de normalização da legislação e por medidas provisórias, embora as alterações não tenham sido profundas. O compasso das privatizações no Governo Itamar na realidade continuou o mesmo do Governo Collor, seguindo o método anterior. Dessa maneira, o Programa Nacional de Desestatização (PND) abreviou-se, basicamente, à privatização de empresas por meios de leilões públicos, tendo como apreensão básica o saneamento financeiro do domínio público. Na sua estratégia, o Programa não cogitou qualquer orientação de política industrial, reestruturação do parque situado e / ou incentivo aos investimentos produtivos. Partiu-se do começo de que a gestão privada seria mais competente e de que a venda das empresas ao setor privado, segundo a lei da oferta e da procura em leilões, se responsabilizaria de obter os resultados positivos esperados. Destaca-se que em nenhum momento houve um esclarecimento de

112 •

capítulo 5

justificativas de ordem econômica para a escolha de determinado setor ou empresa a ser privatizada. Na realidade, a linha de desempenho seguiu a lógica de acrescentar no Programa as empresas estatais de áreas em que não havia qualquer obstáculo legal para sua privatização, como siderurgia, petroquímica e fertilizantes. A estratégia utilizada de privatização de empresas e setores com menor carga de impedimentos jurídicos institucionais explica a preferência do setor siderúrgico para se deslanchar o Programa. A escolha pelo início da privatização do setor pela USIMINAS teve como motivação essencial criar um fato político fundamental com a privatização de uma empresa estatal competente e de grande porte, de maneira a romper com os programas de desestatização dos anos 80. Em resumo, a preocupação fundamental dos gestores do Programa (BNDES e Comissão Diretora) prendeu-se ás questões relacionadas à fixação do preço mínimo de venda das empresas e da cesta de moedas de privatização, planejando ao maior abatimento possível da dívida pública federal. Ao mesmo tempo, a maior parte das críticas ao Programa acabaram da mesma forma por se centralizarem nesses mesmos aspectos. 5.1.3  Resultados Obtidos Até março de 1994, foram incorporadas 66 empresas estatais no Programa Nacional de Desestatização, sendo que 25 destas foram privatizadas. A maioria das empresas incluídas pertenciam às áreas de siderurgia, petroquímica e fertilizantes. As outras empresas eram de vários outros setores, ressaltando-se o Lloyd (transporte marítimo), a EMBRAER (aeronaves), Cobra (computadores), bem como outros empreendimentos industriais, cujo administração foi assumido pelo BNDES. Foram também incorporadas à lista de empresas a serem privatizadas algumas do setor de serviço público, como a Light, a Escelsa (distribuição de energia elétrica) e a RFFSA (transporte ferroviário). Das empresas privatizadas, oito faziam parte da área de siderurgia, nove da petroquímica, quatro de fertilizantes e quatro de outras áreas. O número de empresas privatizadas e os valores recebidos ficaram muito abaixo das perspectivas iniciais (previsão de US$17 bilhões em 1990-91). A totalidade das vendas situou-se em US$7 bilhões no período 1991-94, metade desses fundos arrecadados no Governo Collor e metade no Governo Itamar. O resultado inferior ao esperado inicialmente pode ser creditado a uma série de problemas enfrentadas pelo Programa, dentre

capítulo 5

• 113

elas: ações judiciais, presença de acordos de acionistas taxativos à alienação das empresas, obrigação de saneamento adiantado das empresas, bem como relutâncias políticas à privatização. O Programa foi também agravado pela demanda por ações das estatais menor do que se previa, em função do panorama de recessão e da retomada da inflação, decorrentes do fracasso do Plano Collor I. 5.1.4  Impactos da Privatização Sobre a Dívida Pública Com a Lei n: 8018, de 11 de abril de 1990, foram desenvolvidos os Certificados de Privatização (CPs), títulos de emissão do Tesouro Nacional, que se tornaram a principal ferramenta para a compra de empresas privatizadas na esfera do PND. As organizações financeiras e entidades de previdência privada, seguradoras e sociedades de capitalização passaram a ser forçadas a obter esses títulos, considerados "biodegradáveis", pois seu valor de faces só era corrigido completamente até a primeira oferta de ações de empresa pública. Dessa maneira, os CPs tinham a função de encaminhar recurso sem moeda corrente para o Tesouro Nacional e, ao mesmo tempo, de realizar uma transferência compulsória para a União de recursos originários das instituições financeiras, dentro da visão de que esse setor poderia colaborar para o Programa, pois era o que mais havia se favorecido do processo inflacionário da economia brasileira. Forçava, também, a geração de uma "demanda cativa" para os leilões de privatização, o que autorizava a venda das empresas além do preço mínimo fixado. Porém, com a pressão política da área financeira, em setembro de 1991, o Governo articulou, passando a aceitar que a obtenção de GPs fosse totalmente realizada por intervenção de créditos vencidos ligado à União e aos órgãos da Administração Pública Federal. Essa decisão, tomada precisamente quando o sistema financeiro resgatava seu entusiasmo e rentabilidade, até pela volta da inflação, simulou, em verdade, uma contradição com o próprio objetivo de geração dos CPs, já que impossibilitou, na prática, a arrecadação de recurso sem moeda corrente e diminuiu a demanda potencial pelas ações das firmas ofertadas em leilão. Paralelamente, o Governo abraçou uma estratégia de formação e expansão de uma cesta de moedas, constituída de dívidas vencidas securitizadas, para ser usada nos leilões de privatizações. Segundo informações da Secretaria do Tesouro Nacional, o estoque de moedas para a privatização totalizou US$ 47,8 bilhões, em março de 1994, dos quais US$ 7 bilhões foram usados no PND. As moedas mais usadas nas vendas de empresas foram as seguintes:

114 •

capítulo 5

debêntures da SIDERBRÁS, 20,2%, GPs, 18,4%, Obrigações do Fundo Nacional de Desenvolvimento, 8,5%, dívidas securitizadas da União, 34,7% e Títulos da Dívida Agrária (TDAs), 7,5%. Observa-se que, atualmente, existe um saldo disponível de moedas de privatização de cerca de US$ 40 bilhões. Como US$ 37,5 bilhões são referentes aos títulos da dívida externa, sobram somente US$ 3,3 bilhões de moedas domésticas livres, soma extremamente reduzida frente ao valor das empresas incorporadas no Programa. Essa realidade levou ao desafio para o Governo de aumentarem as moedas de privatização e, também, de atrair o capital externo, que teve participação ridícula no processo, principalmente em função da desvalorização de 25 %, imposto aos títulos da dívida externa para a participação nos leilões. O uso de títulos da dívida pública no PND e a baixa arrecadação de recursos monetários retrataram um dos principais pontos de desaprovação ao Programa. Porém o certo é que a autorização para o uso das moedas de privatização teve a sua utilidade, possibilitando a venda de uma série de empresas que, de outra maneira, estaria envolvida. Em contrapartida, o instrumento dos CPs, tal como criado originalmente, era bastante competente para arrecadar recursos financeiros sem dinheiro. Segundo notícias da Secretaria do Tesouro Nacional, a parcela arrecadada em moeda corrente pela venda de Certificados de Privatização, até setembro de 1990, atingiu US$ 366 milhões, montante próximo ao arrecadado em cruzeiros até hoje, mesmo considerando as alterações promovidas no Programa pelo Governo Itamar, tendo como objetivo ao aumento da arrecadação de recursos em moeda corrente. Uma das maiores censuras ao Programa centrava-se na utilização extensa de títulos do Tesouro, que estavam com uma desvalorização muito grande no mercado, como os TDAs, e na sua utilização ao par nos leilões de privatização. O visto de tais moedas pelo seu valor de face foi incentivado pela dificuldade de o Tesouro Nacional anunciar sua situação de mau pagador e de arbitrar perdas. De forma a deter parte do deságio das moedas, o Governo passou a estabilizar um preço mínimo acima do valor de mercado. Se, por um lado, essa artimanha resolveu parte do problema, de outro, prejudicou a transparência do processo, em função da complexidade do público de identificar nitidamente os deságios implícitos de cada título o valor de mercado da empresa e o diferencial empregado no preço mínimo por conta do deságio. Com relação à variação das moedas de privatização, é óbvio que, quanto mais títulos fossem passíveis de serem usados no Programa, maior seria a porção de moedas disponíveis e, em consequência, maior a rivalidade nos leilões e a possibilidade de atingir preços acima do

