Como Alterar O Comportamento Humano, Técnicas Baseadas Na Reflexologia E No Aprendizado - Beech, H R.pdf

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Como Alterar o Comportamento Humano Desde o famoso trabalho de Pavlov sôbre condicionamento de cães e as experiências de Watson com o Pequeno Alberto, há qua­ se 50 anos, muitos psicólogos chegaram à conclusão de que o comportamento anor­ mal pode resultar de aprendizagem falha, mais do que de conflito profundo, como ensinou Freud. Na opinião dos discípulos de Pavlov, justifica-se por isso um ataque direto aos sintomas. Êste radical afastamento em relação ao ponto de vista psicoterapêutico tradicional provocou rápido crescimento de um estilo inteiramente nôvo de tratamentos ativos e dinâmicos, chamado "terapia de comporta­ mento”. As poderosas e convincentes idéias ameaçam não apenas desafiar as noções existentes sôbre a natureza e o tratamento dos distúrbios psicológicos, mas também mudar e modelar nossa maneira de pensar sôbre o comportamento humano no mais amplo contexto. O dr. Beech expõe neste livro a natureza e o desenvolvimento da terapia de compor­ tamento e mostra como na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos se estão hoje aplican­ do em larga escala êsses métodos ao tra­ tamento de doentes. Descreve as técnicas propriamente ditas, com minúcia, e exem­ plifica seu uso por numerosas referências a ampla variedade de problemas clínicos, entre os quais alcoolismo, homossexualida­ de, fetiches sexuais, mêdos irracionais e muitas outras formas de perturbação psi­ cológica. Êste livro apresenta ao leitor em geral uma nova abordagem que talvez venha a resol­ ver, por sua rapidez e eficácia, as clássicas objeções à psicoterapia ortodoxa: tempo, dinheiro e eficácia limitada.

Como Alterar Comportamento Humano

Biblioteca

PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO -

70 -

Volumes publicados: 1. O Segrêdo da P az Familiar 2. Usos e Abusos da Psicologia 3 . Relações Humanas 4. A juda-te Pela Psiquiatria! 5. N os Subterrâneos da Mente 6. Descobre-te a Ti Mesmo 7. S eja Invulnerável! 8. Vença Pela Fé 9. Renovar P ara Vencer 10. A Conquista da M ente 11. As Drogas e a M ente 12. Fato e Ficção na Psicologia 13. Liberdade Sem Mêdo 14. Liberdade Sem Excesso 15. A M arca da Violência 16. Condicionamento Pessoal 17. Criatividade Profissional 18. O Poder Criador da Mente 19. A rte e Ciência da C riatividade 20. Sonhos e Pesadelos 21. A s Três Faces de E va 22. O Rapto do E spirito 23. Educação Soviética 24. A Face Final de E va 25. O Sécido de Freud 26. Educação e Desenvolvimento 27. Economia da Educação 28. A ju de Seu M arido a Vencer 29. A Criança Problem a 30. A Criança Excepcional

H arry F. Tashman H. J. Eysenck Thomason e Clement F ran k S. Caprio F ritz Redlich Stephen Lackner L aura A. Huxley Gordon Powell John W. Gardner William Sargant Robert De Ropp H. J. Eysenck A. S. Neill A. S. Neill F redric W ertham Hornell H art Eugene von Fange Alex F. Osborn George F. Kneller J. A. Hadfield C. H. Thigpen J. A. Meiioo G. L. Kline J. Poling Benjam in Nelson Vários autores John Vaizei Kenneth Hutchin Joseph Roucek Joseph Roucek

COMO ALTERAR O COMPORTAMENTO HUMANO Técnicas Baseadas na Reflexologia e no Aprendizado

H. R. BEECH

Tradução de A ydan o A rru d a

Revista por J o s é R e is

2? Edição

IBR ASA —

In stitu iç ã o

B r a sileir a

de

D ifu sã o

C ultural

S. A.

Título do original inglês:

CHANGING MAN’S BEHAVIOUR

Copyright © 1969 b y H. R. BEECH

Código para obter um livro igual: V-70

Direitos exclusivos para a língua portuguesa da IBRASA - INSTITUIÇÃO BRASILEIRA DE DlFUSÃO CULTURAL S. A. R. Major Quedinho, 300 - Tel. 34-2632 - São Paulo

Publicado em 1976

Impresso no Brasil Printed in Brazil

*7

índice

1. 2. 3. 4. 5. 0. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 1p . 14. 15. 16. 17. 18.

INTRODUÇÃO PELO PROFESSOR B. M. FOSS ....................

U

PREFÁCIO

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................................................................................................

Que é terapia de comportamento .................................... .................... As origens da terapia de comportamento ...................................... Preliminares do tratamento .................................. ........................... Criando hierarquias de ansiedade ...................................................... A técnica de relaxação .......................................................................... Um método para eliminar ansiedade ............................................... Experiências de eliminação de ansiedade com pacientes não psiquiátricos .............................................................................................. Experiências de eliminação de ansiedade com pacientes psiquiátricos ..........................................................................'................ Os fundamentos da terapia de redução de ansiedade ................ Técnicas v a ria d a s....................................................................................... Terapia de aversão ................................................................................... Alguns problemas da terapia de aversão ........... .......................... Condicionamento operante com incentivos positivos ................ Condicionamento operante com incentivos negativos ................ Processo do pensamento e terapia de comportamento ................ Até que ponto é válida a terapia de comportamento? ................ As razões contra terapia de comportamento ............................. Através do espelho ...................................................................................

111 129 139 163 180 195 215 229 247 265 278

REFERÊNCIAS

283

.......................................................... .............................

17 32 50 65 77 85 97

Lista de Ilustrações 1.

Método pavloviano de condicionamento salivar .............................

28

2.

A situação do "Pequeno Alberto” ........................................................

34

3.

Situação de conflito de Maier .................................................................

38

4.

Aparelho paia enurese noturna .......................................................... ..

154

5.

Máquina de condicionamento operante para uso com crianças

199

0.

Aparelho para oontrôle de tremor .........................................................

219

7.

Solução do problema de nove pontos ..............................................

233

r

Introdução A m aioria dos pais procura controlar o comportamento dos filhos por meio de castigos e recompensas, ou ameaça, embora naturalm ente os castigos e as recompensas possam ser mais simbólicos do que reais. Só os pais mais pessim istas nega­ riam possível modificar consideràvelmente o comportamento por êsses meios. Há meio século psicólogos experim entais têm investigado os efeitos de recompensa e castigo, e de condicionamento, mas só nas duas últimas décadas muitos dêles levaram a sé­ rio a possibilidade de êsses efeitos incluírem a formação de sintom as; e só na última década houve tentativas de ver se era possível usar processos correlatos na remoção de sinto­ mas. Às técnicas assim derivadas chamou-se “terapia de com­ portam ento”, mas os leitores verificarão que tal expressão não seria um bom título para êste livro, pois as técnicas ho­ je utilizadas estão muito distantes de suas origens comportamentais. Surgem dificuldades quando o praticante de uma técnica tem a responsabilidade de avaliar-lhe a eficácia e escrever a respeito. A crítica da técnica desafia a lealdade a ela. O dr. Beech evidentemente é fiel a essas técnicas, mas ainda as­ sim permanece louvàvelmente desprendido quando escreve a respeito delas. Ê cuidadoso ao declarar as bases pelas quais se julga o sucesso ou o malogro de uma técnica. Até agora, essas espécies de terapia têm tido algum êxito em algumas fobias, algumas adicções e alguns outros distúrbios. Às ve­ zes há uma “cu ra” transitória. Quando ocorre cura, existe 11

pouca ou nenhuma indicação de “substituição de sintom a”. De m aneira geral os resultados podem com parar-se favoràvelmente com os obtidos por outros métodos de terapia. Resta ver quais serão os limites e se há ou não casos em que as téc­ nicas psicanalíticas ou seus derivados sejam mais ap ro p ria­ dos. V árias vêzes já se tentou reconciliar as teorias psicanalítica e comportamental, sendo interessante descobrir que as práticas terapêuticas de psicanalistas e terapeutas comportam entais têm certa base comum. Todavia, exagerar o que têm em comum provàvelmente constitui desserviço às peno­ sas avaliações que se tornam necessárias. B. M. Foss Departamento de Psicologia Bedford College London University

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Prefácio P or que a vizinha sempre se preocupa excessivamente com

a segurança dos filhos quando voltam da escola p ara casa? P or que aquêle chefe de escritório é tão desnecessariamente rude com os subordinados? Por que precisamos evitar tôda referência a extração de dentes quando falam os com um de nossos amigos? As respostas a essas e outras perguntas semelhantes m uitas vêzes se encontram em pequenas, porém muito difundidas dificuldades psicológicas. É claro que, se os problemas não são excessivamente sé­ rios, em geral não precisamos tom ar a menor providência; continuamos a preocupar-nos com o que não precisa preo­ cupar-nos, continuamos m altratando (talvez culposamente) os auxiliares de escritório, continuamos evitando tópicos pro­ vavelmente "penosos” e assim por diante. Freqüentemente, porém, os problemas envolvidos nas perturbações psicológi­ cas são muito mais sérios e impelem a vítima a procurar aju­ da e conselho de outros. Êste livro tra ta de uma espécie de ajuda que se pode às vêzes oferecer: uma coleção de técnicas conhccidas como terapia de comportamento. Essas técnicas são novas e vigorosas, constituindo desafio d irfto a conceitos e métodos psícoterapêuticos tradicionais. É por isso, em essência, que provocaram tão grande impacto na cena de tratam ento psicológico — e é por isso que são muitas vêzes recebidas com forte ressentimento e árdua re­ sistência. De fato, a terapia de comportamento deixou, no campo das perturbações psicológicas, m arca absolutamente desproporcional a sua praticabilidade geral; isso indica de-

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certo as nuanças emocionais que resultam de seu desafio a opiniões e métodos mais tradicionais a respeito da descrição e do tratam ento de tais distúrbios. Que form a assume o desafio? Não raro parece residir na substituição da não-interferência mais perm issiva da psicoterap ia por uma abordagem forte, ativa e dinâmica. A pa­ rentem ente insiste um regime terapêutico com objetivos e planos claros, nos quais fazer tem papel mais im portante do que falar. Os "modelos” de distúrbio psicológico e o tra ta ­ mento pretendem basear-se em experimentação e rigorosa abordagem científica da compreensão, em flagrante contraste com o sabor filosófico e intuitivo que caracteriza as altern a­ tivas existentes. Tão radicais diferenças na perspectiva exigem evidente­ mente atenção, em particular quando argum ento e contra-argumento envolvem, com freqüência, fortes apelos emocionais, e não a razão. Êste livro é, principalm ente, uma tentativa de apresentar desapaixonada avaliação das provas sôbre as práticas, os fundamentos teóricos e os resultados do emprego de terap ia de comportamento. N aturalm ente, dentro do esco­ po de um pequeno livro desta espécie, não se pode dizer tu ­ do, mas se tentou oferecer retrato mais justo e equilibrado possível do estado da terap ia de comportamento. Isso im­ plica inevitavelmente a seleção de m aterial p ara apresenta­ ção, dando margem a alegações de não se ter discutido êste ou aquêle tópico, de se haver deixado sem definição deter­ minados têrmos ou omitido certos estudos. A não ser escre­ vendo um trabalho que se estenda por vários volumes, não há como fugir ao dilema. A estratégia adotada consistiu em apresentar um relato razoavelmente amplo dos métodos de terap ia de com porta­ mento, atribuindo ênfase especial ao que parece serem atual­ mente as técnicas mais im portantes. As idéias básicas são essencialmente simples e esforçamo-nos p ara apresentá-las de form a que sejam facilmente compreendidas. Consideramos tam bém conveniente incluir referências no texto, de modo que aquêles que desejem obter conhecimento em prim eira mão e mais minucioso das técnicas possam fa ­ zê-lo sem excessiva dificuldade. Espera-se que essa assis14

tência ao prosseguimento do estudo não seja contrabalança­ da pelas desvantagens de um estilo mais fatual. Finalmente, cabe uma palavra de advertência. Nãt» deve­ mos considerar os pormenores práticos de tratam ento aqui mencionados como preparação adequada à terapia de compor­ tamento ou treinam ento nela. Com o tempo é bem possível que um treinam ento breve nesses métodos venha a b astar pa­ ra finalidades práticas; no momento deve-se reservar sua aplicação a pessoas convenientemente habilitadas. Pede-se, portanto, ao leitor que não tente em pregar a terap ia de com­ portam ento em si próprio ou em outros, pois sem supervisão apropriada pode resultar mais mal do que bem.

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Capitulo I

Que é Terapia de Comportamento?

Dois p erso n a g en s saem do portão do h o sp ital: uma mulher, que parece algo apreensiva, e seu terapeuta. Hoje, na segun­ da semana do tratam ento da paciente, motivado por seu in­ tenso mêdo de sair sòzinha, ela vai te n tar algo nôvo. O exer­ cício é muito simples, mas foi cuidadosamente preparado e planejado com antecedência, de modo que a paciente sabe exatam ente o que dela se exige e como deve executar a ta ­ refa. Após algumas palavras anim adoras do terapeuta, ela inicia seu passeio solitário, que a leva até o terceiro poste de iluminação e, depois, cum prida sua missão, volta ao por­ tão do hospital, agora sorrindo com a r de felicidade. Nos dias subseqüentes a fobia, ou mêdo anormal, desta mulher será tratad a por exercícios semelhantes. Cada está­ dio será perfeitam ente consolidado, antes de passar p ara o seguinte, mas, gradualmente, ela aprenderá a sentir prazer na espécie de liberdade de movimento — ir à loja, andar em veículos coletivos ou outros meios de transporte etc. — que a m aioria de nós considera perfeitam ente natural, mas que, talvez durante anos, p ara ela não foi possível. Veremos mais

tard e como êsse esquema funciona na teoria e na prática, m as prim eiro é im portante apresentar alguma espécie de perspectiva sôbre êsse e outros tipos de comportamento anormal. Talvez devamos começar com os tipos de pergunta que ime­ diatam ente ocorrem à m aioria das pessoas quando lhes dizem que um exercício como o descrito acima pode ter valor na redução ou eliminação de comportamento neurótico. No mais das vêzes a pergunta central é sôbre a possibilidade de êxito com tratam ento tão simples, quando é “bem sabido” que “complexos” profundos e ocultos estão na raiz de tôdas as neuroses. Sem dúvida, continua a pessoa que pergunta, ela poderia fazer tudo o que diz impossível, se realmente quisesse fazê-lo! Seja como fôr, não estará ela “fingindo” quando parece tão agitada pela vista de uma ru a vazia, m ui­ to comum e inócua? Essas perguntas baseiam-se em con­ cepções muito especiais de problemas psicológicos e suas causas, na maioria das vêzes decorrendo de relatos popula­ res sôbre psicoterapia e psicanálise. Falando de m aneira geral, é verdade que as terapias mais conhecidas (e ainda mais freqüentem ente em pregadas) p ara perturbações neuróticas se fundam entam na presunção da existência de um “complexo” subjacente, que reside nos “re­ cessos ocultos” da m en te(* ). O complexo que, por sua na­ tureza inconsciente, não é conhecido da vítima, causa o apa­ recimento de sintomas como gagueira, fobias ou perturbação sexual. Portanto, a ta re fa do terapeuta deve ser identificar e erradicar a “verdadeira” fonte do distúrbio (o complexo). P or outro lado, é possível assum ir ponto de vista muito di­ ferente sôbre males neuróticos e outras form as de compor­ tam ento anormal. Em um nível, o argum ento é essencial­ mente simples; é que tais anormalidades comportamentais parecem haver sido aprendidas ou adquiridas através de ex­ periências da vida, de modo que talvez seja possível simples­ mente inverter essas tendências e elim inar ou erradicar al­ guma aprendizagem anterior ou aprender algum com porta­ ( * ) O têrmo "psicoterapia”, neste livro, designa tratamento baseado nessas presunções.

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mento novo e melhor (mais adaptativo ou norm al). Contu­ do, mesmo supondo que a aprendizagem seja tão simples e direta* como sugere êsse modêlo, daí decorrerá natuiwilmente que possamos inverter tendências anormais seguindo certos exercícios em aprendizagem nova ou processos p ara apagar a antiga? O leitor compreenderá que ambas as posições, a da psicoterapia e a da “abordagem de aprendizagem ”, que chamaremos de terapia de comportamento, envolvem presunÇões sôbre a natureza e as causas da anormalidade psicológi­ ca. Examinemos com mais pormenores algumas dessas dife­ renças de abordagem. Talvez a diferença mais fundam ental e im portante se refi­ ra à natureza das provas em favor das posições rivais. De um lado, parece haver pouca dúvida de que a psicoterapia não tem muito a recomendá-la em têrm os de rigor científi­ co (*). Em prim eiro lugar, as teorias são m uitas vêzes mal formuladas, de tal modo que seria difícil, senão impossível, testá-las convenientemente e, em segundo lugar, a prova não é colhida no tipo de condições bem controladas que podería­ mos exigir em outras circunstâncias; se, por exemplo, esti­ véssemos escolhendo um novo automóvel ou fogão elétrico, provavelmente insistiríam os em prova adequada de sua se­ gurança e eficiência. Até certo ponto, a terap ia de compor­ tamento ou método de aprendizagem parece mais científica, embora se deva dizer que as aparências aqui são, com muita freqüência, enganadoras. Contudo, falando de m aneira geral, as teorias em que se baseia essa form a de tratam ento são convenientemente construídas, e a verdade das teorias pode ser exam inada por experiência direta. Isso na realidade não é muito surpreendente, pois as provas a p a rtir das quais se construíram essas teorias foram em geral recolhidas cuida­ dosa e trabalhosam ente em condições experim entais con­ troladas. Na medida em que achamos que a ciência pode ajudar-nos a resolver problemas psicológicos, deve aum entar nossa con­ (* ) Certas formas de psicoterapia não discutidas neste livro talvez tinham muito a recomendá-las, tanto em têrmos de teoria como de trabalho experimental. Exemplo destacado disso é objeto do livro de C. B. Truax e R, R, Carkliuff, Counseling and Psychotherapy, Chicago, Aldine, 1967.

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fiança na abordagem de aprendizagem. No fim, por meio de experiência crítica descobrimos quando estamos absoluta­ mente errados nas previsões que fizemos, ao passo que, se não fizermos esse teste, poderemos perm anecer na leda in­ consciência da falsidade de nossas idéias. Na análise últi­ ma, a maioria de nós naturalm ente se preocupa mais com os resultados efetivos do que com as razões pelas quais pen­ samos tê-los obtido. Afinal, a questão de resultados é de muito maior interesse p ara grande número das vítim as e talvez se possa dar agora uma resposta prelim inar a isso. A té onde podemos dizer, pelas esparsas provas existentes (e isto será discutido mais minuciosamente em seção poste­ rio r), terapia de comportamento parece te r a vantagem de ser mais rápida e mais eficaz do que psicoterapia. Contu­ do, a resposta final a respeito da superioridade de uma ou outra abordagem não será fácil de obter e talvez se m ostre mais complexa do que dizer se *JA é melhor do que B” . Pondo de lado as teorias e provas em que se baseiam, as duas abordagens diferem muito em suas presunções sobre a natureza da perturbação neurótica e especialmente sôbre o papel dos sintomas. A psicoterapia presume serem os sinto­ mas (como depressão, fobias etc.) evidentes sinais de difi­ culdade que testem unham a existência de algum complexo interior não im ediatamente acessível ao paciente ou ao te ­ rapeuta. De acôrdo com êste ponto de vista, a espécie de sintoma encontrado depende da estratégia ou do subterfúgio que o paciente achou necessário para proteger-se contra a penosa revelação de seu complexo; assim, podemos explicar a incapacidade de sair sozinho (o “sintom a” ) como prote­ ção contra a atuação dos impulsos agressivos do paciente (o “complexo” ). Em flagrante contraste com êsse ponto de vista sôbre a significação dos sintomas, a terapia de com­ portam ento considera-os indicação de aprendizagem defei­ tuosa sem causa subjacente profunda, e presume que a apren­ dizagem de sintomas neuróticos só difere de qualquer outra por ser inadequada e mal adaptativa. Por exemplo, não é adequado experim entar intensa ansiedade quando se vê uma rua comum vazia; êsse tipo de reação seria estatisticamen20

te incomum e anormal no sentido de tai comportamento ter probabilidade de to rn ar a vida muito difícil. Por outro lado, não é difícil ver como, por um processo de associação aprendida, se poderia chegar a uma reação de mêdo assim anorm al; por exemplo, a lembrança de um feroz ataque anterior em circunstâncias semelhantes poderia muito bem fazer que ficássemo3 nervosos quando novamen­ te colocados nas mesmas condições. N aturalm ente, porém, não seria plausível argum entar que a diferença entre neuró­ ticos e outros só existe em term os de experiência trau m áti­ ca; com m uita razão, o terapeuta de comportamento presta a devida atenção a que se pode descobrir experiência psico­ logicamente abaladora na história das pessoas chamadas normais tanto quanto dos neuróticos. Sustenta-se, portan­ to, que a diferença crucial entre êsses grupos reside nas condições especiais em que ocorre a experiência e na reação individual a esta. Do ponto de vista de quem não é especialista a maior e mais evidente diferença entre psicoterapia e terapia de com­ portam ento se encontra nas técnicas e na estratégia do pro­ cesso de tratam ento propriam ente dito. Como se pode obter uma “cura” ? Que processos e técnicas podem facilitá-lo? Pelo que dissemos anteriorm ente, é claro que um ataque di­ reto a sintomas ou expressões declaradas de dificuldade seria considerado êrro pelo psicoterapeuta. Afinal, em sua opi­ nião, os sintomas são realmente relevantes apenas como in­ dicação de dificuldade e possível indício da natureza do que exiate oculto na personalidade da vítima. No tratam ento o psicoterapeuta evidentemente precisa dar ênfase ;:o trato dos problemas subjacentes de que o paciente não tem cons­ ciência. A técnica para obtenção de minucioso conhecimen­ to dêsses conflitos e complexos é, em grande parte, um pro­ cesso de pergunta e resposta, mas provàvelmente também Sé usará a interpretação dos sonhos e das atividades do paciente em vigília para chegar a adequada formulação do problema oculto do paciente. É claro que, se correta essa presunção, seguir-se-á logicamente que dedicar atenção ape­ nas aos sintomas evidentes deixará in tata a causa “real” da perturbação; por isso, o psicoterapeuta costuma argu­ 21

m entar que o tratam ento sintomático só faz que o paciente adquira ainda outros sinais de dificuldade, novos sintomas para substituir os removidos pela terap ia “superficial”. O ponto de vista do terapeuta de comportamento a res­ peito do tratam ento sintomático torna-se claro pelo que se disse antes. A terapia efetuada por suas técnicas visa à remoção dos sintomas do paciente, perm itindo que êste de­ saprenda um comportamento mal adaptativo ou aprenda um nôvo comportamento adaptativo. Êsse ponto de vista sus­ tenta, caracteristicam ente, que os sintomas são a neurose e que nesta nada mais existe além dos problemas observados ou potencialmente observáveis da v ítim a(*). Portanto, en­ quanto na psicoterapia o tratam ento tende a consistir p rin ­ cipalmente em trocas verbais entre terapeuta e paciente, na terapia de comportamento a tendência é concentrar-se nas dificuldades efetivas de que se queixa o paciente, por exem­ plo,' a incapacidade de atravessar ruas ou subir a lugares altos. Assim, no último caso o foco é o comportamento per­ turbado efetivo, e daí deriva seu nome a form a de tratam ento. Do ponto de vista do paciente, suas experiências de tra ta ­ mento são talvez o mais notável. Na psicoterapia, êle ge­ ralm ente observa que a atm osfera é muito permissiva, que lhe dão muito pouca orientação sôbre o que fazer ou dizer, mas que a relação por êle estabelecida com o terapeuta pa­ rece de particular interêsse para o próprio terapeuta. Na terap ia de comportamento, o paciente percebe logo que os objetivos do tratam ento lhé são im ediatamente esclarecidos, que o terapeuta é em geral muito mais ativo, animador e persuasivo, e que se atrib u i relativam ente pouca im portân­ cia a relações pessoais. (* ) Parece haver pouca dúvida de que a hereditariedade desempenha certo papel na aquisição de uma perturnação psicológica pelo indivíduo. Influências genéticas provàvelmente desempenham papel mais importante em algumas formas de distúrbio do que em outras, sendo mais salientes, por exemplo, nas reações psicóticas do que nas neuróticas. Não devemos negligenciar tais fatôr<<s, mus o não serem muito suscetíveis de modificação leva claramente a terapia a concentrar-se na contribuição do ambiente e na aprendizagem. A maioria dos terapeutas de comportamento concorda na possível importância de fatores geneticos na exposição do indivíduo a risco de colapso psicológico.

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Essas diferenças servem p ara indicar a divisão muito subs­ tancial de opiniões que hoje caracteriza o tratam ento de per­ turbações psicológicas. A diferença muitas vêzes paroce tão grande que sugere, na melhor das hipóteses, que só um dos pontos de vista pode ser correto e que a tarefa com que de­ frontam os é a de decidir qual das duas abordagens tem mais a oferecer. É desnecessário dizer que uma decisão em favor da abordagem de terapia de comportamento revolucionaria tanto o treinam ento em terapias psicológicas quanto sua p rá­ tica. Até agora, pouco trabalho significativo foi realizado por qualquer dos lados para decidir entre as alternativas, em­ bora a terapia de comportamento — apesar de ter história consideravelmente mais curta — pareça haver feito pelo me­ nos algumas surtidas prelim inares úteis. Não deve haver, naturalm ente, falta de oportunidades p ara exam inar os mé­ ritos rivais dos dois tipos distintos de terapia em têrm os tan ­ to de sua eficiência geral como de certas proposições espe­ cíficas. De fato, uma das últim as já recebeu m uita atenção especial: a possibilidade de surgirem novos sintomas, a me­ nos que se remova o complexo interior pressuposto. Até agora os indícios levam à conclusão de que a remoção de sintomas existentes não conduz à formação de outros. Em outras pala­ vras, a posição adotada pelo terapeuta de comportamento pa­ rece mais plausível nesse aspecto. Contudo, provàvelmente ainda transcorrerão muitos anos antes que se desfechem gol­ pes finais e fatais a qualquer das abordagens ou a ambas, não se podendo ainda prever o resultado. Presumivelmente ocorreu a m uitos leitores que identificar terapia de comportamento com abordagem de aprendizagem é sugerir que psicoterapia tem geralmente muito pouco a ver com aprendizagem. Não é esse realm ente o caso, pois am­ bas as abordagens atribuem im portância à aprendizagem, tanto na aquisição como na remoção de perturbação psico­ lógica. Neste sentido psicoterapeutas e terapeutas de com­ portam ento estão de acordo em considerar as perturbações neuróticas como sinais de aprendizagem defeituosa, em vez de expressão inevitável de anormalidades inerentes. Contu­ do» o prim eiro grupo tende a interessar-se principalm ente pelo conteúdo do que foi aprendido e não pelo processo de 23

aprendizagem propriam ente dito. Em conseqüência, há um sentido muito real em que os terapeutas de comportamento podem afirm ar que adotam abordagem de aprendizagem, a qual tem considerável validade histórica. D urante cêrca de 70 anos, psicólogos se têm interessado em estudar como os organismos apreendem, tendo tais estu­ dos abrangido ampla variedade de espécies e enorme varie­ dade de tarefas. O objetivo foi acum ular fatos ou provas sôbre os quais basear uma teoria de aprendizagem que en­ volva a postulação de certas regras, leis ou proposições ge­ rais. Diversas dessas leis parecem confirm ar noções de sen­ so comum, por exemplo, que em geral quanto mais freqüen­ tem ente executamos uma atividade, melhor a aprendemos, e que a aprendizagem parece mais eficaz em condições que ofe­ reçam recompensa. Todavia, existem na aprendizagem mui­ tas peculiaridades e paradoxos que não são facilmente expli­ cáveis e muitas regras que provavelmente só teriam sido des­ cobertas pela experimentação. P ara o terapeuta de comportamento a im portância dêste trabalho, represèntando a acumulação de anos de teorização e experimentação, consiste em podermos, a p a rtir daí, começar a aprender o controle e a modificação do comportamento — o exame dos processos de aprendizagem, das técnicas e dos resultados obtidos pode revelar sugestões valiosas p ara desa­ prender os tipos de comportamento de que desejamos livrarnos e que outros consideram anormais ou neuróticas. É a êste corpo de experiência e teoria que o terapeuta de com­ portam ento espera recorrer para desenvolver seus processos terapêuticos particulares; mas isto causa uma das preocupa­ ções básicas daqueles que atribuem especial valor à unicidade e santidade do comportamento humano, pois m uitas das ex­ periências e grande parte da teorização baseiam-se no de­ sempenho de ratos brancos, pombos e outros sêres que ocupam lugar relativamente baixo na escala filogenética. Muitos acham que o homem é tão diferente em sua constituição psico­ lógica que pouco ou nenhum valor se pode atrib u ir a “leis” nascidas da observação de ratos brancos a executar alguma ta re fa simples! Talvez achem que ao homem devem aplicarse leis muito especiais. É contudo, questão de fato, e não de 24

opinião, a medida era que o estudo de organismos simples pode levar-nos ao conhecimento de uma perturbação neuró­ tica complexa; a prova, em qualquer dos sentidos, deve ser decidida por teste empírico. Comecemos por exam inar algum as das idéias que parecem im portantes p ara os terapeutas de comportamento em seus ambientes de laboratório. Talvez os exemplos mais im por­ tantes sejam as clássicas experiências de Pavlov (1927), em p arte porque exemplificam certas noções básicas sustentadas pelos terapeutas de comportamento, mas também porque re­ velam uma im portante form a de aprendizagem chamada “con­ dicionamento”, Com m uita freqüência, dada a im portância atribuída a êste tipo de aprendizagem, a terapia de compor­ tamento vem referida como “condicionamento” ou mesmo “descondicionamento”. O processo descrito no mais citado estudo de Pavlov, o de condicionamento salivar, é essencialmente muito simples. Co­ meçou êle notando que certos acontecimentos (os “estímu­ los” ) que geralmente precediam a apresentação de alimentos a seus animais experim entais — as batidas no prato de co­ mida ou os passos da pessoa que leva o alimento — podiam produzir salivação nos cães. Poder-se-ia dizer que os cães salivavam na previsão do alimento a receber, mas Pavlov achou que êste comportamento era novo (aprendido) e re­ sultava de (ou achava-se condicionado a) repetidas associa­ ções dos novos estimulos à salivação com um estímulo na­ turalm ente adequado. Em outras palavras, se qualquer estí­ mulo — digamos, uma cam painha — é repetidam ente asso­ ciado ao cheiro de comida, que sem outro treinam ento basta para produzir fluxo salivar, essa reação particular poderá ser produzida apenas pela campainha. A reação condicional ou condicionada, envolvida mesmo neste nível simples, tinha certas características definidas; primeiro, exigia que os no­ vos estímulos aos quais o animal iria reagir ocorressem antes do estímulo que já era capaz de produzir o comportamento desejado; segundo, o intervalo entre esses dois estímulos não era longo (a m aioria das pesquisas sugere de fato que deve ger muito breve, cerca de 0-5 segundos para obtenção dos melhores re su lta d o s); e, terceiro, que era preciso fazer que 25

o comportamento a ligar ao nôvo estimulo ocorresse por en­ comenda. Mesmo essas simples regras p ara obtenção de novas associações ou nova aprendizagem são difíceis de apli­ car na prática, não sendo surpreendente descobrir que as tentativas de condicionamento do comportamento de pacien­ tes ficam muito aquém dos padrões ideais e freqüentem ente falham. Uma das principais dificuldades na aplicação da aborda­ gem de condicionamento a problema prático pode apreciarse melhor no seguinte exem plo: Suponhamos que estamos tentando “descondicionar” um paciente alcoólatra. No passado, muito freqüentem ente hou­ ve tendência, ainda muitas vêzes mencionada, de usar certos agentes químicos capazes de produzir violentos vômitos no paciente e associar êsse estado à presença ou ao consumo de álcool. Idealmente, é claro, gostaríamos de fazer com que o estímulo (álcool) fôsse dado mais ou menos meio segundo antes do início do vômito; dessa m aneira poderíamos levar ao máximo a força da associação entre estímulo e sensação desagradável. Na prática, porém, é altam ente imprevisível o tempo em que o estímulo “aversivo” (a droga) demora para produzir efeito, assim como a intensidade da reação do paciente em qualquer ocasião e, empregando tais meios, só podemos esperar chegar perto das condições ideais. F e­ lizmente existem outros métodos p ara obtenção de controle mais preciso da situação, mas êste exemplo m ostra um dos problemas práticos que podem muito bem ter contribuído p ara os resultados relativam ente maus do tratam ento de al­ coolismo por métodos de condicionamento. Poder-se-ia encarar a espécie de tratam ento acima re fe ri­ da como exemplo do ensino de uma reação absolutamente nova ao paciente. A nteriorm ente, o alcoólatra sentia prazer em sua bebida; agora vão ensinar-lhe uma nova associação, a de que o álcool causa extremo desconforto. Contudo, se perguntarm os por que o paciente continua a beber, talvez possamos chegar a algum im portante tratam ento alternativo ao de ensinar reações novas. N aturalm ente, as razões por­ menorizadas pelas quais determinado alcoólatra continua a beber podem ser idiossincráticas. Todavia, poderíamos di26

zer que o estado de embriaguez completa ou parcial é satisfa­ tório, em term os gerais, p ara todos os alcoólatras — é um estado que êles criam e mantêm urgente e deliberadamente. Se correta esta presunção, podemos sem dúvida dedicar tem­ po e energia a meios de elim inar os efeitos satisfatórios, de modo que, de alguma form a, se perca a natureza deleitável da atividade. Pavlov conseguiu dem onstrar em suas experiências ser pos­ sível de fato suprim ir ou “extinguir" a nova aprendizagem ou condicionamento pela simples eliminação dos *aspectos compensadores da situação. P or exemplo, mostrou que, em­ bora se pudesse estabelecer uma reação salivar condicionada a uma cam painha de m aneira rápida e fácil, a reação apenas à cam painha desaparecia a menos que se desse também o estímulo adequado e apropriado (alimento) em conjunto com a campainha, de tempos a tempos. Em outras palavras, se o cão fôra treinado a salivar só por intervenção da campai­ nha, repetidos toques desta, sem alimento, eram acompanha­ dos por uma reação progressivamente mais fraca (menos saliva) até a reação desaparecer completamente. A reação condicionada precisa de alguma espécie de recompensa inter­ mitente p ara sustentá-la por um certo período. Ora, afirm am os terapeutas de comportamento que muitas anormalidades psicológicas, especialmente as de pessoas neu­ róticas, são, na realidade, reações condicionadas. Do que se disse decorre, portanto, que tais reações condicionadas são preservadas por serem compensadoras de alguma manei­ ra. À prim eira vista isso pode parecer um pouco estranho. Como pode ser compensadora a m utiladora desvantagem do embaraço social, por exemplo? Certamente a vítim a experi­ menta considerável sofrimento psicológico ou pelo menos agu­ do desconforto em resultado de sua fobia ou outra deficiên­ cia. A resposta do terapeuta de comportamento é direta e simples. As recompensas em tais casos resultam de fuga ou evitação das atividades que causam o desconforto. É com­ pensador, satisfatório e aliviador evitar um elevador quando se tem medo de altu ras; é um grande alívio escusar-se de ír a uma festa quando se tem mêdo de multidões em espaços confinados; é muito satisfatório ficar sentado em casa quan27

F i g u r a 1. Método puvloviario de condicionamunto falivar. O cão é prêso mediante correias-, como mostra a figura. A saliva é recoIhida por uma abertura cirúrgica na face do cão e depois levada para o equipamento de medição,

do se deseja evitar a ansiedade criada por estar num centro comercial movimentado. Sob êsse ponto de vista, são os aspectos imediatamente compensadores da situação que man­ têm a reação mal adaptativa; pouco importa que sejam pe­ nosos os efeitos a longo prazo de comportamento tão aber­ rante. De fato, certos resultados experimentais que parecem indicar as conseqüências de um comportamento, quando muito distantes do comportamento propriamente dito, dei­ xam completamente de influenciá-lo. O que isso significa é que podemos tentar remover as fon­ tes de satisfação que um comportamento anormal estaja pro­ duzindo. Eliminadas tais satisfações, esperamos que o com­ portamento desapareça do repertório do paciente. Vejamos agora ràpidamente uma experiência em que se empregou exa­ tamente êsse processo para modificar o comportamento de pacientes psiquiátricos hospitalizados. O estudo foi realizado por Ayllon e Michael (1959) ( * ) e abrangeu 14 esquizofrênicos e cinco pacientes mentalmente ( * ) No final do volume, há referencias completas sôbre as autorida­ des citadas.

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deficientes, que representavam problemas para as enferm ei­ ras por seu comportamento muito difícil. A observação dêsses pacientes parecia sugerir que em todos os casos t> com­ portam ento indesejável era m antido pela atenção que o pes­ soal de enferm agem prestava a tal procedimento. Conseqüen­ tem ente ficou decidido que só se daria essa recompensa, re ­ presentada pela atenção das enferm eiras, quando ocorresse comportamento desejável, negando-se completamente sempre que o paciente agisse de m aneira difícil. Êste regime — muito difícil de aplicar na p rática — foi mantido 24 horas por dia nos sete dias da sem an a; a dificuldade, naturalm ente, consistia principalm ente em conservar-se surdo e cego sem­ pre que o paciente apresentasse comportamento indesejável! Não é de surpreender que o progresso, mesmo com esforço tão concentrado, tenha sido muito lento e haja levado de 6 a 11 semanas p ara modificar alguma porção específica de comportamento. No entanto, houve progresso e a maioria dos pacientes tornou-se mais tratáv el nesse regime. Lucille, por exemplo, fizera constantes visitas à sala das enferm ei­ ras e in terferira sèríam ente em seu trabalho durante dois anos. Ao fim de sete semanas de tratam ento essas visitas ha­ viam-se reduzido de 16 p ara uma média de duas por dia. A estranha tagarelice de Helen, que em várias ocasiões moti­ vava seu espancamento por outros pacientes, também apre­ sentou substancial redução depois de 12 semanas de terapia, e a tendência de H arry a esconder coisas im prestáveis em­ baixo de suas roupas (o que obrigava as enferm eiras a fa ­ zer-lhe uma limpeza várias vêzes por dia) mostrou decrésci­ mo igualmente satisfatório. Torna-se agora evidente que podemos obter o que, pelo menos em princípio, parece um modelo simples de aprendi­ zagem e dele derivar tratam entos que tenham valor real, mes­ mo para problemas notoriamente difíceis, como os encontra­ dos em pacientes esquizofrênicos e mentalmente débeis. De­ vemos, porém, refazer-nos de nossa surpresa por descobrir meios aparentem ente tão simples de modificar o com porta­ mento, pois, de fato, as aparências são enganadoras e o que pe assemelha muito a bom senso exige planejam ento muito cuidadoso e execução meticulosa p ara que o plano dê resulta29

dos. Os numerosos e sérios problemas de aplicação dos p rin ­ cípios de aprendizagem, para modificação de distúrbio psi­ cológico, tornar-se-ão mais evidentes em capítulos posteriores. Até agora, portanto, a terapia de comportamento parece baseada na noção de que muitas anormalidades psicológicas resultam de uma infeliz história de condicionáfriento; a tra ­ vés de um processo de aprendizagem o indivíduo pode vir a te r um ou mais comportamentos supérfluos e mal adaptativos que o em baraçam ou prejudicam de várias maneiras. Poder-se-ia, porém, acrescentar que tam bém de outra manei­ ra podemos adquirir problemas psicológicos que talvez sejam vencidos por treinam ento especial do tipo dos proporciona­ dos pelas técnicas de terapia de comportamento. Referimonos aqui a deficiências de aprendizagem, quando o paciente deixa de adquirir, por algum motivo, um padrão de compor­ tam ento adaptativo ou normal. Um dos exemplos mais comumente observados desta últi­ ma deficiência é a enurese noturna, o hábito de u rin ar na cama. Poder-se-ia supor aqui que o indivíduo — geralmente criança — deixou de adquirir o hábito normal de levantar-se para ir ao banheiro durante a noite e que, em tais casos, o problema consista em dispor as circunstâncias de modo que possa ocorrer tal aprendizagem. É neste terreno particular que a terapia de comportamento tem tido considerável su­ cesso e, pelos resultados do tratam ento dêsse distúrbio, pa­ rece que pelo menos aqui não há razão p ara acreditar (como presumem às vêzes outras abordagens) que exista algum complexo por trá s do sintoma. Finalmente, neste capítulo introdutório im porta acentuar que é completamente errad a a idéia de a terapia de compor­ tam ento consistir apenas em uma ou duas regras simples que se podem aplicar de m aneira simples p ara lidar com p ertu r­ bações psicológicas. De fato, acumularam-se vários processos muito diferentes para lidar com tais problemas, alguns dire­ tos, alguns mais complicados, uns exigindo pouco mais do que cuidadosa supervisão pelo terapeuta e outros ainda exi­ gindo dêle as mais árduas e habilidosas atenções. Mesmo quando permanece constante a técnica escolhida para lidar com determinado tipo de perturbação, é m uitas vêzes neces­ 30

sário introduzir modificações que adaptem a terapia aos ca­ prichos das necessidades individuais do paciente. E m outras palavras, terapia de comportamento não é um método, mas vários métodos bem diferentes aos quais, sem dúvida, muito 3 outros serão acrescentados com o passar do tempo. A rgu­ menta-se que o que essas técnicas m ostram em comum é a origem nas teorias e experiências a respeito dos processos de aprendizagem. Acontece que tais experiências e teorias foram relatadas quase exclusivamente por psicólogos, cujo trein a­ mento se tem interessado muito tipicam ente por essa á re a ; é natural, portanto, que a origem e o desenvolvimento da te ra­ pia de comportamento h aja sido, com a notável exceção de Wolpe (1958), atribuível aos esforços do psicólogo e não do psiquiatra. Talvez este fato, mais do que qualquer caracterís­ tica intrínseca da própria terap ia de comportamento, haja em­ prestado a tais técnicas um frescor, um vigor e um radica­ lismo que a m uitas pessoas parecem bem-vindos depois do longo período em que as teorias e os métodos de Freud pre­ dominaram quase completamente. Decerto, o impacto inicial da terapia de comportamento foi muito profundo e essa form a de tratam ento é agora am­ plamente utilizada tanto na G rã-B retanha como nos Estados Unidos. Resta ver — e o conteúdo dêste livro talvez ajude o leitor a decidir — se a terapia de comportamento virá ou não a ser o principal tratam ento futuro para a doença neu­ rótica e certas outras formas de distúrbio de comportamento.