capítulo 5

• 115

mínimo fixado. Logo, a crítica de que a utilização de diferentes moedas impedia os resultados do Programa não procede. Convém destacar, entretanto, que o abatimento da dívida pública, objetivo central do Programa, ficou muito aquém do esperado. Por outro lado, logo ficou claro que a utilização de títulos do Governo não significava, na prática, o resgate automático da dívida do Tesouro. Isto porque na maior parte dos casos o alienante não era a União, mas, sim, empresas controladas por ela, como a Petroquisa, a Petrofértil e o Banco do Brasil. Nesses casos, o que ocorria era a simples troca de participações acionárias do acionista controlador por títulos do Governo, criando um problema sério no balanço daquelas empresas. Posteriormente, o Governo editou medida provisória para viabilizar a troca desses títulos por outros do Tesouro Nacional, com prazos de pagamento mais alongados. 5.1.5  Alterações no Programa Com a mudança de Governo em outubro de 1992, o Programa Nacional de Desestatização passou por um período de questionamentos e indefinições. O Governo Itamar planejava fazer alterações no Programa, de modo a contornar as críticas feitas e a torná-lo mais nítido. O Decreto n: 724, de 19 de janeiro de 1993, alterou e estabilizou a regulamentação da Lei n: 8.031/90, que gerou o PND. Como não foi modificada a legislação básica, as mudanças não representaram uma modificação essencial no Programa, mas, sim, na operacionalização de alguns de seus mecanismos. Cabe notar que foi preservada a sistemática de utilização de títulos e créditos vencidos como meio de pagamento nos leilões pelo valor de face, apesar de desempenhar um dos pontos de maior controvérsia do Programa. Em resumo, o Governo pretendeu apontar mudanças no sentido de refinar os recursos arrecadados em moeda corrente, crescer o poder do Presidente da República nas resoluções da Comissão e oferecer a canalização de recursos arrecadados para o setor social. Note-se, porém, que, a rigor, tais decisões poderiam ser tomadas administrativamente, não precisando de decreto presidencial. O aumento da intervenção presidencial estava assegurado na legislação pelo fato de que a Comissão constantemente foi subordinada diretamente a ele, a definição de setores para a transferência de recursos da privatização pode e deve ser feita no Orçamento da União, e o percentual de recurso sem dinheiro já era determinado pela Comissão Diretora subordinada diretamente ao Presidente. A medida mais enérgica de vedação à participação dos fundos de pensão foi

116 •

capítulo 5

logo invalidada pelo Decreto n: 786, de março de 1993, dada a conclusão de que o corte dos fundos de pensão das privatizações iria, na verdade, comprometer o êxito dos leilões, por eliminar um comprador potencial importante. O problema da realização da transferência de recursos continuou havendo, pois ampla parte das vendas foi feita por empresas monitoradas pela União, e não diretamente pela União, como já ressaltado. Para solucionar essa questão e ainda realizar outras mudanças na legislação, o Governo publicou a Medida Provisória n: 327, de 24 de junho de 1993, sucessivamente repetida até junho de 1994. A Medida Provisória aumentou a influência sobre o Programa Nacional de Desestatização do Ministério da Fazenda, que passou a coordenar, supervisionar e fiscalizar a sua realização, apesar de a Comissão Diretora permanecer subordinada ao Presidente da República. Além disso, foi prevista a obrigação de concordância prévia do Ministro da Fazenda, para que a Comissão Diretora pudesse autorizar ajustes de caráter operacional, imprescindíveis aos processos de venda. Na verdade, essas modificações evidenciaram a manutenção da mesma visão adotada anteriormente, de contração do endividamento do setor público como meta prioritária do Programa, apresentando o fato de que o Tesouro Nacional era um dos principais responsáveis do processo de privatização. Outra modificação importante referia-se à chance de o Presidente da República determinar as moedas de privatização por meios de decreto, isto é, sem a necessidade de consentimento legislativo, desde que atendidas certas convicções. Essa medida visava permitir maior agilidade na definição dos meios de pagamento para privatização e impedir as discussões na Justiça, que atrapalhavam o andamento do Programa. Adicionalmente, a MP elevou o percentual para alienação de ações na esfera do Programa a pessoas físicas ou a empresas estrangeiras de 40 para 100%, de maneira a atrair o capital estrangeiro. Além disso a MP defendia o emprego da Nota do Tesouro Nacional (NTN) para compra pelo alienante, com recursos obtidos em moeda corrente, e permuta pelos títulos e créditos. Dessa maneira, pretendia-se solucionar o antigo problema de recebimento de títulos de privatização por alienantes, que não o Tesouro Nacional, que se viam na eventualidade de manter tais ativos de baixíssima liquidez em carteira. Tentou-se, igualmente, criar uma organização para possibilitar a transferência de recursos arrecadados com a privatização para programas prioritários do Governo, por meios da aquisição da NTN pelo alienante com os recursos recebidos em moeda vigente. Observou-se que, na prática, a obtenção da NTN pelos alienantes seria compulsória. Se o mecanismo produzido proporcionava

capítulo 5

• 117

a transferência de recursos da privatização para outros programas, por outro lado impossibilitava a utilização de tais recursos para consolidar o setor produtivo estatal. Foi modificada, ainda, a formação da Comissão Diretora, que passou a ter 15 componentes, somente quatro representantes de órgãos da Administração Federal de livre nomeação do Presidente da República, e os outros aprovados, ou até mesmo escolhidos, pelo Senado Federal. Foi mantida, assim, uma estrutura bastante inchada e uma atuação de representantes do Governo pouco significativa em termos relativos, o que poderia configurar como um excesso de "democratismo", tendo em vista que o Governo era o maior interessado, já que era o acionista majoritário das empresas a serem alienadas. Tempos depois, o Governo anunciou a colocação, no PND, de participações societárias minoritárias, detidas pelas empresas da Administração Federal. O Decreto no 1.068, de 2 de março de 1994, obrigava que as empresas monitoradas direta ou indiretamente pela União depositassem no Fundo Nacional de Desestatização tais participações minoritárias, à exclusão da BNDESPAR, do Banco do Brasil, do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), de ações objeto de demanda judicial, até o seu trânsito em julgado, e de participações minoritárias que forem consideradas fundamentais à consecução do objeto social da empresa participante. Os fundos arrecadados com a venda das participações minoritárias deveriam ser utilizados na compra de Notas do Tesouro Nacional, série P, próprias para a troca de recursos oriundos da privatização de empresas. A medida foi positiva, uma vez que proporcionava a centralização das resoluções sobre a venda das participações acionárias da União, viabilizando a melhor administração da carteira de investimentos da União. Nota-se, entretanto, que o Decreto coloca que, à exceção do IRB, as empresas poderíamos manter suas ações pelo período máximo de seis anos. Se essa determinação fosse usada, as participações minoritárias em poder dos órgãos da administração pública com esse período estourado teriam que ser vendidas de imediato, o que causaria uma enxurrada de oferta de ações, diminuição de seu valor de venda e consequente perda patrimonial para a União. Então, essa sentença deveria ter sido tomada a nível administrativo, mas nunca explicitada por meio de decreto. Complementarmente, o Governo publicou o Decreto no 1.092, de 21 de março de1994, regulando o estabelecimento de acordos de acionistas ou a aprovação de compromissos de característica societária das empresas públicas monitoradas pela União à anuência preliminar do Ministério da Fazenda. A medida também visava concentrar as decisões da União sobre suas participações acionárias e havia concedido execução de uma política total para a administração da carteira

118 •

capítulo 5

de investimentos da União. Foi tentado pelo Governo a inclusão de outras moedas como instrumentos de pagamento para a privatização, em especial as dívidas sociais. Porém o Congresso ofereceu enorme resistência, não aprovando o projeto de lei que transformava as dívidas de empresas públicas com o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) em crédito com o mesmo fundo. 5.1.6  Privatizações após 1994 No ano de 1995, com base na MP n: 841 (19/01/95), foram introduzidas algumas alterações significativas no controle do Programa Nacional de Desestatização (PND). As decisões do programa que previamente eram tomadas pela Comissão Diretora (CD), passaram a ficar sob o cuidado do Conselho Nacional de Desestatização (CND), composto por ministros de Estado relacionados com o PND, planejando agilizar a implantação das decisões. Além disso, as autorizações da lei geral de concessões (Lei 8.987/95) e da lei que estabeleceu o novo regime de concessões de serviços públicos (Lei 9.074/95) tornaram possível a inclusão dos setores de infraestrutura e de serviços de utilidade pública no PND. A partir de 1995, iniciou no Brasil a privatização dos serviços públicos com foco para os setores de telecomunicações e energia elétrica. Ao inverso das privatizações anteriores, no caso desses setores era fundamental que a venda dessas empresas fosse acompanhada pelo esboço de um esquema apropriado de regulação, sob pena de trocar uma situação de monopólio público por outra de monopólio privado. É fácil compreender a diferença entre as novas privatizações e as efetuadas até 1995. Se o consumidor não estivesse contente com a qualidade ou com o preço dos produtos de uma instituição siderúrgica, ele poderia obter os de uma concorrente ou, no limite, importar aço. Já um consumidor residencial que não estivesse contente com o serviço do fornecedor de energia elétrica não teria a alternativa de mudança de provedor nem de apelar para a aquisição de energia do exterior. Por sensibilizar o grande público e pela própria grandeza das empresas, trataram-se de princípios, de um modo geral, mais demorados e sujeitos a um estudo maior por parte da imprensa e da opinião pública em geral. Esse período de privatização iniciou com o setor elétrico. Inicialmente, o governo pôs à venda as duas empresas distribuidoras de energia de propriedade do governo federal, pertencentes à holding Eletrobrás: Escelsa e Light. A partir desse momento, passou para a investida de venda das quatro empresas geradoras da mesmas Eletrobrás: Furnas, Eletrosul, Eletronorte e Companhia

capítulo 5

• 119

Hidroelétrica do rio São Francisco (CHESF). A dificuldade com o qual o governo federal defrontou-se foi que essas instituições vendiam a energia para as companhias de distribuição, de propriedade dos governos estaduais. A saída foi privatizar inclusive as companhias de distribuição. No final, a quase totalidade das empresas de distribuição foi privatizada, abrindo-se, dessa maneira, espaço para a venda das unidades do grupo Eletrobrás. As dificuldades surgidas no processo de privatização do setor elétrico fizeram com que a privatização das telecomunicações, apesar de ter começado depois, acabasse antes do término do setor elétrico, tendo sido concluída a privatização do setor no primeiro governo do presidente Fernando Henrique Cardoso. Nas telecomunicações, o processo começou pela venda das concessões da chamada "banda B" de telefonia celular, jornalisticamente denominada como "venda de vento", pela circunstância de se estar leiloando apenas o direito de competição com as empresas públicas que já atavam com telefonia celular. Em seguida, as mais de 25 empresas de domínio estadual subsidiárias da holding Telebrás foram divididas em empresas de telefonia básica e celular ("banda A"). Além disso, houve um reagrupamento, com a criação de grandes empresas regionais de telefonia básica e celular. Todas essas empresas, juntamente com a Embratel, foram vendidas em 1998. A alegação de que as empresas privadas são mais lucrativas do que as estatais, deve ser estudado com cautela. As empresas privadas expostas às forças do mercado podem, de fato, usar o nível de lucros, como um sinal de eficiência, à medida que a aquisição de lucros, efetivamente é o seu principal objetivo. No que diz respeito à uma estatal, entretanto, outras finalidades também são importantes e, muitas vezes, ultrapassam em importância as metas de lucro. No caso brasileiro, por exemplo, ao longo do sistema de industrialização foi comum a venda de produtos das estatais a preços subsidiados com a finalidade de incentivar o desenvolvimento do setor industrial. Sendo assim, os possíveis prejuízos mostrados pelas empresas estatais não mostrariam, necessariamente, sua incompetência, mas sim uma opção política do governo. De qualquer maneira, é uma questão em aberto se essa escolha política é a melhor do ponto de vista da sociedade como um todo, indagação essa que tem sido feita pelos defensores da privatização, com a alegação de que esta tem como objetivo, justamente, entre outras coisas, diminuir esse grau de arbítrio do governo. Vários estudos acadêmicos tentaram mensurar comparativamente a eficiência das empresas estatal e privada. O predomínio, porém, não autorizou uma opinião conclusiva quanto à maior competência da empresa privada quando comparada à