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CAPÍTULO

II

As Origens da Terapia de Comportamento

F a la r em história da terap ia de comportamento parece en­ volver certa distorção do sentido mais usual dêsse têrmo. A final, foi só em 1958 que Lazarus (segundo Wolpe) em pre­ gou a expressão “terap ia de comportamento” p ara descrever “uma nova espécie de psicoterapia”. Por outro lado, poderse-ia argum entar que terapia de comportamento é tão an ti­ ga quanto as tentativas feitas pelo homem para modelar e controlar o comportamento por meio de recompensas e puni­ ções, embora isto seja quase o mesmo que atrib u ir ao inventor do ábaco grau de refinam ento igual ao do desenhista do computador moderno.

Parece haver muito em favor da afirm ação de que W atson e M ary Co ver Jones foram os fundadores da terapia de com­ portam ento, e podemos começar fazendo um relato de seu trabalho pioneiro. W atson ficara extrem am ente impressio­ nado pelo trabalho de Pavlov em condicionamento e, enquan­ to o último considerara o método de condicionamento ape­ nas como conveniente meio de estudar a fisiologia da córtex cerebral, Watson começou a encarar o condicionamento como 32

explicação de todo o comportamento. Imediatamente se des­ cortinaram as amplas implicações de reações condicionadas e uma delas lev' -u Watson a realizar sua experiência^ hoje célebre, com o pequeno Albert (1920). O pequeno Albert, que tinha nove meses quando se inicia­ ram as experiências, era uma criança vigorosa, im perturbá­ vel e nada em ociona^— tendo sido especialmente escolhido por sua evidente saúde psicológica e física. W atson impôs-se a tarefa de ensinar à criança um novo mêdo, escolhendo para isso o método de condicionamento. O problema era estabele­ cer uma reação emocional condicionada. Em prim eiro lugar A lbert foi exposto a uma rotina re­ gular na qual se examinavam suas reações à repentina apre­ sentação de um rato branco, um coelho, um cão, um macaco e vários outros estímulos. W atson relata que A lbert muitas vezes estendeu a mão para agarrá-los, sem jam ais demons­ tr a r sinais de mêdo. Por outro lado foi fácil m o strar que um ruído fo rte e inesperado podia produzir clara evidência de reação de mêdo e choro na criança. Nessa fase — quando A lbert chegara à idade de 11 meses — os pesquisadores es­ tavam preparados para empreender seu trabalho. O plano, muito simples, consistia em ligar o mêdo desper­ tado por um ruído forte a um dos estímulos que, no início, eram interessantes e não atemorizadores para Albert. O processo consistia em oferecer-lhe um rato branco e, exata­ mente quando sua mão tocava o animal, fazer um ruído for­ te bem atrás de sua cabeça. De fato, foi necessário um total de sete associações ou “em parelham entos” do ruído e do rato branco p ara “produzir a reação completa", tempo ao fim do qual o rato branco sòzinho e ra capaz de produzir for­ tes reações de mêdo na criança. Parecia que essa associação deliberadamente planejada resultara na aquisição de um novo mêdo por p arte de Albert. Com freqüência, porém, tais medos, como outras reações emocionais condicionadas, não são específicos, porém mos­ tram indícios de generalização, e o problema então era saber ae o mêdo do pequeno A lbert apresentara ou não propagação espontânea a estímulos que tivessem alguma semelhança com 0 rato branco. Evidentemente não houve transferência do 3

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F ig u r a 2 . Situação do “Pequeno Albert” . O experimentador espera até Albert estender a mão para apanhar o rato antes de bater os pratos de metal.

mêdo para um jogo de blocos de armar, pois Albert brincava com êles normalmente. Todavia, um cão, um coelho e um casaco de pele pareciam evocar graus variados de reação emo­ cional. Êsses resultados indicavam evidentemente que o mê­ do aprendido apresentava então indícios de propagar-se de maneira lógica a coisas de certa maneira semelhantes ao es­ tímulo condicionado original, o rato branco. A fase final da experiência foi dedicada ao exame dos efei­ tos do tempo sôbre os medos recém-adquiridos. No caso do pequeno Albert descobriu-se que mesmo após um mês ainda havia evidência de mêdo do rato branco e outros estímulos correlatos, embora geralmente o mêdo parecesse ter diminuí­ do um pouco. Não obstante, foi possível concluir que a rea­ ção emocional diretamente condicionada, assim como aquelas condicionadas por transferência, podiam persistir durante al­ gum tempo. O caso do pequeno Albert parecia indicar de maneira con­ vincente que o processo de condicionamento podia explicar alguns de nossos mêdos anormais e mal adaptativos, e que tais mêdos podiam propagar-se e ser duradouros. E ssas des-

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cobertas pareciam, pelo menos superficialm ente, correr pa­ relhas com o desenvolvimento e o curso do tipo de dificulda­ des que chamamos de “neuróticas”. Contudo, restavâ ainda dem onstrar se o paradigm a de condicionamento tinha alguma implicação valiosa na remoção de tais mêdos depois de adqui­ ridos. Não demorou muito p ara que Jones (1924), sob a orientação de Watson, estabelecesse a base do tratam ento de mêdos “adquiridos”. Os pacientes de seu estudo foram 70 crianças instituciona­ lizadas, de três meses a sete anos de idade, entre as quais se escolheram as que dem onstravam acentuado mêdo em cer­ tas circunstâncias (estar no escuro, ver surgirem repentina­ mente à sua frente vários animais, ouvir ruídos fortes, ver máscaras etc.). N esta experiência presumia-se, portanto, que a manifestação do mêdo resultasse de algum condicionamen­ to anterior ao ingresso da criança na instituição. Tentou-se uma variedade de métodos terapêuticos, entre os quais o “mé­ todo de eliminação pelo desuso”. Êste tratam ento baseava-se de fato na idéia amplamente difundida de que um mêdo de­ sapareceria realm ente se não fôsse despertado durante certo tempo. O resultado demonstrou claramente, porém, que os mêdos simplesmente não m orrem quando não são exercita­ dos — pelo menos durante um período de semanas ou mesmo meses. Parece que talvez seja necessária alguma ação posi­ tiva para erradicar tais reações de m aneira efetiva e defi­ nitiva. Igualm ente ineficaz (e, em certas ocasiões, positivamente nociva) foi a tentativa de remover um mêdo pela apresen­ tação repetida do objeto tem ido(* ), havendo tam bém malo­ grado tentativas de modificar a reação de mêdo por meio de apoquentação, ridicularização ou repreensão. Só uma técnica parecia oferecer verdadeira prom essa de êxito: a de tentar associar o objeto-mêdo a algum estímulo que evocasse reaç&o deleitável; a isso chamou-se método de “condicionamen­ to direto”. Uma das m aneiras de em pregar êste método envolvia a Utilização de doces p ara obter a reação deleitável na crian( * ) Esta resistência à "extinção” de uma reação de mêdo aprendida Btliltas vêzes se encontra em experiências com animais.

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ça. Enquanto esta se ocupava em comer, o objeto-mêdo era introduzido a certa distância (para não provocar uma rea­ ção de medo intenso) e só gradualm ente aproximado. Se assim se procedia com suficiente cuidado, a criança come­ çava , em certo estádio, a tolerar a presença próxim a dp objeto temido ou mesmo a sentir prazer em sua proximidade. Jones mal toca na explicação p ara o êxito dêste método. Em bora êste seja chamado de “condicionamento direto”, não se apresenta argum ento bem organizado p ara que se con­ sidere apropriado o modêlo de condicionamento. À guisa de explicação Jones afirm a que se lida com dois “sistemas de reação”, um positivo (invocado pela apresentação de ali­ mento) e outro negativo (produzido pelo objeto tem ido), sendo o objeto temido “transform ado em fonte de reação positiva”. Embora isso possa estar longe de um relato r i­ goroso e convincente dos processos terapêuticos envolvidos, do ponto de vista prático parece que dois elementos cons­ piraram para provocar o resultado terapêutico desejado. Prim eiro, foi necessário introduzir o objeto temido pouco a pouco — se assim não se faz, como acentua Jones, pode desenvolver-se uma associação que ligue mêdo à comida em lugar de, como se deseja, ligar prazer à presença de um rato branco ou outro estímulo temido. Segundo, parece que a reação deleitável é p arte vital do processo e dá a im pres­ são de evocar uma forte reação incompatível com a presen­ ça de ansiedade, isto é, uma reação que bloqueia a experiên­ cia de ansiedade. Pesquisas posteriores realizadas por numerosos autores, entre os quais M asserman e Wolpe, indicaram o valor e a necessidade dêsses dois elementos na terapia de fobias. F e­ lizmente êstes autores começaram tam bém a promover um relato mais satisfatório dos motivos precisos pelos quais êsses elementos são eficazes em combinação; mencionare­ mos êsse trabaího em uma seção posterior. No momento, basta observar que, em essência, a experiência de Jones e seu método de condicionamento direto são precisamente os empregados hoje como principal técnica de terapia de com­ portam ento. Sem dúvida, introduziram -se muitos refin a­ mentos, mas os princípios básicos permanecem os mesmos. 36

É de certo interesse observar, porém, que apesar desta de­ monstração inicial, por W atson e Jones, da relevância do condicionamento em anormalidades com portamentais,^) mun­ do pareceu m anter-se indiferente, e só nos anos de pós-guer­ ra é que houve repentina e rápida aceleração do interesse por esta abordagem. Não obstante isso, houve confirmação esporádica e isolada das idéias apresentadas e testadas por êles, sendo um desses casos o estudo de Jersild e Holmes (1935) sôbre métodos utilizados pelos pais p ara lidar com mêdos infantis. Em geral estas últimas observações con­ firm am a descoberta de que, enquanto a punição pela de­ monstração de mêdo e a repetida exposição à situação te­ mida foram mal sucedidas, o contato gradual e progressivo e as tentativas de reduzir a ansiedade da criança na pre­ sença do objeto ou situação tem ida dem onstraram certo valor. Em bora êstes prim eiros estudos terapêuticos fôssem de considerável interesse, outros pesquisadores preocuparamse mais com as condições em que se podiam produzir rea­ ções psicológicas anormais. E stas experiências, menciona­ das como estudos de neuroses experimentais, pareciam real­ mente fechar o círculo e levar de volta às conclusões te ra ­ pêuticas tiradas por Jones, Provàvelmente a prim eira dessas experiências foi realiza­ da por Pavlov e seus colegas (1927), que começaram en­ sinando um de seus cães experim entais a distinguir entre um círculo e uma elipse como sinal de alimento; quando se m ostrava o círculo, o animal podia esperar comida, mas ne­ nhum alimento se seguia à apresentação de uma elipse, A fase seguinte foi modificar gradualm ente a form a da elipse, de modo que começasse a parecer um círculo, tornando assim cada vez mais difícil p ara o cão determ inar se esse era ou não o sinal para obtenção de comida. Em uma fase crítica nesta p arte da experiência o cão, presumivelmente quando não mais capaz de distinguir entre os estímulos mostrados, parecia sofrer uma espécie de colapso no qual se tornava intensam ente emocional, mordia, debatia-se nas correias que o prendiam e uivava. Em seguida parecia desenvolver-se um mêdo da situação total e o cão tornava-se

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“neurótico” sempre que colocado na situação de teste. Pa­ recia que se provocava "neurose” quando numa situação que envolvia tarefa excessivamente difícil de realizar a re­ compensa dependia de resultado bem sucedido(*). Experiências semelhantes foram realizadas também por Liddell (1944), desta vez com o emprêgo de carneiros. Os animais foram obrigados a fazer discriminações difíceis en­ tre os sinais de “choque” e “não choque”. Colapso emocio­ nal ou neurose experimental também caracterizou esta si­ tuação de conflito, mas Liddell conseguiu acrescentar úteis informações. Importante observação foi a de poder ser muito duradoura a neurose assim criada, pois, mesmo após permanecer ausente do laboratório durante meses, o animal imediatamente mostrava sinais de reação emocional quan­ do levado de volta; contudo a neurose parecia específica da situação de laboratório porque a saída dêste restabele­ cia comportamento normal.

F i g u r a 3. Situação de Conflito de Maier. O rato, sôbre a plataforma, antes de saltar precisa escolher entre as duas portas (O e + ) , A escolha correta é recompensada e os erros são punidos.

(* ) Experiências semelhantes indicaram que o desenvolvimento ou não de neurose experimental dependia do temperamento do animal estudado.

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Alguns anos mais tarde (1949) Maier publicou seu pró­ prio relato (*) sôbre neurose experim ental resultante de conflito, tendo usado neste caso ratos brancos como synimais experimentais. Neste estudo a situação de conflito consistia em forçar o animal a saltar de uma alta plataform a para obter acesso através de uma ou outra de duas portas. Se o animal escolhia corretam ente, a porta se abria e êle podia en trar com segurança, sem se m achucar; por outro lado, uma escolha incorreta geralmente resultava em doloroso con­ tato com uma porta firm em ente fechada e uma queda de vários decímetros até uma rêde. Animais relutantes podiam ser induzidos a saltar da plataform a por meio de choques elétricos. O resultado foi tam bém colapso, às vezes envol­ vendo excitabilidade intensificada e, em outro estádio, uma espécie de estado estuporoso no qual o pesquisador podia moldar o rato inerte em várias posturas. Surge naturalm ente a questão de saber se as reações des­ critas nesses animais — cães, carneiros ou ratos brancos — são em qualquer sentido semelhantes à neurose humana. Existem claram ente diferenças reais que parecem caracteri­ zar a reação neurótica humana, mas pelo menos há indícios de que conflito extremo, em tôdas as espécies, envolve es­ tados emocionais anormais e que talvez algo nesse sentido se possa aprender com o tipo de experiências descrito. Contudo, até então os estudos não se interessaram pelas condições em que pudessem restabelecer-se reações normais, cabendo a M asserman (1943) d ar mais êsse passo. Èle o fêz criando neuroses experim entais em gatos, ainda pela tra ­ dicional situação de conflito, e depois usando como meio de terapia técnicas muito semelhantes ao método de condicio­ namento direto, que Jones considerara bem sucedido em pa­ cientes humanos. M asserman prim eiro treinou seus gatos, conservados em gaiolas especiais, para que, apertando uma alavanca, acionassem uma campainha, ao que se seguia a en­ trega de alimento na gaiola. Depois de aprender a fazer isso, os gatos foram sujeitos a violentas e repentinas lu­ fadas de a r no momento em que comiam o alimento, pro(* ) MAIER, N. R. F. (1 9 4 9 ), Frustration: W ithout a Goál, McGraw-Hill, Nova York.

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A Study of B eh a m o u s

duzindo-se assim fortes reações de medo. Como resultado do processo os animais recusaram alimento, mesmo quando extremamente esfomeados, e êsse resultado parecia refletir a enorme potência da “ansiedade”, capaz de bloquear efeti­ vamente uma necessidade tão básica.

Testaram -se então dois tratam entos principais. Prim eiro M asserman tentou forçar os animais a aproxim arem -se do alimento que desejavam evitar. E sta form a de tratam ento pela compulsão parecia, entretanto, assemelhar-se a méto­ dos empregados em outros estudos já mencionados e mos­ trou-se igualmente ineficaz. Êxito muito maior se obteve tentando criar um estado emocional que atuasse contra a ansiedade, o que se conseguiu alisando e acariciando os ani­ mais, dando-lhes comida na mão e depois gradualm ente induzindo-os a comer enquanto ainda estavam na gaiola. É consideràvelmente significativo te r o pesquisador descober­ to que era preciso executar o processo de retreinam ento de m aneira cuidadosa e sem pressa; caso contrário, o animal se tornava de nôvo emocionalmente instável e medroso. Assim, os dois. princípios de “pouco a pouco” e “estado contra-ativo” pareciam produzir os mesmos resultados favorá­ veis observados em estudos anteriores. O terreno estava agora preparado p ara as experiências realizadas por Wolpe (1958). Acrescentou êle im portante ingrediente à situação; acentuou que, embora outros estu­ dos sôbre neurose experim ental presumissem que o conflito era a condição necessária, a estimulação nociva repetida po­ dia, por si só, produzir resultados igualmente im pressionan­ tes. Sua técnica consistia em colocar gatos numa gaiola especial onde, depois de um sinal de advertência, eram su­ jeitos a fortes choques elétricos. Êste tratam ento produzia as esperadas reações emocionais poderosas, nas quais os ani­ mais trem iam , uivavam, bufavam, agachavam-se e apresen­ tavam outras manifestações de agitação. Essas reações logo pareciam estabilizar-se e ocorriam sem­ pre que o animal era colocado na gaiola. Apresentavam também pouca ou nenhum a redução em certo período de tempo e, enquanto na gaiola, os animais recusavam comer mesmo depois de vários dias de privação de alimento. Como

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Masserman, Wolpe descobriu que repetida exposição a esta situação parecia contribuir p ara reduzir a reação neurótica, embora não mais se aplicassem choques elétricos na „gaiola; parecia que êsse mêdo aprendido à situação adquirira certo grau de permanência. Contudo, obteve-se êxito empregando a técnica, sugerida por M asserman e outros, de usar alimento para combater a ansiedade sofrida pelo animal e só gradualm ente se apro­ xim ar da situação em que surgia maior mêdo (a gaiola). Primeiro, o alimento era oferecido numa sala fora do labo­ ratório experimental, onde o nível de ansiedade do animal era tão baixo que não inibia a alimentação; depois, por es­ tádios graduais e fáceis, o animal era alimentado a distân­ cias menores da gaiola até que pudesse finalm ente comer o alimento dentro da própria gaiola. Wolpe indica êste processo como demonstração de que existia antagonismo recíproco entre alimentação e ansieda­ de; quando esta era forte demais (na gaiola), a alimenta­ ção era inibida; quando a ansiedade era pequena (em uma sala fora do laboratório experim ental) a alimentação po­ dia inibir a ansiedade. Observava-se uma ou o utra reação, alimentação ou ansiedade, dependendo de qual fôsse a mais forte. Êste argum ento levou Wolpe a form ular seu princí­ pio geral de “inibição recíproca”. Em essência, êste prin­ cípio declara que, embora a ansiedade possa ser evocada pela presença de certos sinais ou estímulos, tal reação não é inevitável e talvez seja possível, nessas circunstâncias, pro­ vocar um comportamento absolutamente incompatível com ansiedade, isto é, que não pode ocorrer ao mesmo tempo que ela. Se pudermos provocar deliberadamente tais reações incompatíveis quando estão presentes sugestões de ansieda­ de, enfraquecer-se-á a associação entre tais sugestões e a reação de ansiedade. Portanto, de acôrdo com êste ponto de vista, nossa tarefa é atacar a conexão ou associação entre certas sugestões (ele­ vadores, ruas movimentadas, espaços confinados, gaiolas etc.) e a ansiedade que elas produzem. Podemos conseguilo criando de m aneira deliberada um estado de ansiedade de todo diferente e oposto, enquanto aquelas sugestões es­ 4

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tão presentes. Dessa m aneira, novas associações de fato substituem associações antigas — estamos treinando p ara sen­ tir-nos “não ansiosos” numa situação que antes nos fazia sentir mêdo. De acôrdo com Wolpe e outras fontes de pro­ vas, a alimentação é uma dessas reações incompatíveis com a presença de ansiedade; o mesmo acontece com um estado de profunda relaxação muscular e, como veremos mais tarde, ainda com outras alternativas. Todavia, existe nesse “tratam ento” um aspecto essencial, ainda não explicado. O êxito na eliminação das “reações neuróticas” de animais parecia envolver gradual aproximação da principal situação de ansiedade, em lugar de grande con­ frontação com ela. Podemos imaginá-lo desta maneira. A ansiedade é reação de tal modo poderosa que, como mostrou o estudo de Masserman, chega a suprim ir fortes impulsos biológicos. De fato, pode apresentar-se tão avassaladoramente poderosa que se torne difícil ou impossível inibi-la. De nada adianta querer provocar um estado de relação, fazer com que o paciente tome alimento ou evocar qualquer outra reação capaz de bloquear a ansiedade, se esta últim a tiver atingido certos níveis crí­ ticos. A solução consiste, como vimos, em lidar com a ansie­ dade um pouco de cada vez, começando com situações nas quais só estejam presentes pequenas quantidades e inibir re­ ciprocamente estas, depois prosseguir por estádios fáceis p ara elim inar mais da ansiedade total. Se, por exemplo, im aginar­ mos que a situação A produz 100 unidades de ansiedade e nossa reação de alimentação tenha um valor total de apenas 15 unidades, então na situação A a ansiedade sufocará clara­ mente a reação alim entar. Se nos aproxim armos da situa­ ção A em estádios, cada passo abrangendo apenas 10 unidades de ansiedade, então em cada passo poderão potencialmente ocorrer reações de alimentação; aqui a alimentação (valor 15) inibirá reciprocamente a ansiedade (valor 10). Depois de inibir as 10 prim eiras unidades de ansiedade poderemos passar a fazer o mesmo com as 10 unidades seguintes e assim por diante, até term os lidado com todas as 100 unidades. Êste é um trabalho de matem ática um tanto arbitrário, mas serve pelo menos p ara ilu strar a espécie de explicação ofere­ 42

cida pelo terapeuta de comportamento p ara o êxito dêste método. O princípio de “inibição recíproca” de Wolpe constitui a base do tratam ento hoje conhecido como “dessensibilização sistem ática”, que é, no momento, a técnica de terap ia de comportamento empregada com mais freqüência p ara lidar com sintomas acompanhados por ansiedade (por exemplo, fo­ bias). Sendo técnica muito im portante, dedicaremos parte substancial dêste livro a cuidadoso exame do que nela está envolvido, tanto em termos de questões práticas como de ques­ tões teóricas. Todavia, voltaremos agora a atenção p ara um desenvolvimento algo diferente que ocorreu mais ou menos no mesmo período. Já dissemos que, embora os hábitos de aprendizagem sigam geralmente o padrão que o senso comum manda esperar, há ocasiões em que tal não acontece. Exemplo disso foi obser­ vado por Pavlov, que relatou como um comportamento podia, ainda que continuamente recompensado, m ostrar sinais de en­ fraquecimento; isto parecia acontecer quando se fazia ocor­ rer o comportamento m uitas vêzes em rápida sucessão. E ra como se o comportamento ou reação ficasse cansado, poden­ do o enfraquecimento ser perm anente ou pelo menos semipermanente. Acredita-se geralmente que W akeham (1928) tenha sido um dos prim eiros a fazer uso terapêutico dêste método de reduzir a ocorrência de comportamento não desejado. Acon­ tece que êle ficou irritado por certos erros em que incidia re­ petidamente quando executava ao piano a Toccata e Fuga em Ré Menor de Each e se dedicou à ta re fa de eliminá-los. Seu método consistiu em praticar os erros deliberada e conscien­ temente m uitas vêzes. Ao fim de uma quinzena de dedicado esforço constatou que era capaz de fazer uma interpretação Bem erros. Aplicação mais séria do princípio de prática negativa (como veio a cham ar-se) foi feita por Dunlap (1928 e 1932), atribuindo-se-lhe geralmente o m érito de haver apresentado a prim eira exposição sistem ática do método. Sua utilidade nas mãos de Dunlap parecia quase ilimitada, pois êle relatou êxito no tratam ento e eliminação de vários distúrbios, entre 43

os quais gagueira, hábito de chupar o dedo e até mesmo ho­ mossexualidade. A pesar dessas afirmações, poucos outros pareceram impressionar-se a ponto de em pregar também o método. Quando faziam algum uso da prática negativa, pa­ recia que geralmente a consideravam mais adequada p ara lidar com dificuldades motoras — como erros de datilografia — do que com fenômenos neuróticos complexos. O próprio Dunlap apresentou três possíveis explicações p ara os resulta­ dos da prática negativa, chamando-as de hipóteses alfa, beta e gama. Contudo, em resultado de trabalho realizado por pesquisadores posteriores, os terapeutas de comportamento parecem encarar mais favoravelmente a noção de “inibição intrínseca” como explicação mais plausível dêsse efeito. E sta noção, derivada dos escritos de Clark Hull (1943), sugere que é a manipulação de “estados de impulso” que constitui a base da prática negativa. Em resumo, o argum ento con­ siste em que certos tipos de comportamento persistem — isto é, tornam -se hábitos — simplesmente porque levam à redu­ ção de impulsos (necessidades compulsivas) do organism o; assim, um determinado hábito pode tornar-se fixo porque re­ duz um estado (impulso) de fome, outro porque consegue di­ m inuir um estado de tensão sexual etc. Até dado limite, quan­ to m aior a freqüência com que se consegue a redução de im­ pulso por meio de determ inada reação, mais forte e mais fixa esta se torna. Todavia, as situações podem envolver mais de uma espécie de estado de impulso e, em certas ocasiões, os estados de im­ pulso em questão podem atu ar de m aneiras absolutamente opostas. Atividade repetitiva pode, depois de algum tempo, ser acompanhada por um impulso (forte necessidade) de ces­ sar a atividade, e a reação pode deixar de ser compensadora e agradável, passando a produzir desgosto e fadiga. Neste caso muda a natureza da associação entre a ação e o impulso, ou estado de necessidade; a cessação da atividade torna-se então redutora de impulso — que é, de acôrdo com Hull, p re­ cisamente a condição que favorece aprendizagem nova. Neste caso, deixar de fazer o que quer que seja dá como resultado a redução de fadiga. E sta argumentação talvez se torne mais 44

clara com um exemplo prático oferecido por Yates (1958) em seu tratam ento de uma môça com tiques múltiplos. Yates começou sugerindo que os tiques e a espécie mo­ vimentos nêles envolvidos talvez tivessem persistido porque conseguiam reduzir em parte a ansiedade, que sustentava ser um estado de impulso. A môça de fato localizara o início de seus tiques numa ocasião em que, aos 15 anos, ficara muito am edrontada pelo processo de ser anestesiada. Sentira que ia sufocar-se e liitara ferozmente para escapar da situação, parecendo que êsses movimentos de fuga foram preservados em seus tiques. O tratam ento consistiu em prolongadas sessões nas quais a paciente reproduzia voluntariam ente seus tiques (êles comumente eram involuntários e fugiam-lhe ao controle), rea­ lizando-se tal prática duas vêzes por dia. Ao térm ino dessas sessões atingia-se um estado no qual a paciente se mostrava absolutamente incapaz de produzir um único tique; form arase um nôvo estado de inibição de tiques. N aturalm ente, ao mesmo tempo havia um forte estado de impulso de p arar de fazer tiques, o qual era reduzido permitindo-se que a môça descansasse de seus esforços de produzir mais tiques. Isto significa efetivam ente que um estado de impulso se vai. redu­ zindo na presença da ação de “ não fazer tique” e, de acôrdo com a teoria de Hull, isto levaria ao fortalecimento do há­ bito de “não fazer tique”. Sem dúvida, os resultados deste tratam ento pareciam de acôrdo com a teoria; os tiques tr a ­ tados diminuíam consideràvelmente de freqüência e, quanto maior era a prática, maior o impacto sôbre os tiques. Todavia, o quadro não era inteiram ente encorajador do ponto de vista da paciente. Em bora nesse estádio ela já ti­ vesse recebido 315 sessões de intensiva “prática de tiques”, nenhum dêles desapareceu completamente. Além disso, en­ quanto alguns de seus tiques involuntários haviam apresenta­ do grande redução, outros apresentavam pouca ou nenhuma modificação com a terapia. A mesma paciente foi mais tard e atendida por Jones (1960), que continuou o tratam ento e conseguiu produzir um pouco mais de redução na freqüência dos tiques, mas desco­ briu que parecia haver um estádio além do qual todo nòvo

progresso era efetivam ente barrado. Os resultados parecem, portanto, criar interessantes e intrigantes problemas práticos e teóricos. Por que alguns tiques reagiram bem a êsse tipo de terapia e outros não? Por que o progresso cessava em estádio bem anterior à recuperação completa? Voltemos agora a atenção para uma terceira corrente p rin­ cipal no desenvolvimento da terapia de com portam ento: a do condicionamento aversivo. Embora a punição ou ameaça dela tenha desempenhado papel significativo na história do homem como meio de influenciar o comportamento, o interesse ini­ cial da psicologia científica centralizou-se nas mudanças comportam entais que se podiam produzir e não nos meios pelos quais podíamos efetuá-las. Nas experiências pavlovianas, por exemplo, o choque elétrico era simplesmente um meio de fazer o animal erguer a pata, para que êste movimento pu­ desse ser condicionado a algum outro estímulo, por exem­ plo, uma campainha. E sta ênfase nos aspectos acadêmicos e teóricos, e não nos práticos e aplicados da punição, teve sem dúvida a maior significação e foi a principal influência sôbre a espécie de trabalho realizado. Isto não quer dizer que algum as das questões teóricas fôssem irrelevantes a con­ siderações práticas; de fato, aconteceu exatam ente o contrá­ rio em muitas experiências e pode-se dizer que ainda não começamos a explicar e aplicar em terapia a espécie de pen­ samento refinado a respeito de punição que essas experiên­ cias poderiam proporcionar. Típico do gênero de trabalho realizado foi a tentativa de Schlosberg (1934) de com parar os efeitos de punição evitá­ vel e inevitável. Neste estudo, aplicava-se choque elétrico à cauda de ratos brancos, alguns dos quais podiam escapar do choque encolhendo a cauda, enquanto outros não podiam fazê-lo. No decorrer dêsse estudo êle não descobriu diferen­ ças entre as duas espécies de treinam ento, mas em estudo posterior (1936) relatou que a aprendizagem era mais rápida quando empregava choque inevitável, ao passo que parecia mais duradoura quando o animal escapava ao treinam ento. P or outro lado, Brogden e colegas (1938) encontraram enor­ me superioridade no treinam ento de fuga em cobaias, tanto em rapidez de aprendizagem quanto em sua sobrevivência. 46

No caso desta controvérsia particular talvez a prova seja melhor sintetizada por Solomon e Brush (1956). O pêso da prova, dizem êles, é substancialmente em favor do treinam en­ to de evitação ou fuga como produtor de aprendizagem mais rápida e atuação mais duradoura; por outro lado, a punição inevitável parece geralmente resultar em intensificação de an­ siedade e emoção. Se levarmos a sério essas conclusões, não teremos dúvida de que, se vamos usar na terap ia o trein a­ mento aversivo, as tentativas de ensinar uma nova reação envolverão o emprego de condições de fu g a ; mas, naturalm en­ te, podemos achar que em certas condições um estado de emocionalidade e ansiedade intensificadas poderia te r considerá­ vel valor terapêutico, justificando o uso de punição inevitá­ vel como p arte de nosso plano geral de tratam ento. Técnicas de condicionamento com o emprego de incentivos negativos (punição) conseguiram sem dúvida causar algum impacto no campo aplicado. No diagnóstico, por exemplo, Upton (1929) e Aldrich (1928) investigaram a utilidade dêste método na avaliação de lim iares sensoriais. A técnica con­ sistia na produção de algum comportamento por meio de estímulo doloroso associado a algum outro estímulo de inte­ resse diagnóstico. Se êste outro estímulo fôsse capaz de provocar o comportamento (isto é, se a reação se tornasse condicionada), podiam tirar-se certas conclusões de valor diagnóstico. Por exemplo, Aldrich relatou que a audição de bebês podia ser testada por êste meio, sendo os estímulos nes­ te caso auditivo condicionados a alguma reação comportam ental; se não se form a a associação, é possível naturalm en­ te que a criança seja completa ou parcialm ente surda ou que o condicionamento não tenha ocorrido, por outras razões. Provavelmente as prim eiras tentativas sistem áticas de usar condicionamento aversivo relacionaram-se com o tratam ento de alcoolismo. Êste trabalho e a metodologia utilizada per­ maneceram virtualm ente inalterados desde a década de 1920 até o presente, embora, como acentua Franks (1960), sejam comuns as dificuldades metodológicas e processuais nos re­ latórios publicados. Um terapeuta (ver Franks, 1960) che­ gou a preconizar que, no tratam ento de alcoólatras pelo con­ dicionamento, só se desse o álcool depois da produção de um 47

estado aversivo, isto é, o álcool só fôsse oferecido após o pa­ ciente estar nauseado. É n atural que esta seqüência seja exatam ente o oposto do que deveria ser p ara assegurar con­ dicionamento efetivo; o álcool deveria preceder o estado aver­ sivo por um prazo muito pequeno, mas crucial. A ignorân­ cia fundam ental e séria dos mais básicos princípios de con­ dicionamento e aprendizagem talvez tenha contribuído, e talvez ainda contribua, p ara alguns dos malogros da terapia de comportamento. Talvez a falta de refinam ento que ca­ racterizou o emprego inicial da terapia aversiva também te ­ nha servido para lim itar-lhe o uso. Uma extensão inicial e isolada da técnica aversiva apresen­ ta im portância histórica. Em breve relatório, Max (1935) indicou que a aplicação de choque elétrico na presença de um objeto obsedante podia produzir persistente reação de fuga em relação a êle. A aplicação de tais processos a desvio de comportamento sexual iniciou-se com êste trabalho; tais es­ tudos são atualmente muito difundidos e serão exemplifica­ dos em capítulo posterior. Isto efetivamente conclui a história da terapia de compor­ tam ento antes da guerra (com alguns acréscimos de pós-guer­ ra ), um período de cêrca de 20 anos no qual se vislum bra­ ram os princípios de uma nova abordagem da compreensão e do tratam ento de distúrbios psicológicos, mas que não fo­ ram efetivamente entendidos. Coube a um repentino e pode­ roso surto de interesse nos anos de pós-guerra dar à terapia de comportamento a espécie de impulso de que precisava. E sta história, embora curta, parece apontar certas conclusões im portantes. Antes de tudo, poderíamos dizer que o interesse pela apren­ dizagem foi e continua sendo prim ordialm ente acadêmico. Grande ênfase se deu e ainda se dá a questões teóricas, des­ cobertas experimentais discrepantes e procura de um modêlo mais satisfatório p ara explicar o comportamento humano — do que podemos concluir que os fatos e as teorias até agora existentes ainda estão muito longe de oferecer expli­ cação adequada dos motivos do comportamento das pessoas. Nossa segunda conclusão seria a de podermos distinguir a 48

presença de três tipos principais de tratam ento psicológico que pretendem derivar-se de teorias da aprendizagem : o tr a ­ tamento de inibição recíproca, a terapia de prática negativa e o condicionamento aversivo. Nossa terceira conclusão pro­ vavelmente seria que, examinadas mais de perto, nenhuma dessas form as de terapia parece dever muito às fontes a que são atribuídas. Por exemplo, além do emprego do têrmo “condicionamento”, o prim eiro uso relatado da terapia de ini­ bição recíproca por Jones (1924) não pareceu ter raízes pro­ fundas na teoria pavloviana de experimentação. O mesmo se poderia dizer dos outros tratam entos que parecem trazer a marca de justificação teórica post hoc em lugar do sêlo de métodos baseados em cuidadosa atenção a qualquer corpo existente de teoria e fato. P or fim, provavelmente concluíríamos que esses prim eiros estudos pioneiros sôbre tratam en­ to foram essencialmente toscos e singelos, tanto que é sur­ preendente que se tenham obtido resultados positivos. Ainda assim, êsses esforços, embora grosseiros e forçados, form a­ ram o terreno necessário p ara o prolixo crescimento da te­ rapia de comportamento nos anos de pós-guerra, o qual criou tão revolucionária transform ação de pensamento no campo dos distúrbios psicológicos.

CAPÍTULO

III

Preliminares do Tratamento

A SRa. R. d isten d e-se, reclinada em sua confortável poltrona. A seu lado há um toca-discos do qual saem os acordes de sua peça musical favorita. À distância de um metro da poltrona há uma mesinha onde repousa grande vaso de vidro com ro­ busto e vivo espécime da aranha doméstica britânica. Os aspectos quase de ópera cômica dessa situação são ignorados pelos participantes, pelo terapeuta e pela paciente; esta cena é apenas uma das muitas no tratamento da fobia da sra. R. por aranhas. O mêdo parecia ter-se originado num único episódio traum ático que a sra. R. experimentou quando menina. N a­ quela época, seu pai, qua passava grande p arte do tempo no exterior, voltou para casa e, depois dos habituais cum pri­ mentos preliminares, passou a tira r os objetos de uma caixa na sala de estar, onde os membros da fam ília estavam reu­ nidos para receber presentes. De súbito e inesperadamente, uma grande e ativa aranha tropical saiu do meio dos paco­ tes e, depois de m uita consternação, confusão e inúm eras ten­ tativas de matá-la, fugiu p ara nunca mais ser vista. 50

0 mêdo experimentado pela sra. R. quando viu esta cena foi intenso e sua ansiedade foi provavelmente m antida por algum tempo depois, uma vez que as pessoas da casa„continuaram a procurar o que pensavam pudesse ser um animal de picada fatal. Parecia tam bém que em vez de dim inuir com o passar dos anos, sua ansiedade de fato aum entara a cada nova “experiência de aran h a”, por mais inofensiva que fôsse, e atingira uma fase em que às vêzes era incapacitadora. Alguns dos problemas assim criados representavam mero es­ torvo, como sua incapacidade de v iajar para o exterior (de mêdo de encontrar aranhas maiores) e sua falta de inclinação pelo campismo (form a de passeio em feriados apreciada por seu m arido). Mais séria, de seu ponto de vista, era a g ran ­ de dificuldade que tinha em executar trabalhos domésticos comuns; numerosas peças do mobiliário poderiam fàcilmente ocultar uma aranha que apareceria se o móvel fôsse tirado do lugar ou limpado. É evidente que lidar com um problema dessa espécie pode ser muito simples; por outro lado é bem possível que a per­ turbação tivesse implicações mai3 sinistras, embora não re­ veladas. O necessário, naturalm ente, é minuciosa investiga­ ção sôbre as origens, o desenvolvimento e o estado presente dêste problema e de todos os outros que possam ou não relacionar-se com êle. Neste caso, a investigação revelou que a fobia, ou mêdo, de aranhas era completamente isolada e desacompanhada de qualquer o utra anormalidade localizável, sendo possível efetuar seu tratam ento pelo princípio de ini­ bição recíproca. N aturalm ente, p ara isso ainda era preciso que tivéssemos alguma inform ação básica sôbre seu mêdo; primeiro, que atributos das aranhas poderiam ser usados e manipulados p ara executar a p arte “pouco a pouco” da te ra­ pia e, segundo, que espécie de reação incompatível com an­ siedade poderíamos ten tar obter. Ambos êsses itens de infor­ mação foram fàcilmente obtidos dessa mulher inteligente, ponderada e cooperativa. Verificou-se que certas características das aranhas eram consideradas mais am edrontadoras do que outras; negrura, pilosidade, tam anho, grau de atividade e proximidade. Uma aranha grande, preta, peluda e muito ativa sôbre aquela mu51

Iher podia ser a coisa mais am edrontadora que ela fôsse capaz de im aginar, ao passo que, em contraste, uma aranha pequena morta, de cor clara e sem pêlos, a uma distância de um metro, causava pouca ansiedade. Evidentemente, procurando com diligência, encontram-se espécimes de aranhas que variam ao longo de toda a escala, desde as menos até as mais amedrontadoras. A prim eira ta re fa foi o simples trabalho prático de fazer isso. A reação incompatível foi igualmente fácil de de­ term inar, pois a paciente pôde dizer que peça musical tinha para ela associação especialmente agradável e conseguia sem­ pre provocar disposição calma e relaxante. Na medida em que ela estivesse certa a êsse respeito, poderíamos tocar essa peça musical e saber que os sentimentos por ela provocados seriam capazes de suprim ir ou bloquear uma pequena quan­ tidade de ansiedade. De fato, o resultado do tratam ento dessa mulher foi intei­ ram ente bem sucedido. Utilizando a música como meio de inibir a ansiedade que comumente experim entaria na presen­ ça de “sugestões de aran h a”, ela fêz logo rápido progresso e no final podia deixar que grandes aranhas domésticas su­ bissem e descessem livremente por seus braços — sem música. Parece provável que existam muitos casos assim simples na população em geral. Freqüentem ente tais casos foram no passado tratados sem sim patia (sendo o comportamento con­ siderado como “bobagem” ou “fingim ento” ) ou se mostrou irresistível a tendência a oferecer interpretações indecentes ou im pertinentes para o sintoma. Em geral os indivíduos nessa infortunada posição tentavam ocultar seu medo “absur­ do” e desenvolviam tôda espécie de estratagem as para evitar en trar em contato com o objeto temido. Mas naturalm ente nem todos os casos são tão diretos e com freqüência os sin­ tomas prejudicam mais seriam ente a vida do indivíduo. A pergunta a que precisamos responder refere-se, por isso, às espécies de idéias, atitudes e indagações que o terapeuta de comportamento considera apropriadas ao deparar êsses pro­ blemas mais difíceis, geralmente classificados como “neuró­ ticos”. Deve-se acentuar que é êrro cardeal m ergulhar na 52

terapia sem nada além de investigação muito superficial; a aparente simplicidade de um caso pode m uitas vezes ser ilu­ sória e levar a êrro sério. ~ Podemos portanto perguntar que pontos de interrogação específicos devemos abranger. Prim eiro, devemo^ sentir que temos completo conhecimento da natureza da doença do pa­ ciente e, ao fazer essa investigação, devemos perceber que m uitas vêzes o paciente pode encontrar dificuldade para or­ ganizar seu pensamento de m aneira que a situação fique clara para o terapeuta. Além disso, em certas ocasiões o pacien­ te pode realmente não saber quais as suas dificuldades ou, em razão de culpa, vergonha etc., pode não estar disposto a relatar mais do que pequena p arte de sua história. Por essas razões é naturalm ente preferível obter tais informações de parentes e amigos, com a permissão do paciente. É também m uitas vêzes útil exam inar a natureza das dificuldades n ar­ radas de m aneira muito simples e direta, se possível; obser­ vando as reações do paciente a algum objeto ou situação de que diga te r mêdo pode-se aprender muito sobre a fôrça e a qualidade da reação, assim como obter outras informações úteis. É também im portante, por várias razões, realizar o inter­ rogatório intensivamente, p ara que não permaneçam áreas de dúvida ou falta de clareza sôbre as dificuldades do paciente. Às vêzes a informação pode su rg ir de m aneira divertida e espontânea, como exemplifica um caso da experiência do pró­ prio autor. D urante uma entrevista prelim inar na qual a pa­ ciente negava repetidam ente ter qualquer dificuldade ou pro­ blema além daquele de que se queixava, o terapeuta pediu-lhe que telefonasse para tra ta r de certo assunto alguns dias de­ pois. E sta sugestão foi im ediatamente rejeitada pela pa­ ciente, que disse que, não tendo telefone em casa e ficando aterrorizada ao usar uma cabina de telefone público, nunca poderia fazê-lo. É desnecessário dizer que vários outros pro­ blemas vieram à luz no devido tempo, mas neste caso a pa­ ciente simplesmente não considerava êsses outros mêdos dig­ nos da atenção do terapeuta — afinal, tinha-os fazia tantos anos! Às vêzes, em tais casos, é valioso: estimular a memória do paciente recitando uma lista de problemas comuns que 53

possam ou não conter suas próprias dificuldades — uma des­ sas listas foi compilada por Wolpe (1966) — mas, evidente­ mente, não se pode confiar apenas nessa espécie de estímulo. De m aneira geral é útil estender a investigação além do âmbito evidente das dificuldades apresentadas pelo paciente. Uma história muito pormenorizada da vida do paciente pode às vêzes ajudar a colocar na perspectiva apropriada o pro­ blema do tratam ento, e aqui tam bém a coleta de informações pode centralizar-se em um ou outro dos moldes padronizados existentes para m ontar os fatos relevantes. O presente merece, naturalm ente, ta n ta ou mais ênfase do que o passado, e informações sôbre a posição social atual do paciente, suas circunstâncias e suas dificuldades fornecem dados valiosos sôbre os quais basear o tratam ento e o prog­ nóstico. A êste respeito, alguns terapeutas de comportamen­ to dem onstram preferência pelo emprêgo de testes psicoló­ gicos, argumentando que o conhecimento dos resultados de certos testes é extrem am ente útil. A opinião do autor é que pouco ou nada se obtém do emprêgo de testes psicológicos formais, embora em algumas ocasiões certas informações ti­ radas dêles possam ter implicações gerais potencialmente úteis; seria, naturalm ente, valioso saber se, caso a ansiedade tenha atingido certos níveis críticos, um condicionamento aversivo teria probabilidade de produzir piora em lugar de melhora no estado do paciente. Uma relação desta espécie foi sugerida pelo autor (Beech, 1960) em resultado do tr a ­ tamento de casos de cãibra dos escrivães por terapia de com­ portamento, havendo-se concluído dessa experiência que, quando a ansiedade é característica proeminente do proble­ ma, a terapia de inibição recíproca parece a mais promisso­ ra de tôdas as terapias de comportamento. Por quaisquer meios que cheguemos à nossa formulação geral dos problemas do paciente, mais cedo ou mais tarde somos obrigados a considerar a lista de anormalidades que pensamos merecer atenção. E stas estão com freqüência muito obviamente relacionadas; por exemplo, vários diferentes pro­ blemas podem surgir como um conjunto de situações especí­ ficas nas quais se experim entam vários graus de inferiorida­ de social ou nas quais diversos graus de “desacordo” cons­ 54

tituem o “tem a” unificador que liga essas sugestões à an­ siedade. Um paciente pode, naturalm ente, ter vários temas separados — que, de fato, significam vários mêdos inc^pendentes. M uitas vêzes é boa idéia exam inar com bastante cuidado as listas de anormalidades, dificuldades ou problemas, pois, tomados em conjunto, estes podem sugerir algum pro­ blema subjacente mais fundam ental que mereça a atenção indivisa do terapeuta. E sta possibilidade pode ser exempli­ ficada por um dos casos do próprio autor. O paciente, sr. W., foi encaminhado para tratam ento de sua cãibra dos escrivães e poderia te r sido tratad o só dêste problema. Contudo, notou-se que tinha uma leve gagueira que, como a cãibra dos escrivães, ocorria interm itente e (de acôrdo com o relato do paciente) muito misteriosamente. Sintomas interm itentes, como certos defeitos às vêzes encon­ trados em automóveis, são notoriam ente difíceis de rastrear. Neste caso particular decidiu-se que seria proveitosa um a in­ vestigação mais profunda. O im portante era saber se os dois sintomas tinham relação entre si e, em caso afirm ativo, qual o elo unificador entre êles. Descobriu-se, usando uma adapta­ ção da “Kelly Repertory G rid” (1955), que havia de fato estreita associação entre a cãibra dos escrivães e a gagueira, parecendo a natureza dêsse elo envolver as reações adversas do paciente a situações de “autoridade”. Estaríam os, pois, lidando não tanto com um paciente com dois males indepen­ dentes, mas com um paciente em quem êsses sintomas eram função de uma variável básica e im portante. Transpareceu dessas observações que, quanto mais im portante era a figura de autoridade com quem êle lidava, pior ficavam a gagueira e a cãibra; a ausência de figuras de autoridade inevitàvelmente levava a comportamento normal. É fácil ver por que o paciente pensava que seus sintomas tinham aparência variável! É im portante, porém, não confiar inteiram ente em resul­ tados obtidos por esse processo de “papel e lápis” que podem m uitas vêzes ser enganadores. Evidentemente preferiríam os nestas circunstâncias a prova confirm atória de uma experiên­ cia direta. Podemos presenciar o aparecimento e desapareci­ mento dos sintom as sob condições que os resultados de nossos 55

testes sugerem apropriadas? Tal experiência foi de fato rea­ lizada e cofisistiu simplesmente em pedir ao paciente que fa ­ lasse e escrevesse na presença de certos colegas do autor, es­ pecialmente selecionados como características de vários graus de “autoritarism o”. O resultado dêste teste crítico foi sa­ tisfatória confirmação do previsto; o observador permissivo não produzia anormalidade no paciente, enquanto mesmo o mais casual contato com uma pessoa au to ritária provocava os sintomas descritos. . Duas perguntas ocorrem naturalm ente a muitos daqueles que consideram êste caso. Em prim eiro lugar, é possível ou provável que Um paciente inteligente e perceptivo perm ane­ ça ignorando a sugestão crítica de sua ansiedade? Em se­ gundo lugar, não se revela' aqui um “complexo” da espécie que os terapeutas de comportamento tendem a rejeitar como irrelevante para o tratam ento eficaz de distúrbio neurótico? E stas perguntas são decerto im portantes e as respostas serão consideradas ém capítulo posterior, porém no momento sim­ plesmente diremos que êste exemplo deve servir de salutar lição. É possível -os pacientes permanecerem ignorantes da verdadeira natureza de suas dificuldades,,mesmo quando estas sejam evidentes p ara outros, ou ocultarem deliberadamente do terapeuta essas informações. N aturalm ente, a moral é que o terapeuta deve estar preparado p ara gastar tempo e energia a fim de chegar ao conhecimento dos problemas que lhe são apresentados. A terapia de comportamento, preten­ dendo que a rapidez de execução é uma de suas virtudes su­ premas, talvez se descuide muitas vêzes dêste aspecto dos problemas. A apreciação e a avaliação do paciente e de sua p ertu rb a­ ção precisam inevitavelmente considerar o impacto que o tratam ento pode ter sôbre ele e seu ambiente, òbviamente precisamos obter certeza de que identificamos tôdas as su­ gestões que na vida do paciente servem p ara provocar suas dificuldades e de que se tornou inofensiva cada uma dessas sugestões. Talvez igualmente óbvia é a necessidade de asse­ g u rar que no curso do tratam ento o paciente não seja repe­ tidam ente exposto à reaprendizagem de sua reação mal adapta tiv a ; seria, por exemplo, inútil tra ta r o paciente porque 56

tem mêdo de v iajar de trem se, dia após dia, êsse mêdo fôsse provocado nas tentativas que o paciente fizesse p ara ir tr a ­ balhar. Com freqüência impõem-se investigações muito cui­ dadosas sôbre a poâsibilidade de reaprendizagem e, á* luz do que se descobre, talvez seja mais prudente in tern ar o pa­ ciente em hospital a fim de evitar os perigos de reexposição muito precoce a sugestões de ansiedade; um ambiente hos­ pitalar controlado pode p erm itir ao terapeuta rápido início de tratam ento, ou talvez essa providência seja mesmo impe­ rativa. Alguns casos exigem a espécie de estrito e contínuo controle do am biente mencionado no estudo de Ayllon e Michael; será obviamente inútil ver o paciente uma ou duas vêzes e depois deixar que êle volte a um ambiente que siste­ maticamente inverte o treinamento. Contudo, o terapeuta deve exam inar outras possíveis con­ seqüências do tratam ento, sendo talvez uma das mais impor­ tantes a consideração de escoadouros alternativos p ara os impulsos e as energias do paciente. Tomemos, por exemplo, o tratam ento de perturbações das quais se obtém prazer ou alívio, como homossexualidade, alcoolismo e travestism o, Se decidirmos por um curso de condicionamento aversivo no qual possamos efetivam ente bloquear o prazer do paciente em tais atividades, deveremos considerar que se deixam ao paciente modos alternativos de comportamento. Será razoá­ vel, nas circunstâncias pessoais do paciente, esperar que o bloqueio das suas tendências alcoólicas descarregue n atural­ mente essas energias e tensões em ofícios manuais ou alguma outra form a de comportamento socialmente aceitável? Blo­ queando tais impulsos, não poderemos soltar algum outro te r­ rível monstro que afete não apenas o paciente, mas muitas outras pessoas? Êstes também são sérios problemas, natu­ ralm ente não peculiares p ara terapeutas de comportamento que tendam a ser “estreitos” em sua visão de distúrbio mental. Não é que devamos encarar como provável a chamada “substituição de sintom as” (substituição de um sintoma por outro, por não ter sido erradicada a causa real) ; de fato, as indicações sugerem que êsse não é um verdadeiro risco. O que estamos considerando é a extensão lógica de uma aborda5

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gem de aprendizado para a compreensão do comportamento hum ano; devemos sentir-nos responsáveis por ensinar ao ho­ mossexual uma reação heterossexual, nova e adaptativa, a fim de livrá-lo de seus velhos hábitos? Tudo que não seja o empenho num retreinam ento sistemático além do destreinamento pareceria descuido pelo bem-estar final do paciente. O processo p ara conseguir isso apresenta, naturalm ente, mui­ tos problemas práticos e éticos. Consideração relacionada com a que acabamos de mencio­ nar é se os benefícios que o tratam ento poderá conferir su­ perarão as novas dificuldades com que o paciente venha a defrontar. Tais considerações podem levar a uma política de mínima ou nenhuma interferência terapêutica, a menos que os efeitos dos sintomas sejam singularm ente dilacerados. Por exemplo, parece que o gago, quando se torna fluente, en­ contra problemas novos, inesperados e às vêzes mais sérios; geralm ente teve essa dificuldade a vida inteira e seus interes­ ses, atividades, amigos etc. foram organizados em torno do defeito. A eliminação dêste significa naturalm ente que o gago fica livre p ara dedicar-se a tôdas as form as de situações e atividades que antes evitava por ser gago; m udar o estilo de vida, pode ser infinitam ente mais difícil do que o proble­ ma de continuar gago. Cuidadosa atenção devemos dar também, durante o exame prelim inar do paciente, ao problema de motivação. Há vá­ rios aspectos em que isto é im portante, mas só um ou dois dêles serão aqui mencionados. Em prim eiro lugar, o te ra ­ peuta precisa considerar a motivação que serve p ara m anter a doença ou distúrbio — a situação em que o paciente se en­ contra recompensa-o efetivam ente de permanecer doente ? Se o problema envolve, por exemplo, o desejo de cham ar atenção, êste comportamento será mantido pelo ambiente do lar ou do local de trabalho do paciente, dando-lhe pouco ou nenhum incentivo para m udar? Ou sua atual motivação para ven­ cer as dificuldades é real e capaz de sustentá-lo durante o processo de terapia? O paciente deseja realm ente livrar-se de seus problemas, ou não? Os efeitos de tais problemas motivacionais talvez possam deduzir-se da tabela de resultados de tratam ento de homossexualidade oferecida por Freund 58

(1960) ; essa tabela m ostra que o tratam ento dos pacientes que o procuram por sua própria vontade dá em geral resul­ tados muito melhores do que aquêle a que são arrastados por uma instituição oficial, um parente ou outro agente externo. É naturalm ente difícil avaliar a motivação que um pacien­ te tem p ara vencer suas dificuldades e cooperar plenamente num regime de tratam ento destinado a conseguir êsse fim. Uma das melhores indicações aqui parece serem as expres­ sões iniciais do paciente sôbre o tratam ento. Grandes reser­ vas por êle expressadas em relação à possibilidade de recupe­ rar-se parecem ter relação com resultado muito ruim ; as ex­ pressões desta falta de motivação parecem v ariar desde sim­ ples pessimismo até ativa sabotagem do program a de tra ta ­ mento. Ainda não atingimos o estádio em que possamos com­ preender perfeitam ente êste problema e medir adequadamen­ te a motivação em suas implicações quanto ao resultado do tratam ento, porém Mowrer apresentou um ponto de vista sôbre o problema. A rgum enta êle que o comportamento neu­ rótico m uitas vêzes, ou mesmo quase sempre, envolve um malogro de “aprendizagem integrativa” ; isto simplesmente descreve situações nas quais a recompensa ou o ganho ime­ diato proporcionado pelo comportamento neurótico é de maior significação, enquanto os efeitos punitivos a longo prazo, por ser neurótico, ficam distantes demais para produzir altera­ ção ou modificação, consistindo pois a ta re fa do terapeuta em negar a influência de qualquer recompensa a curto prazo. Poder-se-ia com razão argum entar que existem ainda outros problemas motivacionais a enfrentar. Como, em alguns casos, é o paciente induzido a procurar tratam ento? Com muita freqüência a espôsa ou o m arido neurótico pode, segundo parece, recusar-se a reconhecer a im propriedade de seu com­ portam ento e os problemas que cria; de fato, pode muitas vêzes ser tão esperto que apresente boas razões p ara o “neuroticismo” de seu cônjuge! Em seu tra to prelim inar com o paciente o terapeuta pre­ cisa também considerar até que ponto vai em pregar “insight” (*) ou “conselho racional” . Wolpe, sem dúvida, se (* ) (N . R.).

Insisht, aqui, significa introvisão ou rápida compreensão global

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declara favorável à correção de falsas impressões e crenças deturpadas que o paciente possa ter em relação a si próprio e à sua doença, e desconfia-se que a maioria dos terapeutas de comportamento se entrega muito a êsse aspecto. Ofere­ cendo essa espécie de assistência durante as fases iniciais da investigação, o terapeuta pode acreditar que está prepa­ rando caminho para o “verdadeiro” tratam ento que virá mais tarde e que, esclarecendo o paciente sôbre mêdos e noções absurdas a respeito da sua doença, do tratam ento etc., dei­ xa-o livre para concentrar-se no processo de condicionamen­ to ou aprendizagem e beneficiar-se plenamente dêle. Geral­ mente o “insight” tem sido, porém, considerado como arm a muito mais potente na terapia e há indicações de sua eficácia em provocar modificações consideráveis no comportamento. Uma paciente do autor foi capaz de fazer substanciais alte­ rações em seu comportamento anormal quando se lhe deu “insight” dos mecanismos que causavam as dificuldades em questão. Neste caso bastou um vislumbre dêsses meca­ nismos p ara reduzir os sintomas psicossomáticos e perm itir que o indivíduo obtivesse êxito em tarefa na qual tinha ante­ riorm ente pronunciada história de malogro. Outro problema a cujo respeito o terapeuta precisa deci­ dir é o da relação que existirá entre êle e o paciente. Em psicoterapia essa relação geralmente tem lugar muito es­ pecial e papel muito im portante a desempenhar, e, p ara te­ rapeutas de comportamento como Wolpe, uma atitude caloro­ sa, confiante e simpática de sua parte pode aju d ar o pacien­ te a “desabafar” ou pode oferecer “esclarecimento ou tran qüilização”. Por outro lado, os terapeutas de comportamen­ to m uitas vêzes não dão ênfase a esta função particular da relação; encaram um bom contato com o paciente simples­ mente como um dos vários meios de que dispõem para redu­ zir ansiedade. Na terapia de inibição recíproca, por exem­ plo, cujo objetivo principal é apresentar os estímulos à an­ siedade e ao mesmo tempo inibir a reação de ansiedade, se o paciente confiar no terapeuta e sentir-se seguro e confiante em sua presença, êsses sentimentos evidentemente poderão ajudar a combater tôda a ansiedade que a situação comumente evocaria. 60

Dentro do âmbito desta atitude geralmente útil e tranqüilizadora, que todos os terapeutas provavelmente adotam vo­ luntária ou involuntàriamente, três form as específicas de conselho freqüentemente se dão ao paciente. A prim eira re­ fere-se à natureza de sua doença; a segunda envolve a apre­ sentação de algum relato de como o paciente veio a adquirir seu conjunto particular de dificuldades; e a terceira preten­ de conter as heróicas, mas inúteis, tentativas do paciente para enfrentar e vencer seus mêdos. Examinemos cada uma delas minuciosamente. Com m uita freqüência, em suas discussões com o terapeu­ ta, os pacientes indicam que estão indevidamente preocupa­ dos com a presença de anormalidades de comportamento. Seus problemas são encarados como mais do que empecilhos a uma existência plena e agradável, de fato como presságio de al­ guma condição mais terrível. Uma noção comum em condi­ ções relativam ente brandas de anormalidade é a idéia de que o paciente poderia, com o tempo, ficar completa e permanen­ temente insano; êle pode ter guardado essa idéia consigo, mas fica muito preocupado com ela, até finalm ente discuti-la com o terapeuta. Não é difícil tranqüilizar os pacientes mostrando-lhes que essa idéia é partilhada por numerosas pessoas que se preocupam indevidamente com doença de es­ pécie física, pensando, por exemplo, que um resfriado pode ser o temido precursor de algum a doença fatal. Às vêzes, naturalm ente, o paciente já tentou explicar suas dificuldades a outros, mas não conseguiu transm itir-lhes exatamente como se sentia; o resultado pode ser falta de compreensão e simpatia, retirad a de apoio, espanto e até mesmo hostili­ dade declarada. O alívio que o paciente obtém é devido p rin­ cipalmente a compreensão, tolerância e calma tranqüilização oferecidas pelo terapeuta, mas pode ser em p arte atribuído ao conforto derivado de desabafar-se de um segrêdo cuida­ dosamente guardado. Tudo isso inclui-se entre os efeitos não específicos da m aioria das form as de tratam ento. Igualm ente eficaz talvez seja a tendência, da parte do te­ rapeuta de comportamento, a explicar o comportamento do paciente. Wolpe acentua que muitos pacientes alimentam estranhas noções a respeito da origem de seus sintomas e 61

por essa especulação, ou pela leitura de relatos mais sinis­ tros de psicopatologia, conseguem assustar-se muito mais. A afirm ação do terapeuta (senão sua crença) de que o compor­ tam ento do paciente é inteiram ente explicável em têrmos de condicionamento pode fazer considerável diferença no nivel de ansiedade do último, especialmente quando acompanhada por garantias de que a tendência pode ser facilmente inver­ tida por princípios fáceis de entender. Contudo, deve-se acentuar aqui que, embora êsses métodos p ara atenuar a an­ siedade por meio de explicação e tranqüilização sejam em­ pregados por Wolpe, sua afirm ação é que ansiedade neuró­ tica só pode ser tratad a e eliminada pelo método de inibição recíproca. Êsse é um curioso estado de coisas, e fazer tal distinção implica que podemos diferenciar êsses dois tipos de ansiedade, um dos quais pode ser eliminado mediante “conversa” , enquanto o outro precisa ser extinguido por al­ gum outro processo. Além da distinção que consiste em cha­ má-los de tipos diferentes de ansiedade e sugerir que têm origens e desenvolvimento diversos, não existem reais e sa­ tisfatórios fundamentos p ara sua diferenciação; evidentemen­ te esta é no momento uma posição insatisfatória. Contudo, existe uma extensão desta espécie de explicação para a qual parece haver certa medida de apoio experimental e que por esta razão poderia ser de interesse especial. Descobriu-se que em geral o efeito da instrução sobre experiências de condi­ cionamento com pacientes humanos tem sido aum entar a ra ­ pidez com que ocorre a nova aprendizagem. Ê possível tam ­ bém que, até onde podemos generalizar do laboratório para situações de terapia, a instrução a respeito do caráter das reações desejadas do paciente facilite sua aquisição. C erta­ mente parece que vale a pena fazer essa presunção em mui­ tos casos, embora, como veremos numa seção posterior sôbre processos “operantes”, o efeito nem sempre seja o que dese­ jamos obter. Voltando ao terceiro tipo de tranqüilização recomendado por terapeutas de comportamento, m uitas vêzes deve parecer ao paciente, seus parentes e amigos que o conselho para não en fren tar os próprios mêdos simplesmente foge ao bom senso. Os padrões culturais ocidentais estão cheios de exortações 62

diretas p ara que a pessoa “seja homem”, “enfrente as coisas”, “se vire sozinho”. É claro que êsse conselho pode freqüente­ mente ser muito útil, mas seu valor no sentido de^perm itir que alguém vença intensa ansiedade é sem dúvida muito li­ mitado, como a experiência demonstrou. Em bora um pa­ ciente possa vir a reconhecer que não existe verdadeira vir­ tude em te n tar desafiar seus mêdos, êle é com m uita freqüên­ cia tentado a fazê-lo durante o curso de seu tratam ento a fim de “safar-se sozinho”. Em certas ocasiões, tal experiên­ cia pode ser proveitosa; mais geralm ente produz um recuo e é preciso incentivar fortem ente o paciente a não te n ta r essa espécie de prova. Além da descoberta de que um ataque gradual e convenientemente planejado contra o mêdo é mais eficaz, os pacientes provàvelmente se beneficiam da redução da culpa e vergonha que podem ser causadas por árduas, porém m alogradas investidas, e também pelo conhecimento de que estarão dando passos que ficarão bem dentro de sua capacidade. Finalmente, cabe aqui um breve comentário sôbre o lugar da responsabilidade moral na opinião de terapeutas de com­ portamento, no sentido especial de saber se o paciente deve ou não carreg ar certo pêso de culpa por sua condição. Os terapeutas de comportamento em sua maioria podem, pelo menos nesse aspecto, ser considerados como firm es aliados de F rc u d ; parecem ser em geral decididos “determ inistas psíquicos”, acreditando que as pessoas só podem comportar-se como as circunstâncias lhes permitem. Êste ponto de vista é claramente exposto por Wolpe, que acentua a necessidade de inform ar aos pacientes que êles absolutamente não têm responsabilidade moral por seus problemas, o que está em flagrante contraste com as recentes opiniões expressadas por Mowrer, que argum enta que culpa neurótica é culpa real por acontecimentos reais e só pode ser tratad a por expiação real. Geralmente, porém, o terapeuta de comportamento evita cul­ par o paciente por perm itir-se com portar de m aneira anor­ mal, e não o culpa também pela falta de êxito que possam encontrar seus mais ardorosos esforços terapêuticos — de­ vendo neste último caso o terap eu ta aceitar a responsabili­ dade pelo bloqueio e agir de acôrdo. 63

Êsses são, portanto, alguns dos passos e das condições pre­ liminares que o terapeuta de comportamento — e às vezes outros tipos de terapeutas — parece achar úteis. O que de­ vemos agora considerar são os passos iniciais no processo te­ rapêutico propriamente dito.

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CAPÍTULO

IV

Criando Hierarquias de Ansiedade

E x ist e m , como já vimos, vários métodos de terapia de com­ portamento, todos pretendendo derivar de teorias e experiên­ cias em aprendizagem. Dissemos também que esses diferen­ tes métodos tendem a ser aplicados de maneira seletiva; a terapia de aversão, por exemplo, tem sido freqüentemente es­ colhida para tratamento de impulsos desviados que proporcio­ nam satisfação ao paciente (alcoolismo, travestismo etc.). Por outro lado, a forma de tratamento de inibição recíproca, co­ nhecida como dessensibilização sistemática, tem sido em geral preferida no tratamento de problemas de ansiedade, sendo portanto fácil compreender por que existem tantos relatórios de sua aplicação no tratamento de doença neurótica.

Deve-se acentuar que existem de fato dois tipos principais de dessensibilização sistemática; o tipo de “ vida real” , ou hi vivo; e a dessensibilização imaginária. Na primeira os exercícios do paciente são planejados e organizados em tor­ no de experiências no mundo real; trata-se o mêdo de eleva­ dores por meio de experiência com elevadores reais, e a fobia por multidões expondo o paciente a situações mais ou menos

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de multidão. Em contraste, a dessensibilização imaginária procura tratar e inibir ansiedade evocada pela criação de imagens na mente do paciente — fantasias de situações que o paciente tem mêdo de enfrentar. É óbvio que ambos os méto­ dos apresentam dificuldades e vantagens. A dessensibilização imaginária tem a grande vantagem de permitir escolha e con­ trole completamente isentos de situações que evocam ansie­ dade — virtualmente se pode criar ou eliminar com pouca dificuldade qualquer situação se o paciente é suficientemen­ te imaginativo. Aí reside naturalmente o maior empecilho possível — o de o paciente não ter imaginação para criar as necessárias imagens mentais ou achá-las irreais e não ge­ radoras da mesma espécie de ansiedade que a do estímulo da vida real. Contudo, diremos posteriormente sôbre esta escolha entre dessensibilização imaginária e in vivo. Por ora, devemos voltar nossa atenção para o importante problema de arrumar os degraus ou hierarquias de nossa terapia de des­ sensibilização. Quer se usem situações imaginárias ou reais, o condicio­ namento direto (como Jones chamava ao método) ou dessen­ sibilização, como se chama hoje, envolve dois elementos prin­ cipais: primeiro, precisamos ter uma abordagem gradual de situações que envolvem pouca ansiedade até aquelas que en­ volvem muita ansiedade; segundo, precisamos decidir sôbre o tipo de reação inibidora de ansiedade que tentaremos fazer o paciente usar na presença das sugestões ou dos sinais co­ muns de ansiedade. É a primeira dessas considerações — a abordagem passo a passo ■ — que precisa de planejamento mais diligente e cuidadoso. A falta de planejamento apro­ priado desse passo leva, de acôrdo com a teoria, a um de dois perigos principais: o paciente se tornará ainda mais an­ sioso com o tratamento ou chegará a uma parada completa e deixará de fazer qualquer progresso. No estabelecimento de uma hierarquia a preliminar impor­ tante é, naturalmente, identificar o tema com o qual se tra­ balhará. Às vêzes isto é relativamente fácil, como no caso da paciente com fobia por aranhas mencionado anteriormen­ te; outras, é mais difícil, como no caso do paciente com cãibra dos escrivães e gagueira. São naturalmente impor­ 66

tantes as capacidades de cooperação, de comunicar pensamen­ tos e sentimentos, e de descrição clara, do paciente. Sem essas vantagens o trabalho de descobrir a natureza do problema ou tema do paciente pode ser árduo e muitas vêzes ingrato. Nessa fase consultam-se, tipicamente, quatro fontes prin­ cipais de informação: a história do paciente, sua reação a testes formais (por exemplo, questionários a respeito do tipo e severidade dos mêdos que o paciente possa ter), as reações do paciente a interrogatório intensivo pelo terapeuta e as opiniões de parentes ou amigos entrevistados com o consen­ timento do paciente. Além disso, muitas vêzes o terapeuta acha valioso ter uma documentação “ in loco” da situação que causou ansiedade, assim como da força de tal reação, o que se pode conseguir pedindo ao paciente que mantenha um diário minucioso de tais acontecimentos. Êste último mé­ todo freqüentemente proporciona informação de grande im­ portância que o paciente deixou de dar ou que não se obteve de qualquer outra maneira. É surpreendente descobrir que certos provocadores óbvios de perturbação podem ser igno­ rados pelo paciente ao fazer seu relato ao terapeuta. Uma paciente, por exemplo, pensava que de seu corpo emanava um odor desagradável, que causava consternação e embara­ ço a si própria e aos outros. Depois de manter um diário por certo período, ficou perfeitamente claro que a experiên­ cia só ocorria quando outros estavam presentes e era mais pronunciada quando se tratava de estranhos em cuja presen­ ça ela se sentia pouco à vontade. Com essa espécie de in­ formação a nossa disposição, podemos começar a testar ex­ plicações alternativas quanto à verdadeira fonte do problema de um paciente e em seguida determinar uma hierarquia apropriada para seu mêdo oculto. Às vêzes, mesmo depois da mais diligente busca, a lista de problemas, dificuldades, mêdos, embaraços etc. é muito limitada; outras vêzes, é longa e minuciosa. No primeiro caso, o problema é mais simples, pois temos apenas um tema principal, por exemplo, o mêdo de aranhas, do tipo discuti­ do anteriormente. Isto envolve apenas a verificação dos atri­ butos de aranhas capazes de provocar vários graus de an­ siedade e depois a disposição dessas características ou suas

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combinações, de modo que possamos começar o tratamento com um mínimo de ansiedade. Podemos iniciar com uma aranha pequena, morta e de côr clara a uma distância de três metros. Depois de uma série de exercícios nos quais aproximamos êsse espécime cada vez mais do paciente, ma­ nipularemos alguma outra característica da aranha, talvez o tamanho ou a côr. Passo a passo, avançaremos para a situa­ ção que, no princípio do tratamento, provocava mais ansie­ dade — uma aranha grande, ativa, preta e peluda, muito próxima do paciente. Por outro lado, podemos descobrir que temos uma lista longa e confusa de problemas e a tarefa do terapeuta é es­ colher entre êles e identificar os diferentes temas que pos­ sam estar envolvidos. No mais das vêzes parece que o in­ divíduo neurótico se caracteriza por várias fontes separadas de ansiedade, ponto que merece atenção cuidadosa em vista de suas implicações. Serão os neuróticos simplesmente pes­ soas sem sorte que se viram expostas com mais freqüência do que as normais a condicionamento traumático acidental? Ou existe algo diferente e especial em tais indivíduos ? Além disso, se a resposta à última pergunta é afirmativa, podemos deduzir que terapia de comportamento, sendo útil para ali­ viar maus hábitos em pessoas normais, será igualmente útil para lidar com um padrão complexo de sintomas neuróticos? Devemos ter sempre essas perguntas em mente ao conside­ rarmos os passos no processo de terapia de comportamento. O mais importante nesta fase é certificar-nos de que, ao identificar nossos temas, não estamos deixando de lado as­ pectos cruciais da situação ou lidando com uma distorção dos fatos verdadeiros. Podemos exemplificar brevemente esta espécie de dificuldade com um dos casos de Wolpe (1966). Tratava-se de mulher de 34 anos que se sentia “ fechada” e tinha premente impulso de “ fugir” quando conversava com outras pessoas. Êsses sintomas foram tomados por seu valor aparente e criou-se uma hierarquia que se baseava no tema de “ estar sendo olhada” , sendo a ansiedade variável uma função da distância entre “ a pessoa que olhava” e a pacien­ te. Isso correu muito bem até quando o estímulo crítico (a “ pessoa que olhava” ) ficou muito perto e, nesta fase, a pa-

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ciente teve uma severa reação de ansiedade; apesar de tudo quanto o terapeuta tentou, parecia bloqueado todo nôvo pro­ gresso. Felizmente para a paciente, o problema se resolveu aci­ dentalmente, quando ela perguntou ao terapeuta se podia fa­ zer algo para reduzir seu desconforto e êle respondeu que um pouco de álcool talvez ajudasse. O terapeuta foi então in­ formado de que seu marido não lhe permitia beber e, de­ pois dessa confissão, seguiram-se muitas outras indicando o extremo domínio do marido em tôdas as atividades da pa­ ciente. O problema configurou-se então a Wolpe muito dife­ rente — a fobia começou a parecer uma preocupação por outros interferirem e espionarem suas dificuldades, e o sen­ timento de claustrofobia pareceu estar relacionado com o sentir-se ela presa na armadilha que achava ser seu casa­ mento. Podemos suspeitar que tudo isto se assemelhe à es­ pécie de análise que o psicoterapeuta poderia oferecer muito diferente do ponto de vista de “ condicionamento” mais austero em geral adotado pelos terapeutas de comportamento. É ver­ dade que na abordagem de condicionamento nada existe que torne mais aceitável a interpretação dada por Wolpe aos pro­ blemas da paciente e parece (pelo que sabemos através da descrição de Wolpe) que não se tentou teste experimental al­ gum déssa interpretação. Não se revelou se a terapia deu bom resultado, mas um resultado bem sucedido naturalmente não estabeleceria a validade da interpretação apresentada. Por outro lado, o episódio sugere a possível existência de pro­ blemas que o paciente ignora e podemos argumentar que sua existência talvez seja uma barreira ao êxito da terapia. Consideremos três exemplos de temas que parecem muito claramente identificáveis. Um pode ter relação com senti­ mentos de claustrofobia e talvez envoíva mêdo de estar entre uma multidão que assiste a futebol, num centro comercial movimentado, numa igreja lotada e assim por diante. Outro poderia relacionar-se principalmente com ansiedade em torno de doença e poderia envolver mêdo de hospitais, de deter­ minados cheiros, de desmaiar, de injeções e semelhantes. Um terceiro tema poderia ter relação com uma condição agorafóbica e manifestar-se na ansiedade por ficar sozinho, sair

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sozinho em alguma viagem e outras circunstâncias semelhan­ tes. Assim, o tema é simplesmente uma maneira convenien­ te de descrever o importante fio de significação que corre através de uma coleção de medos ou ansiedades. A parte seguinte da tarefa do terapeuta, geralmente mais fácil, é decidir sobre os passos ou estádios separados que constituirão a hierarquia apropriada ao tema. Primeiro, os passos precisam naturalmente ser relevantes quanto ao te­ ma e, falando estritamente, cada passo deve ser cuidadosa­ mente testado quanto a esta característica. Na prática acei­ ta-se como suficiente a validade aparente (isto é, a relevân­ cia aparente), mas é possível que aspectos acidentalmente específicos de determinado passo o tornem inócuo, de modo que não criará ansiedade que se possa inibir ou incluirá ele­ mentos adicionais causadores de ansiedade que criem difi­ culdades. Um segundo ponto é que, evidentemente, os itens ou passos não devem ser espaçados demais se desejarmos preservar o princípio aparentemente importante da abordagem gradual. A repentina transição de um item que causa pouca ansiedade para outro que evoca fortemente essa reação, de acôrdo com a teoria — e aparentemente na prática — leva a renovada aprendizagem da associação entre as sugestões de ansiedade e a reação de ansiedade propriamente dita. Talvez possamos exemplificar melhor referindo-nos mais uma vez à aritméti­ ca da inibição recíproca. Supondo que o valor “ antiansiedade” da reação incompatí­ vel seja de 10 unidades, podemos presumir que a ansiedade até um valor de 9 unidades será satisfatoriamente inibida. Afinal, o argumento em favor de inibição recíproca é que duas reações incompatíveis não podem ocorrer ao mesmo tempo -— a reação mais forte inibe a mais fraca e impede sua ocorrência. Se nossos passos hierárquicos no tratamento forem bem espaçados em unidades de menos de 10, prosse­ guiremos, naturalmente, sem dificuldade do passo que envolve a menor quantidade para o que envolve a maior quantidade de ansiedade. Passo a passo eliminaremos a an­ siedade à razão de menos de 10 unidades cada vez. Contudo, se nossos três primeiros passos envolverem oito unidades de