120 •

capítulo 5

estatal. Ainda que algumas análises tenham apontado uma ligeira superioridade das empresas privadas sobre as estatais, o fato é que, de maneira geral, não há diferenças consideráveis de comportamento entre empresas públicas, privadas e privatizadas quando expostas ao mesmo conjunto de regras e regulações. Acreditava-se que empresas estatais de setores como transporte ferroviário, energia, metalurgia, telecomunicações e petroquímica poderiam ser eficientes, apesar de controvérsias, colaborando de forma expressiva para o desenvolvimento econômico. Empresas deste setor, contribuíram de forma significativa para o desenvolvimento econômico no período de 1965/1970, por terem promovido a transformação da estrutura econômica depois de 1950. Estas aceleraram o processo de industrialização elevando o nível de sofisticação técnica na economia gerando oportunidades de investimento para a iniciativa privada. No que diz respeito a lucratividade, as estatais estiveram sujeitas a controles de preços, da mesma maneira tiveram que atuar nas áreas de capital mais intensivos da economia, o que poderia explicar o fato de suas taxas de atratividade sobre o investimento terem sido mais baixas do que as adquiridas pelos setores privados em outras indústrias. É importante destacar que nos casos em que a privatização parece ter levado ao aumento da competência das empresas, houve dificuldade em distinguir entre as alterações decorrentes da desestatização, daquelas resultantes dos sistemas paralelos de liberalização das importações e desregulamentação do mercado interno, e do avanço do panorama macroeconômico. Ou seja, se indagou se essas mudanças positivas nas firmas não teriam acontecido mesmo que as firmas não tivessem sido privatizadas. Estudos práticos podem mostrar que em áreas competitivas as empresas privadas são frequentemente mais eficientes que as estatais, enquanto em áreas oligopolizadas a desigualdade é mínima. Essa conclusão é essencial, principalmente, no que diz respeito, às áreas de utilidade pública marcadas por monopólios naturais. Como não há garantia de que, sem disputa, a simples transferência de propriedade para a área privada resulte em um aumento da competência, é primordial o estabelecimento de mecanismos eficientes de ajuste por parte do governo. Quanto aos resultados notados após a privatização no Brasil, algumas análises apontam para melhorias nos principais indicadores empresariais. Segundo um trabalho interno criado no âmbito do BNDES, que tratou das empresas nas áreas de siderurgia, petroquímica e fertilizantes após a privatização, os resultados demonstraram para um aumento da produção, do faturamento, do investimento, do lucro e da produtividade, com a contração do número de empregados. Em relação especialmente ao setor siderúrgico, porém, o trabalho destaca o fato

capítulo 5

• 121

de que além da privatização, certamente outras causas contribuíram para a progresso do setor, como a liberalização dos preços e os acertos feitos nas empresas anteriormente ao sistema de venda das mesmas. Estudos tiveram por objetivo testar se houve ou não alteração de desempenho nas estatais privatizadas. Sete variáveis foram escolhidas: o lucro líquido, o patrimônio líquido, o investimento, o imobilizado, o número de funcionários, o endividamento e a liquidez corrente. Com base nestas variáveis, derivaram-se outras seis, com a meta de medir a competência das empresas (vendas e lucro por funcionário), sua rentabilidade (lucro sobre vendas e lucro sobre patrimônio líquido) e a tendência em investir (investimento sobre vendas e investimento sobre o imobilizado). Quando possível, o conceito foi de confrontar o desempenho das variáveis nos quatro anos seguintes à privatização com os quatro anos anteriores à mesma. Geralmente, os resultados mostraram para uma evolução do desempenho das empresas após a privatização. Os resultados do sistema de privatização no período de 1991/2000 foram muito significativos, atingindo mais de US$100 bilhões. A soma das receitas pelas vendas das estatais foi de US$82 bilhões no período de 1991/00. Inclusive foi significativo a soma total de dívidas transferidas, que no período, foi em torno de US$18 bilhões. Vale destacar também o crescimento da entrada de investimentos externos diretos para a privatização, o que colaborou para o financiamento parcial do déficit em transações correntes do Brasil durante alguns anos (figura 5.). Em associação à participação setorial, os setores de energia elétrica e telecomunicações mostraram a maior participação na totalização dos resultados da privatização acumulados no período de 1991/2000 (figura 5.2). 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0

8,8 7,1 5,2

6,1

2,6

1996

1997

1998

1999

Figura 5.1  –  Elaboração própria a partir de dados do Banco Central.

122 •

capítulo 5

2000

Outros Petroquímica

Energia Elétrica

Financeiro

Telecomunicações

Siderurgia Mineração

Figura 5.2  –  Elaboração própria a partir de dados do BNDES.

O dever do programa de privatização e sua relação com a situação macroeconômica foram se alterando ao longo do tempo. Do começo dos anos de 1990, quando, de fato, passou a ser uma das prioridades da política econômica, até 1996, o sistema de privatização funcionou sobretudo como um sinalizador de um compromisso do Estado com as denominadas "reformas de mercado" que isso representava. Em um contexto internacional de grande quantidade de capitais, isto significou um posicionamento vantajoso do país no universo dos países emergentes, o que se repercutiu, na atração de um fluxo importante de capitais, na forma de empréstimos. A partir de meados de 1997, contudo, a realidade se modificou. Em primeiro lugar, porque as somas arrecadadas com a privatização, pela primeira vez, tornaram-se expressivas, em termos macroeconômicos. Em segundo, porque com a crise asiática, a privatização obteve uma "funcionalidade", conduzindo o governo a tentar ser diferente em relação a diversos países que tinham sido objeto de ataques abstratos ou eram potencialmente candidatos a isso. A privatização, nessa circunstância, passou a representar uma espécie de "ponte para a estabilidade", autorizando ao país ganhar tempo para tentar resolver seus dois enormes desequilíbrios, o déficit externo e o fiscal. Ao reduzir a necessidade de obter recursos no exterior na forma de empréstimos para o financiamento do déficit em conta corrente, a privatização ajudaria, conforme o desejo do governo, para que o país passasse pela fase crítica de fechamento parcial de mercado de capitais, após a redução de liquidez internacional iniciada em 1997.

capítulo 5

• 123

5.2  O papel regulador do Estado 5.2.1  Intervenção do Estado na Economia Conforme a Constituição da República, em seu artigo 173 e 174, existem dois modos de intervenção do Estado na atividade econômica, na primeira, diretamente competindo com o mercado privado, nas ocorrências de expressivo interesse público, e no segundo, o Estado somente administra as condutas relacionadas à área econômica. A distinção entre intervencionismo direito e indireto é importante para fixarmos uma primeira mensagem: a retirada do Estado do exercício de uma atividade econômica não significa uma redução do intervencionismo estatal. Muito pelo contrário, tanto entre nós como em vários outros exemplos podemos ver na experiência europeia, pode-se observar que a retirada do Estado do exercício direto da atividade correspondeu a um crescimento da intervenção indireta do estado sobre a atividade privada. Numa outra maneira de atuação do Estado na atividade econômica, visa-se estimular ou desestimular alguns segmentos de atividades focadas à área econômica. Os métodos intervencionistas se dividem em atuação na economia ou sobre a economia. Na primeira hipótese, verificada quando a organização estatal se assenhora da condição de sujeito da atividade econômica, tem-se: a) atuação por absorção, retratada pelo controle, em regime de monopólio, dos meios de produção quanto a determinado setor da economia; b) atuação por participação, na qual aquela assume parcialmente, em concorrência com os demais agentes do setor privado, ou mediante a titularidade de parcela do capital, o exercício de atividade empresarial. No particular da ação sobre a economia, podemos notar em primeiro lugar a atuação por direção, verificável quando o Estado passa a desempenhar pressão sobre a economia, estatuindo normas de comportamento compulsório para os agentes econômicos. Em segundo lugar a atuação por indução, a sobrevir quando o Poder Público dinamiza instrumentos de ingerência em consonância com as leis diretoras do mercado. 5.2.2  Órgãos Administrativos Econômicos O Banco Central do Brasil – BACEN é uma entidade administrativa reguladora da economia de mercado e dono exclusivo do poder de enviar a moeda nacional (artigo 164 da Constituição da República). Este banco que imprime as regras do