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ansiedade e o quarto produzir 12 unidades adicionais, haverá ansiedade e o tratamento não será bem sucedido. Desnecessário dizer que os passos também não devemuser pequenos, pois nesse caso pode desperdiçar-se muito tempo. O ideal seria fazer que os passos envolvessem incrementos de ansiedade apenas pouco menores do que o valor de nossa reação de contra-ansiedade (relaxação, alimentação etc.), mas tal idéia — e de fato todo o assunto da inibição recíproca — levanta algumas importantes questões técnicas e teóricas. Uma envolve a noção de que a ansiedade pode ser “ drenada” pouco a pouco, como supõe a teoria, de modo que, após qual­ quer estádio, essa quantidade de ansiedade pode ser subtraí­ da do estádio seguinte. Em outras palavras, supondo-se que o passo 1 desperte oito unidades de ansiedade e o passo 2 desperte 16, poderemos presumir que a ansiedade do passo 2, depois do tratamento do passo 1, cairá para oito, tendo-se eliminado oito unidades? Uma segunda presunção, desta vez de natureza mais técni­ ca, é a de que nós (ou o paciente) podemos antecipar jul­ gamentos certos sôbre a quantidade de ansiedade que cada passo evocará. Às vêzes a presunção que fundamenta os passos no tratamento não parece inteiramente plausível em bases empíricas, por exemplo uma serpente à distância de dois metros não evocará necessàriamente duas vêzes mais an­ siedade do que o mesmo reptil a quatro metros; julgamen­ tos psicológicos não parecem corresponder com muita freqüên­ cia a essa simples translação em têrmos de espaço físico. Naturalmente seria simples determinar os passos se tivés­ semos algum meio seguro para medir ansiedade. Não o te­ mos atualmente. Contudo, poder-se-ia argumentar, de um ponto de vista puramente prático, que as objeções levanta­ das não são realmente sérios riscos práticos — que podemos aparentemente tratar de maneira eficaz anormalidades psi­ cológicas por dessensibilização sem nos preocuparmos demais com êsses pontos mais técnicos e teóricos. Isto envolve ques­ tões tanto de fato como de opinião. No último sentido, é lícito dizer que o esclarecimento dêsses problemas pode levar a uma terapia mais refinada e eficaz; quanto ao primeiro, devemos dizer que os fatos do tratamento por terapia de

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comportamento e outros meios precisam falar por si próprios. Os fatos de que dispomos sobre êste aspecto aparecem em um capítulo posterior. Ainda assim, podemos introduzir certa medida de segu­ rança em nossa hierarquia. Wolpe recomenda o emprego de uma escala algo tôsca para consegui-lo. Trata-se de pedir ao paciente que imagine a,maior ansiedade que já experimen­ tou e coloque isso na extremidade superior de sua escala subjetiva, atribuindo-lhe um valor de 100. Depois se pede ao paciente que pense em um estado de absoluta calma e dê a êste ponto na escala o valor zero. Então podemos usar po­ sições entre êsses dois extremos para indicar as várias intensidades de ansiedade que se prendem à variedade de si­ tuações a usar no tratamento; o paciente pode pensar que sair para uma rua secundária sossegada tem probabilidade de provocar 25 unidades de ansiedade, enquanto uma rua mo­ vimentada poderia produzir 90 unidades e assim por diante. Wolpe diz que, após adquirir um pouco de prática no uso dêsse tipo de escala, o paciente obtém certa aptidão para in­ dicar a ansiedade que prevê. Os itens ou estímulos que se vão apresentar ao paciente devem, de acordo com Wolpe, ser separados por 5 a 10 unidades nessa escala (ele se refere a essas unidades como “ suds” ou “ subjective units of disturbance” ( *) ) . De fato, desde que a reação incompatível tenha força suficiente, não existe razão teórica para que os inter­ valos não sejam mais espaçados. Contudo, vale a pena se­ guir êste conselho empírico de Wolpe. Talvez um método mais tôsco — embora em certos senti­ dos mais seguro — para obter informação semelhante con­ sista em comparações emparelhadas. Isto envolve simplesmen­ te a impressão de uma ampla variedade de estímulos rele­ vantes à ansiedade em cartões separados que depois se dão ao paciente, dois de cada vez, cabendo-lhe indicar quais dos dois evocará maior ansiedade. Isso oferece maior segurança do que o método de Wolpe, mas, naturalmente, não nos per­ mite fazer mais do que “ ordenar em categoria” as situações, isto é, ordená-las segundo sua fôrça de criar ansiedade; em outras palavras, não poderíamos obter a espécie de estima(* )

N. T, — “ Unidades subjetivas de perturbação” .

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tiva quantitativa que Wolpe obtém com sua escala. Contudo, alguém familiarizado com métodos de escalonamento perce­ berá a natureza falível da escala de Wolpe e o êrro guase certo em que incorreríamos se dela tentássemos tirar infe­ rências “ óbvias” — como a de que a marca do '“ nível de 50 sud” indica duas vêzes mais ansiedade que a do “ nível de 25 sud” . Essa não é questão em que devamos entrar, mas o leitor interessado talvez ache que vale a pena examinar, em um livro de Guilford (1954) as dificuldades de escalonamento existentes. Aqui basta dizer que, se desejarmos levar a sério o problema de escalonamento, disporemos agora de técnicas muito mais refinadas do que as descritas. O problema de medir com precisão a proporção entre an­ siedade e reações de contra-ansiedade em determinado es­ tádio é decerto importante; a estabilidade daquela propor­ ção é também de grande importância. A experiência suge­ re que os níveis de ansiedade não permanecem estáticos, mas apresentam tendência a flutuar, e a condição do paciente não permanece necessariamente a mesma de dia para dia. Isso significa que nossa proporção calculada em qualquer ponto no tempo pode não refletir precisamente essa relação em alguma ocasião futura; é como se houvesse um nível de ansiedade geral que pudéssemos acrescentar ao que o pa­ ciente manifestaria, em média, na presença de algum estí­ mulo específico. Nessas circunstâncias, o paciente pode inesperadamente manifestar, e às vêzes manifesta, ansieda­ de em alguma situação, embora tenha enfrentado muito bem essa situação em várias ocasiões anteriores. Podemos enfrentar essa eventualidade recuando alguns passos nesta hierarquia e voltando a situações mais fáceis, pela introdu­ ção de passos intermediários entre os pontos da hierarquia já assinalados ou pelo emprêgo de outros meios (drogas por exemplo) para fazer baixar o nível de ansiedade geral. O terapeuta experimentado naturalmente estará em guarda contra sinais de variabilidade no estado clínico, antes de co­ meçar o tratamento em qualquer sessão. Os exemplos de hierarquias que aparecem nas publicações de terapeutas de comportamento são, com freqüência, tão breves que não proporcionam noção clara de quais os passos 6

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realmente envolvidos. Tomemos, por exemplo, a hierarquia simples inventada por Lazarus (1960) para lidar com o in­ tenso medo que um menino de oito anos tinha de automó­ veis, adquirido após um acidente. O primeiro passo na te­ rapia consistiu em “ falar com John” sôbre os vários tipos de veículos, processo durante o qual se deu chocolate à crian­ ça. O estádio seguinte foi realizar “ uma série de acidentes deliberados” com automóveis de brinquedo, oferecendo-se novamente chocolate, até que John “ entrasse inteiramente no espírito da brincadeira” . Em seguida o terapeuta e o pa­ ciente sentaram-se num carro parado e discutiram o aciden­ te, sendo êste estádio seguido por outro que envolvia curtos passeios de automóvel. No final no tratamento, a criança havia começado a gostar de automóveis por êles próprios, sem a necessidade de receber chocolate. Esta hierarquia é decerto muito grosseira e, naturalmen­ te, deixa enormes vazios em nossa compreensão do que real­ mente aconteceu durante a terapia. De fato, a precisão que o terapeuta de comportamento geralmente afirma ser carac­ terística de seu método falta singularmente em tais exem­ plos de casos; por exemplo, que se quer dizer por “ falar com John sôbre trens, aviões, ônibus etc.” ? O que, e como, efe­ tivamente se disse fica inteiramente à imaginação do leitor. Por outro lado, a descrição que Wolpe (1962) faz da hie­ rarquia envolvida no tratamento da Sra. C. é muito mais ampla e contém descrição mais precisa dos estádios empre­ gados na dessensibilização imaginária. Neste caso a hierar­ quia abrangia 36 pontos, tendo o tema relação com a fobia da paciente a situações de tráfego, e Wolpe fornece infor­ mação a respeito do número de vêzes em que apresentou cada cena ou passo, assim como outros pormenores que permitem obter um quadro muito claro do que aconteceu. De manei­ ra semelhante, consideráveis pormenores fornece Walton (1964) em sua descrição da hierarquia empregada no tra­ tamento de uma mulher de 48 anos com intenso mêdo de ser considerada morta e enterrada viva. A hierarquia aqui variou desde uma cena em que a paciente estava apenas in­ consciente e era examinada por um médico, passando por outra em que ela era levada a um necrotério e examinada

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ali por um médico, até ao exame no necrotério, colocação em um esquife e decapitação! Contudo, só quando estamos lidando com anormalidade circunscrita, como aspectos comportamentais claramente definidos, é que a hierarquia começa a assumir a espécie de precisão que nos dá confiança em que os dois pesquisadores que usaram êsses passos estavam fazendo essencialmente o mesmo. Encontra-se essa espécie de clareza, por exemplo, na descrição que Walton faz da hierarquia utilizada para lidar com um mêdo obsessivo de contaminação por várias fontes de sujeira. Uma dessas hierarquias consistia em apa­ nhar objetos do chão e envolvia os seguintes estádios ou passos preliminares. 1. Apanhar um pedaço de papel limpo de um chão limpo, sem tocar o chão. 2. Como em 1, mas desta vez o papel está amassado (objeto um pouco mais desagradável). 3. Como em 1, mas neste caso o papel contém tinta. 4. Como em 1, mas nesta ocasião a paciente toca o chão. 5. Aqui se repete 4, mas o chão não foi conveniente­ mente lavado, apenas limpado com um pano sêco. 6. Repete-se o passo 5, sem a menor tentativa de lim­ par o chão. 7. Êste passo envolveu o apanhamento de um pedaço de papel limpo de uma parte mais usada do chão, sendo êste tocado pela paciente ao apanhar o papel. Naturalmente, o problema vai além de saber se dois pes­ quisadores, tendo tal hierarquia com que lidar, fariam a mesma coisa. Quem já empregou dessensibilização imagi­ nária sabe também que o paciente pode, em certas ocasiões, achar difícil controlar seu processo imaginativo de acordo com as instruções dadas pelo terapeuta. Recente exemplo da experiência do autor vem à mente e refere-se a uma ten­ tativa de lidar com uma fobia por gato. Pediu-se à pacien­ te, em um estádio, que imaginasse um gato de determinada espécie parado a uma distância de 1,80 m dela; a pa­

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ciente conseguiu fazê-lo, porém não pôde deixar de “ ver”’ o gato começando a andar em sua direção, o que produziu mais ansiedade do que fôra planejado! Problemas desta espécie, que ocorrem na aplicação de dessensibilização, não são incomuns, embora a literatura existente possa sugerir o contrário. Em princípio, a questão de criar hierarquias de ansieda­ de é simples de resolver ; na prática, como vimos, podem surgir numerosos problemas de natureza técnica e teórica. Geralmente tais problemas foram ignorados ou receberam pouco reconhecimento por parte dos terapeutas de comporta­ mento, para os quais a questão importante tem sido a de saber se o que estavam fazendo tinha ou não um resultado útil, em têrmos de melhora ou recuperação do paciente. Só o tempo poderá determinar se o terapeuta de comportamento está certo quando se descuida dêsses problemas.

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CAPÍTULO

V

A Técnica de Relaxação

T eor ica m en te , tôda reação antagônica à ansiedade poderia

ser empregada na terapia de dessensibilização e nenhum mé­ rito especial se atribuiria a uma ou outra dessas alternati­ vas, exceto em têrmos de sua relativa eficácia ou conveniên­ cia. Naturalmente, a escolha dependerá até certo ponto, de certas considerações especiais que possamos aplicar ; por exemplo, reações de alimentação parecem mais apropriadas a crianças, enquanto reações sexuais (em sentido estreito) seriam impossíveis em pacientes jovens. Também em des­ sensibilização na vida real completa está evidentemente ex­ cluída a relaxação muscular, pois seria impossível executar os exercícios recomendados, enquanto em dessensibilização imaginária a relação parece ter propriedades ideais. Assumindo hoje a dessensibilização imaginária importan­ te papel nessa espécie de tratamento e sendo a relaxação quase invariavelmente usada nesse contexto, é importante descrever a técnica para obtenção do estado relaxado. Pa­ rece que Jacobson (1938) foi o primeiro a acentuar a im­ portância da relaxação como meio de combater ansiedade.

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Seu argumento era que a experiência subjetiva pessoal de um estado emocional deriva, em grande parte, das fortea contrações musculares que o acompanham; por outro lado, sugeria êle, a relaxação parece ser exatamente a condição oposta. Em outras palavras, existe uma poderosa relação entre o grau de tensão muscular e a percepção de uma con­ dição emocional pelo indivíduo; se ausente a tensão muscular, não é provável que o indivíduo seja capaz de sentir-se emocionalmente excitado. De fato, isto significaria que os efeitos autonômicos que acompanham um estado de profunda relaxação são exatamente opostos aos que seriam experimen­ tados em estado de ansiedade. Em apoio a êsse argumento Jacobson (1939-1940) mos­ trou que o ritmo da pulsação e a pressão arterial — ambos tipicamente intensificados em estados emocionais — são sig­ nificativamente diminuídos por relaxação profunda. Outra pesquisa, efetuada por Clark (1963) e pelo próprio Wolpe (1964), também indica que a resistência da pele e a respi­ ração (que têm sido usadas freqüentemente como medidas de ansiedade) mostram tendências opostas às encontradas em estados de ansiedade quando o indivíduo está muscular­ mente relaxado. Todavia, no que se refere a esta reação in­ compatível particular, existe pouca dúvida de ser quase sem­ pre necessário um período de treinamento; alguns indivíduos acham, de fato, muito difícil obter o nível de relaxação profun­ da exigido pelo terapeuta. Com freqüência o treinamento co­ meça muito pouco tempo depois da primeira entrevista e é continuado durante o processo de coleta de informações bási­ cas sôbre os problemas e criação de hierarquias de ansiedade. A maioria dos terapeutas parece achar que dividir a sessão do paciente dessa maneira é o meio mais eficiente de cuidar das coisas e não faz com que os recursos do paciente sejam excessivamente sobrecarregados por uma única tarefa. Toda­ via, não precisamos estabelecer ou seguir regras fixas e o terapeuta em geral deseja sentir-se livre para organizar a hora do paciente como achar mais benéfico. Esta flexibilidade é muitas vezes, naturalmente, imposta ao terapeuta pela na­ tureza das dificuldades individuais do paciente; alguns podem ser extremamente vagarosos para adquirir o nível desejado 78

de relaxação, enquanto outros podem demorar muito tempo para revelar e esclarecer seus problemas. Em média, porém, a maioria das pessoas obtém ralzoável facilidade de relaxação depois de umas seis sessões de meia hora, freqüentemente suplementadas por prática em casa durante um ou dois curtos períodos diários. O treinamento é em geral precedido de alguma explicação sôbre o papel que a relaxação desempenhará, tanto como tratamento como nos momentos mais difíceis do paciente. Tal explicação pode ter a importante função de reduzir a apreensão que muitos pacientes experimentam quando lhes pedem para ceder cer­ to grau de controle a um agente de fora. Em qualquer caso, tais sentimentos em geral desaparecem depois de um pouco de prática e a maioria dos pacientes parece gostar das sen­ sações de relaxação completa. Explicações preliminares acentuarão, portanto, o valor da relaxação no combate à ansiedade e informarão o paciente de que o terapeuta ten­ tará produzir um estado de inatividade muscular muito além do ponto que os indivíduos geralmente conseguem. A idéia central é fazer o paciente prestar atenção à espé­ cie de realimentação provinda de sua musculatura, que comumente deixa de ser percebida. O objetivo é, em outras palavras, proporcionar um conjunto de exercícios que per­ mitam ao paciente diferenciar claramente estados de tensão muscular e relaxação, de modo que possa finalmente exer­ cer controle voluntário sôbre esse sistema. Antes de passar aos exercícios formais é naturalmente necessário certificarse de que o ambiente físico é de molde a facilitar a rela­ xação. O aposento deve ser quieto e livre de interrupções que possam perturbar ou embaraçar o paciente, dedicandose ainda especial atenção ao tipo de cadeira em que êle se senta. Esta deve ser confortavelmente estofada, não muito alta e permitir que o paciente se recline em posição repou­ sante. Um suporte para a cabeça ou uma cadeira com en­ costo suficientemente alto é muito vantajoso. Geralmente o terapeuta começa com tentativas de relaxar os braços do paciente. Embora não haja ordem fixada e necessária a seguir, e o terapeuta possa, se desejar, começar pela cabeça ou pelas pernas, parece que os pacientes são 79

mais capazes de obter controle dos braços e, assim, essa é a maneira apropriada para iniciar. O terapeuta diz ao pa­ ciente para relaxar-se ao máximo e acomodar-se da maneira mais confortável possível em sua cadeira. Depois lhe dá instrução para que cerre bem o punho direito" e se concen­ tre sôbre as sensações que essa atividade produz, apertando ainda mais a mão se puder e tentando identificar onde ocor­ rem as sensações de tensão. Depois de alguns segundos, diz-lhe para relaxar-se, deixando a mão aberta e os braços, dedos e pulso soltos e bambos, observando ao mesmo tempo a diferença entre o estado tenso e o relaxado. Êste exercí­ cio é repetido uma ou duas vêzes, até o terapeuta achar que o paciente apreendeu a idéia geral e está começando a con­ trolar esta parte de sua musculatura. Neste ponto a mão e o antebraço esquerdos são tratados exatamente da mesma maneira. Em seguida pode-se pedir ao paciente que execute o mesmo exercício usando as duas mãos, cerrando os pu­ nhos, estudando as tensões em suas mãos, dedos e antebra­ ços, enquanto o resto do corpo permanece o mais relaxado possível. Êste exercício, com o emprego de ambos os braços, simplesmente reforça o que já foi aprendido e continua até que o terapeuta verifique que se obteve grau apropriado de controle sôbre as mãos e a parte inferior dos braços. A atenção é então transferida para a parte superior dos braços, pedindo-se ao paciente que dobre o cotovelo e torne o bíceps proeminente, usando a máxima tensão que puder. O terapeuta pede-lhe que aumente a tensão se puder e a mantenha por alguns segundos. Depois lhe diz para soltar e relaxar-se, permitindo que os braços caiam de lado e fi­ quem tão bambos e desprovidos de tensão quanto possível, ao mesmo tempo que anota cuidadosamente as sensações de tensão e relaxação, e a diferença entre êsses estados. Êste exercício é também repetido várias vêzes, primeiro com um braço, depois com o outro e finalmente com os dois. Os músculos tríceps, ao longo da parte traseira dos braços, são igualmente tratados, desta vez endireitando o braço ao má­ ximo possível até se experimentarem sensações de tensão. Novamente se dão instruções para pensar e concentrar-se nas sensações criadas por êsse estado de tensão e pelo es­ 80

tado de relaxação subseqüente, diferenciando o mais possí­ vel essas sensações, O terapeuta pode então decidir testar o grau enwque o paciente conseguiu controle. Diz ao paciente para relaxar completamente seus braços e pode então realizar um teste simples erguendo o braço do paciente alguns centímetros e deixando-o cair de nôvo sôbre o braço da poltrona. A di­ ferença entre erguer um braço relaxado e um braço tenso é evidente para o terapeuta experimentado, e a maneira como o braço cai também indica até que ponto está relaxado. Nesta questão a prática é a única maneira eficaz de apren­ der, porém mesmo o principiante percebe o pêso do braço relaxado e a maneira como êle cai precipitadamente, em lugar de descer de maneira graciosamente controlada até o braço da poltrona. O terapeuta volta a atenção em seguida para a cabeça e o pescoço, começando novamente por pedir ao paciente que se relaxe ao máximo possível. Depois lida sucessivamente com os músculos dos lábios, língua, maxilares, nariz, couro cabe­ ludo, testa e da área em volta dos olhos, precisamente da mesma maneira empregada nos braços relaxados. Os lábios, por exemplo, são espichados, franzidos, bem apertados juntos e depois relaxados; os olhos são bem fechados e depois rela­ xados, e assim por diante. Particular atenção pode-se pres­ tar à testa, que é muitas vêzes um centro de tensão. Tam­ bém os músculos do pescoço são alternadamente retesados e relaxados, apertando-se a cabeça para frente e para trás até o máximo possível, e virando-a para um lado e depois para o outro. A repetição de exercícios que envolvam tensão e soltura de músculos usados nessas áreas, juntamente com cui­ dadoso estudo das sensações e das diferenças entre o dois es­ tados extremos, deve permitir ao paciente adquirir controle voluntário do processo de relaxação. Os ombros também estão freqüentemente associados a um grau especial de tensão e aqui os exercícios incluirão o ato de erguer os ombros até o máximo possível, empurrá-los para a frente e puxá-los para trás, de modo a criar fortes sensa­ ções de tensão. Cada estado de tensão é seguido por tentati­ vas de relaxar ao máximo possível, permitindo que a muscula­

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tura se torne tão flácida quanto possível, e tentando conseguir níveis realmente profundos de relaxação. Os músculos do peito são controlados principalmente pela respiração, mas po­ dem ser também manipulados por movimentos de pressão para dentro da parte superior dos braços e do& ombros. O objetivo é também permitir que o paciente localize sensações de tensão e diferencie essas sensações daquelas do estado re­ laxado. A respiração profunda é meio de conseguir isso, pro­ duzindo a inalação profunda uma sensação de tensão que é aliviada pela exalação. Geralmente é um pouco mais difícil lidar com os músculos do estômago, principalmente porque os pacientes acham mais difícil repuxá-los e tornar firme a área abdominal. Isto pa­ rece particularmente difícil às mulheres. Contudo, com prá­ tica o paciente pode aprender tanto a criar tensão nesta área como a relaxar seus músculos. Êste exercício é suplementado pelo encolhimento do estômago, outro meio de criar sensações de tensão abdominal. Naturalmente, essas sensações são re­ petidas várias vezes, sendo cada ocasião seguida por tentati­ vas de relaxar completamente os grupos musculares relevan­ tes. Da mesma maneira, os músculos principais das costas são tratados arqueando-se e relaxando-se as costas em várias ocasiões sucessivas. Dobrando os joelhos é possível retesar os músculos das ná­ degas e da parte de trás das coxas, e endireitando-se vigoro­ samente as pernas podem-se flexionar os músculos da parte da frente das coxas. Igualmente, dobrando-se os dedos dos pés para baixo e também forçando-os para cima podem-se tornar tensos os músculos da barriga das pernas, devendo esses movimentos ser efetuados com o máximo possível de esfôrço antes de serem seguidos de relaxação. Êsses exercí­ cios são realizados várias vêzes, seguindo-se cada ocasião de instruções para relaxar-se ao máximo possível e concentrarse nas sensações criadas. Dessa maneira o corpo do paciente deve tornar-se mais re­ laxado, embora, como o leitor perceberá, os exercícios suge­ ridos não tenham relação com todos os músculos do corpo. No entanto são em geral muito adequados para produzir a espé­ cie de estado que serve para inibir ansiedade branda. De82

ve-se também acentuar que os exercícios descritos são uma versão muito simplificada dos recomendados por Jacobson, e qualquer outra adaptação de suas técnicas de relaxaçãp mais apuradas pode ser igualmente bem sucedida. De maneira ne­ nhuma se afirma que a técnica aqui proposta seja a única ou mesmo a mais eficaz para conseguir níveis apropriados de re­ laxação; o que se afirma é que podemos obter resultados sa­ tisfatórios seguindo os processos descritos. Todavia, existem certas regras adicionais que, tipicamente incorporadas nas instruções de relaxação, até agora não foram mencionadas; não se sabe se são ou não necessárias ou vitais para a obten­ ção do resultado desejado, mas a experiência sugere que au­ mentam a eficácia geral do método. A primeira dessas regras refere-se ao papel da sugestão. Não há dúvida de que a maioria dos terapeutas de compor­ tamento parece empregar poderosa sugestão em suas instru­ ções, acentuando para o paciente que êle pode gostar da sen­ sação de relaxação, que deve imaginar que não é preciso es­ forço para erguer seu braço quando completamente relaxado e que se sente muito melhor quando é capaz de descarregar a tensão. De fato, o estado finalmente atingido por muitos pacientes tem mais a natureza de um ligeiro transe hipnótico do que de um profundo estado de relaxação muscular. É bem possível que grande parte da alegada potência da rela­ xação para combater ansiedade se possa atribuir a êste aspec­ to das instruções e não ao que Wolpe sustenta ser a condição crítica. Parte do aspecto sugestivo envolve também o emprêgo pelo terapeuta de uma voz calma e tranqliilizadora. Não seria fá­ cil relaxar-se diante de instruções dadas com voz gritada, abrupta e rude, e a idéia é convencer o indivíduo a relaxar-se, não insistir para que se relaxe; a primeira abordagem pare­ ce reduzir a apreensão inicial e, naturalmente, é mais com­ patível com o estado de calma que se procura criar. O pa­ ciente, especialmente nos estádios adiantados do treinamen­ to, talvez deseje fechar os olhos. Isto parece facilitar o pro­ cesso de relaxação, provàvelmente por eliminar as influên­ cias diversionistas que pode haver no aposento, permitindo ao paciente concentrar mais a atenção no que o terapeuta

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está dizendo e nas sensações que está experimentando. Fe­ char os olhos pode naturalmente ter um benefício adicional pelas associações passadas com estados de repouso. Ponto extremamente importante é manter contínuo conta­ to verbal com o paciente, o que envolve “ falar sôbre” a ques­ tão de relaxação além de simplesmente dar as instruções men­ cionadas no comêço dêste capítulo. Grande parte dêsse con­ tato verbal contínuo é repetitiva; por exemplo, o paciente é freqüentemente exortado a “ continuar abandonando-se.. . cada vez mais” durante o processo de relaxação ou persua­ dido a “ tentar conseguir um nível ainda mais profundo de relaxação desta vez” . É importante também discorrer lon­ gamente sôbre as sensações que o paciente possa estar sen­ tindo durante o processo de tensão ou relaxação, devendo o terapeuta estar preparado para usar palavras que transmi­ tam as sensações, os sentimentos e as atitudes que sejam úteis. Por exemplo, durante o estado relaxado pode descre­ ver os membros como “ pesados” , “ bambos” e “ soltos” e o movimento nessa condição como “ sem esforço” . O emprego de tais adjetivos e expressões descritivas pode variar com o tipo de paciente que se submete a treinamento, mas todos êles parecem beneficiar-se de sua inclusão nos comentários correntes do terapeuta. Finalmente, o instrutor achará útil no curso do treinamen­ to voltar continuamente a terreno antigo. Tipicamente, du­ rante certo número de sessões se considera separada e suces­ sivamente cada uma das mencionadas áreas do corpo, mas, quando lidar com músculos abdominais, por exemplo, é útil referir-nos a outros grupos de músculos tratados anteriormen­ te, lembrando ao paciente a relaxação nessas áreas. Assim podem prosseguir ao mesmo tempo treinamento nôvo e con­ solidação do antigo.

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CAPÍTULO

VI

Um Método Para Eliminar Ansiedade

0 pacien te , homem elegantemente vestido, de cinqüenta e tantos anos, reclina-se confortavelmente na poltrona; seus olhos estão fechados, a respiração é fácil e os membros estão estendidos. Parece absolutamente relaxado quando o tera­ peuta lhe pede imaginar que está entrando no trem do metrô em determinada estação. O terapeuta pede então ao pacien­ te que retrate a cena quando as portas do trem se fecham às suas costas e o trem começa a sair da estação. Agora o paciente apresenta alguns sinais físicos de desconforto e agi­ tação; ergue o dedo indicador da mão direita para indicar que está experimentando excessiva ansiedade. Imediatamen­ te o terapeuta lhe diz que encerre a cena e se torne novamen­ te relaxado e calmo. Depois de alguns momentos, a cena é apresentada mais uma vez, O paciente é um homem de negócios altamente bem su­ cedido, muito preocupado com sua incapacidade de viajar em transporte colefivo. Poderia, naturalmente, usar alternativas que estão à sua disposição e de fato se arrumou dessa manei­ ra durante algum tempo. Agora acha que precisa fazer algo

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para vencer seu mêdo, em parte porque às vêzes fica em­ baraçado pela sua presença, em parte porque fica irritado por êsse sinal de fracasso quando é eminentemente bem su­ cedido em tantos outros aspectos, e provàvelmente ainda por outras razões. Concluídas as investigações preliminares, compilada a hie­ rarquia das situações com que se vai lidar, começa agora a terapia propriamente dita. Em essência, esta envolve a apre­ sentação de cenas (os pontos na hierarquia de ansiedade) em condições favoráveis à inibição do mêdo, neste caso relaxa­ ção completa. O terapeuta provàvelmente está trabalhando na presunção de que cada ponto na hierarquia provoca uma pequena quantidade de mêdo que é depois inibido pela rea­ ção de relaxação; após êste estado inibitório ter sido repe­ tido várias vêzes para a situação A, torna-se fixado e per­ manentemente ligado a essa situação. À medida que o tera­ peuta progride ao longo da lista hierárquica, a intensidade da reação fóbica vai sendo gradual e finalmente eliminada. Desnecessário se torna dizer que o processo de terapia não é tão simples como sugere esta descrição, embora também não seja especialmente difícil. O que temos de fazer é adquirir compreensão do paciente e de seu problema, obter uma boa idéia dos fundamentos do tratamento e aprender suas regras. É habitual começar dando ao paciente instruções sôbre a importância de evitar excessiva ansiedade, dizendo-lhe que, se ficar muito ansioso, deve erguer o dedo indicador da mão direita. Êste será portanto o sinal para que o terapeuta en­ cerre a cena que produziu reação exagerada e também para tomar tôdas as outras precauções necessárias. Estas medi­ das podem envolver uma abordagem mais gradual da situa­ ção temida, a repetição e consolidação de estádios anteriores ou qualquer outra alternativa, inclusive um reexame da pró­ pria hierarquia para descobrir se algum aspecto importante foi ou não ignorado ou omitido. Mais tipicamente, porém, à medida que se apresenta a cena repetidas vêzes, diminui a inclinação do paciente a reagir com ansiedade. É útil também incluir mais um sinal que o paciente possa usar para transmitir informação vital sem sair de seu estado relaxado. O paciente é, às vêzes, incapaz de evocar determi­

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nada cena por uma ou outra razão e, quando há dúvida quan­ to a essa capacidade, o terapeuta pode pedir-lhe que indique êxito na criação da imagem erguendo o dedo indicatjpr da mão esquerda. Não é preciso fazer constantes indagações sôbre essa necessidade, mas apenas nos pontos em que o te­ rapeuta possa achar que há alguma razão especial para isso. Êste processo tem a vantagem adicional de ajudar a revelar se o paciente está excessivamente intimidado pela situação terapêutica a ponto de não poder “ abandonar-se” ; às vêzes parece que o paciente fica tão preocupado com a situação que se torna totalmente inibida sua capacidade para a repro­ dução imaginária das cenas sugeridas. Após o paciente ter compreendido perfeitamente essas ins­ truções, o terapeuta pode passar a criar uma condição plena­ mente relaxada e apresentar uma cena que ao mesmo tempo facilite a aquisição dessa condição e também submeta a pro­ va à capacidade do paciente para criar cenas imaginárias. A maioria das pessoas encontra pouca dificuldade para visua­ lizar-se deitada na margem gramada de um rio em um dia de calor, ouvindo o som da água que corre sôbre as pedras, sen­ tindo-se agradàvelmente sonolenta etc. (naturalmente essas imagens não seriam aceitáveis, neste estádio, a um indivíduo com mêdo de insetos). O terapeuta diz ao paciente que quan­ do tiver êsse quadro claro em sua mente deve erguer o dedo indicador da mão esquerda. Depois, o terapeuta só ocasio­ nalmente precisará indagar sôbre a qualidade das cenas. Quando está certo da reação do paciente à cena de con­ trole, o terapeuta volta-se para o primeiro ponto na hierar­ quia de ansiedade. Naturalmente, informa disso o paciente, em geral dizendo ser possível esperar que a cena não crie muita perturbação nem interfira no seu estado de relaxação, mas lembrando-lhe mais uma vez que deve usar o dedo in­ dicador da mão direita para demonstrar qualquer aumento inesperado no nível de ansiedade. Então apresenta a cena. Os terapeutas provàvelmente di­ ferem no grau de pormenores que introduzem na descrição e é possível, naturalmente, que pacientes diversos exijam ní­ veis e minúcias de verbalização muito diferentes a fim de obter imagens satisfatórias. Com muita freqüência o por-

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menor irrelevante parece ser o que serve para ativar a ima­ ginação preguiçosa, e não qualquer palavra que indique a presença de um objeto temido. Por exemplo, a maneira como a porta range nas dobradiças e a corrente de ar quando a porta se abre podem ser importantes ingredientes na cria­ ção de um bom quadro de cena que envolva um gato como objeto fóbico; a outros pacientes talvez baste dizer que “ um gato entra pela porta” a fim de obter uma imagem vívida e evocadora de ansiedade. A mesma cena é apresentada em diversas ocasiões, até qua­ se ou completamente se eliminar toda ansiedade ligada a ela. Naturalmente, para ter certeza de que se pode passar para o estádio seguinte sem perturbação indevida é preciso pres­ supor completamente eliminada tôda ansiedade ligada ao es­ tádio anterior; se tal não acontecer a ansiedade residual da cena A pode, segundo parece, acrescentar-se à experimenta­ da na cena B, tornando-se grande demais para ser pronta­ mente inibida pela relaxação. Contudo, supondo-se que o paciente, quando interrogado, te­ nha indicado clara percepção da cena e não tenha indicado ansiedade, o terapeuta permite que o paciente demore na cena de 5 a 15 segundos. Em seguida, dá-lhe instrução para en­ cerrar essa cena e concentrar mais uma vez a atenção na operação de relaxação, dando um pouco de tempo para rea­ lizá-lo. Ao término desse tempo, a cena é apresentada mais uma vez, sendo a descrição verbal do terapeuta seguida por uma curta pausa de alguns segundos. Uma vez que não tenham surgido dificuldades, o paciente recebe instrução para “ desligar” a imagem e voltar tôda a atenção para a relaxa­ ção, dando-se mais uma vez para isso um prazo adequado. A cena é apresentada várias vezes sucessivas dessa manei­ ra. O tempo destinado a cada parte da seqüência (apresen­ tação verbal, pausa, relaxação, pausa) deve ser muito flexí­ vel, mas em geral é apenas uma questão de segundos; aqui o terapeuta precisa realmente utilizar seu julgamento da si­ tuação, particularmente ao tentar avaliar quanta ansiedade o paciente pode ter experimentado. Todavia, é importante não confiar na completa eficiência do sistema de sinalização descrito anteriormente e, ao término da primeira cena, po-

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de-se aproveitar a oportunidade para interrogar o paciente tanto sôbre a clareza de suas imagens quanto sobre o grau de ansiedade por ele experimentado, Não devemos ficar de­ cepcionados ao saber que êle sentiu alguma ansiedaíe sem que se tivesse dado o sinal (erguer o dedo indicador da mão direita) ; isso comumente parece indicar que a ansiedade não foi muito perturbadora e geralmente se notará que a ansie­ dade foi menor a cada apresentação sucessiva da cena. Desde que tudo pareça estar correndo razoàvelmente bem neste ponto, o terapeuta pode em seguida voltar a atenção para alguma outra cena. Esta pode ser uma cena alternati­ va no mesmo ponto — ou a respeito do mesmo ponto — na hierarquia de ansiedade ou pode representar situação que evoque mais ansiedade. Qualquer que seja o caso, o processo é exatamente o mesmo descrito antes; breve apresentação, pausa, instrução para relaxar-se, pausa. Gradualmente, cena por cena, vão sendo tratados os pontos na hierarquia, inibin­ do-se certa ansiedade em cada ocasião, até que finalmente receba atenção a última cena de um tema determinado. Com uma condição fóbica perceber-se-á que todo o processo pode ser muito curto, pois as apresentações de cena são muito breves. Contudo, a recuperação de uma condição fóbica não se registra freqüentemente no espaço de poucas sessões, a menos que o indivíduo tratado seja de fato normal nas outras coisas; indivíduos neuróticos parecem exigir tratamento bem mais prolongado. Alguns outros aspectos do tratamento são evidentemente importantes, como o número de temas com que se deve lidar numa única ocasião, a duração da sessão ideal de dessensibi­ lização e assim por diante. No momento, porém, não pode­ mos responder a essas questões senão em termos de experiên­ cia clínica, pois virtualmente não há prova experimental a que se possa recorrer. De fato, é bem possível que a situa­ ção exija tanta flexibilidade que não permita informação quantitativa significativa. Todavia, a experiência clínica su­ gere certos limites que parecem associados a bons resultados. Já vimos que às vezes só alguns temas parecem reclamar atenção terapêutica; mas isto é exceção e não regra com in­ divíduos neuróticos e é raro mesmo entre a população não7

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psiquiátrica. Mais freqüentemente parecem estar envolvidos vários temas, sendo necessário decidir com quantos dêsses temas se deve lidar em qualquer sessão terapêutica. Deve­ mos só tentar lidar com um tema, dois ou possivelmente seis ou sete? A escolha, até onde se pode ver, depende princi­ palmente do tempo disponível, da inclinação do terapeuta e do estado clínico do paciente, assim como de outros fatôres. O normal é só considerar um ou dois temas dentro de um período de tratamento, existindo normalmente certa reserva em lidar com mais de três. Cada tema exigirá, naturalmente, a criação de uma hierar­ quia de cenas, cada qual provocando maior ou menor quan­ tidade de ansiedade no paciente. Surge a questão de saber quantas vêzes devemos apresentar essas cenas ao paciente em cada sessão de tratamento. Se a cena não é bem sucedida e a ansiedade é claramente aumentada pela apresentação re­ petida, cumpre adotar medidas apropriadas e não tentar outras apresentações. Contudo, se tivermos sido cuidadosos na criação da hierarquia e o paciente preciso na previsão da ansiedade que será evocada por várias situações, em geral bastará a média de três ou quatro apresentações de qualquer, cena determinada. É melhor considerar isso como mínimo e aumentar o número se houver qualquer dúvida prolongada sôbre a maneira como se sentiu o paciente. O problema do número de cenas a apresentar dentro de um período de tratamento é principalmente questão de tempo dis­ ponível. Em geral a sessão de dessensibilização dura de 20 minutos a uma hora e pode naturalmente ser mais longa se houver no caso considerações especiais, por exemplo, se o pa­ ciente só puder submeter-se a terapia durante suas férias anuais de 15 dias. O período habitual de 45 minutos desti­ nado a tratamento permite apresentar quatro a cinco cenas, se o terapeuta desejar, mas também não se pode fazer uma recomendação firme a êsse respeito e o terapeuta deve julgar a situação por si mesmo. As cenas propriamente ditas em geral se apresentam du­ rante apenas alguns segundos (digamos, de 5 a 15), embora também o terapeuta possa aplicar seu critério nesta questão. Êle achará mais prudente exposições mais curtas em dois

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casos: quando suspeitar que determinada cena causa uma quantidade de ansiedade maior que a habitual ou quando criar um grau inesperado de ansiedade. Neste último casoj natu­ ralmente, o terapeuta deve encerrar imediatamente a cena e esforçar-se por fazer o paciente voltar a um estado calmo e plenamente relaxado o mais depressa possível. A seqüência de apresentação de cena-pausa-relaxação é naturalmente seguida por mais um intervalo durante o qual se permite que o paciente continue sua relaxação antes da apresentação da mesma cena ou da seguinte. Esta pausa é geralmente mais longa do que a existente entre apresenta­ ção de cena e relaxação, e pode durar cerca de meio minuto. Mais uma vez, não há regras definidas sôbre a duração dêste intervalo, mas existe pelo menos uma boa razão para que o o intervalo não seja muito curto. A experiência realizada por Napolkov em 1963, emborà não envolvendo pacientes humanos, sugere que a duração do intervalo que separa um sinal de ansiedade do sinal seguinte pode ser crucial para decidir se a ansiedade aumentará ou diminuirá. Se desper­ tada a ansiedade por um sinal, será preciso extingui-la antes de dar o sinal seguinte; caso contrário a ansiedade criada na primeira ocasião poderá ser aumentada pela segunda e com sucessivos sinais a ansiedade experimentada poderá apresen­ tar efeito acentuadamente cumulativo. Para evitarmos a possibilidade de aumentos alarmantes na reação não adaptativa, em lugar da diminuição planejada, é importante natu­ ralmente dar tempo para que a ansiedade excessiva se dissi­ pe; por isso, tôda cena acompanhada por excessiva pertur­ bação deverá ser seguida por uma pausa mais longa para relaxação. Surgem também problemas relacionados com o número de sessões de tratamento que o paciente deve receber cada se­ mana. Em geral a questão se resolve mediante consideração do que é possível para o paciente, por exemplo, se êle pre­ cisa viajar certa distância, se lhe é difícil tirar tempo de seu trabalho e assim por diante. Por outro lado, quando se trata de pacientes internados, em geral é possível vê-los várias vêzes por dia. Para alguns tipos de casos de terapia de aver­ são se tem de fato considerado essencial manter o paciente

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em tratamento durante grande parte do dia. A freqüência recomendada para o tratamento, seja diário ou semanal, é porém quase inteiramente baseada em conjeturas com muito poucas provas. Argumenta-se, talvez com razão, que o con­ tato mais freqüente com o paciente aumenta sua motivação pelo progresso mais rápido e, através da repetição da lista de coisas que o paciente deve fazer e de que deve lembrar-se, reduz a possibilidade de exposição a reaprendizagem do há­ bito neurótico por descuido ou negligência. Uma tentativa de substituir considerações de senso comum por um método mais exato, ao decidir sôbre a freqüência apropriada do tratamento, levou a uma comparação entre os efeitos documentados de prática “ maciça” e “ espaçada” . Ex­ periência familiar em aprendizagem tem sido demonstrar que a eficácia aumenta quando se usam várias provas curtas (es­ paçadas) em lugar de uma prova prolongada (maciça), e poder-se-ia argumentar que é possível esperar tal resultado no caso de processos de terapia de comportamento. Isto pro­ vavelmente influenciou terapeutas a optarem por certo nú­ mero de sessões terapêuticas curtas, mas a dificuldade é dey cidir como aplicar o princípio de prática espaçada — que constitui uma sessão curta — e quantas sessões curtas são necessárias para produzir maior eficácia do que uma sessão longa? Não se dispõe atualmente de boas respostas para essas perguntas, mas os resultados de uma experiência pro­ vavelmente merecem citação neste contexto. Nesse estudo, de Ramsay (1966), comparou-se apenas um tipo de prática espaçada com um tipo de prática maciça e usaram-se 21 pa­ cientes normais que apresentavam vários mêdos de animais. Na condição de prática espaçada cada paciente recebeu dois estímulos da hierarquia de mêdo com que lidar através de dessensibilização, sendo cada um dêles apresentado 20 vêzes em um período de 20 minutos. Realizaram-se ao todo qua­ tro sessões de tratamento. A prática maciça consistiu na apresentação de cada estímulo 40 vêzes em igual número de minutos durante um período de duas sessões. Aqui se veri­ ficou que, embora tanto as sessões maciças como as espaça­ das tenham produzido reduções no mêdo, as espaçadas foram mais eficazes, resultado que parece contradizer a afirmativa 92

de Wolpe de que o espaçamento de sessões de tratamento parece não ter importância. Todavia, continua difícil deter­ minar a base que deve servir à decisão quanto à duração e ao espaçamento apropriados das sessões de tratamento para cada indivíduo e cada doença. Tudo isso torna impossível calcular o número total de ses­ sões necessárias para aliviar algum sintoma ou combinação de sintomas; infelizmente, muitas vezes esta é a pergunta que os pacientes acham mais importante. De fato, pelo que se disse, é claro que, embora se possa prontamente apreciar o princípio de inibição recíproca, os problemas práticos en­ contrados em sua aplicação parecem ofuscar a aura de pre­ cisão que êste tratamento possa ter adquirido. No momen­ to, parece não haver maneira muito útil de prever o tempo necessário para dessensibilização sistemática, embora algu­ mas sugestões interessantes tenham surgido de um estudo mencionado no capítulo seguinte. Portanto, o terapeuta pre­ cisa aqui também voltar a recorrer à intuição e à experiência para orientá-lo nas cautelosas observações sôbre resultado que porventura se permita fazer. Voltemo-nos agora para alguns outros problemas de espé­ cie mais óbvia e urgente que se podem encontrar nesta for­ ma de terapia. Um dos mais freqüentes se relaciona com relaxação. Alguns pacientes parecem jamais conseguir ní­ vel de relaxação que sirva para inibir convenientemente a ansiedade. Parece que isto se pode até certo ponto atribuir à indisposição de “ abandonar-se” , presumivelmente da mes­ ma espécie que frustra o processo de hipnose; sem dúvida aquêles que deixam de relaxar-se parecem incapazes de con­ seguir êste estado de abandono ou diminuição de controle. Em tais casos, o terapeuta tem de oferecer a garantia de que o paciente precisa, mas não encontra na situação, tal­ vez mantendo presente mais de um terapeuta ou introduzin­ do um terapeuta de sexo diferente. Alternativamente, pode ter sido excessivamente superficial o treinamento de relaxa­ ção aplicado e o paciente pode realmente não ter adquirido u necessária aptidão para controlar sua musculatura. Neste último caso, a solução é simples e óbvia: é preciso haver mais tratamento completo antes que se possa fazer nôvo progresso. 93

A fim de vencer essa dificuldade particular, podemos con­ tudo explorar outros caminhos, um dos quais poderia ser abandonar a dessensibilização imaginária e voltar-se para a terapia in vivo . Neste caso se escolheria alguma reação in­ compatível que não a relaxação. Outra alternativa poderia consistir em tentar a redução da ansiedade situacional do paciente por meios químicos, mediante a ministração de dro­ gas redutoras de ansiedade, embora aqui o problema resida na possibilidade de os ganhos em redução de ansiedade serem compensados pela redução da capa ■ ’.idade de aprender com a situação. Sem dúvida, como indicou Franks (1960), há in­ dicações de que certos tipos de drogas podem prejudicar a eficácia da aprendizagem e não desejaríamos eliminar a an­ siedade à custa de uma aprendizagem cuja ocorrência pu­ déssemos desejar nas condições de “ ansiedade reduzida” . Wolpe preconiza, porém, vigorosamente o emprego tanto de drogas como de dióxido de carbono como método para lidar com níveis altos de ansiedade. ^ W olp e sugere também a possível eficácia de processos de alívio de ansiedade em tais casos. O método baseia-se no estabelecimento de associação entre, de um lado, certas su­ gestões que o paciente possa manipular e, de outro, a redu­ ção do estado de tensão. Em geral o paciente se submete a um choque elétrico forte e contínuo, que é interrompido pelo terapeuta sempre que o^paciente profira alguma palavra es­ pecífica — qualquer palavra sem sentido serve muito bem. Com o tempo espera-se que o paciente forme uma associação entre a palavra proferida e os sentimentos de alívio que po­ dem ocorrer quando interrompido o choque de modo que seja capaz de reduzir outros estados emocionais poderosos em ocasiões futuras pronunciando a mesma palavra. Se o paciente achar difícil abandonar-se e relaxar-se durante o treinamento de relaxação ou subseqüentemente, poderá usar a mesma palavra para ajudar a reduzir essa ansiedade si­ tuacional. Naturalmente, deve-se acentuar que êste processo se baseia em muitas presunções (por exemplo, que o pacien­ te não diferencia a “ ansiedade” produzida por choque elétri­ co daquela despertada na sessão de dessensibilização) e que — até onde o autor tem conhecimento — não existe a menor 94

prova experimental de que ele dê resultado. O autor não obteve o menor êxito no emprêgo dessa técnica com alguns pacientes, embora não se possa generalizar a partir dessa experiência. Mais um problema surge em relação com inadequações de imagens que podem encontrar-se em alguns pacientes. Uma paciente do autor era absolutamente incapaz de reproduzir em sua imaginação uma trovoada; as cenas que conseguia criar mentalmente nada tinham de semelhante com aquelas que caracterizam a verdadeira trovoada, da qual ela tinha muito mêdo. Não há dúvida que as pessoas diferem muito em sua capacidade de criar cenas imaginárias e Wolpe faz observações a êsse respeito, afirmando que pode haver em ação alguma influência cultural. Tanto nos Estados Unidos como na África do Sul, diz êle, noventa por cento dos pacien­ tes são capazes de conseguir as necessárias criações mentais sem dificuldade, enquanto na Grã-Bretanha a proporção é muito menor. Pelo menos três cursos de ação estão aber­ tos ao terapeuta que defronta com êste problema particular. Em primeiro lugar, pode tentar dramatizar a apresentação das cenas pelo emprêgo de palavras especialmente escolhidas ou outros estímulos (por exemplo, trovão gravado em fita). Em segundo lugar, pode tentar empregar hipnose, sob cuja influência talvez seja possível injetar maior noção de reali­ dade na imagem. Em terceiro lugar, o terapeuta pode vol­ tar-se para a dessensibilização in vivo como meio de envol­ ver diretamente situações de vida real, embora aqui o pro­ blema de criar sob medida as condições apropriadas seja um pêso constante. Um dos problemas mais importantes talvez surja quando o terapeuta se torna cônscio de que nenhum progresso está ocorrendo. As implicações são naturalmente muito sérias, pois isso sugere que se podem ter deixado de lado algumas considerações muito básicas. O caso de Wolpe com a espôsa dominada, citado anteriormente, é um exemplo dessa espécie e tais casos aparecem com certa freqüência. Quando o pro­ blema surge de deficiências na coleta e interpretação de in­ formação básica sôbre as dificuldades do paciente, a única solução para o terapeuta é começar de nôvo com uma inves95

tigação mais cuidadosa do que antes. Naturalmente, o ma­ logro em progredir pode ocorrer por outras razões que não sejam erros do terapeuta; uma possibilidade — muito real — é que a técnica de dessensibilização sistemática, imaginá­ ria ou in vivo, simplesmente seja inadequada para lidar com determinadas doenças. Na opinião do autor, por exemplo, pode ser difícil e às vezes impossível tratar, por essas técni­ cas, doença obsessiva grave, embora, se conhecêssemos mais sobre o distúrbio em questão, talvez êle se mostrasse mais sensível a ataque terapêutico. Em outras palavras, o malo­ gro em conseguir melhora ou cura pode ser considerado como malogro das próprias técnicas; procurando em outras dire­ ções a origem do malogro, talvez se perca muito tempo, que se deveria gastar em tentativas de inventar e refinar trata­ mentos alternativos. Nossas afirmações em favor da eficá­ cia da dessensibilização devem basear-se em fatos relativos a êxitos e malogros, não em quaisquer explicações post hoc das razões pelas quais as técnicas não apresentaram eficácia universal. É para alguns desses fatos que devemos agora voltar-nos, partindo dos aspectos clínicos e intuitivos da des­ sensibilização expostos nos três capítulos anteriores.

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CAPÍTULO

Vlí

Experiências de Eliminação de Ansiedade Com Pacientes Não Psiquiátricos

O p ac ien te , jovem estudante universitário, reclina-se confortàvelmente no consultório do terapeuta; os olhos estão fecha­ dos e o corpo completamente relaxado. Seu problema tem relação com a ansiedade que experimenta antes e durante os exames colegiais e o terapeuta está apresentando cenas que representam o paciente em várias situações, lendo um ma­ nual poucos meses antes da ocasião crítica; em seguida sen­ tado na sala de exame lendo as perguntas e depois escrevem do-as. Ao término da sessão de tratamento o paciente afir­ ma sentir-se diferente em relação a seu problema e diz que já pode contemplar o futuro imediato com calma considera­ velmente maior. Depois de dez sessões de dessensibilização imaginária, tanto êle como o terapeuta acham possível deixálo trabalhar e fazer seus exames, sem o pêso de esmagado­ ra ansiedade.

A maioria das provas em terapia de comportamento é desta espécie — um relato anedótico de processos que alegadamente incorporam certos princípios psicológicos, mas sem a es97

pécie de informação que nos permitiria chegar à conclusão de que a terapia propriamente dita efetuou de fato a mu­ dança. Naturalmente, o grosso dos estudos psiquiátricos é também dessa espécie — relato breve de uma situação com­ plexa e a conclusão de que aquilo que aconteceu, seja o que fôr, serviu para efetuar a melhora. Porém, tais estudos na­ da fazem para convencer-nos de que o tratamento tem real­ mente relação com o resultado — talvez o paciente se recupe­ rasse de qualquer jeito ou talvez a ida ao terapeuta o tenha levado a “ firmar-se” de um modo que até então evi­ tara. Por essa espécie de descrição de caso simplesmente não podemos dizer se um tratamento é eficaz ou não, quan­ to mais se é eficaz pelas razões que o terapeuta possa espe­ cificar. O que realmente precisamos para avaliar uma variá­ vel, como a representada pelo tratamento, é experiência con­ trolada de alguma espécie. Experiências assim infelizmente ainda são raras na terapia de comportamento (e considera­ velmente mais raras na psicoterapia), mas dois tipos princi­ pais foram relatados. Em uma delas as condições de trata­ mento são delibèradamente modificadas ou alteradas, e cuidadosamente observados os efeitos de tais modificações; para estudar uma variável como relaxação, podemos avaliar sua contribuição incluindo-a numa experiência e excluindo-a de outra, e comparando os resultados obtidos nas duas con­ dições. Na outra, podemos dispor-nos a responder a uma pergunta diferente, isto é, se êsse tratamento é ou não me­ lhor do que outros em certas maneiras definíveis. Ambos os tipos de experiência exigem cuidado no planejamento e execução. Uma experiência inicial foi realizada por Lang e Lazovik (1963), que aplicaram dessensibilização sistemática a pessoas normais (casos não psiquiátricos) com fobia de serpente e compararam êsses resultados com os obtidos quando só usa­ ram relaxação. O resultado indicou que a apresentação siste­ mática de itens de ansiedade do “ menos” até o “ mais atemorizador” em condições de relaxação foi bem sucedida, enquan­ to a relaxação sòzinha pareceu nada ter adiantado. Não só o primeiro processo produziu diminuição do mêdo na presen­ ça de serpentes verdadeiras, mas a melhora se manteve quan­ 98

do feitas verificações semestrais, não parecendo que algum outro “ sintoma” haja substituído o que fôra eliminado. Êste resultado sugere que a dessensibilização sistemática é trata­ mento válido para fobia de serpente em casos não psiquiátri­ cos e, com tais pessoas, não houve necessidade de mudar a personalidade do indivíduo ou de explorar os fatores que leva­ ram à aquisição da fobia. Êstes dois últimos pontos presu­ mivelmente diferenciariam de maneira clara essa forma de tratamento das espécies mais comuns de psicoterapia. A fobia de serpentes em pessoas normais também recebeu atenção em estudo posterior de Lang e outros (1965), comparando-se desta vez um grupo que recebeu terapia formal de dessensibilização com dois grupos de controle. Um desses grupos de controle não recebeu o menor tratamento, enquan­ to o outro foi submetido a “ pseudoterapia” , consistindo em entrevistas, que não se harmonizava com qualquer tratamen­ to eficaz reconhecido. Verificou-se que a dessensibilização certamente produziu resultados melhores do que os encontra­ dos nos dois grupos de controle, mas, naturalmente, essa fraca comparação pouco contribui para confirmar a validade ou eficácia da terapia de comportamento. Estudo mais convincente foi realizado por Paul (1966). Preferiu ele investigar a possibilidade de eliminar o mêdo de falar em público entre pacientes não psiquiátricos e, ao fazê-lo, comparou três tipos diferentes de terapia, deixando além disso um grupo sem receber o menor tratamento. Esta última precaução naturalmente lhe permitiria avaliar quais­ quer mudanças encontradas nos três outros grupos. As tera­ pias aplicadas foram dessensibilização sistemática, uma pseudoterapia supostamente ineficaz e terapia de “ insight” que parecia ter as características habituais de psicoterapia. Naturalmente a comparação importante a fazer era entre terapia de “ insight” e dessensibilização. Neste ponto, o estu­ do de Paul é de especial interesse porque êle preferiu empregar cinco experientes terapeutas de “ insight” para aplicar tôdas as formas de tratamento. Evidentemente seria possível esperar nos resultados alguma parcialidade contra a dessensibilização, de modo que qualquer vantagem demons­ trável dêste tratamento teria considerável significação. 99

Constatou-se que o uso de dessensibilização sistemática foi bem sucedido em todos os casos, o que é, de fato, um resul­ tado impressionante. Por outro lado, a terapia de “ insight” , embora obtendo êxito em quase 50 por cento dos casos assim tratados, não foi melhor do que a pseudoterapia. De interêsse adicional foi, a descoberta de que 17 por cento dos pacientes não submetidos a tratamento mostraram ter-se re­ cuperado de seu mêdo de falar em público. Prova ainda mais concludente é terem os experientes terapeutas de “ in­ sight” declarado que começariam a usar dessensibilização sistemática com seus clientes e demonstrar o método em seu trabalho de treinamento e consulta. Sua decisão, se executa­ da, poderia considerar-se um tanto apressada por diversas razões. Antes de mais nada, os pacientes não eram casos psíquicos e não era óbvia a obtenção de resultado semelhante em casos psíquicos. Além disso, o que em geral se conhece como terapia de “ insight” tipicamente demora muito mais do que o tempo dedicado a êsse estudo e poderia ter produ­ zido maior medida de sucesso se aplicados mais tratamentos. A terapia de “ insight” costuma também ter objetivos muito mais amplos do que alívio sintomático, e qualquer compa­ ração simplesmente em têrmos de impacto sôbre a fobia poderia ser injusta para com êsse tipo de tratamento. To­ davia, êsses resultados dão certa medida de apoio à superio­ ridade da dessensibilização como meio de eliminar fobias comuns em pessoas normais. Também interessa o estudo de Davison (1966) sôbre fobia de serpentes em 28 mulheres normais, principalmente por­ que lança certa luz sôbre os elementos importantes do tra­ tamento de dessensibilização. A um grupo aplicou-se a des­ sensibilização com relaxação da maneira habitua], enquanto outro foi submetido a dessensibilização sem relaxação. Uma comparação entre os resultados desses dois grupos indicaria a importância da relaxação. Entretanto, um terceiro grupo foi submetido a relaxação com cenas ou imagens irrelevantes (isto é, irrelevantes para a fobia de serpentes) e a compa­ ração dos resultados dêste grupo com os obtidos nos outros permitiria determinar a importância das imagens como agentes terapêuticos, em comparação com a relaxação. Além

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disso, um quarto grupo não foi submetido ao menor trata­ mento. Os resultados dêste estudo parecem muito claros; o ferupo de dessensibilização com relaxação apresentou mais melhora do que qualquer dos outros três. De fato, quando empregadas imagens irrelevantes e quando omitida a relaxação, os resul­ tados não foram :nelhores do que os obtidos quando não se aplicou o menor tratamento. Isso sugere fortemente que tanto a relaxação como as imagens apropriadas são ingredien­ tes necessários ao bom êxito na eliminação de fobias. Nova­ mente, porém, precisamos ser cautelosos ao tirar conclusões dêste estudo, pois não se usaram neuróticos, a fobia era li­ mitada e o mesmo terapeuta serviu em todos os grupos — com todas as parcialidades possíveis que tal processo poderia introduzir. A validade das descobertas de Davison foi apoiada pelo estudo de Rachman (1965) sôbre indivíduos normais que so­ friam de intenso mêdo de aranhas. A dessensibilização, com e sem relaxação, foi comparada aqui com um grupo subme­ tido “ apenas a relaxação” e outro grupo “ sem tratamento” , e os resultados indicaram também que a apresentação gra­ dual de estímulos evocadores de ansiedade, juntamente com relaxação, produziu os melhores resultados. Por outro lado, dessensibilização sozinha e relaxação sozinha parecem não ter sido adequadas para eliminar a condição fóbica. Con­ tudo, devemos novamente observar que êste estudo é carac­ terizado por limitações semelhantes às do estudo de Davison e precisamos ser extremamente cautelosos na maneira como extrapolamos dêsses resultados. Investigação com objetivos semelhantes aos que acabamos de mencionar foi realizada por Moore (1965), sendo os pa­ cientes 12 indivíduos que sofriam de asma. Aplicaram-se três tratamentos ao grupo de pacientes: relaxação sozinha (A ), relaxação com poderosa sugestão de que a asma do paciente melhoraria (B ) e o método habitual de dessensi­ bilização com relaxação (C) (* ). A fim de comparar os ( * ) No caso do tratamento por dessensibilização, apresentou-se aos pacientes uma hierarquia de situações relativas ao ataque asmático propria­ mente dito, assim como as referentes às tensões psicológicas que os produzem.

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efeitos desses tratamentos separados era necessário natural­ mente assegurar que um tipo de terapia não ocupasse posição mais favorável do que os outros e por isso decidiu-se oferecer dois tratamentos a cada paciente, variando-se a ordem em que eram aplicados. Por exemplo, um paciente recebia tra­ tamento A seguido por tratamento B, outro B seguido por A, outro C seguido por B e assim por diante. Moore relata que, embora os pacientes tenham experimen­ tado melhora subjetiva com tôdas as três terapias, só a des­ sensibilização com relaxação pareceu produzir prova obje­ tiva de recuperação da condição asmática. Tal prova é de fato convincente, pois não estamos mais lidando com uma dificuldade relativamente leve experimentada por indivíduos normais, mas com forma grave de distúrbio que freqüente­ mente é mal controlada por outros tipos de terapia. Ainda existem, naturalmente, numerosos problemas que precisamos considerar antes que possamos concluir que a terapia de inibição recíproca tem algum potencial no tratamento de dis­ túrbios psicossomáticos, mas o resultado dêste estudo parti­ cular oferece pelò menos considerável esperança para o futuro. Todavia, além dessa descoberta muito interessante de que alguns ataques asmáticos parecem reagir à terapia de inibi­ ção recíproca, Moore pôde confirmar a conclusão, tirada de outros estudos, de que a dessensibilização precisa ser acom­ panhada de relaxação para apresentar tôda sua eficácia. To­ mados em conjunto, portanto, êsses estudos deveriam servir para aumentar nossa confiança na existência de algum valor terapêutico específico no tratamento de inibição recíproca, tenha ou não êsse valor algo a ver com princípios da teoria de aprendizagem. Problema experimental da terapia de inibição recíproca, muito diferente, foi abordado por Cooke (1966) e tem impor­ tante influência sobre considerações práticas. A questão é saber se os processos da dessensibilização in vivo e da imagi­ nária produzem os mesmos resultados. Já dissemos em capí­ tulo anterior que, aceitando as coisas por seu valor aparente, poder-se-ia afirmar que os processos in vivo são mais efica­ zes, mas que a dessensibilização imaginária é provàvelment

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mais fácil de executar, O estudo envolveu 12 estudantes uni­ versitários que declararam ter “ muito mêdo” de ratos de laboratório, sendo êsses pacientes incluídos em um ou outro de três grupos — dessensibilização in vivo , dessensibilização imaginária e sem tratamento. Aos dois primeiros grupos ensinou-se uma forma do método de relaxação de Jacobson e depois se apresentou, em realidade ou em imaginação, uma hierarquia de “ situações de rato” com que lidar, variando desde ficar parado à porta de uma sala observando um rato em sua gaiola até tirar um rato de uma gaiola contendo vá­ rios outros. O resultado desta experiência indicou que ambas as formas de tratamento eram igualmente eficazes; êste resultado tende naturalmente a favorecer maior uso da dessensibilização imaginária por sua maior flexibilidade e conveniência. Con­ tudo, outro aspecto interessante dessa experiência refere-se ao processo empregado. É evidente que na situação de vida real o paciente não poderia estar completamente relaxado e ao mesmo tempo dedicar-se às atividades ordenadas pelo experimentador — de fato, foi necessário relaxar o paciente entre as várias atividades executadas, Terem ambos os pro­ cessos dado resultados igualmente bons deve levar-nos a le­ vantar questões sôbre o papel da relaxação pois, pelo menos nesta experiência, a inibição de ansiedade pela relaxação foi necessariamente retardada. Sem dúvida, tal arranjo não pa­ rece corresponder às exigências ideais da terapia de inibição recíproca, segundo expostos por Wolpe. Outro problema de consideráveis implicações práticas re­ cebeu também atenção experimental. Relaciona-se com a vital questão de saber se podemos aumentar a eficácia terapêutica tratando os pacientes em grupo e não individualmente. O primeiro estudo dessa espécie foi relatado por Lazarus (1961) e abrangeu indivíduos com variadas fobias, assim como ou­ tras perturbações. Os pacientes não foram tirados de uma população psiquiátrica, embora se dissesse que eram muito deficientes em suas relações sociais e no ajustamento geral; supõe-se que êste estudo é melhor considerado como exemplo de dessensibilização de pessoas normais com mêdos irracio­ nais.

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Alguns dêsses pacientes experimentais receberam terapia formal de dessensibilização, mas em ambiente de grupo, e os resultados foram comparados aos obtidos quando aplicada “ terapia interpretativa” , também em ambiente de grupo. La­ zarus relata que enquanto a dessensibilização em grupo pro­ duziu índices de alto sucesso, a terapia interpretativa não efetuou melhora a não ser acompanhada de relaxação, quando se obteve ligeira vantagem. Dos 18 indivíduos tratados por inibição recíproca, 13 se recuperaram, embora três hajam sofrido recaída; entre as nove pessoas submetidas a terapia interpretativa de grupo não houve recuperações; dos oito pa­ cientes que receberam terapia interpretativa com relaxação, dois se recuperaram, um dos quais sofreu recaída. Do ponto de vista de Lazarus um dos aspectos mais significativos dessa investigação surgiu quando se submeteram os pacientes em quem malogrou a terapia interpretativa de grupo, a trata­ mento de dessensibilização: daí resultaram mais dez recupe­ rações, com duas recaídas posteriores. Êste aspecto da in­ vestigação parece sem dúvida impressionante — tomar malogros de uma forma de tratamento e demonstrar que outro tipo de terapia se mostra eficaz com os mesmos pacien­ tes é uma demonstração convincente. Contudo, as aparências aqui podem ser um tanto enganadoras, pois o estudo tem al­ gumas falhas cruciais de planejamento. Em primeiro lugar, Lazarus foi responsável tanto pelo tratamento como pela ava­ liação dos pacientes, quando em estudo solidamente planejado as duas atividades deveriam ser independentes. Em segundo lugar, temos realmente pouca noção do tipo de “ terapia in­ terpretativa” envolvida nesse estudo, especialmente por La­ zarus não ser terapeuta interpretativo, sendo possível argu­ mentar que êste tipo de tratamento tem pouca significação real. Baseados nessa prova não poderíamos, por exemplo, concluir que psicoterapia é inferior a dessensibilização. Merece rápida menção um interessante ponto final que emerge dêsse estudo. Lazarus observou que o número médio de sessões de tratamento exigido pelo grupo de dessensibi­ lização foi de 20,4; por outro lado, os que foram submetidos a dessensibilização depois de não apresentar melhora com te­ rapia interpretativa se recuperaram em apenas 10,1 sessões.

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Lazarus sugere que isso parece indicar que a terapia interpretativa teve certo impacto sôbre os indivíduos, embora de­ clare que o benefício foi “ não específico” . Seria naturalmente de considerável interesse saber o que produziu êsse benefício não específico e se, com clara compreensão dos mecanismos envolvidos, seria possível aumentar a contribuição prestada à recuperação rápida. Em outro desses estudos, de Paul e Shannon (1966), compararam-se os resultados do tratamento de dez estudantes “ cronicamente ansiosos” (embora provàvelmente não neuró­ ticos) com dez estudantes que não receberam o menor tratamento. Os resultados do estudo sugeriram que esta adaptação da terapia individual mais habitual produziu ín­ dices de considerável sucesso. Em estudo semelhante sôbre estudantes com ansiedade relativa a exames, Kondas (1967) confirmou também o valor do emprego de inibição recíproca em base de grupo. Os problemas são aqui certamente um pouco maiores do que no tratamento individual. Por exem­ plo, é aconselhável incluir só pacientes com uma fobia tida em comum e para os quais se possa criar uma hierarquia con­ junta. Outro problema é evidentemente o da rapidez com que os vários indivíduos reagem ao processo de dessensibili­ zação; o emprego de terapia de grupo pressupõe que todos os membros avançarão mais ou menos no mesmo ritmo. Além disso, em distúrbios- mais complexos é muitas yêzes essencial que o terapeuta mantenha estreita vigilância sôbre os mí­ nimos indícios que possam apontar a presença de excessiva ansiedade, o que é, naturalmente, difícil em ambiente de grupo. Contudo, como demonstrado pelo estudo de Lazarus citado anteriormente neste capítulo, embora se possa aumen­ tar o tempo total gasto pelo terapeuta em condições de des­ sensibilização de grupo, o dispêndio de tempo por paciente pode ser significativamente reduzido. Podemos finalmente mencionar duas outras experiências relativas a dessensibilização de pacientes normais, embora te­ nham interesse mais teórico do que prático. Na primeira, Rachman (1966) comparou um processo padronizado de des­ sensibilização* (apresentação de uma hierarquia de ansiedade 8

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durante relaxação) com um processo conhecido como “ torren­ te’^ * ) . Êste envolvia a apresentação repetida de cenas ima­ ginárias destinadas a criar alta ansiedade a respeito do objeto fóbico, neste caso aranhas. Os resultados desta experiência deveriam indicar a importância da apresentação hierárquica dos estímulos de mêdo em oposição à aplicação repetida das cenas no tôpo de tal hierarquia. O resultado foi de fato o que se esperava das considerações teóricas e das conclusões tira­ das de estudos terapêuticos — a abordagem padrão pouco a pouco se mostrou muito superior à de torrente para reduzir o mêdo de aranhas. De fato, no que se refere aos resultados desta investigação, a torrente não pareceu produzir qualquer modificação no nível de mêdo experimentado e deu o mesmo resultado que se obtém sem tratamento algum(**). Indivíduos normais com “ intenso" mêdo de aranhas foram também escolhidos por Rachman (1966) para sua experiência destinada a investigar a rapidez com que o progresso em situações d e dessensibilização imaginária é transferido para os da vida real. Esta exploração resultou de uma observação feita em estudo anterior, a saber, que aparecia um intervalo. de tempo na transição da situação imaginária para a real e que essa discrepância poderia ter significação tanto teórica como prática. Basicamente, o processo consistiu em proporcionar dessen­ sibilização imaginária para alguns estímulos determinantes de ansiedade e depois expor o paciente a situação de vida real exatamente correspondente à cena imaginada. Tal ex­ posição ocorria com variados intervalos de tempo depois de executada a dessensibilização. Só se usaram três pacientes neste estudo, mas foi possível realizar numerosos testes da rapidez de* generalização para a vida real em cada um dos indivíduos envolvidos. A descoberta mais importante foi que em mais de 80 por cento das observações feitas a transferên­ cia da ansiedade reduzida da situação imaginária para a real foi imediata e êste resultado encoraja-nos a acreditar que (* ) N. T. — ‘Tlooding*’, no original. ( 0 0 ) Verifícou-se que a “ torrente” muitas vezes aumenta em lugar de diminuir a ansiedade.

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um dos supostos riscos de dessensibilização imaginária é mais aparente do que real. Importante qualificação desta regra geral refere-se & algu­ mas ocasiões em que a transferência tendeu a ser retardada e em certa proporção de tais casos a melhora retardada foi precedida de imediato aumento de ansiedade. Tal resultado pareceu associado a estímulos nas escalas superiores da evo­ cação de ansiedade e talvez se precise fazer preparação mais intensiva no início do tratamento para lidar com as cenas que parecem causar ansiedade. Contudo, embora mais de oitenta por cento dos casos tenham mostrado impacto ime­ diato da dessensibilização imaginária sôbre os estímulos da vida real, o estudo indicou também que as reduções de mêdo obtidas nem sempre são estáveis e podem apresentar flutua­ ções. De fato, Rachman acentua que as cifras atuais indi­ cam que certa medida de recaída ocorre em quarenta por cento das ocasiões quando se apresenta a cena de ansiedade apenas três vezes em cada sessão, tendo-se encarecido em capítulo anterior que tal resultado pode causar dificuldade em fases posteriores na apresentação de cenas de hierarquia de mêdo. A recuperação de ansiedade que foi inibida não é muito difícil de explicar; afinal, o fenômeno de nova aprendizagem que se dissipa em certo prazo certamente não é incomum e o bom senso ofereceu um meio para lidar com a situação. Experiências de laboratório indicam também que uma reação inibida durante o treinamento tenderá a apresentar recupe­ ração espontânea e reaparecerá com força depois de algum tempo. Por exemplo, se um cão foi treinado a salivar ao ouvir o som de uma campainha (como se descreveu em capí­ tulo anterior) pode-se fàcilmente extinguir ou inibir essa reação tocando continuamente a campainha sem oferecer ali­ mento. Depois de um repouso adequado, porém, o cão come­ çará de nôvo a atuar (isto é, salivar) quando tocada a cam­ painha; o hábito de salivação demonstrou alguns podêres de recuperação apps inibido. É bem possível que seja inevitável a recuperação espontânea de uma reação fóbica inibida, a mjpnos que adotemos deliberadamente medidas para combater êsse resultado. Uma possibilidade sugerida pela literatura

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experimental é a superaprendizagem: isto é, continuar a pra­ ticar o nôvo hábito durante algum tempo após ter sido satis­ fatoriamente aprendido. Por exemplo, a maioria de nós sabe que para ter certeza de não esquecer nossas falas em uma peça, um poema ou uma lista de compras, o ensaio é impor­ tante — precisamos continuar a ensaiar o material mesmo depois de “ sabê-lo” . Da mesma maneira, talvez, a repetição de cenas imaginárias deve continuar por algum tempo após o paciente ter anunciado que desapareceu toda ansiedade nes­ sa situação. Neste ponto talvez fôsse útil examinar as conclusões que se podem tirar dos estudos experimentais de casos não psi­ quiátricos tratados por dessensibilização. Talvez a mais im­ portante delas seja que o tratamento de inibição recíproca parece ter êxito na eliminação das fobias ou mêdos irracio­ nais de indivíduos normais; isto parece bem estabelecido em resultado de estudos em que se comparou êsse tratamento com o que acontece quando não se aplica tratamento algum. Uma segunda conclusão poderia ser que a terapia de inibição re­ cíproca parece ter certas vantagens sobre outras formas de tratamento com as quais foi comparada. Esta conclusão não é, porém, inteiramente justificada pelas provas citadas, pois as experiências estão abertas a diversas críticas; já se acen­ tuou que em alguns estudos o terapeuta (quase invariavel­ mente terapeuta de comportamento) aplica o tratamento e ao mesmo tempo julga o grau de melhora. Isto não é, natu­ ralmente, uma acusação de que a prova seja deliberadamente falseada em favor da terapia de comportamento, mas sim­ plesmente o reconhecimento de que parcialidades pessoais influenciam os julgamentos. Poder-se-ia também argumen­ tar que por várias razões (algumas das quais já menciona­ das) as comparações feitas com psicoterapia ■ —■ ou terapia de “ insight” — não se realizaram em condições apropriadas e que nenhuma conclusão se pode tirar dessas experiências. Todavia, podemos também concluir que os estudos men­ cionados mostram que a melhoria obtida pela dessensibiliza­ ção não dependeu de busca histórica das origens do mêdo, nem de uma tentativa de mudar de qualquer maneira a per­ sonalidade do indivíduo. Tal conclusão poderia convencer-nos

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de que êsses dois aspectos da psicoterapia são redundantes, embora isso vá bem além das provas. Pode ser que, embora os indivíduos normais não exijam as habituais atenções psicoterapêuticas, os neuróticos delas necessitem; podemos estar lidando aqui com uma diferença entre maus hábitos e neu­ roses. Cautela semelhante poderíamos recomendar a respeito de outra conclusão que se podaria tirar dos estudos até agora mencionados. Embora não haja indicações de substituição de sintoma, com o aparecimento de novos sintomas em lugar dos que foram removidos, elas poderiam aparecer em pessoas neuróticas anormais. Em outras palavras, as conclusões que tiramos dessa^ in­ vestigações dependem até certo ponto de considerarmos se as regras que parecem aplicar-se a casos não psiquiátricos se aplicam igualmente a neuróticos. A única maneira de res­ ponder a esta pergunta, e resolver tôdas as dúvidas, é realizar investigações com pacientes psiquiátricos. As descobertas preliminares de estudos nesse sentido são apresentadas no capítulo seguinte. Contudo, antes de considerarmos outras experiências de dessensibilização, devemos voltar nossa atenção para duas outras conclusões que poderiam tirar-se das provas apresen­ tadas. Uma, da maior importância, é a descoberta de que essas experiências aparentemente confirmam as conclusões tiradas de estudos e observações anteriores, a saber, que os resultados efetivos parecem depender da presença de dois ele­ mentos — abordagem gradual do objeto principal de medo e simultânea inibição de ansiedade por alguma reação anta­ gônica (incompatível), como relaxação. Isto parece pelo me­ nos necessário e poderíamos acrescentar que nenhum ele­ mento usado sozinho parece efetuar melhora. A segunda con­ clusão refere-se à importância de relações na terapia, fator a que se dá ênfase especial na psicoterapia. Os resultados desses estudos poderiam sugerir que o ingrediente ativo no tratamento de inibição recíproca não é a relação entre tera­ peuta e paciente — afinal, relações de alguma espécie carac­ terizaram terapias que, usadas para comparação, se mostra­ ram ineficazes. Naturalmente, poder-se-ia argumentar que não é qualquer relação, mas um tipo especial, que tem valor 109

terapêutico e sua presença depende da atitude do terapeuta; se êle é terapeuta de comportamento talvez essa relação par­ ticular só apareça quando está realizando com satisfação um tratamento ortodoxo. Contra isso, porém, poder-se-ia opor o estudo de Paul que sugere que mesmo as parcialidades que o terapeuta de “ insight” poderia introduzir na situação não compensam a superior eficácia do tratamento de inibição re­ cíproca. Evidentemente, essas experiências fazem pouco mais do que raspar a superfície dos problemas envolvidos e precisamos de muito mais pesquisa antes que as dúvidas possam trans­ formar-se em certeza. Podemos, porém, esperar esclarecer certas questões considerando o trabalho experimental reali­ zado com populações psiquiátricas. O capítulo seguinte trata dessa questão.