124 •

capítulo 5

jogo econômico, decidindo a taxa dos juros aplicáveis ao mercado, motivando a economia, fazendo-a reagir nos momentos de crise. O Conselho Monetário Nacional –CMN é um órgão regulamentar do sistema financeiro nacional, gerado na reformulação do sistema pela lei 4.595/64. É presidido pelo Ministro da Fazenda, sendo o Ministro do Planejamento o vice. O Comitê de Política Monetária -COPOM que se reúne todo dia 21 para estudar as condições do mercado, usando critérios para a política de juros praticada pelo país. Combina-se a taxa Selic, que abrange o valor percentual que o governo paga por seus papéis, sejam os juros quanto aos créditos e aos débitos. Os créditos são os juros que ele cobra por seus empréstimos, e os débitos os juros que paga ao emprestar. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social –BNDES, cuja função é apoiar a nova estratégia nacional no desenvolvimento de maneira que resulte maior integração social e contração das desigualdades, a sustentabilidade do crescimento econômico e o fortalecimento da autoridade nacional e da integração regional, é outro órgão de enorme responsabilidade na política econômica e social do país. 5.2.3  O Estado como explorador da atividade econômica Autorizar que a livre iniciativa retarde algumas atividades vitais para o Estado, sem controle, atrapalharia os princípios do bem comum. Instalaria uma insegurança face as infraestruturas de serviços como saúde, educação, previdência, enfim, pois cada um prestaria a seu modo, sem limites. Desta forma o Estado, não permitiria que tais serviços pudessem ficar simplesmente relegados à livre iniciativa, a fim de satisfazer necessidades ou comodidades do todo social, reputadas como fundamentais em dado tempo e lugar. O Serviço público pode ser compreendido como uma atividade adotada pelo Estado onde são oferecidas utilidades materiais designadas à satisfação da coletividade em geral. Com o passar dos tempos, o Estado percebeu que não dispunha de organização adequada para a realização destas atividades tidas por essenciais. A partir daí começou a haver gestão na área reservada aos serviços públicos por particulares, mediante contratos de concessão, permissão e autorização. Compreende-se que em relação à enorme maioria dos serviços públicos, não há obrigação do Estado de prestar tais serviços diretamente, podendo este simplesmente patrocinar a prestação dos serviços pela concessão de seu exercício a terceiros, através de concessão ou permissão. A exploração da atividade

capítulo 5

• 125

econômica realizada pelo Estado se dará através das empresas públicas ou pelas sociedades de economia mista. A empresa pública é uma pessoa jurídica de direito privado. Quando se fala que a empresa é pública não se refere ao seu regime jurídico, mas sim ao caráter estatal da empresa (capital). Deve ser criada por lei e é esta que deve indicar sua área de atuação. Estas empresas podem destinar-se prestação de serviços públicos ou de atividade econômica. Desse modo, o Estado pode atuar diretamente na economia, produzindo e comercializando tais bens, como se fosse uma empresa particular. As sociedades de economia mista também são pessoas jurídicas de direito privado, onde, no capital social da empresa, figura como sócia uma organização dotada de personalidade de direito público. A característica fundamental nestas empresas é o poder de controle junto ao Estado, dono do maior número de ações ou cotas que dão direito de comando. Conforme o artigo 3º do Código Tributário Nacional, um tributo é qualquer prestação pecuniária compulsória, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante uma atividade administrativa plenamente vinculada. A função primordial do tributo é carrear recursos financeiros para o Estado. Porém, atualmente o tributo é amplamente utilizado com o propósito de interferir na economia privada, estimulando atividades, setores econômicos ou regiões, desestimulando o consumo de certos bens e produzindo, finalmente, os efeitos mais diversos na economia. Esta é a função extrafiscal do tributo, onde o Estado o utiliza como mecanismo de controle normativo de certas atividades econômicas. 5.2.4  O Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica Vale destacar o papel adotado pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), pela SDE (Secretária de Direito Econômica), pela ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicação), pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), pela ANA (Agência Nacional de Águas), pela ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), pela ANS (Agência Nacional de Saúde), pela ANP (Agência Nacional do Petróleo), pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), pela ADA (Agência de Desenvolvimento da Amazônia), entre outros que poderão ser empregados nos âmbitos Federal, Estaduais e Municipais. A função básica das agências reguladoras é a intervenção do Estado no domínio econômico, ou

126 •

capítulo 5

ainda, a promoção do desenvolvimento econômico sob o prisma do fortalecimento da competição no setor privado da economia e da criação de procedimentos de controle absolutamente claros e racionais. A função regulatória do Estado, em frente das reformas realizadas nas estruturas administrativas, viabiliza maior agilidade diante às atividades do setor privado, capacitando o Estado de se comandar as atividades com fins econômicos ou que de certa maneira atingem a economia de acordo com seu interesse - lê-se interesse coletivo e social. 5.2.5  Conselho Administrativo de Defesa Econômica - CADE. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica –CADE é uma agência judicante (dizer o direito nos casos de interesse econômico), criado pela Lei nº 4.137, de 1962. O CADE foi alterado pela Lei nº 8.884, de 1994, em autonomia federal vinculada ao Ministério da Justiça, com sede e foro no Distrito Federal. Nos termos do Artigo 7º da Lei 8.884/94 diz respeito ao Conselho, as seguintes funções: (I) decidir sobre a existência de violação à ordem econômica e aplicar as punições previstas em lei; (II) decidir os processos estabelecidos pela Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça; (III) ordenar medidas que conduzam à interrupção de infração à ordem econômica, dentro do prazo que determinar; (IV) validar os termos do acordo de cessação de prática e do compromisso de desempenho, bem como indicar à Secretaria de Direito Econômico (SDE) que fiscalize seu cumprimento; (V) solicitar dos órgãos do Poder Executivo Federal e requisitar das autoridades dos Estados, Municípios, Distrito Federal e Territórios as medidas básicas ao cumprimento desta lei; (VI) solicitar ao Poder Judiciário a execução de suas resoluções, nos termos desta lei. Importante autuação do CADE aconteceu na fusão das fábricas de cervejas detentoras das marcas Brahma, Skol e Antártica, gerando a empresa AmBev (American Beverage Corporate) em meados do ano de 2000. Com a união destas empresas na AmBev (American Beverage Corporate), muito se discutiu sobre um possível monopólio instaurado no país, tendo em vista que as três cervejas referidas detinham cerca de 70% do mercado nacional. Assim sendo, é mais ou menos por aqui que o Conselho e demais órgãos dedicados na função de fiscalizar as práticas inclinadas a romper com o princípio constitucional da livre concorrência devem agir.