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CAPÍTULO

VIII

Experiências de Eliminação de Ansiedade Com Pacientes Psiquiátricos A p ac ien te , dona de casa de 35 anos, está dominada por poderosa perturbação obsessiva. A ansiedade que ela afirma ser-lhe mais danosa é a de que ingerirá alguma substância nociva, como vidro moído, e o terror que sofre parece intei­ ramente desproporcional aos riscos a que está exposta. O impacto de seu medo é generalizado: a lavagem da louça re­ clama complicadas garantias contra pedaços de louça ou vidro moído; mesmo alimentos enlatados precisam ser esmagados e examinados cuidadosamente para o caso de os produtores terem inadvertidamente deixado que substâncias potencial­ mente perigosas se misturassem com o conteúdo comestível. Esta é a espécie de problema que foi tratado por dessensibi­ lização. O problema não é, porém, tão simples como pode sugerir êste esbôço. Um exame mais cuidadoso da vida da paciente revela uma multidão de medos, idéias tolas, atitudes falhas, relações difíceis com os outros, compulsões de prejudicar pessoas (inclusive o próprio marido e os filhos), severa de­ pressão, explosões de cólera incontrolável e numerosas outras anormalidades. A questão refere-se aqui à medida em que esses vários problemas e dificuldades estão relacionados entre

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si — existem muitas perturbações ou apenas uma, da qual tôdas as demais resultam? Além disso, de que valor será a redução de seu mêdo principal, no contexto total de suas anor­ malidades? Ou ainda, por que a paciente torna tão difícil o tratamento, por meio de evasões, meias verdades e pretextos para não executar os exercícios a cujo respeito ela e o te­ rapeuta concordaram? Êsses e muitos outros problemas po­ dem surgir e surgem no curso do tratamento de pacientes psiquiátricos e essas complicações, envolvendo numerosas facêtas da existência do paciente, diferenciam tais indivíduos dos que são considerados normais, mas têm alguma fobia específica. De fato, as anormalidades psiquiátricas podem às vêzes ser tão complexas a ponto de anular completamente qualquer tentativa de explicar a origem ou desenvolvimento de sintomas a partir de qualquer paradigma de teoria de aprendizagem, bem podendo o terapeuta começar a duvidar de que um simples modêlo de condicionamento tenha qualquer poder cxplanatório no que se refere a tais distúrbios. Rara­ mente, ao que parece, podemos identificar uma possível ori­ gem de sintomas c-ontemporâneos a partir de acontecimentos traumáticos do passado, embora, se estivermos dispostos a ser superficiais em nossa investigação, isso possa não parecer difícil; raramente podemos apresentar algo que se assemelhe a um relato plausível das extravagâncias e flutuações da per­ turbação na história do paciente. De fato, é incomum sentir­ mos confiança em nossa descrição do quadro total presente pela teoria de aprendizagem, embora alguns aspectos parti­ culares dêsse quadro possam ajustar-se perfeitamente bem. Naturalmente, poderíamos argumentar que existem aqui pelo menos duas questões importantes, uma relacionada com a validade do relato da doença neurótica pela teoria de apren­ dizagem e outra relacionada com a questão mais prática de saber o que a dessensibilização e outros processos podem con­ seguir em tais casos. Podem ser de fato perguntas comple­ tamente independentes e a resposta a uma delas talvez não permita tirar qualquer conclusão óbvia a respeito da resposta à outra. Poder-se-ia concluir, pela literatura existente, que os terapeutas de comportamento estão menos interessados na resposta à primeira do que na da segunda pergunta. No

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mais das vêzes, os aspectos teóricos são sumariamente esbo­ çados, formulados com evidente pressa e vagamente expres­ sados, e em certas ocasiões o tratamento “ deduzido” d« prin­ cípios teóricos não parece absolutamente ter relação com suas origens putativas. Talvez ainda mais séria seja a insegurança das próprias origens — os*, fundamentos da moderna teoria da aprendizagem. Todavia, o que se disse não implica descrédito para os in­ vestigadores sérios interessados em sondar as aplicações e os limites da teoria da aprendizagem na compreensão e mo­ dificação de problemas psiquiátricos; para êjes a questão não é de propaganda, movimento ou patrocínio especial, mas de indagação científica em área onde existem muito poucas provas sólidas. Para êles as teorias de aprendizagem e con­ dicionamento representam simplesmente uma estrutura pos­ sivelmente útil para compreensão e tratamento de distúrbio psiquiátrico, cujo valor precisa ser sistemática e trabalho­ samente explorado. Ainda assim, tudo isso exige tempo e esforço, e até agora somente se fêz um comêço pequeno, embora importante. Talvez pela pressão para desenvolver novas técnicas terapêuticas, a maior parte da energia foi absorvida pelo campo mais prático da pesquisa — responder à pergunta sôbre se técnicas de terapia de comportamento dão algum resultado — sejam quais forem as razões de êxito ou malogro. A maioria das provas existentes refere-se a estudos de casos individuais, em que se aplicou a dessensibilização a uma condição psicológica. Os relatórios são de pouco valor, como já acentuado, principalmente porque é impossível de­ terminar se as mudanças observadas eram atribuíveis à te­ rapia de comportamento ou a um dos numerosos fatores descontrolados que atuavam na complexa situação terapêu­ tica. Além disso, a publicação de tais estudos — quase invariàvelmente relatos de sucesso — deixa de fora um nú­ mero desconhecido de malogros, de modo que êsse tipo de relatório nem mesmo nos permite calcular até que ponto a terapia de comportamento tem probabilidade de êxito. Evi­ dentemente existe necessidade de estudo experimental con­ trolado da dessensibilização e outras formas de terapia de

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comportamento, assim como de qualquer outro tratamento de perturbações neuróticas. Um progresso sôbre estudos de casos isolados, na litera­ tura sobre tratamento de inibição recíproca, é representado pelos estudos retrospectivos dos efeitos da terapia de com­ portamento aplicada a grupos numerosos. Pelo menos aqui talvez possamos começar a formar certa impressão de como esse tipo de tratamento se compara com outros tradicional­ mente empregados. Vejamos alguns desses estudos. Num dêles Wolpe (1958) apresenta o relato dos resul­ tados obtidos com 210 pacientes neuróticos. Os critérios que usou para julgamento do resultado do tratamento de inibição recíproca foram os propostos por Knight (1941) — melhora sintomática, aumento da produtividade, melhora de ajustamento sexual, melhora de relações com outras pessoas e aumento da tolerância às tensões habituais da vida — embora o uso desses critérios não seja naturalmente garan­ tia de objetividade. Wolpe julgou altamente bem sucedido o resultado nesses 210 casos, quase 90 por cento dêles con­ siderados como “ aparentemente curados” ou “ muito melho­ rados” ; 7 por cento foram “ de ligeiramente a moderada­ mente melhorados” , enquanto apenas 3 por cento foram “ sem melhora” . São cifras que indicam espantoso sucesso por qualquer padrão, especialmente quando se considera a quantidade relativamente pequena de tempo terapêutico empregado (uma média de 10,7 meses para uma média de 46 entrevistas). Wolpe compara seus resultados com os obtidos por dois institutos psicanalíticos onde a porcenta­ gem de melhora variou de 38 a 60 por cento, em flagrante contraste com seus 90 por cento! Isso aparentemente de­ monstra clara superioridade da inibição recíproca, mas mui­ tos fatores podem ter contribuído para essa aparente discre­ pância entre as duas formas de tratamento, inclusive o tipo de casos tratados, o rigor com que se fizeram as avaliações de melhora e assim por diante, não sendo possível basear nesse relatório conclusões firmes sôbre a eficácia relativa da terapia de comportamento e da psicanálise. Estudo semelhante foi publicado por Lazarus (1963), que citou os resultados do tratamento por inibição recíproca de

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408 pacientes neuróticos. O resultado, de acordo com Lazarus, foi menos satisfatório do que o obtido por Wolpe, tendo sido de 78 por cento (um pouco melhor do que o índice de remissão espontânea de distúrbios neuróticos não tratados, que é muitas vêzes citada como de 66 por cento) a porcenta­ gem de “ aparentemente curados” ou “ muito melhorados” . Um aspecto útil do estudo de Lazarus foi at separação de 126 casos, dos 408, que se podiam considerar como representati­ vos de condições neuróticas graves. Isso se fêz para determi­ nar se a terapia de comportamento por inibição recíproca era ou não eficaz em outros casos além dos que se pudessem con­ siderar simples e diretos. A cifra comparável de sucesso nesses 126 casos (62 por cento) foi compreensivelmente um pouco inferior à do grupo em geral, mas é de certo interesse só ter havido recaída em um dos casos bem sucedidos, quando Lazarus realizou um seguimento de dois anos após o trata­ mento. Todavia, também neste caso, o estudo está longe de satisfatório e não serve para substituir experiências conve­ nientemente controladas. O mesmo se pode dizer do relatório de Hussain (1964) sôbre 90 por cento de sucesso no trata­ mento de 105 pacientes neuróticos por “ inibição recíproca e recondicionamento” , em períodos de terapia que variaram de 4 a 16 semanas. Contudo, neste estudo existe tão pouca in­ formação precisa sôbre a forma de tratamento, o tipo de pa­ cientes etc., que as cifras citadas têm ainda menos significa­ ção do que é comum nessa espécie de investigação. Certa tentativa para introduzir uma forma de controle experimental foi feita por Cooper (1963), embora o estudo seja prejudicado por diversos defeitos. Os pacientes eram 30 casos tratados por vários processos de terapia de compor­ tamento, entre os quais inibição recíproca, por um período de cêrca de seis anos, tendo Cooper tentado comparar êsses casos com outros tratados por métodos alternativos, como drogas ou psicoterapia. As conclusões dêsse estudo foram que, embora a terapia de comportamento parecesse produzir resultados mais favoráveis a curto prazo, não havia diferen­ ças a longo prazo entre os métodos de tratamento. Contudo, a experiência foi retrospectiva, de modo que as avaliações do estado do paciente no fim do tratamento, depois de um

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ano etc., precisaram basear-se em notas tomadas na ocasião, o que pode acarretar erros consideráveis. Além disso, a com­ paração efetiva de todos os 30 pacientes de terapia de com­ portamento mostrou-se extremamente difícil e talvez nem tenha sido conseguida. Finalmente, vários dos casos de te­ rapia de comportamento representavam pacientes resistentes que não haviam reagido a qualquer outro tratamento depois de prolongados períodos de terapia; tais casos não se podem considerar representativos de neuróticos em geral, devendo ter especial significação os resultados da aplicação de mé­ todos de terapia de comportamento a tal amostragem. Por essas e várias outras razões, a experiência de Cooper não nos permite tirar conclusões firmes sôbre a eficácia da terapia de comportamento em geral ou do tratamento de inibição re­ cíproca especificamente, nem comparar os resultados obtidos como os citados por Lazarus, Wolpe ou qualquer outro pesqui­ sador. Por outro lado, uma das decididas vantagens dêsse estudo foi a independência do investigador que fazia as ava­ liações, ao passo que no caso de Wolpe e Lazarus o próprio terapeuta fêz as avaliações da melhora. As descobertas de Cooper foram ampliadas em publicação posterior (1965), mais uma vez se empregando a técnica de exame retrospectivo de casos tratados por terapia de com­ portamento. Desta vez a amostragem compreendia 77 pacien­ tes: 29 agorafóbicos, 12 com “ outras fobias” , 10 obsessivos, 13 casos de cãibra de escrivão e 13 “ males variados” . Êsses pacientes foram emparelhados para diagnóstico com pacien­ tes que recebiam alguma outra forma de terapia, embora precisemos mais uma vez ter em mente a reserva de que o emparelhamento dessa maneira deixa muito a desejar. Con­ tudo, nada sugere que tal emparelhamento não fôsse inteira­ mente justo para com a terapia de comportamento ou, pelo menos, que mostrasse inclinação contra um resultado favorá­ vel a êsse tratamento. A análise retrospectiva indicou que, enquanto os pacientes experimentais (terapia de comporta­ mento) tiveram um índice de melhora geral de 61 por cento, os de controle (outros tratamentos refletiram apenas um índice de sucesso de 44 por cento. Do ponto de vista da tera­ pia de inibição recíproca uma descoberta talvez ainda mais

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importante no estudo foi a melhora de 100 por cento dos pa­ cientes fóbicos tratados por êsse método. Neste caso, os re­ sultados parecem evidentemente ter muita semelhança com os relatados por Wolpe e Lazarus, mas infelizmente se refe­ rem apenas ao estado dos pacientes no fim do tratamento e grande parte do ganho aparentemente se perdeu quando os pacientes foram seguidos durante algum tempo após o tér­ mino do tratamento. Aqui também se poderia, porém, argu­ mentar que só pode ter pouco pêso um estudo retrospectivo envolvendo avaliações especulativas do que poderia ter aconcido, assim como problemas de emparelhamento. O eviden­ temente necessário é um estudo contemporâneo que inclua seguimento imediato, pormenorizado, em condições cuidado­ samente controladas. Apesar disso, merece menção um estudo retrospectivo mais ambicioso, realizado por Marks e Gelder (1965), tendo o pro­ jeto se limitado a casos fóbicos. Ao todo havia na investi­ gação 32 pacientes, 21 agorafóbicos e 11 com outras fobias de várias espécies, todos os quais foram tratados por terapia de comportamento em ambiente de hospital particular. Êsses pacientes foram cuidadosamente emparelhados com outros (que haviam sido tratados por psicoterapia) quanto ao tipo e gravidade da doença, sexo, idade, duração da condição e condição em que o tratamento fôra aplicado (se em ambula­ tório ou com internação em hospital). Infelizmente o estudo não foi uma pura comparação de terapia de comportamento e psicoterapia, pois se usaram outras formas de tratamento em ambos os grupos, inclusive terapia eletroconvulsiva e drogas. Ainda assim, o grupo de terapia de comportamento recebeu principalmente inibição recíproca (em grande parte in vivo), enquanto o grupo de controle foi tratado principal­ mente por psicoterapia. Quaisquer diferenças no resultado poderiam razoavelmente ser atribuídas aos efeitos da forma principal do tratamento aplicado. Várias descobertas interessantes resultaram dessa investi­ gação, algumas das quais podem ser melhor apreciadas por um exame das cifras apresentadas na tabela a seguir.

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Essas cifras parecem sugerir ligeira vantagem em favor da terapia de comportamento sôbre a psicoterapia. A dife­ rença mais impressionante surge no número total de pacien­ tes. que aparecem na categoria de “ muito melhorados” de sintomas fóbicos, o que parece mais notavelmente em favor da terapia de comportamento imediatamente após o término do tratamento. Contudo, o número de pacientes que apre­ sentam certas indicações de melhora parece mais ou menos igual em ambas as terapias e os benefícios do tratamento (se atribuíveis as alterações ao tratamento) tendem a ser pre­ servados pelo menos por um ano em seguida ao término da terapia. O índice efetivo de melhora nesses casos é de cêrca de 60 por cento para ambos os tipos de tratamento e é bem mais baixo do que o obtido em alguns outros estudos, assim como mais baixo do que a cifra freqüentemente mencionada de recuperação espontânea sem nenhum tratamento. A me­ lhora geral, como se mostra na segunda parte da tabela, não parece tão acentuada quanto a melhora no sintoma propria­ mente dito. Isto não é muito surpreendente no caso da tera­ pia de comportamento que se dispõe especificamente a lidar com sintomas; é bem mais curioso ter a psicoterapia — que geralmente condena tal interêsse por sintomas — apresen­ tado padrão semelhante de resultados. Portanto, no grupo agorafóbico, os resultados dessa inves­ tigação retrospectiva parecem indicar que não houve diferen-. Ças importantes no tipo e extensão do impacto entre psicote­ rapia e terapia de comportamento da variedade de inibição recíproca. Êsse resultado difere evidentemente do citado por Wolpe e Lazarus, e diverge claramente dos resultados obtidos nas fobias simples de indivíduos normais citados anterior­ mente, pois mais ou menos 40 por cento dos casos absoluta­ mente não parecem ter reagido à terapia de comportamento. Quadro um tanto diferente surge, porém, quando examina­ mos os dados referentes ao tratamento de pacientes com ou­ tras fobias que não agorafobia. Ali o resultado parece muito mais favorável à terapia de comportamento, pois ao término do tratamento todos os 11 casos tratados por êsse método h£Íviam apresentado indicações de melhora, enquanto apenas três dos dez casos de psicoterapia podiam classificar-se de

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maneira semelhante. As diferenças depois de um ano dimi­ nuíram um pouco, mas ainda refletiam a maior eficácia da terapia de comportamento no tratamento de fobias específi­ cas. Nossa segunda conclusão dêste estudo poderia ser, por­ tanto, que a inibição recíproca leva especial vantagem sôbre as terapias alternativas no tratamento de determinadas for­ mas de perturbações neuróticas. Gelder e Marks (1966) voltaram em seguida sua atenção para a realização de um estudo de perspectiva controlado no qual, mais uma vez, a inibição recíproca ou o tratamento de dessensibilização sistemática foi comparado com a psicoterapia. O processo consistiu em aceitar 20 pacientes agorafóbicos para internamento em hospital e depois incluir êsses pacientes em um ou outro dos dois grupos de tratamento. Embora o sintoma principal fôsse a condição agorafóbica, os pacientes eram todos caracterizados por outros males, como depressão, obsessões, problemas sexuais etc., e foi necessário igualar os grupos quanto ao tipo de problema e outras variá­ veis. De fato, fêz-se uma tentativa de emparelhar os dois grupos quanto a idade, duração e tipo de sintoma, gravidade da fobia e diversos outros fatores possivelmente importantes. O objetivo era, naturalmente, ter dois grupos tanto quanto possível semelhantes, de modo que só o tratamento que rece­ bessem os diferenciasse; dessa maneira, qualquer resultado vantajoso, para um ou outro grupo, poderia ser atribuído à forma de terapia aplicada e não a algum outro fator. É naturalmente difícil ter controles perfeitos em qualquer estudo e algumas dificuldades sérias se encontraram nessa investigação. Em primeiro lugar, o tratamento dentro de qualquer grupo não é uniforme; alguns pacientes no grupo de terapia de comportamento foram submetidos a tratamento assertivo (forma especial de tratamento de inibição recíproca que será descrita mais adiante) “ como necessário” , e alguns tomaram drogas como Librium e amital sódico para facilitar o tratamento. Novamente, embora os membros do grupo de psicoterapia tivessem entrevistas centralizadas em problemas interpessoais atuais que os relacionavam com experiências passadas, receberam também tratamento por droga quando o terapeuta achou que isso seria útil, escolha que foi de fato 9

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feita em sete dos dez casos dêsse grupo. Além disso, poderse-ia argumentar que, como todos os pacientes foram trata­ dos por pessoas que não seriam consideradas especialistas em qualquer forma de tratamento, excessiva importância se po­ deria ter atribuído ao resultado. Contudo, tendo em mente essas e várias outras desvantagens, vale a pena dar-se o trabalho de examinar os dados apresentados. Todos os pacientes foram recebidos para tratamento em três ocasiões por semana, cada sessão durando 45 minutos, e ao fim dêsse tempo sete dos dez pacientes de cada grupo apresentaram alguma melhora no sintoma principal (agora­ fobia), sendo o grau de melhora ligeiramente maior nos ca­ sos de terapia de comportamento. Contudo, quando terminou o tratamento, todos os pacientes ainda ficaram, com alguma dificuldade residual em maior ou menor grau em têrmos da fobia principal, e parece ter havido tendência a perder-se tôda a melhora com o passar do tempo. Nenhum tratamento pa­ receu exercer muito impacto sôbre outros sintomas (fobias, obsessões, ansiedade, depressão) que o paciente pudesse ter, embora em alguns outros aspectos parecessem ter ocorrido mudanças e modificações favoráveis ao paciente, em parti­ cular quanto ao resultado imediato do tratamento. Encontraram-se geralmente melhoras de ligeiras a moderadas, por exemplo em situações de trabalho e lazer, comportamento se­ xual, relação com outras pessoas e categorias de auto-satisfação, interessante exceção a isso tendo sido a tendência dos pacientes de psicoterapia para apresentar deterioração e não melhora nas relações familiares. Apesar disso, aqui também as categorias indicaram que todos os ganhos obtidos nessas áreas ao término do tratamento tenderam a diminuir após seis meses a um ano. Alguns indivíduos passaram melhor do que outros, embora os resultados em geral fossem decepcionantes do ponto de vista tanto dos terapeutas de comportamento como dos psicoterapeutas. Essas diferenças individuais na reação ao tra­ tamento foram examinadas por pesquisadores que descobri­ ram que resultado mais bem sucedido pacrecia estar relacionado com pacientes que tinham sintomas menos graves antes do tratamento, melhor história de ajustamento ao tra­

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balho, atividades de lazer menos limitadas e menor insatisfa­ ção consigo mesmo como pessoa. Contudo, falando de ma­ neira geral, os resultados foram maus e, nesse sentido, apare­ ceram confirmar a conclusão tirada do estudo retrospectivo anterior, a saber, que os agorafóbicos não são tão sensíveis à terapia quanto outros tipos de pacientes fóbicos. Em outro estudo controlado, Gelder e Marks, juntamente com W olff (1967) dispuseram-se a comparar os efeitos da dessensibilização imaginária sôbre fobias com os da psicoterapia individual e de grupo. Todos os pacientes eram psiquiàtricamente doentes, mas estavam sendo tratados em am­ bulatório, podendo-se presumir daí que a gravidade da perturbação geralmente não era tanta quanto no estudo an­ terior. Os pacientes foram incluídos em um de três grupos após terem sido excluídos os pacientes muito deprimidos ou obses­ sivos; 16 foram submetidos a terapia de comportamento (dessensibilização imaginária), 16 a psicoterapia de grupo e 10 a psicoterapia individual. Alegou-se que o menor ta­ manho dêste grupo de pacientes submetidos a psicoterapia individual era necessário em virtude do limitado número de psicoterapeutas habilitados existentes, mas poder-se-ia argu­ mentar que a ênfase dada à ministração habilitada dessa for­ ma de terapia deixava a terapia de comportamento com certa desvantagem. De fato, enquanto os psicoterapeutas tanto de grupo como individuais haviam tido um mínimo de 18 meses de experiência nesses tratamentos, quatro dos cinco psiquia­ tras que realizaram terapia de comportamento não tinham a menor experiência nessa forma de tratamento. É possível que êsse fator, juntamente com a provável ignorância da teoria de aprendizagem envolvida, tenha servido para limitar a eficiência da técnica. Todos os três grupos de tratamento continham várias con­ dições fóbicas. O grupo de dessensibilização compreendia oito agorafóbicos, quatro com “ fobias sociais” e quatro com “ ou­ tras fobias” a amostragem de psicoterapia de grupo con­ sistia em sete agorafóbicos, três com “ fobias sociais” e seis com “ outras fobias” ; a psicoterapia individual foi aplicada

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em sete agorafóbicos e três casos de “ fobia social". A psicoterapia individual, envolvendo a análise de pensamentos, fan­ tasias, sentimentos e ações, em relação a experiências passa­ das e presentes, foi aplicada durante uma hora cada semana. A terapia de comportamento foi também aplicada durante uma hora cada semana e consistiu em dessensibilização ima­ ginária incluindo relaxação. A terapia de grupo foi realizada durante uma hora e meia por semana, com ênfase em linhas psicanalíticas de tratamento, sendo examinadas manifestações de transferência e apresentadas interpretações. Além das três principais variedades de terapia mencionadas, alguns pacientes em cada grupo receberam tratamento suplementar por meio de drogas. O aspecto mais importante dos resultados talvez tenha tido relação com as mudanças na fobia principal de que se queixa­ va o paciente, não havendo dúvida de que a terapia de com­ portamento foi o tratamento mais eficaz por ter produzido mais rápida melhora. Esta superioridade da dessensibiliza­ ção foi confirmada nas avaliações tanto de psiquiatras como de pacientes, que mostraram ter sido essa forma de trata­ mento significativamente melhor do que as alternativas con­ sideradas. Essa substancial diferença em eficácia é também indicada pelos períodos médios em que os três grupos per­ maneceram sob terapia; em terapia de comportamento foi de nove meses, em psicoterapia individual de 12 e em psicoterapia de grupo de 18. É de certo interêsse observar que, embora a terapia de comportamento pareça comparativamen­ te econômica, o número médio de sessões terapêuticas exigidas é muito maior do que o número exigido para remover as fobias “ normais" mencionadas no capítulo anterior. Houve seguimento dos pacientes até cêrca de 18 meses de­ pois de iniciado o tratamento e deve-se compreender que essa escolha prejudicava a terapia mais eficaz, pois o prazo para recaída era naturalmente maior. Assim o seguimento ocor­ reu durante nove meses após o término da terapia de com­ portamento, seis meses após o da psicoterapia individual e imediatamente após o da psicoterapia de grupo. Apesar dessa parcialidade, a dessensibilização ainda pareceu ter pro­ duzido melhores resultados no referente à fobia principal.

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Considerando tôdas as fobias juntas (isto é, a fobia principal mais as outras que o paciente apresentava), os resultados pareceram também mais favoráveis à terapia de comporta­ mento, embora as diferenças entre os tratamentos não fossem grandes. No que se refere a outros sintomas que não fobias, o resultado foi um tanto variável. Algumas indicações su­ geriram, por exemplo, que os pacientes de psicoterapia de grupo apresentaram menos redução do nível de ansiedade do que os dos dois outros grupos. A respeito de depressão, pare­ ceu haver mais progresso no grupo de dessensibilização, pas­ sando os pacientes de psicoterapia individual menos bem e os de psicoterapia de grupo melhorando ainda menos. Por outro lado, os sintomas obsessivos e a despersonalização (*) não pareceram ser muito afetados, se é que o foram, por qualquer dos tratamentos aplicados. Ainda assim, a terapia de com­ portamento pareceu produzir efeitos geralmente mais favo­ ráveis sôbre os sintomas dessas neuroses do que psicoterapia individual ou de grupo, embora as cifras fiquem aquém das citadas em alguns estudos anteriores. O mesmo resultado também apareceu na investigação de outras facêtas dos pacientes. Só o ajustamento ao lazer de­ monstrou mudança significativa, e isso apenas com trata­ mento de dessensibilização, mas tendências em outras direções também pareceram mais favoráveis à terapia de comporta­ mento do que a qualquer dos outros dois tratamentos. Por exemplo, as relações entre o paciente e outros membros de sua família apresentaram melhora ligeira, mas não signi­ ficativa, no grupo de terapia de comportamento, nenhuma no grupo de psicoterapia de grupo e deterioração ligeira, em­ bora não significativa, no grupo de psicoterapia individual. Também as relações fora da família mostraram certa tendên­ cia a melhora nos grupos de terapia de comportamento e psicoterapia de grupo, mas nenhuma mudança no grupo de psicoterapia individual. Essas tendências ligeiras, mas im­ portantes, parecem ter sido sistematicamente favoráveis ao grupo de tratamento de dessensibilização e servem para au­ (* )

Perda da noção da realidade de si próprio.

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mentar nossa confiança em seu uso em lugar de aceitar as sombrias predições feitas por alguns adversários da terapia de comportamento. Cêrca de sete meses depois da avaliação final os pacientes foram novamente investigados por um assistente social psi­ quiátrico em uma investigação de seguimento. Neste ponto pareceu não haver dúvida de que ocorreu mais melhora sin­ tomática nos pacientes de dessensibilização, seis dos quais foram julgados “ muito melhorados” , enquanto apenas quatro não apresentaram mudança. Melhora geral também se notou nesses pacientes. Em contraste, só dois casos de psicoterapia de grupo foram julgados “ muito melhorados” , enquanto 12 pacientes foram classificados como “ sem alteração” e três dos dez casos de psicoterapia individual foram classificados como “ muito melhorados” , sendo dois considerados “ sem al­ teração” . Deve-se notar que, apesar de a melhora sintomática parecer mais clara no grupo de dessensibilização, julgou-se que todos os três grupos apresentaram indicações de “ melho­ ra geral” . Esta última descoberta pode parecer muito prejudicial à freqüente afirmação de psicoterapeutas de que o tratamento sintomático tem valor limitado; até onde se pode ver, uma terapia reconhecidamente sintomática não apenas está asso­ ciada à melhora geral, mas em certos aspectos parece mais eficaz do que outras formas de tratamento. Além disso os resultados dêsse estudo estão de acôrdo com tôdas as outras investigações experimentais no sentido de mostrar que a subs­ tituição de sintoma (substituição de um sintoma por outro quando removido o primeiro) não é um risco especial na terapia de comportamento por dessensibilização; de fato, o tratamento sintomático parece estar produzindo os resultados mais eficazes. Que conclusões podemos tirar das provas apresentadas nes­ te capítulo? É possível fazer com justiça comparações entre as várias terapias a partir dessas experiências? As respostas a essas e outras perguntas evidentemente devem ser caute­ losas em vista das deficiências dos próprios estudos. Com muita freqüência as amostragens de pacientes foram muito pequenas, além de não ser comparáveis; há excessiva depen­ 126

dência de avaliações possivelmente falíveis feitas pelo pacien­ te e pelo terapeuta; há às vêzes igualmente “ contaminação” de julgamento quando o terapeuta está envolvido também na avaliação da eficácia de seu próprio tratamento; encontramos problemas associados a uma análise retrospectiva; e há pro­ blemas relacionados com a falta de verdadeira perícia do te­ rapeuta. Êsses são apenas alguns dos obstáculos sérios à obtenção de conclusões firmes das provas apresentadas, mas certas generalizações parecem aceitáveis. A primeira é que, até onde se pode ver, os resultados obti­ dos com pacientes psiquiátricos são consideràvelmente piores do que os encontrados quando se tratam de suas fobias indi­ víduos normais por dessensibilização. Em segundo lugar, o tratamento de dessensibilização parece caracterizar-se pelas limitações que afetam outras formas de terapia, exercendo mais impacto sôbre o sintoma principal, mas alguns outros defeitos deixam de ser tocados pelo ataque terapêutico. Isso na realidade não surpreende no caso da terapia de compor­ tamento, que declara explicitamente seus estreitos interesses; deveria ser motivo de maior preocupação a psicoterapia apa­ rentemente não conseguir mais do que a dessensibilização em qualquer aspecto particular. Uma terceira conclusão parece ser que o pêso da prova dêsses estudos dá a impressão de favorecer a dessensibilização como o mais eficaz e rápido dos tratamentos considerados, para a escala de condições neu­ róticas examinadas. Esta última conclusão deve naturalmen­ te considerar que pouca ou nenhuma diferença parece existir entre as terapias no que se refere a agorafóbicos, e a terapia de comportamento só se mostrou superior quando se exami­ nam outras espécies de fobias. Resta ver se essa superiori­ dade se estende a outras formas de anormalidade psicológica não consideradas nos estudos. Deve-se compreender que os estudos examinados exercem influência apenas sôbre uma das importantes perguntas a formular: a referente aos resultados do emprêgo de dessen­ sibilização e sua eficácia comparativa no trato de problemas de doença neurótica. A outra pergunta importante a res­ ponder é, naturalmente, se os resultados dessas investigações lançam alguma luz sôbre a validade das teorias e presunções 127

em que se baseia a terapia de comportamento. A resposta imediata é que relativamente pouco apoio teórico em favor da dessensibilização deriva dêsses estudos, mas em dois as­ pectos particulares pelo menos a causa da terapia de compor­ tamento parece fortalecida pelo resultado. Em primeiro lu­ gar, poder-se-ia argumentar que um ataque central contra a \ queixa principal feita pelo paciente produz benefício genera­ lizado que se estende a outras áreas de desajustamentos; essa descoberta está de acordo com a afirmação de que o sintoma principal é o cerne da “ neurose” e que outras anormalidades podem estar funcionalmente relacionadas com essa fonte pri­ mária. Em segundo lugar, tratar a queixa principal de ma­ neira direta e sistemática — e assim modificá-la e removê-la — não leva ao aparecimento de sintomas alternativos mais do que no caso de outras espécies de terapia examinadas. Em outras palavras, a substituição de sintoma não é um problema especial da terapia de comportamento por dessensibilização, resultado que parece minar a noção popular de que o sintoma é apenas a ponta visível da verdadeira fonte do mal — um “ complexo ocuito” .Naturalmente, a terapia de comportamento ainda tem um longo caminho a percorrer antes que se possam confirmar essas conclusões provisórias, mas razoáveis; todavia as des­ cobertas parecem pelo menos oferecer alguma promessa de que talvez tenhamos uma alternativa eficaz e válida para a forma tradicional de psicoterapia. No processo de realização de outras experiências, talvez aprendamos muita coisa sôbre psicoterapia e terapia de comportamento, podendo êsse co­ nhecimento levar ao refinamento e melhora de ambas as es­ pécies de tratamento.

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CAPÍTULO

IX

Os Fundamentos da Terapia de Redução de Ansiedade

E y s e n c k acentuou que o problema de explicar e tratar per­ turbação psicológica pode entender-se de três maneiras. À primeira delas chama “ nocional” , referindo-se a essa abor­ dagem como “ pré-científica” e de pouca significação prática porque, como a cartomancia e a frenologia, não tem base fatual. Uma segunda categoria, muito mais útil, poderia ser chamada de “ empírica” , e aqui nos interessamos por métodos de reconhecido valor e significação práticos, embora as razões pormenorizadas por que êsses métodos dão resultado talvez não sejam compreendidas — podendo-se conseqüentemente argumentar que não alcança posição plenamente “ científica” . Existem, naturalmente, muitos exemplos de métodos empíri­ cos bem sucedidos, tanto na medicina geral como na psiquia­ tria; por exemplo, o emprêgo de terapia eletroconvulsiva em casos de depressão grave parece de grande importância, em­ bora ainda não se tenha estabelecido a base do êxito dessa forma de tratamento.

Tanto a abordagem nocional como a empírica têm evidentes perigos, sendo o principal dêles podermos continuar a exe­ cutar uma prática cegamente e sem considerações por erros que se podem cometer inadvertidamente. Tomemos, por

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exemplo, o interessante estudo realizado nos Estados Unidos a respeito de amigdalectomia. Grande amostra de crianças foi apresentada a um grupo de médicos, pedindo-se-lhes que decidissem quais delas seriam beneficiadas pela extração das amígdalas. Substancial proporção das crianças foi selecio­ nada para essa operação e as restantes, “ sadias” , foram le­ vadas a um segundo grupo de médicos aos quais se fêz o mesmo pedido. Mais uma vez, substancial número de crianças foi selecionado como necessitado de amigdalectomia, sendo o processo repetido ainda uma vez com resultados essencial­ mente semelhantes. Presumivelmente o processo poderia ter sido continuado até quase tôdas as crianças serem recomen­ dadas para êsse tipo de operação. Nessa história podemos ver como as abordagens nocional e empírica se tornaram in­ trinsecamente fundidas, de modo que agora quando se subme­ te qualquer caso ao médico mediano, ele pode presumir a exis­ tência de algum distúrbio e recomendar um tratamento, quer exista ou não a doença. Evidentemente muitos pacientes po­ dem receber seu tratamento nessa base e é bem possível que pacientes psiquiátricos sejam especialmente vulneráveis à presunção de alguma causa determinada de distúrbio mental e à presunção de que isso seria sensível a uma das terapias existentes. Na opinião de Eysenck o tratamento mais geralmente em­ pregado para distúrbios neuróticos (psicoterapia) é de fato em grande parte nocional por não ter posição científica acei­ tável e faltar-lhe a espécie de prova de valor pragmático, que lhe daria o direito de ser chamado de empírico. Por outro lado, a terapia de comportamento surgiu de um corpo de teoria e experiência psicológicas — e é portanto aceitavel­ mente “ científica” — e os resultados obtidos quando se usam essas formas de tratamento demonstram a validade de tais idéias. Até agora, nos dois últimos capítulos, examinamos a principal prova experimental relativa ao valor prático ou empírico de uma forma de terapia de comportamento, a des­ sensibilização sistemática; neste capítulo, propomo-nos dar breve atenção aos fundamentos teóricos dêsse tipo de tera­ pia. Contudo, antes de fazê-lo talvez convenha acentuar que o estado da prova empírica em favor do tratamento dc des130

sensibilização não é de fato muito satisfatório, embora se possa dizer que a prova colhida é animadora. É importante manter perspectiva adequada ao examinar os resultados da pesquisa empírica realizada até agora, particularmente por­ que o prazo envolvido (efetivamente apenas dez anos), a falta de pessoal treinado, a escassez de ajuda financeira e facili­ dades para esse tipo de pesquisa, assim como outros impor­ tantes fatores, tornaram difícil o progresso com a desejável rapidez. Todavia, os dois ou três últimos anos foram um período de impulso muito acentuado na pesquisa sôbre tera­ pia de comportamento e, se continuar a atual tendência, mui­ to poderá realizar-se na próxima década. A presunção básica da terapia de comportamento é que comportamento neurótico é aprendido de tal modo que, por um processo de associação, reações altamente emocionais são ligadas a acontecimentos, objetos ou situações inócuos. Para Eysenck, acontecimentos traumáticos simples parecem mui­ tas vêzes estar na raiz de uma reação fóbica, embora êle considere mais provável que grande número de acontecimen­ tos “ subtraumáticos” seja responsável pelos casos de ansie­ dade difusa. Em qualquer tipo de caso, de acôrdo com essa tese, a ansiedade torna-se ligada ao que deveria ser estímu­ los “ neutros” , por um processo de condicionamento. Sem dú­ vida, os aspectos superficiais da prova sôbre este ponto são muito convincentes, mas a prova mais forte, de tipo experi­ mental, refere-se a estudos com animais e não com sêres hu­ manos, enquanto a prova no caso de sêres humanos é em grande parte anedótica. Grande parte das razões em favor do modêlo condicionador das neuroses gira, portanto, em tor­ no da medida em que se pode traçar um paralelo entre neu­ roses experimentais de ratos, gatos, cães, carneiros etc., e a condição neurótica humana. Talvez seja sua fé na validade dêste paralelo, entre outras coisas, que convence Wolpe e outros terapeutas de comportamento a localizar a fonte de ansiedade neurótica em um nível subcortical ( “ subpensante” ). De acôrdo com Wolpe, a terapia de inibição recíproca pro­ duz seus resultados por um processo de inibição repetida de ansiedade, de espécie não adaptativa. A hierarquia de situa­ ções de ansiedade apresentada ao paciente é de crucial im­

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portância nesse sentido, pois, através de seu uso, evocam-se e depois inibem-se com êxito pequenas quantidades de ansie­ dade, sendo a inibição realizada pela permissão que se dá ao paciente de produzir uma reação incompatível com a presen­ ça de sentimentos de ansiedade. Êste processo de eliminar cada pequena porção da ansiedade total não se realiza, na­ turalmente de imediato, precisando repetir-se o processo de inibição várias vêzes para assegurar que a ansiedade ligada a algum estímulo seja bem e verdadeiramente “ arrancada” . Dessa maneira considera-se que um novo hábito se está for­ mando por passos graduais — o hábito de não reagir com ansiedade — diminuindo a fôrça do hábito antigo (reagir com ansiedade) à medida que aumenta a fôrça dêsse nôvo. Vê-se, portanto, que a base do tratamento de Wolpe abran­ ge dois princípios psicológicos. Um é a repetida apresen­ tação de alguma condição evocadora de ansiedade, seja em cena real ou imaginada, o outro envolve o ensino de uma reação alternativa à de ansiedade, geralmente relaxação. A r­ gumenta-se que ambos são essenciais à terapia eficaz, mas as experiências realizadas com animais pelo próprio Wolpe não foram conclusivas nesse aspecto, pois não houve a menor ten­ tativa de examinar isoladamente a eficácia de um ou outro dêsses elementos; é possível que só fôsse necessária a apre­ sentação repetitiva de estímulos de ansiedade. Tal conclusão foi de fato sustentada por Lomont (1965) em resultado de seu reexame de várias experiências com animais, nas quais apenas dois estudos sugeriram a obtenção de resultados su­ periores quando se usava uma contra-reação inibitória. Ba­ seado nisso, Lomont sugeriu que o elemento eficaz é a ex­ tinção (da espécie anteriormente mencionada em relação com o trabalho de Pavlov) não o contracondicionamento. Con­ tudo, esta conclusão não foi inteiramente confirmada por uma experiência posterior, feita por Lomont e Edwards (1967), quando se comparou dessensibilização sem relaxação com des­ sensibilização com relaxação, usando-se um grupo de pacien­ tes não neuróticos com fobia por serpente. Em três das cinco medidas empregadas, o último processo pareceu produ­ zir resultados superiores, enquanto o primeiro pareceu to­ talmente ineficaz.