capítulo 5

• 127

5.2.6  Secretaria de Direito Econômico - SDE. A Secretaria de Direito Econômica – SDE é um órgão ligado ao Ministério da Justiça, competindo-lhe dar cumprimento ao disposto nas Leis 8.884/94 e 9.021/95, atuando em coordenação com o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) na repressão das diretrizes aos princípios ligados a ordem econômica, esboçados na Constituição da República. Nos termos da Lei 8.884/94, em seu artigo 14, diz respeito à Secretaria de Direito Econômico – SDE, as seguintes funções: (I) cuidar pelo cumprimento desta lei, fiscalizando e acompanhando as práticas de mercado; (II) acompanhar, continuamente, as atividades e práticas comerciais de pessoas físicas ou jurídicas que detiverem posição predominante em mercado considerável de bens ou serviços, para prevenir violações da ordem econômica, podendo, para tanto, solicitar as informações e documentos necessários, sustentando o sigilo legal, quando for o caso; (III) instalar processo administrativo para apuração e contenção de infrações da ordem econômica; (IV) escolher medidas preventivas que conduzam à interrupção de prática que constitua violação da ordem econômica, fixando prazo para seu implemento e o valor da multa diária a ser adotada, no caso de descumprimento; (V) melhorar estudos e pesquisas visando orientar a política de prevenção de infrações da ordem econômica; (VI) ensinar o público sobre as diversas maneiras de infração da ordem econômica, e as maneiras de sua prevenção e repressão. No mais, a criação contínua de atos normativos completando as cláusulas abusivas relacionadas no artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, adequando a com a realidade presente, é um dos pontos de ênfase da atuação desta Secretaria, nos termos dos artigos 9º e seguintes do Decreto nº 2.181/97. 5.2.7  Agência Nacional de Telecomunicação - ANATEL. Esta agência é uma instituição integrante da Administração Pública Federal indireta, exposta a regime autárquico especial e ligada ao Ministério das Comunicações, com a função de instituição reguladora das telecomunicações, com sede no Distrito Federal, podendo indicar unidades regionais (artigo 8º da Lei nº 9.472/97). Sua atividade consiste em impulsionar o desenvolvimento das telecomunicações no País, de maneira a dotá-lo de uma moderna e eficiente infraestrutura de telecomunicações, capaz de disponibilizar à sociedade serviços

128 •

capítulo 5

adequados, variados e a preços justos, em todo o território nacional. Nos termos do artigo 19 da Lei 9.472/97, à agência compete utilizar as medidas essenciais para o atendimento do interesse público e para o progresso das telecomunicações brasileiras, agindo com independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade, e especialmente: (I) implantar, em sua esfera de encargos, a política nacional de telecomunicações; (II) realizar e propor ao Presidente da República, por intermédio do Ministro de Estado das Comunicações, a utilização de certas medidas, submetendo antecipadamente a consulta pública; (III) enviar normas quanto à permissão, prestação e uso fruto dos serviços de telecomunicações no regime público; (IV) publicar atos de permissão e extinção de direito de exploração do serviço no regime público; (V) praticar e gerenciar contratos de concessão e supervisionar a prestação do serviço no regime público, utilizando sanções e concretizando intervenções; dentre outras. Muito se viu na evolução dos serviços de telefonia, segundo uma pesquisa publicada em um importante jornal televisivo, datada de 11 de outubro de 2003, no corrente ano de 1992, próximo de 19% da população brasileira possuía linha telefônica fixa. Nos dias de hoje, após a privatização desta área, o número elevou para aproximadamente 68% da população, exceto os proprietários de telefonia móvel - aparelhos de telefone celular. De fato, houve uma evolução com a saída do Estado do setor telefônico, promovendo de maneira eficaz a justiça social. A disputa entre as prestadoras fez com que as tarifas fossem diminuídas, as tecnologias fossem trazidas e usadas e a qualidade do serviço melhorasse. 5.2.8  Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL. Estabelecida pela lei nº 9.427/96, autarquia de natureza jurídica especial, ligada ao Ministério de Minas e Energia, tendo por objetivo regular e supervisionar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em acordo com as políticas e orientações do governo federal (artigos 1º e 2º da supracitada lei). Nos termos do artigo 3º da lei nº 9.427/96, diz respeito à Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, as seguintes funções: (I) implantar as políticas e orientações do governo federal para a exploração da energia elétrica e a utilidade dos potenciais hidráulicos, expedindo os atos regulamentares essenciais ao cumprimento das normas determinadas pela Lei no 9.074, de 7 de julho de 1995; (II) impulsionar as licitações designadas à contratação de concessionárias de serviço público para produção, transmissão e distribuição de

capítulo 5

• 129

energia elétrica e para a autonomia de concessão para utilização de potenciais hidráulicos; (III) realizar e conduzir os contratos de concessão ou de permissão de serviços públicos de energia elétrica, de concessão de uso de bem público, enviar as autorizações, bem como supervisionar, diretamente ou através de convênios com órgãos estaduais, as concessões e a prestação dos serviços de energia elétrica; (IV) impedir, no âmbito administrativo, as discordâncias entre concessionárias, permissionárias, habilitadas, produtores livres e autoprodutores, bem como entre esses agentes e seus consumidores. Qualquer erro no setor energético nacional pode comprometer o equilíbrio econômico do país, provocando o caos total, seja pela demissão em massa, seja pela ausência de produtos industrializados no mercado para municiar os consumidores que irão buscá-los lá fora, importando-os. Essencial uma política eficiente para este setor, apto de conduzi-lo a modernidade, permitindo ao país disputar de igual para igual com os países desenvolvidos. 5.2.9  Agência Nacional de Águas - ANA. A Agência Nacional de Águas - ANA, autarquia sob regime especial, com liberdade administrativa e financeira, ligada ao Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de implantar, em seu âmbito de atribuições, a Política Nacional de Recursos Hídricos, incluindo o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, foi estabelecida pela lei nº 9.984/2000 (artigo 3º, desta lei). Nos termos do artigo 4º da lei que gerou a agência das águas, o desempenho desta agência seguirá aos fundamentos, objetivos, diretrizes e ferramentas da Política Nacional de Recursos Hídricos e será desenvolvida em acordo com órgãos e instituições públicas e privadas componentes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, cabendo-lhe: (I) fiscalizar, controlar e avaliar as ações e atividades resultantes do cumprimento da legislação federal adequada aos recursos hídricos; (II) formar, em caráter normativo, a implantação, a operacionalização, o controle e a avaliação das ferramentas da Política Nacional de Recursos Hídricos; (III) outorgar, por meio de autorização, o direito de poder de recursos hídricos em corpos de água de domínio da União; ente outras. A preocupação com a administração dos recursos hídricos é uma matéria que ilustra na ordem do dia. Sabe-se que 70% da superfície do planeta Terra é composta de água, porém somente 0,3% é potável, apta ao consumo. Tem-se feito várias análises acerca do recurso hídrico mundial, mostrando que num