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Gale, Strumfels e Gale (1966) também reexaminaram a prova a respeito dos dois elementos da terapia de Wolpe, concluindo que puderam encontrar dois estudos compatíveis com a necessidade tanto de extinção quando de contracondicionamento e dois contrários a isso. Todavia, acharam que todos os quatro estudos continham falhas cruciais, em vista do que realizaram sua própria experiência, usando ratos al­ binos como pacientes. Primeiro os animais foram submeti­ dos a treinamento no qual, por meio de choque elétrico, adqui­ riam reação de mêdo condicionado ao som de determinada tonalidade, e depois foram divididos em três grupos. Um recebeu apenas prática graduada (uma hierarquia de tons que se tornavam cada vez mais semelhantes ao que produzia a reação de mêdo) ; ao outro se deu a mesma hierarquia, mas além disso se evocou uma reação de alimentação (incompa­ tível), enquanto o terceiro grupo não recebeu tratamento al­ gum. O grupo de inibição recíproca foi indubitàvelmente o mais receptivo no sentido de ter “ desaprendido” sua reação de mêdo ao timbre muito mais depressa do que os animais submetidos apenas a extinção (apresentação repetida dos timbres sem evocar reação incompatível). Entretanto, dois outros pontos de interesse podem mencionar-se em relação a êste estudo. Primeiro, o grupo de extinção apresentou me­ lhora, embora lenta, e esta descoberta sugere que inibir re­ ciprocamente a reação de ansiedade não é característica es­ sencial do tratamento, mas provàvelmente serve para aumen­ tar-lhe a eficácia. Segundo, descobriu-se que quando feita uma tentativa de retreinar os animais para que demonstras­ sem mêdo do timbre, isto se conseguiu muito facilmente em ambos os grupos de tratamento. Poder-se-ia, portanto, argu­ mentar que, se realmente inibido o mêdo no grupo de inibição recíproca, de acordo com a teoria de Wolpe, o grupo que re­ cebeu êsse tipo de tratamento deveria ter apresentado reaprendizagem mais lenta da reação de mêdo do que o grupo submetido apenas a provas de extinção. A questão não está inteiramente resolvida por essas expe­ riências nem as informações extraídas de experiências de Rachman, Davison e outros, citadas no capítulo anterior, per­ mitem tirar conclusões firmes. Contudo, o pêso da prova

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parece indicar que manter tanto o componente de dessensibi­ lização ( “ pouco a pouco” ) como a evocação simultânea de uma reação que bloqueie a ansiedade parece aumentar a efi­ cácia da modificação. Ainda assim restam vários problemas, um dos quais gira em tôrno da expressão do princípio de inibição recíproca de Wolpe. De acordo com êsse princípio, argumenta êle que precisamos conseguir supressão completa ou parcial da ansiedade mediante reação incompatível, e êsse reconhecimento de que a supressão parcial poderia ser ade­ quada apresenta pelo menos duas dificuldades teóricas. Pri­ meiro, se a supressão é apenas parcial, isso deve significar que dois sistemas diferentes de reação podem ser ativados ao mesmo tempo — de modo que não se pode conseguir ver­ dadeira incompatibilidade de reação — ou que somente se evocou ansiedade e esta reação foi bem sucedida em inibir reciprocamente qualquer sistema de reação concorrente. Com­ preende-se prontamente não só que esta situação é difícil em bases teóricas, mas que há um lado prático sério do proble­ ma, pois alguma experiência de ansiedade mínima durante o tratamento de dessensibilização é a regra, e não exceção. Por que, neste caso, não é fortalecida pelo processo a ligação ou associação entre os estímulos de ansiedade (as cenas) e o sentimento de mêdo? Sugere isso realmente que algum tipo de processo de extinção é o mecanismo mais provável? É, de fato, necessário que o sistema de reação alternativa seja incompatível com ansiedade? O emprego de relaxação como meio de combater ansiedade provém de Jacobson, como vimos no Capítulo V. Argumen­ tou êle que a experiência de um estado emocional deriva em grande parte de impulsos proprioceptivos e que contração muscular é o acompanhamento de tôdas as reações emocio­ nais. Parecia a Jacobson que o estado de relaxação seria portanto absolutamente oposto ao encontrado em qualquer estado emocional e, em conseqüência, antagônico ao estado de ansiedade. Gelhorn (1964) concorda com êsse ponto de vista que aceita uma relação recíproca entre atividade mus­ cular e estados de emoção, e postula que as raízes desse an­ tagonismo são as relações recíprocas entre as áreas anterior e posterior do hipotálamo. De acôrdo com Gelhorn, existe

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entre essas duas regiões um equilíbrio tal que, quando uma é estimulada, a outra é suprimida ou inibida, o que se pode ver no baixar da temperatura da área anterior durante um derrame e subir durante o período de aplicação de estimula­ ção desagradável. Também a estimulação por fontes perifé­ ricas, como mudanças na postura de um indivíduo ou seu estado de tensão muscular, pode servir para alterar o "equi­ líbrio hipotalãmico” . Gelhorn relatou também que, enquan­ to a tensão muscular aumenta quando há descargas da re­ gião posterior do hipotálamo, observam-se decréscimos quando essas descargas ocorrem na região anterior. Igualmente, quando os impulsos proprioceptivos são reduzidos ou elimina­ dos por meio de bloqueio de alguma junção neuromuscular, diminuem os estados de excitação, enquanto os opostos são estimulados. De acordo com Gelhorn essas conclusões experi­ mentais sugerem a base de um modelo psicológico que propor­ ciona um elo entre sentimentos e estados de tensão muscular, o que, sugere êle, é adequado para explicar os resultados obtidos quando se emprega terapia de relaxação. Contudo, embora o modelo de Gelhorn pareça proporcio­ nar um relato aceitável da maneira como a ansiedade é su­ primida ou inibida pela relaxação, não indica, por si só, como tal inibição pode tornar-se permanente. Em outras palavras, embora a relaxação possa combater a ansiedade, é bem pos­ sível que sem relaxação o paciente mais uma vez experimen­ te ansiedade. Poderíamos presumir, portanto, como faz real­ mente Wolpe, que a inibição de ansiedade se torna parte con­ dicionada ou aprendida do comportamento do paciente. Por outro lado, Lader e Wing (1966) propuseram um fun­ damento alternativo para o tratamento de inibição recíproca. Sugerem que a dessensibilização é simplesmente uma forma de habituação ou adaptação em condições mais apropriadas a êsse resultado, argumentando que a adaptação ocorre mais eficientemente quando a estimulação é pequena e o paciente está em baixo nível de atividade. O aspecto de “ estimulação reduzida” dêst^ argumento é satisfeito pela apresentação de estímulos “ pouco a pouco” , enquanto o aspecto de “ nível de atividade reduzida” parece assegurado pela colocação do pa­ ciente em estado de relaxação profunda, quando seu estado

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de excitação interna é tão baixo quanto seja compatível com a permanência em estado consciente. Sua afirmação é apoia­ da por prova experimental que indica que uma relação inversa pode existir entre o nível de atividade do paciente e o ritmo em que ele se torna habituado- ou adaptado a algum estímulo. O estudo mostra, com efeito, que, se o nível de atividade (o estado de excitabilidade do paciente) é alto, sua receptividade a uma pequena quantida­ de de estimulação continua por prazo mais longo. Por outro lado, Lader e Wing acentuam que quando a ansiedade do pa­ ciente (excitabilidade) é baixa, parece ocorrer o inverso; toda estimulação contínua ou repetitiva eleva apenas breve­ mente o nível de atividade. Aqui, dizem êles, a habituação (receptividade diminuída a um estímulo) é rápida, enquan­ to nos casos em que o paciente se encontra em estado de alta excitação e está muito ansioso, a habituação pode faltar e a estimulação repetida pode de fato elevar ainda mais um nível alto de atividade existente. Pode-se recordar que o efeito de Napalkov referido em capítulo anterior parecia envolver resultado semelhante; um poderoso estímulo parecia criar no animal um estado de excitabilidade intensificada que parecia aumentar de intensidade ao invés de diminuir, como resulta­ do de mais estimulação, embora esta fôsse por si só inócua. Os resultados desta experiência são também interessantes em outro sentido, pois apóiam descobertas relatadas por outros, a saber, que pode ser difícil a adaptação a estimula­ ção repetida errí indivíduos morbidamente ansiosos. Se é êste o caso e se correta a hipótese de Lader e Wing. isso eviden­ temente impõe sérias limitações à terapia de comportamento. De fato, Lader e Wing mostraram, usando medidas de ati­ vidade eletrodérmica, que pacientes com fobias isoladas ten­ dem a caracterizar-se por níveis mais baixos de excitabili­ dade e adaptação mais rápida do que os agorafóbicos, e tam­ bém que existe relação positiva entre essas medidas e a rea­ ção de pacientes à terapia de comportamento. Em outras pa­ lavras, se correta a hipótese de Lader-Wing, os indivíduos “ hiperexcitáveis" com pouca capacidade de adaptação (entre os quais talvez haja muitos agorafóbicos) podem ser pouco

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afetados pela terapia de inibição recíproca ou completamen­ te insensíveis a ela. O êxito dessa forma de terapia com fóbicos mono-sintomáticos e restritos, assim como as dificulda­ des mais sérias com pacientes agorafóbicos parecem compa­ tíveis com essa idéia. Certas descobertas clínicas já referidas parecem também de acordo com a hipótese de Lader-Wing. Talvez o exemplo mais convincente seja a observação clínica do próprio Wolpe, de que pacientes com níveis altos e penetrantes de ansiedade reagem mal à dessensibilização; em tais casos Wolpe preco­ nizou o emprêgo de inalações de dióxido de carbono como meio de reduzir a ansiedade a níveis controláveis. A desco­ berta de que a “ torrente” (exposição repetida a situações de alta ansiedade) é caracteristicamente mal sucedida cons­ titui também importante peça de prova, como é a opinião de Wolpe de que essa técnica pode muitas vêzes aumentar a ansiedade, ao invés de reduzi-la. Além disso, existe o relatório de Rachman, corroborando a experiência de outros terapeutas que empregam dessensibili­ zação, no sentido de que os itens no topo de uma hierarquia de ansiedade são mais difíceis de tratar do que os do fim. Em certo sentido esta descoberta poderia sugerir que as quan­ tidades maiores de ansiedade que caracterizam os escalões mais altos da hierarquia, impedem a adaptação bem sucedida que Lader e Wing sugerem necessária; por outro lado, po­ der-se-ia também argumentar que êsse resultado lança dúvi­ da sobre o êxito de experiências “ inibitórias” anteriores e pode indicar que alguma ansiedade ligada a cenas que ficam no fundo da hierarquia escaparam ao processo inibitório. A hipótese de Lader-Wing parece, portanto, oferecer uma alternativa genuína às idéias propostas por Wolpe, existin­ do importantes observações experimentais e clínicas compa­ tíveis com seus pontos de vista, a mais importante das quais talvez seja a possibilidade de predizer quando o tratamento de dessensibilização será ou não bem sucedido. Tem-se ar­ gumentado, porém, que a habituação sozinha (noção central da hipótese de Lader-Wing) não pode ser o agente crítico que contribui para o valor da inibição recíproca, porque vá­ rias investigações mostram a necessidade dos elementos tanto 10

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de “ pouco a pouco" como de “ reação incompatível” ; se bas­ tasse a habituação, certamente só o primeiro dêsses elemen­ tos seria eficaz. Contudo, o que Lader e Wing propõem é que a adaptação exige certas condições ideais, inclusive um es­ tado de excitabilidade diminuída, e é bem possível que a re­ laxação as proporcione. De fato, podemos apelar ainda para outra das observações clínicas que foram relatadas — a de que a dessensibilização imaginária parece, em certas ocasiões, produzir resultados melhores do que os métodos in vivo. Na­ turalmente, há várias razões para isso, algumas das quais já mencionadas, mas pode ser que a relaxação usada na des­ sensibilização imaginária seja um meio não tanto de inibir reciprocamente ansiedade, quanto de criar as condições es­ peciais de menor excitabilidade necessárias para adaptação eficiente. Finalmente, tem-se argumentado que os comumente men­ cionados efeitos de habituação em geral são de curta dura­ ção, podendo o organismo, após um prazo, novamente rea­ gir a certos estímulos aos quais se tornara temporàriamente indiferente. A experiência cotidiana parece confirmar êsse ponto de vista; podemos adaptar-nos a um ambiente baru­ lhento a ponto de não sermos mais incomodados por êle, mas depois de um período em que descansamos de tal ambiente parecemos achá-lo novamente incômodo. Contudo, os efeitos de esforços sistemáticos e intensivos para habituar-se não são ainda perfeitamente compreendidos e experimentados, não se podendo dar como resolvida essa objeção em particular. Tanto a teoria de Wolpe como a proposta por Lader e Wing parecem receber certo apoio, mas nenhuma delas deve ser considerada como relato final ou de fato plenamente ade­ quado. Da mesma maneira que as teorias apresentadas em quaisquer outras disciplinas, devem ser consideradas como es­ truturas convenientes com as quais podemos relacionar fatos novos. Quando deixarem de produzir progressos no conheci­ mento ou de ser aprovadas em algum teste crítico, deverão ser abandonadas em favor de alguma estrutura alternativa e mais adequada.

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CAPÍTULO

X

Técnicas Variadas

TREINAMENTO

ASSERTIVO

A rthur B. aprendeu desde tenra idade a suprimir seus senti­

mentos. Seu pai sempre lhe incutira a importância de evitar as crises e dificuldades da vida falando menos. Certa manhã, sua esposa empregou palavras que lhe feriram os sentimentos e, caracteristicamente, êle não respondeu, mas saiu em silên­ cio rumo ao escritório. Quando chegou ao local de trabalho, o chefe criticou-o por erro alheio, mas Arthur novamente per­ maneceu em silêncio e procurou absorver a repreensão injus­ ta. Mais tarde, no mesmo dia, um funcionário inferior tratouo com rudeza, mas ainda uma vez não houve reação da parte de Arthur. Finalmente, quando chegou a casa, descobriu que um parente usara e estragara seu gravador de fita. A raiva que viera crescendo continuamente durante o dia exigiu afi­ nal um escoadouro, mas a cólera incontrolável por êle mani­ festada dirigiu-se para a espôsa e não para o parente ofensor, e foi, de qualquer maneira, absolutamente desproporcio­ nal ao vulto da ofensa. Contudo, a revolta criada pelos acon­ tecimentos do dia e a culpa despertada em Arthur pelo re­ conhecimento de que sua raiva fora exagerada e mal dirigi139

da, fizeram que êle se sentisse desesperado e próximo do suicídio. Pareceu evidente a Wolpe que a dificuldade dêsse pacien­ te representava um mêdo de afirmação resultante do treina­ mento paterno inicial. A reação de Arthur B. ã frustração consistia simplesmente em reprimir os sentimentos que o afligiam e só “ desabafar" quando colocada a última palha sôbre a quantidade, geralmente grande, de raiva reprimida. A tarefa do terapeuta seria portanto treiná-lo a expressar seus sentimentos de maneira natural, adaptativa e “ sadia". Tal treinamento é a essência do que geralmente se chama terapia ou treinamento assertivo, que busca promover mu­ danças no modo de vida do paciente, em particular nas cir­ cunstâncias em que as relações interpessoais parecem impor­ tantes no desajustamento. Wolpe deve ter considerado essa forma de tratamento como um caso especial do princípio de inibição recíproca em ação, no qual ser afirmativo serve como reação contra ansiedade, da mesma forma que- relaxação e alimentação teriam essa função. Contudo, parece que neste caso a reação de ser afir­ mativo não constitui simplesmente um meio de inibir ansie­ dade em certas situações interpessoais, mas é importante há­ bito nôvo que será preservado fora do ambiente terapêutico. Tentemos esclarecer essa distinção. Na dessensibilização ima-* ginária a reação incompatível de relaxação só tem valor na supressão de ansiedade durante o processo terapêutico; não se quer que o paciente, em ocasiões futuras, quando coloca­ do diante de situações de ansiedade, assuma um estado de relaxação completa; não haveria necessidade disso, pois a “ ansiedade", pelo menos teoricamente, foi de todo inibida. No caso iJo treinamento assertivo, porém, a reação que se está ensinando é, não apenas o oposto da produzida pelo pa­ ciente (submissão), mas uma reação que o terapeuta espera se reproduza repetidas vêzes em circunstâncias apropriadas na vida do paciente. A presunção em que se baseia o tratamento é que certos indivíduos levam o autocontrole e o refreamento a um ex­ tremo não adaptativo, em geral porque a ansiedade se asso­ 140

ciou à expressão de reações convenientemente afirmativas. Por outro lado, não se deve pensar que o treinamento ideal é o de constante belicosidade; isso seria tão pouco adaptativo quanto a submissão permanente. Daí ver-se o terapeu­ ta na difícil situação de precisar fazer julgamentos a res­ peito do grau apropriado de refreamento ou emocionalidade que o paciente deve demonstrar. Isso tem sempre grande relação com o comportamento do próprio terapeuta e não com quaisquer noções a respeito de padrões ideais de condu­ ta em circunstâncias frustradoras. O treinamento assertivo, como descrito por Wolpe, parece dar grande ênfase à recompensa pelo comportamento mais afirmativo. Nesse sentido, também existe certa diferença em relação ao que anteriormente descrevemos como terapia de inibição recíproca, na qual se dá ênfase à remoção de ansiedade opressiva. A estratégia do treinamento assertivo tem, portanto, dois componentes. Primeiro, existe a apa­ rente necessidade de inibir a ansiedade gerada por certas situações e, segundo, há certa ênfase em assegurar que o com­ portamento afirmativo produza conseqüências recompensado­ ras para o paciente, como obter reconhecimento, promoção ou outras satisfações que talvez lhe fôssem negadas. Como no caso de dessensibilização ou qualquer outra for­ ma de tratamento, é decerto necessário juntar tôdas as in­ formações relevantes sôbre o paciente e a natureza de seus problemas. Em geral, porém, não é difícil determinar quan­ do o problema central consiste em falta de auto-afirmação que atingiu proporções críticas, mostrando-se o paciente, no mais das vêzes, muito disposto (sob a orientação de um en­ trevistador permissivo e compreensivo) a ventilar seu res­ sentimento devido a injustiças que sofreu, à maneira como outros o menosprezaram, ao que teria gostado de dizer em certa situação, mas não disse ou não pôde dizer, e assim por diante. Wolpe acha que o passo seguinte é dizer ao pa­ ciente e em seguida demonstrar-lhe que a expressão exterior de ser afirmativo pode inibir a timidez e a ansiedade por êle experimentadas. Isso pode fazer-se de várias maneiras, por exemplo, mostrando como o próprio relato do paciente sôbre seu comportamento em certa situação indica que uma

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ansiedade social bloqueou a reação mais apropriada. Podese também dizer-lhe como seu padrão comportamental atual serve para frustrar-lhe os desejos de emprego melhor, pro­ moção, posição social, reconhecimento etc., e fazer um relato da maneira como surgiu sua falta de afirmação (pelas san­ ções paternas no caso de Arthur B .). Em seguida, o terapeuta pode continuar explicando como, com prática na execução de repetidos atos de auto-afirmação em condições convenientemente controladas, aumentará a confiança e se formará a capacidade de lidar de maneira apropriada e efi­ ciente com crises em relações interpessoais. Finalmente, o terapeuta pode apresentar alguns exemplos de como o pa­ ciente é capaz de começar a aplicar auto-afirmação em situa­ ções de pequena importância — assegurando, até onde possí­ vel, que os atos afirmativos em foco serão, não apenas úteis, mas também encorajadores para o paciente. Compreende-se que muito do que comumente se chama de terapia de “ insight” entra nos preliminares do treinamento assertivo, pedindo-se ao paciente que reconheça suas falhas e se familiarize com modos de conduta, alternativos e mais adaptativos. Contudo, o tratamento não é composto só por “ insights” dessa espécie, mas também pelo emprêgo, recomen­ dado por Wolpe, de sugestões poderosas visando a aumentar a motivação do paciente para abandonar s*.-.u padrão ante­ rior de comportamento e adotar os padrões indicados pelo terapeuta, e Wolpe sugere que o terapeuta deve apresentar um quadro desagradável do paciente em sua situação atual e depois acentuar que as pessoas nessa condição são conside­ radas socialmente desagradáveis e são insultadas, deprezadas, ignoradas e geralmente menosprezadas pela maioria. Pode alongar-se sôbre a monotonia da existência de tais indivídyos, acentuando que seu comportamento traz poucas das recompensas que a sociedade reserva às pessoas “ bem suce­ didas” e que os “ não afirmativos” em geral sofrem grandes injustiças. Wolpe preconiza também o emprêgo de poderosos argumentos morais a respeito da necessidade de “ defender os próprios direitos” , presumivelmente para que o paciente ad­ quira adequada orientação e propósito de “ mudar para melhor” .

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É difícil, em vista dessas recomendações, determinar de maneira clara como operam os princípios de condicionamen­ to. Se argumentarmos que a terapia de comportamento de­ riva de uma consideração de princípios da teoria de apren­ dizagem, cabe perguntar de que princípios determinados se tiram os preliminares da terapia assertiva; sem dúvida, tal ligação é, no mínimo, obscura. O mesmo se pode dizer dos tipos de exercício prático que o paciente deve realizar. Entre êles podem incluir-se a formação de hierarquias de ansieda­ de, a apresentação de cenas imaginárias e o trato com acon­ tecimentos semelhantes aos que ocorrem na vida do paciente, mas os aspectos teóricos do que se está fazendo são freqüen­ temente menos do que claros. O desempenho de papel, ou re­ presentação (* ), por exemplo, parece constituir parte impor­ tante da terapia pelo treinamento assertivo e sua operação poderia ser também ilustrada pela citação de um dos casos de Wolpe, o do sr. P. R. Êste paciente, apesar de excelentes habilitações, fizera pou­ co ou nenhum progresso na companhia onde trabalhava e, em conseqüência, estava frustrado e desmoralizado. Uma situação que cumpria claramente enfrentar era a de ser en­ trevistado para um nôvo emprêgo. Por isso, pediu-se ao pa­ ciente que supusesse ser o terapeuta um diretor de empre­ sa e estar êle (o paciente) pleiteando um emprêgo. A tí­ mida batida do paciente na porta do consultório teve como resposta a enérgica e dominadora ordem de “ entre” dada pelo terapeuta, após o que o sr. P. R. entrou hesitante, arrastan­ do os pés, olhos baixos, evidentemente tímido e apreensivo. Imediatamente o terapeuta interrompeu o processo para re­ presentar a atuação do paciente de modo que êle, não só sen­ tisse o que era estar em tal situação, mas também visse o que parecia aos olhos dos outros. Essa demonstração foi se­ guida pela troca de papéis, representando o terapeuta o pa­ pel de candidato e dando o que esperava ser uma impressão “ correta” e confiante ao “ diretor de empresa” . O paciente ensaiou depois esta demonstração de “ afirmação” na situa­ ção de entrevista em várias ocasiões até sua técnica ser jul( 0)

Role-playing (N . T .).

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gada satisfatória, após o que outros aspectos do caráter sub­ misso do paciente receberam atenção e treinamento especí­ ficos. A esta altura talvez seja útil ressaltar ainda outra possí­ vel fraqueza da base do treinamento assertivo como parte da abordagem de “ condicionamento” para modificação. O leitor terá agora entendido que os terapeutas de comporta­ mento parecem aceitar a noção de que para tratamento efi­ caz de neuróticos o necessário é uma mudança em reações específicas a determinados estímulos. De fato, acentuamos em capítulos anteriores que se tem dito que as mudanças de comportamento, de formas mal adaptativas para formas adaptativas, foram conseguidas pela terapia de comportamento sem a necessidade de mudança de personalidade. No caso do treinamento assertivo, como exemplificado pelo trato dos problemas do sr. P. R., parece que se está fazendo uma tentativa de mudar alguma faceta da personalidade, pelo me­ nos no sentido geralmente pretendido por teóricos da perso­ nalidade; o emprego de termos como “ afirmação” , “ domínio” e “ timidez” parecem sugerir a espécie de características comportamentais gerais que se têm comumente chamado de tra­ ços de personalidade. Neste sentido, portanto, o treinamen­ to assertivo parece ter objetivos um tanto diferentes dos de algumas outras técnicas de terapia de comportamento. Pode ainda ocorrer a quem examinar os relatos da aplica­ ção de treinamento assertivo, que existe certa vagueza teó­ rica — uma indicação maior do que o grau comum de filoso­ fia caseira — a respeito dos métodos empregados (* ). Tome-se, por exemplo, o relatório de Barnard, Flesher e Steinbook (1966), no qual registram o processo usado para tra­ tar uma mulher casada, de 22 anos, que era considerada des­ provida de qualidades afirmativas, Na primeira fase do tra­ tamento pediu-se à paciente que gritasse um têrmo ofensivo quando um choque elétrico atingisse nível intolerável; na se­ gunda fase, a paciente foi treinada a esmurrar um travessei­ ( * ) Pode-se também argumentar que o treinamento assertivo parece envolver imitação do conmortamento de outros, fenômeno difícil de expli­ car em termos dü teorias de aprendizagem.

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ro com a maior fôrça possível (posteriormente, com o acom­ panhamento de uma “ verbalização agressiva” ), estádio em que ela foi dada como capaz de lidar com o pessoal d# hos­ pital e os demais pacientes de maneira afirmativa. Talvez pareça um pouco surpreendente que atividades simples, como gritar expressões ofensivas e esmurrar travesseiro, possam produzir ajustamento efetivo, ainda que limitado; pode tam­ bém parecer que existe um elemento de excessiva esperança na presunção de que ensinar a um indivíduo um comporta­ mento exageradamente belicoso, como esmurrar travesseiro, possa de alguma maneira traduzir-se em afirmação adaptativa na situação de vida real. Pelo que sabe o autor, só existe um estudo experimental de treinamento assertivo, sendo os demais mera coleção de estudos de casos individuais de certo interesse, mas que por si sós não inspiram confiança nessa forma de tratamento. De fato, seu fundamento teórico algo duvidoso e a curiosa diversidade de aplicações práticas podem tornar difícil nesta fase realizar experiências apropriadas. Contudo, Lazarus (1966) fez um comêço comparando o que chama de método de ensaio de comportamento (desempenho de papel), tipicamente utilizado na terapia assertiva, com dois outros processos para efetuar modificações de proble­ mas psicológicos relacionados com situações sociais ou rela­ ções interpessoais. Uma dessas terapias alternativas é men­ cionada por Lazarus como “ interpretativa-refletiva” (presu­ mivelmente semelhante a uma forma especial de psicoterapia), enquanto à outra êle chama “ conselho direto” (presu­ mivelmente, apenas dizer ao paciente o que êle devia fazer em lugar do que está fazendo). Não descreve nenhuma das alternativas de maneira que permita determinar a verdadei­ ra natureza da terapia e, por essa razão apenas, não é pos­ sível avaliar a experiência de modo muito significativo. Todavia, Lazarus relata ter incluído 25 pacientes em cada grupo de “ tratamento” , cada paciente recebendo um máximo de quatro sessões terapêuticas de 30 minutos. Se, após com­ pletar êsse breve curso, o paciente não apresentava sinais objetivos de melhora, considerava-se que o tratamento fa­ lhara. O ensaio de comportamento produziu “ prova de apren­

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dizagem” em 23 dos 25 casos, enquanto a “ interpretaçãoreflexão” e o “ conselho direto” apresentaram cifras corres­ pondentes de 8 e 11, indicando que o primeiro método foi consideràvelmente mais bem sucedido do que qualquer das alternativas. Além disso, 27 dos 31 pacientes que não se beneficiaram de “ conselho direto” ou “ interpretação-reflexão” foram submetidos a terapia de ensaio de comportamen­ to e 22 dêles apresentaram “ prova de aprendizagem” . To­ madas em seu valor aparente, essas cifras indicariam que 86,5 por cento dos casos submetidos a terapia de ensaio de comportamento apresentaram certa melhora. Esta é certa­ mente uma cifra impressionante, e por ser essa a única prova experimental existente, o estudo merece exame crítico. Certas fraquezas são logo evidentes. Primeiro, como já mencionado, não temos idéia clara da natureza das terapias com que se comparou o ensaio de comportamento; surge assim a questão de saber que valor atribuir à aparente superiori­ dade de uma delas. Segundo, Lazarus não nos dá idéia clara da espécie de pacientes que participaram da experiência, de modo que temos pouca noção do tipo de caso apropriado a tratamento de ensaio de comportamento. Terceiro, poderse-ia dizer que a duração do tratamento foi pequena demais para oferecer provas conclusivas com que julgar sua eficácia. Além disso, embora Lazarus declare que houve avaliações objetivas (como a do paciente ser capaz de propor casamen­ to quando antes do tratamento era incapaz de fazê-lo) para estabelecer a eficácia dos vários tratamentos, a informação efetiva sôbre êste ponto é quase inexistente. O próprio La­ zarus admite também que todos os três tratamentos foram aplicados por êle próprio (e presumivelmente também a ava­ liação do resultado foi de sua responsabilidade), de modo que não se pode eliminar a hipótese de parcialidade. Pro­ blemas técnicos como êsses deixam ainda em dúvida a efi­ cácia do ensaio de comportamento e da terapia assertiva. Finalmente, é preciso chamar atenção para um ponto teó­ rico que surgiu em outras ocasiões relativamente a processos de terapia de comportamento. Lazarus parece argumentar que com fundamentos teóricos se pode esperar que o ensaio de comportamento produza resultados superiores e, portan­

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to, o resultado de sua própria experiência não deveria ser motivo de surpresa, mas sim, pelo contrário, inteiramente es­ perado. Êste argumento, naturalmente, não é válidç, pois sem dúvida estamos aqui diante de uma situação na qual uma teoria está efetivamente sendo submetida a prova; o ter uma teoria não estabelece sua validade e evidentemente não permite que se prejulgue o resultado de qualquer exame experimental. Aparentemente relacionada com o ensaio de comportamen­ to é uma técnica que Wolpe descreve como “ treinamento de papel exagerado". Êste método é empregado em circunstân­ cias semelhantes às mencionadas antes. Argumenta-se que a ansiedade, a respeito de circunstâncias sociais e relações in­ terpessoais, pode ser inibida pelo ensaio de um papel absolu­ tamente oposto ao que comumente caracteriza o paciente; por exemplo, o indivíduo acanhado, tímido e introspectivo pode ser convidado a desempenhar o papel de uma pessoa barulhenta, expansiva e cordial. A um paciente, homem de 40 anos, que ficava ansioso em barbearias, pediu-se por exem­ plo que desempenhasse o papel de um astro de cinema atuan­ do como “ um cavalheiro confiante e meticuloso ao cortar o cabelo” . Êste papel foi desempenhado até o ponto em que o paciente, depois de examinar cuidadosamente o corte de ca­ belo, dizia: “ Por favor, poderia tirar um pouquinho mais em cima?” Tanto quanto sabemos, não há confirmação ou des­ mentido experimental dessa forma de tratamento. A prova que existe é puramente anedótica.

I N I B I Ç Ã O DE A N S I E D A D E CHOQUE ELÉTRICO

POR

Outra das técnicas suplementares da terapia de comportamen­ to deriva de trabalho com neuroses experimentais em ani­ mais. Êsses estudos sugerem que talvez se atribua muita significação a limitações ou restrições ao comportamento de animal, como reação a estimulação desagradável, e parece que confinar o animal reduz sua capacidade de apresentar reação adaptativa. Em outras palavras, a maioria dos organismos,

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em circunstâncias comuns, é capaz de produzir uma reação adaptativa ou normal a estimulação nociva (choques elétri­ cos, queimaduras etc.), mas o confinamento físico ou outra circunstância psicológica incomum pode impedir uma reação apropriada. Conseqüentemente, se impedimos o organismo de ter uma reação que efetivamente ponha fim ao choque ou outra estimulação desagradável, daí resultará um estado emocional intensificado. Deve-se lembrar que a essa espécie de conclusão chegamos em um capítulo anterior, no qual dis­ cutimos as diferenças entre punição evitável e inevitável. Mowrer e Viek (1984) puderam observar que, quando se permitia a animais aprenderem uma reação motora definida diante de estimulação incômoda, havia tendência a diminui­ ção dos efeitos daquela estimulação depois de certo prazo. Conseqüentemente, a sugestão de Wolpe é no sentido de re­ produzir a condição, aparentemente importante, de o pacien­ te ser capaz de pôr têrmo à estimulação desagradável por uma ação motora. Consegue-se isso aplicando um fraco cho­ que elétrico ao braço do paciente durante um período em que êle está imaginando uma cena que acha perturbadora. Quan­ do o paciente informa que se criou uma imagem satisfatória, o terapeuta aplica-lhe o choque até que êle reproduza uma ação motora (flexão do antebraço), sinal que faz terminar a estimulação incômoda. Aqui também não há prova expe­ rimental de que o processo seja útil por si só, embora o oca­ sional estudo clínico citado seja favorável. Choques elétricos foram empregados também de outra ma­ neira, sem qualquer fundamento claro e sem o apoio de pro­ va experimental a respeito da eficácia do processo em ques­ tão. Neste caso, o paciente é submetido a firmes pulsos elé­ tricos, em nível apreciável, mas não doloroso, por 20 a 30 minutos ou até que o paciente informe ter sido reduzida sua ansiedade. Sugeriu-se que a técnica pode ser usada para lidar com ansiedade tanto geral como difusa, que pareça não ter ligação com uma circunstância específica, ou com a es­ pécie de ansiedade específica que se está tratando por tera­ pia de dessensibilização sistemática. Por outro lado, Wolpe acentua o “ notável fato” de fortes choques elétricos, que comumente deveriam intensificar es­

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tados de ansiedade, poderem às vezes produzir resultados be­ néficos. Neste caso, a técnica consiste em fazer que o pa­ ciente evoque em sua imaginação alguma cena provocadora de ansiedade e, quando clara a cena em sua mente, aplicar um ou dois choques que basten; para produzir vigorosa con­ tração muscular. Várias técnicas há, coletivamente mencionadas como pro­ cessos de alívio de ansiedade, que também empregam choque elétrico para efetuar reduções de ansiedade. Em essência a noção básica do emprego dêsses processos, que foram esbo­ çados em capítulo anterior, é associar o término de um es­ tado incômodo a um estímulo que possa ser manipulado pelo paciente. Um meio de conseguir isso é aplicar à mão do pa­ ciente um choque elétrico forte e contínuo, que será suspen­ so quando ele proferir a palavra “ calmo” . Alternativamen­ te, o choque pode ser contínuo, mas de intensidade crescen­ te até o paciente pronunciar a palavra que proporciona alí­ vio (isto é, que resulta na interrupção da corrente). A pre­ sunção básica é, naturalmente, que o choque serve para ge­ rar a espécie de desconforto emocional característico de estados de ansiedade e que a obtenção de alívio do primeiro é semelhante a reduções em ansiedade. Formando uma asso­ ciação entre determinada palavra (digamos, “ calmo” ou qualquer palavra sem sentido) e o término de um estado emo­ cional deliberadamente provocado, espera-se que a própria palavra possa ser usada como meio de reduzir ansiedade; talvez em ocasião futura, quando estiver particularmente per­ turbado por alguma experiência, o paciente consiga recupe­ rar a serenidade dizendo “ calmo” ou aquela mesjna palavra sem sentido. Evidentemente esta técnica tem atraente simplicidade, mas as presunções teóricas que é preciso fazer não parecem par­ ticularmente plausíveis. Naturalmente, poder-se-ia dizer que a questão importante é pragmática — a técnica produz re­ sultados favoráveis? Aqui também, para nossa informação, dependemos de relatos anedóticos, e sem prova experimen­ tal não há meio de avaliar a medida das contribuições te­ rapêuticas dêsses processos de alívio de ansiedade.

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I N I B I Ç Ã O DE A N S I E D A D E EM COMPORTAMENTO SEXUAL A literatura sobre terapia de comportamento está repleta de exemplos de dificuldades sexuais tratadas com êxito. Casos de impotência, ejaculação prematura ou frieza (todos pro­ blemas comuns) são geralmente considerados como promo­ vidos por ansiedade. Um dos pacientes celibatários de Wolpe sentia ansiedade quando em situações sexuais com sua amiga e deixava de conseguir ereção ou sofria ejaculação prematura, enquanto em outro caso relatado por Lazarus e Rachman a impotência do paciente podia atribuir-se a sen­ timentos de incerteza que se tornaram ligados ao ato sexual. Na opinião de Gantt (1949) existe entre ansiedade e ex­ citação sexual uma relação recíproca, de tal modo que uma pode inibir a outra. Um de seus animais experimentais mui­ to estudados, o cão Nick, demonstrou amplamente êste an­ tagonismo entre os dois estados. Nick, animal “ neurótico” , durante um período de excitação sexual e subseqüente orgas­ mo, demonstrou extraordinário grau de placidez em presen­ ça de estímulos que tipicamente evocariam ansiedade. O autor também observou que a ansiedade difusa de pacientes obsessivos muitas vêzes se reduz em resultado de descarga sexual (“ período refratário” de Gantt). Se ansiedade e excitação sexual são de fato sistemas de reação incompatíveis e antagônicos, poderiam naturalmente empregar-se o princípio de inibição recíproca e a terapia cor­ respondente na modificação de perturbações sexuais que en­ volvem ansiedade. De fato, Wolpe, Lazarus, Rachman e outros afirmam ter obtido êxito com a dessensibilização sis­ temática, às- vêzes em relativamente poucas sessões de trata­ mento. A terapia envolve também as duas características aparentemente importantes da abordagem gradual, ao mes­ mo tempo que se evoca reação incompatível. No caso do ho­ mem impotente, por exemplo, completam-se vários estádios ou passos hierárquicos que se aproximam do coito propria­ mente dito, mas não chegam a ele, desde abraços casuais até jogos eróticos profundos, etc. A idéia geral é que o pacien­ te deve deixar que as coisas prossigam até onde fôr eompa-

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tível com a excitação sexual sem a sensação de ansiedade, praticando cada estádio assiduamente antes de passar para o seguinte. ? Nesse sentido surgem, porém, dois problemas principais. O primeiro é que a natureza in vivo do tratamento natural­ mente exige a presença de uma parceira suficientemente co­ operativa e tolerante para trabalhar dentro do esquema de tratamento do terapeuta. Segundo, quando estão envolvidas pessoas solteiras (ou casadas cujas dificuldades sexuais ocor­ rem no contexto de uma relação fora do casamento) poderse-ia argumentar que sérias considerações éticas tornam di­ fícil ou impossível para o terapeuta oferecer assistência. Finalmente, a respeito dêsses problemas de inibição sexual, deve-se notar que não se apresentou ainda uma única prova experimental satisfatória da validade dos processos. Por outro lado, parece haver pouca dúvida de que algumas for­ mas de incapacidade sexual cederam diante dos esforços de Wolpe e outros terapeutas de comportamento, e parece pelo menos possível que a técnica de dessensibilização sistemática proporcionou o agente terapêutico eficaz.