130 •

capítulo 5

futuro próximo haverá falta de água em todas as regiões. Logo, toda e qualquer interferência do Estado para controlar a má utilização da água, bem como educando as pessoas a respeito das medidas necessárias para a proteção do ambiente, que, diga-se de passagem, vem mostrando os reflexos da péssima administração dos recursos hídricos. 5.2.10  AGÊNCIA Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA. Agência Nacional de Vigilância Sanitária -ANVISA foi gerada pela Lei nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999. É uma autarquia sob gestão especial, caracterizada também pela independência administrativa, equilíbrio de seus dirigentes durante a época de mandato e soberania financeira. A administração da ANVISA é responsabilidade de uma Diretoria Colegiada, formada por cinco membros (artigos 3º, parágrafo único, 4º e 9º a Lei nº 9.782/99). Na elaboração da administração pública federal, a Agência está ligada ao Ministério da Saúde, sendo que este relacionamento é ajustado por Contrato de Gestão. O objetivo institucional da Agência é motivar a proteção da saúde da população por meio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos à vigilância sanitária, também dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles referentes. Além disso, a Agência desempenha o controle de portos, aeroportos e fronteiras e a comunicação junto ao Ministério das Relações Exteriores e instituições estrangeiras para tratar de assuntos internacionais no setor de vigilância sanitária. 5.2.11  Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS. Estabelecida pela lei nº 9.961/2000, a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, autarquia sob o regime especial, ligada ao Ministério da Saúde, com sede e foro na cidade do Rio de Janeiro - Estado do Rio de Janeiro, com prazo de duração ilimitado e com atividade em todo o território nacional, como órgão de ajuste, normatização, controle e supervisão das funções que garantam a assistência complementar à saúde. (Artigo 1º e parágrafo único, da supracitada lei). Nos termos do artigo 4º da lei nº 9.961/2000, compete à ANS, dentre outras atividades: (I) sugerir políticas e diretrizes gerais ao Conselho Nacional de Saúde Suplementar - CONSU para o acerto do setor de saúde suplementar; (II) determinar as características gerais das ferramentas contratuais usadas na

capítulo 5

• 131

atividade das operadoras (planos de seguro de saúde); (III) criar o rol de métodos e eventos em saúde, que constituirão referência fundamental para os fins do disposto na Lei no 9.656, de 3 de junho de 1998, e suas excepcionalidades; (IV) fixar regras para as instruções de credenciamento e descredenciamento de prestadores de serviço às operadoras; (V) determinar padrões e indicadores de qualidade e de cobertura em auxílio à saúde para os serviços próprios e de terceiros ofertados pelas operadoras; (VI) determinar normas para reembolso ao Sistema Único de Saúde – SUS. Porém, o Estado não consegue, por si só, atender toda a população. Consciente disso, permitiu-se ao particular, em caráter complementar, abastecer os mesmos serviços, desde que considerados os princípios próprios à seguridade social, bem como aos ligados à ordem econômica. Desta maneira, urgese na presença desta instituição no sistema de saúde nacional, que contempla poucos detentores de poder econômico e elimina a grande maioria dos necessitados, tornando possível não só o serviço público prestado por instituições estatais como os prestados pelos particulares. 5.2.12  A Agência Nacional de Petróleo - ANP A Agência Nacional do Petróleo - ANP é uma autarquia integrante da Administração Pública Federal, ligada ao Ministério de Minas e Energia. Tem por objetivo promover a regulação, a contratação e o controle das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo, de acordo com o definido na Lei nº 9.478, de 06/08/97, regulamentada pelo Decreto nº 2.455, de 14/01/98, nas orientações emanadas do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) e em conformidade com os interesses do País. Sua competência engloba, dentre outras: (I) implementar, em seu âmbito de competências, a política nacional de petróleo e gás natural, contida na política energética nacional, com foco na garantia do suprimento de derivados de petróleo em todo o território nacional e na segurança dos interesses dos consumidores quanto a preço, qualidade e oferta dos produtos; (II) estimular estudos tendo como objetivo à delimitação de blocos, para efeito de concessão das funções de exploração, desenvolvimento e produção; (III) permitir a prática das atividades de refinação, processamento, transporte, importação e exportação, na maneira estabelecida nesta Lei e sua regulamentação. Importante agência indicada a regular o setor energético petrolífero do país!

132 •

capítulo 5

5.2.13  Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT A Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT, instituição integrante da Administração Federal indireta, expostas ao regime autárquico especial e ligadas ao Ministério dos Transportes, tem sede e foro no Distrito Federal, podendo colocar unidades administrativas regionais. (Artigo 21 da Lei nº 10.233/2001). Nos termos do artigo 24 da Lei n.º 10.233 de 5 de junho de 2001, diz respeito à esta agência, dentre outras: (I) estimular pesquisas e estudos característicos de tráfego e de demanda de serviços de transporte; (II) proporcionar estudos aplicados às definições de tarifas, preços e fretes, em confronto com os custos e os benefícios econômicos transferidos aos clientes pelos investimentos realizados; (III) sugerir ao Ministério dos Transportes os planos de concessão, instruídos por estudos próprios de possibilidade técnica e econômica, para exploração da infraestrutura e o fornecimento de serviços de transporte terrestre. Importante aspecto de desempenho desta agência poderia ser na área dos pedágios, que oneram o custo das viagens, do escoamento das produções, atrapalha o crescimento de áreas da economia, causam ilhas econômicas, tendo em vista a impossibilidade financeira de tentar encontrar outros mercados, pois o preço do pedágio desencoraja a ida dos consumidores a outros centros comerciais. 5.2.14  Agência de Desenvolvimento da Amazônia - ADA A Agência de Desenvolvimento de Amazônia - ADA, Autarquia Federal, ligada ao Ministério da Integração Nacional, foi gerada pela Medida Provisória n° 2.157-5, de 24.08.2001, simultaneamente em que foi abolida a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia – SUDAM (artigo 21 da supracitada Medida Provisória). Agência tem sede e foro na cidade de Belém, estado do Pará, com desempenho em toda a Amazônia Legal, integrada pelos Estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e a parcela do Estado do Maranhão que se situa a Oeste do Meridiano 44° de Longitude Oeste (artigo 2º da Medida Provisória 2.157-5/2001). O desempenho da ADA obedecerá aos motivos, objetivos, diretrizes e ferramentas da Política de Desenvolvimento Nacional Integrada e do Plano de Desenvolvimento da Amazônia e será realizada em articulação com o Conselho Delibera-

capítulo 5

• 133

tivo para o desenvolvimento da Amazônia, órgãos e instituições públicas dos governos federal, estaduais e municipais que trabalham na região e a sociedade civil organizada. A missão desta agência é esboçar e promover ações estruturadas que incentivam o desenvolvimento justo e sustentável da Amazônia, bem como a sua integração competitiva nos contextos nacional e internacional, planejando à emancipação econômica e social do Amazônia. O ambiente é, sem sombra de dúvida, o objetivo de maior cuidado das nações desenvolvidas. De agora em diante, sabe-se da necessidade de um ambiente estabilizado, sadio, voltado ao desenvolvimento sustentável da natureza. Em face disto, todos os povos do mundo devem colaborar para um meio ambiente melhor, acessível a todos, devendo todos tomar conta para que o desenvolvimento seja de forma tal que possa assegurar o equilíbrio e a vida natural (fauna e flora).

5.3  A parceria público-privada 5.3.1  Introdução Lei 11.079, de 30.12.04, decidiu juridicamente parceria público-privada (PPP) no Brasil como um modelo de contrato de concessão. Sempre houve PPP no Brasil, em particular em projetos assistenciais, no sentido da atuação privada sustentada com recursos públicos. Possivelmente a denominação PPP devesse ter sido preservada para todo o gênero, procurando-se nomes próprios para cada uma de suas espécies, o que obrigará sempre um autor a esclarecer sobre que conceito pretende tratar. Para as operações de cooperação financeira dos agentes financeiros públicos, a PPP será somente mais um dos muitos modelos de apoio, não devendo modificar profundamente seu desempenho, a partir das experiências com a concessão tradicional e com as ferramentas de “Project Finance”. Combinando os dispositivos das Leis 8.987/95 (Concessões) e 11.079/04 (PPP), pode-se falar que, quanto a serviços contratados a particulares pelo Estado (antecedidos ou não de obra pública), existem agora quatro modelos de contratos de concessão: (I) a concessão habitual ou tradicional calcada em receitas auto suficientes e sem contrapartida do Estado; (II) a concessão habitual ou tradicional com contrapartida do Estado complementar à receita; (III) a concessão patrocinada com contrapartida do Estado, complementar à receita; (IV) a concessão administrativa sem outra receita que não a do Estado.

134 •

capítulo 5

A matéria sobre concessões, seja a habitual ou a PPP, deveria ser consolidada, pelo menos do ponto de vista da ameaça de crédito e da elaboração das operações financeiras. O ideal seria que uma mesma instituição estatal tratasse de concessões habituais, patrocinadas ou administrativas, tirando proveito em todas o conhecimento obtido caso a caso. Uma concessão patrocinada pode prever seu crescimento para uma situação em que seja desobrigada a contrapartida do Estado, sem deixar de estar regulada pela lei de PPP, ainda que passe a ser autossustentável. 5.3.2  Regulamentação da Lei de PPP O que aconteceu no primeiro quadrimestre de 2005 permite supor que um pequeno número de estados sejam os primeiros a divulgar seus editais de PPP, criando os suportes das disputas judiciais e das estruturações financeiras a serem notadas no futuro. Essas primeiras propostas terão toda a atenção da sociedade e não têm muito espaço político para erros, ainda que a lógica seja que tenham os menores alívios, que só serão desenvolvidas com a experiência. O Decreto 5.385/05 regulou a instituição responsável pela PPP federal. O Comitê Gestor (CGP) guarda igualdade com outros órgãos de administração colegiada existentes no Executivo brasileiro. É formado por representantes do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Ministério da Fazenda e da Casa Civil da Presidência da República, podendo ter convite a instituição da área competente. As decisões serão por unanimidade e devem proporcionar que não haja contestações nos patamares inferiores do serviço público. O CGP deverá enviar resoluções sobre várias matérias, como a definição dos serviços prioritários em regime de PPP, validar o Plano de Parcerias Público-Privadas (PLP), disciplinar os métodos para contratação de PPP, consentir a abertura do processo licitatório e autorizar o edital, bem como apreciar os relatórios de execução dos contratos e prestar contas ao Congresso Nacional e ao Tribunal de Contas da União. O acompanhamento e o controle de cada licitação ficarão a cargo dos ministérios e agências reguladoras pertinentes. 5.3.3  Premissas de uma PPP A PPP em infraestrutura aplica-se a contratos de prestação de serviços associados a projetos de investimento que atendam a vantagens da administração pública, predefinidos como objeto de licitação de concessão. Nas publicações

capítulo 5

• 135

e contratos serão identificados os seus objetivos e as formas de medir sua realização. Esses projetos apenas serão especificados como PPP se não forem autossustentáveis e exigirem, de modo necessário, o auxílio total ou parcial de recursos orçamentários públicos, cujos pagamentos serão feitos de modo exclusivo em função do atendimento de critérios acordados e contratados entre as partes. Essa redação da lei de PPP no Brasil excluiu o medo de que todas as concessões de serviços públicos só seduziriam interessados privados nessas novas bases, esvaziando as formas sem garantias do Estado. Inclusive definiu o tamanho das operações ao estabelecer limites a PPP, no alcance da lei, a projetos idênticos ou maiores que R$ 20 milhões. A Lei 11.079/04 identificou a PPP em dois tipos: concessões patrocinadas (estradas, por exemplo), para projetos em que exista contrapartida do poder público, e concessões administrativas (centros administrativos e presídios, por exemplo), para projetos em que o Estado seja o cliente direto ou indireto da concessão e responda de modo exclusivo pelo fluxo de pagamentos. A lei eliminou do regime de PPP os contratos de obras públicas, que continuam administrados pela Lei 8.666/93, e os contratos de concessão habitual (autossustentáveis), que continuam administrados pelas Leis 8.987/95 e 9.047/95, as quais, contudo, terão aplicação subsidiária nas operações de PPP. No Brasil, a enorme necessidade de realização de investimentos em infraestrutura chocase com a pequena disponibilidade de recursos públicos para realizar desembolsos e as limitações fiscais e orçamentárias, como demonstra a exigência federal de integração do projeto de PPP no Plano Plurianual (PPA) de 2004/07. Essa necessidade explica as novidades da legislação e os cuidados para que não haja retrocessos. Outra premissa, que vem sendo abandonada a um segundo plano no debate público é a fundamental revisão econômico-financeira dos projetos. Todos os projetos obrigam um colchão de fontes para cobrir esse acréscimo e uma tolerância nos prazos para cobrir indefinições e imprevistos. Essa premissa pode presumir que haverá uma política de gestão dos contratos, dividida de preferência para a tomada de decisões e respostas rápidas a pedidos de excepcionalidade. Outro ponto que necessita de explicação é o emprego por alguns do conceito de “Private Finance Initiatives” (PFI). Trata-se da nomenclatura oficial na Grã-Bretanha, que incorpora não só a PPP, como inclusive as parcerias autossustentáveis.

136 •

capítulo 5

Também vem sendo divulgada como vantagem da PPP o value for money (VFM), que, grande rigor, é a medida da diferença verificada entre o que seria fazer a mesma obra por meio do Estado ou de um particular contratado para assumir suas ameaças e custos. É provável que possa existir um conjunto de valor mensurável nos projetos, mas isso tem de ser feito de maneira quantitativa, como, por exemplo, comparando-se os custos entre concessionárias públicas e privadas. Observa-se que isso não sugere que a tarifa cobrada do usuário sairá automaticamente mais barata pela utilização de uma PPP. Tomar como princípio que todas as obras do setor público são mais caras que as do setor privado não é uma verdade, principalmente com os inúmeros exemplos de obras entregues a concessionários privados paradas ou com superfaturamento citado em tribunais de contas. Assim, o eventual VFM terá de ser analisado empiricamente caso a caso, pois depende da existência de real disputa entre os construtores e da competência de fiscalização do Estado para não possibilitar uma sobrevalorização possível nesse tipo de obra. Outro aspecto de economias emergentes é a insegurança quanto ao marco regulatório e a fiscalização de custos, sujeitos as crises nos câmbios com desvalorização da moeda nacional. Nesses dois casos a iniciativa privada tem ferramentas tanto de pressão parlamentar como financeiros de hedge de que o setor público não possui. Além disso, é preciso também relacionar algumas premissas aceitas como verdadeiras na literatura estrangeira sobre economias como a nossa.

capítulo 5

• 137

138 •

capítulo 5

Related Documents

Economia
March 2021 0
Economia
February 2021 2
Economia
March 2021 0
Economia
February 2021 2
Economia
January 2021 3
Economia
February 2021 2

More Documents from ""