PRÁTICA

NEGATIVA

Relativamente pouco se pode acrescentar ao já dito sobre esta técnica em capítulo anterior. Pode-se dizer, porém, que, embora pareça haver relativamente poucas ocasiões em que a terapia por prática negativa pode ser indicada como a téc­ nica principal, às vêzes ela parece útil como forma suple­ mentar de tratamento. A idéia central desta forma de terapia é repetir um há­ bito indesejável até um ponto em que se tornam difíceis ou impossíveis outras evocações. Pode-se esperar, com funda­ mentos teóricos, que numerosas sessões dessa espécie produ­ zam uma redução permanente da fôrça da reação indesejável. Wolpe, por exemplo, relata que o hábito de ranger os dentes em uma mulher de 24 anos foi eliminado por prolongados exercícios dêsse mau hábito, realizando-se tal prática 30 vêzes por dia durante um minuto com meio minuto de repouso en­

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tre cada prova. Registra ele que depois de duas semanas e meia dessa terapia o involuntário ranger de dentes da pacien­ te desapareceu e nem mesmo um ano depois se observou recaída. O tratamento de uma pessoa com tique por êsse método foi sistematicamente investigado por Yates e Jones (ver Ca­ pítulo II), mas, embora muito tempo se tenha gasto no tra­ tamento desse paciente, o resultado foi um tanto equívoco, tendo alguns tiques apresentado aparentemente grande me­ lhora, enquanto outros mostraram pouco ou nenhum sinal de redução. É de interesse, portanto, examinar outras provas sôbre o problema de aplicação da prática negativa no trata­ mento de tiques; o estudo de Rafi (1962) sôbre duas pessoas com tique oferece tal oportunidade. Em um dos casos de Rafi, a prática maciça muito prolongada do tique (sessões de prática de duas horas com uma semana de repouso entre elas) pareceu produzir resultados satisfatórios, enquanto no outro caso o processo padronizado de Yates pareceu não in­ fluenciar em escala acentuada a atividade motora anormal. Estudo mais recente de Clark (1966) tem igualmente cer­ to interesse, em parte pelo êxito obtido no tratamento, mas também pela referência que Clark faz das dificuldades que podem surgir também em relação com outras terapias. Com muita freqüência nos apresentam descrições de casos trata­ dos por terapia de comportamento que parecem fazer um re­ lato nada realístico da facilidade com que se aplicam prin­ cípios da teoria de aprendizagem. A experiência tende a mostrar que o curso da aplicação dêsses métodos a problemas psicológicos, como o curso do verdadeiro amor, não é fácil. A investigação de Clark referia-se a três pacientes carac­ terizados pela chamada síndrome de Gilles de la Tourette, perturbação aparentemente rara, sôbre a qual pouco se sabe. A síndrome geralmente começa com tiques e movimentos espasmódicos do rosto, corpo, braços e pernas, sendo êstes últimos acompanhados por vocalização aparentemente invo­ luntária, com muita freqüência de obscenidades. O trata­ mento exige que o paciente repita a obscenidade mais fre­ qüente tantas vêzes quantas fôr possível, e o mais alto pos­

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sível, até a palavra não poder mais ser proferida, nem mes­ mo uma vez, durante um minuto de observação. Obtiveram-se resultados bem sucedidos em dois do'ã três casos tratados, embora ocorressem certas dificuldades. Uma delas foi a interpolação, pelo paciente, de outras palavras além da escolhida para extinção, e outra consistiu em os pa­ cientes fazerem pausas de repouso voluntárias em lugar da­ quelas a que seriam forçados pelo simples pêso dos exercícios efetuados. Em terceiro lugar, e certamente um tanto mais es­ tranho do ponto de vista teórico, foi a descoberta de que o ritmo de reação de um paciente efetivamente aumentou em lugar de diminuir durante a prática. Isto, como acentua Clark, provavelmente decorreu em parte de o paciente fazer pausas de repouso voluntárias, idéia que parece explicar o malogro dêste autor na tentativa de eliminar palavrões com­ pulsivos em um paciente esquizofrênico. Contudo, Clark con­ seguiu resolver os problemas que surgiram, em dois de seus três casos, e êsses dois pacientes parecem ter permanecido livres de sintomas durante quatro anos após o término da terapia. Trata-se de resultado extraordinàriamente bem su­ cedido quando se considera que outros tratamentos existen­ tes parecem não ter produzido o menor benefício real. Evidentemente a aplicação do método de prática negativa exige uma espécie de esforço concentrado e persistente de­ voção à rotina prescrita, que não é fácil de obter. Ainda assim, as provas sugerem que onde se consegue êsse esforço e a rotina é estritamente observada, é possível, em certos casos, modificar ou mesmo eliminar perturbações motoras.

T R A T A M E N T O DE E N U R E S E POR CONDICIONAMENTO POSITIVO Já se acentuou que o tratamento de pessoas que urinam na cama por métodos, de condicionamento não só tem sido con­ siderado muito bem sucedido, mas também tem sido encarado como justificação do ponto de vista comportamentarista sobre a natureza do distúrbio e refutação do ponto de vista fre11

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qüentemente adotado pelo psicoterapeuta. O argumento do terapeuta de comportamento é que o indivíduo enurético dei­ xou de adquirir uma reação condicionada que a maioria dos indivíduos teve pouca dificuldade em adquirir. A solução é conseqüentemente muito simples: corrigir o comportamen­ to deficiente pelo método de condicionamento. Mowrer e Mowrer (1938) foram os primeiros pesquisado­ res a criar e aplicar uma técnica de condicionamento para controle da enurese. Seu fundamento consistia simplesmen­ te em que diversos estímulos relacionados com tensão vesical poderiam associar-se à reação de acordar, de modo que de­ pois de adequado treinamento a criança ou o adulto poderiam ser acordados pelas sensações de bexiga cheia antes de ocor­ rer a micção. Em outras palavras, se o enurético é acordado no momento em que ocorre a micção, podemos argumentar que, com repetição, virá a acordar quando tiver na bexiga volume abaixo do limiar de micção. Depois do tratamento pelo condicionamento o paciente é capaz de dormir a noite inteira sem acordar e sem urinar na cama.

F ig u r a 4 . Aparelho para enurese noturna. Fôlhas de metal A e C são separadas por um grosso pano B. A urina ex­ pelida pela criança passa pelos orifícios em A, penetra em B e completa um circuito elétrico ao atingir C. Isso dispara a campainha de alarma D.

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O aparelho usado era engenhoso, embora simples. O enurético devia dormir sôbre uma almofada especial na qual con­ tatos elétricos eram separados por uma fina fôlha de gaze. Quando a urina penetrava na gaze fechava-se um circuito — as propriedades eletrolíticas da urina asseguravam isso — ativando assim uma campainha que acordava o paciente ador­ mecido. Dessa maneira estabeleceram-se as condições neces­ sárias para tratamento: o estímulo despertava o paciente adormecido quando a bexiga era esvaziada. A partir de en­ tão, com base em fundamentos teóricos e na prática, podiase esperar crescente número de noites sem micção na cama. Os resultados do emprego dêsse equipamento foram reexa­ minados por Jones (1960), que cita resultados favoráveis em cerca de 12 estudos. Os melhores resultados, de acôrdo com êsse reexame, foram relatados por Mowrer e Mowrer, que obtiveram cem por cento de cura em sua amostragem de 30 casos. A porcentagem de malogro nos estudos realizados por outros pesquisadores que empregavam êsse método variou de 4 a 30, e a porcentagem de sucesso completo de 33 a 89. Essas estatísticas confirmam amplamente a conclusão de Jones de que o método de campainha e colchão pode prestar significativa contribuição ao tratamento de enurese. Esta conclusão é apoiada em relato mais recente de Lovibond (1963), no qual o autor demonstrou que o impedimen­ to da enurese podia realizar-se em uma média de cêrca de 14 provas de condicionamento. Infelizmente o quadro, de acôrdo com Lovibond, não é inteiramente satisfatório devido ao substancial índice de recaídas. Contudo, numa das raras ocasiões em que se empregaram princípios acadêmicos dire­ tamente no terreno aplicado, Lovibond dispôs-se a atacar sistemàticamente o problema de freqüentes recaídas, o que cul­ minou no desenvolvimento do método de “ sinais gêmeos” uti­ lizado dentro de um esquema de “ reforço intermitente” . Em síntese, a prova experimental no terreno da psicologia geral indica que a apresentação de recompensas (ou “ reforços” ) torna mais provável a recorrência da atividade ou reação que precedeu a recompensa. Muitas experiências confirmam esta conclusão, embora seja ainda discutível se as recompensas são condição necessária e vital para este processo de fortaleci-

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mento. Contudo, outras provas indicam que, embora possa­ mos esperar aumentos na freqüência de uma reação com re­ petido reforço (recompensa), a contínua aplicação dêste não impede que a reação diminua quando retirada a recompensa. Paradoxalmente, quando se oferece o reforço só ocasional ou intermitentemente, a reação ou hábito recém-adquirido dura tempo apreciàvelmente maior. Êste princípio poderia tam­ bém agir muito bem em um ambiente clínico e sua atuação poderia impedir a perda de hábitos recém-adquiridos, isto é, talvez reduzisse o índice de recaídas que parece acompanhar esta forma de tratamento e talvez outras. O aparelho de sinais gêmeos de Lovibond foi construído, porém, de modo a não só incorporar o princípio aparentemen­ te importante antes mencionado, mas também a testar a va­ lidade de uma teoria alternativa proposta por Mowrer. O argumento de Lovibond era que, em lugar de a distensão vesical ser o estímulo para inibir a micção, o enurético apren­ de a evitar um estímulo incômodo (por exemplo, choque elé­ trico ou campainha forte) pela contração do esfíncter. O aparelho consiste ém uma almofada semelhante à já descrita, mas em lugar do habitual som único acionado pela micção, ocorrem dois sinais. O primeiro é uma forte e desagradá­ vel buzina de automóvel, que toca durante um segundo e se destina a produzir contração aversiva e reflexa do esfíncter, inibindo assim a micção. Isso é seguido um minuto mais tarde pelo som brando de uma cigarra, usado para pedir qualquer assistência necessária. Do que se disse, parece claro que o reforço neste trata­ mento é presumivelmente negativo, porque parte do estímulo incômodo é evitado pela provocação de contração do esfínc­ ter. Poder-se-ia, naturalmente, dizer que é positivamente recompensador produzir alguma reação (contração do esfínc­ ter) que permite evitar certas conseqüências desagradáveis. De qualquer maneira que o encaremos, pode-se dizer que a operação da buzina forte atua como reforço e, para aprovei­ tarmos o princípio de reforço intermitente, o sinal aversivo não deve ser dado em tôdas as ocasiões. De fato, durante o período de treinamento, o aparelho é desligado em metade das ocasiões, sendo a buzina usada ao acaso, condição que

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parece aumentar a estabilidade do novo hábito de não urinar na cama. 0 emprego do sistema de sinais gêmeos com refôrço^ntermitente pareceu sem dúvida produzir excelentes resultados no estudo do próprio Lovibond, pois nenhum de seus 14 pa­ cientes mostrou indícios de recaída até nove meses após o término do tratamento. Indicações mais recentes confirmam êsse processo aparentemente mais bem sucedido, pois Lovi­ bond relata que, enquanto o método de sinais gêmeos com reforço intermitente produziu um índice de recaída de 19 por cento depois de um ano, o método de sinais gêmeos com re­ forço contínuo e o processo de Mowrer caracterizaram-se por índices de recaída de 44 e 35 por cento, respectivamente. Contudo, embora geralmente elevado o índice de sucesso dêste tratamento de enurese, podem surgir e surgem certos problemas. Turner e Young (1966), por exemplo, relatam que quase 30 por cento dos pacientes vistos por êles deixa­ ram de completar o curso de treinamento, embora o período de tratamento em geral não se estenda por mais de dois meses. Acentuam que, embora isso possa parecer tempo muito cur­ to, na realidade faz consideráveis exigências aos pais da criança enurética, que talvez precisem levantar-se várias vêzes durante a noite para trocar a roupa de cama e ligar novamente o aparelho. A experiência de Turner e Young sugeriu-lhes que um dos principais problemas c encorajar os pais a persistirem com o aparelho até conseguir êxito, argu­ mentando êles que um dos principais estímulos para isso se­ ria acelerar o ritmo de progresso. Isso não só estimularia o otimismo e a persistência no uso do aparelho, mas também, naturalmente, reduziria as exigências feitas aos pais. Possí­ vel meio para consegui-lo seria o emprêgo de drogas, pois por fundamentos tanto teóricos (Eysenck, 1957) como empí­ ricos (Frank e Trouton, 1958) há razão para acreditar que o ritmo de condicionamento pode ser afetado por certas subs­ tâncias químicas. Por isso escolheram-se duas drogas, dexedrina e metedrina, como possivelmente capazes de aumentar a rapidez com que a criança enurética pode deixar de urinar na cama, quando usadas em conjunto com o aparelho de campainha* e cobertor.

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0 índice de sucesso do tratamento de condicionamento (ex­ cluídos os casos em que se suspendeu o tratamento) foi acima de 99 por cento, confirmando assim os resultados obtidos em outros estudos. Contudo, do ponto de vista dêste estudo a mais importante descoberta foi que, embora a porcentagem de curas obtidas com o emprego de drogas não tivesse sido maior do que quando usado apenas o método de campainha e cobertor, a rapidez com que se obteve a cura foi significa­ tivamente aumentada tanto pela dexedrina como pela metedrina. O grupo em que não se empregaram drogas teve uma média de 14,18 noites sem micção e a cura foi obtida em uma média de 2,2 meses, enquanto as cifras correspondentes no grupo de dexedrina foram de 10,28 noites sem micção e um tratamento com duração de 2 meses, e no grupo de metedrina foram de 10,12 noites sem micção em um período de tratamento de 1,9 meses. Porém o sucesso no emprêgo de drogas não deixou de sofrer restrições, pois o índice de re­ caídas pareceu afetado pela dexedrina. Dos casos inicialmen­ te curados (isto é, nos quais houve 14 noites sucessivas sem micção na cama), 29,7 por cento recaíram no grupo de dexe­ drina, cifra significativamente mais elevada do que os 13 por cento de índice de recaída quando empregado apenas o método de campainha e cobertor ou mesmo quancío o método foi suplementado por metedrina. Em outras palavras, embo­ ra ambas as drogas parecessem acelerar a velocidade com que o método de campainha e cobertor se torna eficaz, pa­ receram acompanhadas por índices de recaída diferentes; por motivos ainda não conhecidos, a dexedrina talvez não seja uma escolha tão sólida quanto a metedrina no tratamento su­ plementar de enurese por métodos de condicionamento.

CONTRÔLE DE A N O R M A L I D A D E S POR ALTERAÇÕES NA “ REALIMENTAÇÃO” A jovem'dançarina está sentada em confortável cadeira com os olhos fixos num tubo de vidro à sua frente, o qual mostra uma coluna ascendente de mercúrio. A certa altura, ela faz sinal ao atendente de que seu desejo de urinar atingiu ponto

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crítico, significando isso o fim de uma de suas provas tera­ pêuticas. O principal problema dessa paciente decorria de sua freqüência urinária, que, devido à necessidade de J r ao banheiro de meia em meia hora, representava para ela sério empecilho e embaraço. As investigações não revelaram anor­ malidades físicas locais ou gerais, tendo-se concluído que a dificuldade consistia numa reação de ansiedade. A psicoterapia ministrada durante cinco semanas pareceu produzir pouco benefício e a fase de tratamento com outros métodos foi iniciada por Jones (1960). Era essencialmente simples o engenhoso método inventado por Jones para o tratamento. Ligava-se a bexiga da pacien­ te, por um cateter, a um tubo graduado que, claramente vi­ sível por ela, permitia-lhe ler a pressão produzida pelo con­ teúdo de sua bexiga. Depois se introduzia solução salina atra­ vés do cateter e, dessa maneira, a pressão da bexiga era au­ mentada até um ponto crítico no qual a paciente expressava forte necessidade de urinar. Tal arranjo permitia à pacien­ te ver a pressão em que essa necessidade se tornava impera­ tiva, cabendo-lhe a tarefa de tentar melhorar sua atuação, tolerando maiores volumes de conteúdo da bexiga antes de “ ceder” . Além disso, sem que a paciente soubesse, o pes­ quisador dispunha de um aparelho que lhe permitia reduzir a pressão revelada pelo indicador visual. Dessa maneira es­ perava-se que a paciente viesse a tolerar uma quantidade maior de líquido na bexiga, pois anteriormente só sentira urgência em nível de pressão mais elevado do que o mos­ trado. Finalmente, com o emprêgo da realimentação de in­ formação, tanto verdadeira como falsa, a respeito da pres­ são na bexiga, a paciente adquiriu certo grau de domínio sobre sua dificuldade. Os resultados dessa experiência dependiam claramente de estabelecer uma ligação entre as sensações na bexiga e a lei­ tura visual, de modo que, em certo sentido, um dêsses fatos podia ser usado como substituto do outro. A possibilidade de tais ligações foi demonstrada por Bykov (1953), que relatou o emprêgo de técnica semelhante. Êle descobriu que seus pa­ cientes logo mostravam sinais definidos de terem formado associações entre pressão na bexiga e uma leitura visual, de

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modo que um arranjo adequado da última podia evocar for­ tes desejos de urinar mesmo quando havia na bexiga pouco ou nenhum líquido. Surge portanto a questão de saber até onde podemos utili­ zar tais processos no controle de outras anormalidades psi­ cológicas. Até que ponto dependemos de várias espécies de realimentação, como sensações da bexiga, ouvir a pulsação de nosso coração ou controlar nossa fala? Serão úteis essas sugestões ou informações no sentido de permitir-nos contro­ lar nossas atividades, e poderá a realimentação às vezes ser desvantajosa para nós? Com base em certas experiências preliminares, parece que nem tôda realimentação é útil. Isso não surpreende, pois grande parte de nossa atividade invo­ luntária processa-se muito bem sem a menor interferência de processos conscientes, por exemplo, nós andamos bem sem precisarmos concentrar-nos muito nessa atividade. De fato, se tentarmos controlar a atividade de descer um lanço de escada, poderemos muito bem descobrir que os movimentos se tornam desajeitados e vagarosos. Talvez uma das experiências mais interessantes a respeito dos possíveis problemas da realimentação tenha sido relata­ da por Cherry e Sayers (1956). Em síntese, diversas obser­ vações feitas sôbre o comportamento na gagueira levaram êsses pesquisadores a concluir que se poderia atribuir o pro­ blema em grande parte a um defeito na percepção auditiva; passaram então a realizar várias experiências a fim de exa­ minar a validade dessa noção. Numa, bloquearam a aprecia­ ção de sons conduzidos pelo ar em determinada situação, en­ quanto noutra situação os sons conduzidos tanto pelo ar como pelos ossos foram eliminados pela transmissão de um ruído muito alto através de fones de ouvido. A primeira circuns­ tância, onde só se eliminou som conduzido pelo ar, apresentou pouco ou nenhum efeito sôbre a gagueira; a segunda foi es­ pantosamente bem sucedida, pois houve eliminação virtual­ mente completa da gagueira. Êsse resultado sugeriu forte­ mente que é a percepção de som conduzido pelos ossos que se acha defeituosa nesse tipo de anormalidade da fala, ten­ do-se adotado a tese de ser a gagueira atribuível à demora na realimentação da fala através de condutores ósseos. Em 160

outras palavras, esta posição sugere que, enquanto a fala normal é possível quando somos capazes de obter imediata informação (realimentação) sôbre nossas atividades yerbais, qualquer demora no recebimento dessa informação causa con­ fusão e gagueira.. Cherry e Sayers puderam aperfeiçoar sua argumentação realizando outras experiências, a mais importante das quais demonstrou a verdadeira significação de defeitos na percep­ ção de sons conduzidos pelos ossos. Nessa experiência, apre­ sentaram um ruído abafador alto, através de fones de ouvi­ do, em freqüências que ficavam acima ou abaixo de 500 ci­ clos por segundo. Com o ruído abafador de alta freqüência o gago só conseguia perceber os sons de baixa freqüência (conduzidos pelos ossos) de sua própria fala; acontecia o in­ verso quando o ruído abafava todos os sons do paciente, me­ nos os de alta freqüência. Os resultados foram geralmente os previstos, isto é, que era a percepção dos sons de baixa freqüência (profundos) da voz do orador que produzia ga­ gueira. Quando bloqueados de algum modo êsses sons de baixa freqüência, os gaguejos tendiam a diminuir ou desa­ parecer completamente. Esta experiência indicou claramen­ te que certas formas de realimentação, neste caso realimenta­ ção com sons de baixa freqüência, podiam produzir anorma­ lidades. A noção de que podemos conseguir certo grau de controle sôbre processos involuntários por meio de adequado treina­ mento de realimentação recebeu certa medida de apoio em estudos sôbre o ritmo cardíaco. Embora tais estudos geral­ mente não sejam conclusivos, sugerem que o ritmo cardíaco é suscetível de certo grau de influência por processos cogni­ tivos (por exemplo, que é possível manter o ritmo cardíaco dentro de certos limites prescritos) quando existem suges­ tões visuais. Assim, essas sugestões visuais — a representa­ ção pictórica das pulsações do coração da própria pessoa — parecem proporcionar a espécie de realimentação que facilita a aquisição de controle sôbre o processo involuntário; têrmos consciência de uma atividade talvez nos permita governá-la até certo ponto.

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Matthews demonstrou que o fornecimento de realimentação em ambiente mais terapêutico é parcialmente bem sucedido. O paciente neste estudo sofria de cãibra dos escrivães e foi possível determinar que as dificuldades tinham relação com atividade muscular anormal no antebraço. Matthews arran­ jou então uma situação de escrita na qual revelava essa ati­ vidade ao paciente em têrmos de um som que se tornava mais alto ou mais suave, de acôrdo com o grau de anormalidade. O paciente recebeu instruções para manter o som no volume mais baixo possível e, numa curta sessão, êle adquiriu con­ siderável grau de controle sôbre suas reações musculares exa­ geradas, com conseqüente ganho na facilidade de escrever. Infelizmente não se ministrou mais tratamento, não tendo ficado claro até que ponto se poderia fazer progresso adi­ cional, nem quão duradoura seria tal melhora. Evidentemente as possibilidades de controle de realimenta­ ção merecem maiores investigações, embora por enquanto só possamos tirar conclusões tentativas a respeito do valor te­ rapêutico dêsses processos.

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CAPÍTULO

XI

Terapia de Aversão

O pac ien te , jovem motorista de caminhão, está sentado nu­ ma cadeira em uma pequena sala. Acaba de receber uma in­ jeção intramuscular de apomorfina. Seu olhos estão fixados numa tela branca do outro lado da sala e, enquanto continua a fitar a tela, a droga começa a fazer efeito, produzindo sen­ sações de náusea de intensidade rapidamente crescente. En­ quanto relata essas sensações de desconforto, projetam-se imagens na tela e toca-se uma fita gravada com descrição do quadro. As películas de 35 milímetros retratam o pró­ prio paciente, vestindo várias peças de roupa feminina, va­ riando desde algumas roupas de baixo até traje completo com maquilagem cosmética. A gravação de fita é da voz do paciente descrevendo as roupas e repetindo seu próprio nome. O processo é continuado até êle vomitar pelo efeito da droga. O paciente é um travesti que derivava satisfação erótica de vestir-se com roupas femininas desde os 15 anos de idade. Sua esposa, com quem se casara havia menos de um ano, só recentemente soubera de sua prática anormal, e a atitude dela motivara-o fortemente a procurar tratamento. Êle rece­

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beu um total de 68 sessões de tratamento, ao fim das quais estava livre do sintoma, podendo dizer que as imagens eram uma “ desfiguração” e que não mais compreendia como ves­ tir-se de mulher pudera dar-lhe prazer anteriormente. Êsse é apenas um dos numerosos casos semelhantes de desvio de comportamento sexual que foram alterados ou mo­ dificados pelo que comumente se entende por punição. A técnica de terapia de aversão tem probabilidade de exercer considerável atração sôbre os membros mais rigorosos e auto­ ritários da sociedade, que talvez achem tais métodos inteira­ mente apropriados para aplicação a comportamento desviado e pouco compreendido. Ainda assim, a punição de doença pode ser eficaz em certos casos, embora o processo ainda esteja longe de ser tão simples quanto parece. Discutire­ mos no capítulo seguinte os problemas envolvidos, mas é im­ portante acentuar aqui que, para o paciente aprender pela punição, as condições em que ela é aplicada precisam ser cuidadosamente controladas. A aplicação de um estímulo aversivo ou punitivo como meio de modificar comportamento é, naturalmente, antiga e universal. Informações sôbre o êxito de seu emprego e sôbre resultados desastrosos são igualmente encontradas em relatos anedóticos, e mesmo a literatura experimental está repleta de discrepâncias desconcertantes. Daí poderíamos concluir que não existe uma regra simples que se possa seguir, como a de que o indivíduo sempre se comportará de uma maneira que foi associada a prazer e evitará outra que resultou em dor. “ Poupe a vara e estrague a criança” é aparentemente uma meia verdade — mas continua sendo um mistério qual das metades é verdadeira! Os primeiros estudos experimentais sôbre aplicação de es­ timulação incômoda tenderam a interessar-se simplesmente pela produção eficiente de uma reação que não se pudesse obter facilmente por qualquer outro meio. Por exemplo, nos primeiros estudos de condicionamento obteve-se a reação de erguer a pata, em cães, aplicando-se choque elétrico na sola da pata, de modo que êsse comportamento pudesse ser então associado a um som ou algum outro estímulo condicionado. Estudos posteriores tenderam a dar nova ênfase ao emprego

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de punição — a de modificação e controle de reações indese­ jáveis. Talvez os primeiros estudos com orientação decidida­ mente terapêutica tenham sido os relativos à aplicação de punição, em um contexto de condicionamento, ao problema de alcoolismo. Um dos principais estudos nesse terreno provém de Voegtlin, Lemere e colaboradores, que usaram aversão química com alcoólatras. Os estudos são de considerável importância, não só pelo grande volume das amostras investigadas — um total de mais de quatro mil casos — , mas também em virtu­ de do çrolongado período de seguimento dos efeitos do tra­ tamento (em alguns casos dez anos ou mais). O grande princípio, nesse caso, era o de formar uma nova associação com a presença de álcool, combinando seu consu­ mo com sensações de náusea. Conseguia-se isso ministrandose drogas que produziam vômitos e outras sensações desa­ gradáveis, e, enquanto essas sensações estavam sendo expe­ rimentadas, deixava-se que o paciente bebesse pequenas quantidades de sua bebida preferida. Aplicava-se a técnica em uma sala silenciosa e nua, com pouca iluminação, mas onde um holofote iluminava uma fileira de garrafas, asse­ gurando assim a proeminência do estímulo alcoólico. Podiamse dar refrigerantes entre as sessões a fim de permitir que o paciente formasse discriminações apropriadas — isto é, que certas bebidas ‘'produzem” conseqüências desagradáveis, enquanto outras “ produzem” conseqüências agradáveis. Os resultados foram encoraj adores até certo ponto. Notou-se abstinência de bebidas alcoólicas por períodos de até cinco anos em mais de 50 por cento dos casos, embora essa cifra tenha caído para 13 por cento ao fim de períodos mais longos (10 a 13 anos). Mais recentemente Blake (1965) relatou o tratamento de 37 casos pelo que chama de “ terapia de relaxação-aversão” , na qual o treinamento pela relaxação precedeu o condiciona­ mento aversivo mais comumente empregado. Esta combina­ ção de tratamentos foi justificada por Blake sob a alegação de que a terapia bem sucedida de alcoólatras precisa incluir alguns meios pelos quais o paciente possa reduzir a ansieda­

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de e outros impulsos psicológicos que o levam a beber em excesso. Considerou-se que a relaxação poderia atingir êsse fim, deixando o bloqueio do hábito específico de alcoolismo ao componente punitivo do tratamento. Êste fundamento en­ volve, naturalmente, certo número de presunções, por exem­ plo, ser a ansiedade capaz de produzir uma reação de fuga (bebida), a qual tem por sua vez o efeito de reduzir o “ im­ pulso” , e que a relaxação pode ser um substituto eficaz como redutor de ansiedade. Nesta experiência o paciente sentou-se a uma mesa num pequeno cubículo diante de uma tela que só permitia visão de fora para dentro, ligando-se a seus braços elétrodos para aplicar choques. Recebeu água, álcool (de acordo com seu gôsto pessoal), um copo no qual misturar a bebida e instru­ ção para que pusesse a mistura na boca, mas não a engo­ lisse. Durante algumas provas o ató de levar a bebida à bôca era acompanhado por um choque de crescente intensi­ dade, dizendo-se ao paciente que o choque terminaria quando êle cuspisse a bebida em uma vasilha. Em outras provas, o choque elétrico foi omitido, mas pediu-se ao paciente que cuspisse a bebida quando brilhasse uma luz verde. Assim, o processo utilizou o princípio de reforço intermitente, haven­ do choques apenas em metade das provas. Realizaram-se sessões de condicionamento dessa espécie durante um perío­ do de quatro a oito dias, abrangendo uma média de cêrca de cinco horas de tratamento para cada paciente. Seis meses depois da conclusão do tratamento, cêrca de 54 por cento dos pacientes foram dados como “ sóbrios” (usado êsse têrmo de preferência a “ abstêmio,\ pois um paciente se tornara bebedor controlado em lugar de bebedor excessivo), enquanto 38 por cento recaíram. Quanto aos restantes oito por cento, ou se retiraram do tratamento ou não houve informação a seu respeito. Depois de um ano, as cifras de abstinência e recaída (existentes para apenas 25 dos 37 casos tratados) foram semelhantes às obtidas no seguimento anterior. Isso levanta uma questão interessante sôbre quais resultados de Glatt (1964) e Blake estão de acordo, a saber, que o perigo de recaída parece ocorrer prin­ cipalmente nos seis meses imediatamente posteriores ao tra­

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tamento. Contudo, como acentua Blake, os resultados não justificam complacência, embora pareçam ser pelo menos tão bons quanto os obtidos com o emprêgo de outras espécies de terapia — podendo de fato ter sido muito melhores do que com as alternativas existentes. A falta de reação a esta forma de tratamento é sem dúvida muito provável, sendo o estudo de McCulloch e outros (1966) interessante neste contexto. De fato, declaram êles que um dos principais propósitos de sua investigação é o desejo de apresentar “ uma nota inicial de advertência” . Seu processo consistiu em dar ao paciente uma hierarquia de situações relevantes (uma garrafa fechada, uma aberta e bebida alcoólica num copo) em diapositivos fotográficos, ao mesmo tempo que uma gravação em fita convidava o paciente a tomar um gole. Usou-se choque elétrico como estímulo aversivo, no que foi de fato um processo complexo, mas permitiase que o paciente em certas ocasiões evitasse completamente o choque ou escapasse do aumento do nível de choque, desli­ gando o diapositivo. iNenhum dos quatro pacientes nesse estudo se beneficiou com o tratamento, continuando todos a beber excessivamente. Ponto de considerável interesse, po­ rém, foi a descoberta de que todos êsses pacientes apresen­ taram latências variáveis de reação (isto é, prazos flutuantes entre a apresentação do diapositivo e a operação de desligálo) e em muitas ocasiões não conseguiram evitar o choque. Essas características foram iguais às prèviamente encon­ tradas entre homossexuais que deixaram de reagir a condi­ cionamento aversivo (McCulloch e outros, 1965) e foram diferentes das encontradas em pacientes tratados com êxito por êsse meio. É possível portanto, que todos os quatro pa­ cientes tenham sido tirados de um grupo de alcoólatras bem diferente dos tratados por Blake; outros tipos de alcoólatras talvez fôssem mais sensíveis. Naturalmente, são possíveis várias outras explicações para o malogro, entre as quais a de que mais provas de condicionamento, mais estímulos realís­ ticos e maior fôrça de choques tivessem produzido maiores índices de sucesso. O valor de estimulação mais severamente traumática parece confirmado pelo estudo de Sanderson e outros (1963),

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que empregaram a escolina, em seu tratamento de alcoolis­ mo. Esta substância química produz parada respiratória que tem efeito muito forte sôbre os pacientes. O trauma psico­ lógico provocado nessas condições, quando associado a algum estímulo alcoólico como um copo de uísque, pareceu produzir reações fortemente aversivas à bebida. É compreensível talvez que o emprego de condicionamento aversivo se tenha aplicado principalmente à espécie de anor­ malidade psicológica que produz alguma satisfação para o paciente. Espera-se que, por êsse meio, o comportamento proporcionador de satisfação seja efetivamente bloqueado, de modo que o paciente fique livre para adquirir algum nôvo meio de satisfazer sua necessidade. Contudo, prestou-se pouca atenção ao problema de oferecer novos escoadouros adaptativos aos pacientes tratados por terapia de aversão, o que talvez explique muitas das freqüentes recaídas associa­ das a essa forma de terapia. Todavia, mais recentemente, se dedicou certa atenção ao problema de equipar o paciente com reações que substituam as inibidas durante o tratamento, sendo o emprega de relaxação por Blake, naturalmente, um exemplo disso; porém, tais tentativas talvez tenham sido feitas mais sistematicamente até agora no tratamento de homossexuais. Solyom e Miller (1965) realizaram um estudo visando a êsse ponto. Os seis homossexuais analisados na investigação ficavam sentados em confortáveis poltronas numa sala escu­ ra, enquanto se lhes exibiam diapositivos de homens nus ou mulheres nuas. Fortes choques elétricos eram aplicados da maneira habitual, durante a apresentação das figuras mas­ culinas, embora ocasionalmente houvesse provas sem reforço com base no princípio de reforço intermitente. Antes da apresentação da imagem feminina o choque era novamente aplicado, mas desta vez o paciente podia desligar a corrente, ato que imediatamente provocava a projeção do diapositivo. Assim, a técnica procurava reduzir o interesse por estímulos homossexuais e diminuir a ansiedade despertada por mu­ lheres. Um quadro mais ou menos misto transpareceu nos resul­ tados. Medidas fisiológicas tenderam a revelar que nenhuma

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mudança ocorrera nos pacientes em termos de reações a imagens masculinas, enquanto, por outro lado, havia indica­ ções de reação positiva aos estímulos femininos. Clinicamen­ te, a situação foi um pouco mais animadora, pois a abstenção de relações homossexuais parecer ter sido um resultado geral. Solyom e Miller estão claramente cônscios da natureza equí­ voca desses resultados, mas argumentam que o tratamento poderia ter produzido um desenvolvimento “ temporário para conversão heterossexual” . Tal interpretação não parece irracional e, embora as mudanças produzidas possam pare­ cer modestas, é importante notar que três dos seis pacientes já haviam sido submetidos a extensa psicoterapia, sem o menor benefício. Mais tratamento pelo condicionamento muito possivelmente teria produzido plena conversão a uma orientação heterossexual. Resultados um tanto melhores parecem ter sido obtidos por Feldman e McCulIoch (1965) em uma das mais minucio­ sas e completas investigações até hoje relatadas sôbre tera­ pia aversiva. O impulso por trás dessa pesquisa no trata­ mento de homossexualidade proveio do desejo de evitar al­ gumas das cruezas teóricas de estudos anteriores e ‘‘planejar uma técnica que faça uso do conhecimento derivado dos muitos milhares de experiências sôbre aprendizagem animal e humana que aparecem na literatura” . O processo abrangeu a apresentação de diapositivos de homens e mulheres de variados graus de atratividade, sendo o estímulo masculino acompanhado por um choque, enquanto se fazia certa tentativa de associar a projeção de um diaposi­ tivo feminino com alívio de choque. Contudo, as considera­ ções e provisões especiais dêste estudo eram complexas e a simples declaração dos princípios envolvidos não faz justiça à cuidadosa atenção dedicada aos pormenores do,tratamento. De fato, seis variáveis foram controladas de acôrdo com bem documentadas descobertas de experiências sôbre processos de aprendizagem e esperava-se por êsses meios aumentar o benefício obtido tanto em termos de aquisição de novas rea­ ções como de sua preservação. De 16 pacientes tratados por êsses meios, 12 apresentaram alguma melhora, variando desde completa conversão a intè12

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rêsses heterossexuais que culminavam em casamento até ten­ tativas de namorar môças. O resultado pareceu estar asso­ ciado à idade; 10 dos 12 pacientes de menos de 40 anos apresentaram sinais de melhora, enquanto, entre os de mais de 40 anos, só um em quatro mellhorou. Tal descoberta pode, naturalmente, ter muitas implicações, duas das quais saltam logo à mente: primeiro, que isso pode refletir uma diferença entre hábitos que sejam mais ou menos arraigados e, segun­ do, que pode ser mais difícil efetuar mudanças em homens mais idosos cujas possibilidades de contato heterossexual foram diminuídas pela idade. Talvez ocorra ao leitor que grande parte do tratamento descrito lidou com os símbolos de comportamento anormal e não com o comportamento anormal propriamente dito. Por exemplo, retratos de homens nus podem ter sido percebidos como eróticos por homossexuais màsculinos, mas será isso igual à produção de comportamento homossexual em situação de vida real ? Se não fôr, o bloqueio da reação a um símbolo talvez tenha pouco impacto sobre o comportamento fora do laboratório de tratamento. Naturalmente a escolha da repre­ sentação simbólica é imposta ao terapeuta por evidentes limi­ tações técnicas ao que se pode fazer em nome de terapia, mas há exemplos ocasionais da maneira como se introduziu mais realismo nas condições de tratamento sem a menor violação de princípios éticos. Um dêsses casos foi relatado por Blakemore e outros (1963). O paciente, um travesti de 33 anos, encontrava prazer secreto em vestir-se com roupas femininas desde a idade de quatro anos, mas com acentuada excitação sexual durante a adolescência. Até certo ponto o Serviço Militar interrompeu essas atividades, mas mesmo durante êsse pe­ ríodo êle se masturbava com o acompanhamento de fantasias de estar vestido em roupas de mulher. Quando voltou à vida civil estava inteiramente preparado para entregar-se com freqüência a atividades de travestismo e adquiriu a compul­ são de aparecer em público como uma “ mulher completa” — vestido, sapatos, maquilagem e peruca. O casamento não representou solução para seu problema, pois êle começou a achar que vestir-se de mulher era uma condição necessária

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para ter relação sexual satisfatória com a esposa. Psicoterapia também não conseguiu efetuar melhora, embora o pacien­ te tivesse recebido essa forma de tratamento duranfk seis anos. O tratamento pela terapia de aversão foi realizado em uma pequena sala dividida por uma tela. Por trás da tela havia uma poltrona, um espelho grande e uma esteira espe­ cialmente construída para aplicar fortes choques elétricos. No comêço de cada prova o paciente ficava nu em pé sôbre essa esteira e, ao receber instrução, começava a vestir seu traje feminino preferido. Em certa fase, durante o processo, o paciente recebia choque elétrico nas solas dos pés, através de sapatos especialmente adaptados, ou ouvia o som de uma cigarra; qualquer dos sinais era uma sugestão para que começasse a despir-se e o som da cigarra ou o choque repetiase durante êsse tempo até êle estar completamente despido. Vê-se mais uma vez que o processo envolvia choque associado ao ato de vestir-se de mulher, enquanto se conseguia fuga ao choque despindo rapidamente as roupas indesejáveis. O emprego da cigarra em metade das provas foi, segundo se explicou, uma tentativa de incluir uma condição de reforço intermitente. O tratamento foi muito intensivo, realizando-se cinco das provas descritas com intervalos de meia hora durante cêrca de oito horas por dia em um período de seis dias, até com­ pletar um total de 400 provas. O resultado pareceu quase totalmente bem sucedido, pois na investigação de seguimento durante seis meses o paciente declarou não ter o menor dese­ jo de vestir-se de mulher e, talvez mais significativo, sua relação com a esposa apresentou considerável melhora. Certas indicações pareciam apontar alguns traços residuais de sua anormalidade original, mas o paciente achava que essas ocasiões podiam ser enfrentadas por meio de mastur­ bação ou de relação sexual com a esposa. Outras investigações em que se empregou treinamento aversivo tiveram objetivos mais limitados do que os trata­ mentos antes mencionados. Nelas não se fêz a menor tenta­ tiva de efetuar curas cm sentido amplo, mas o objetivo foi modificar um de vários problemas. No caso da investigação

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de Tate e Baroff (19Ç6), por exemplo, aplicou-se tratamento aversivo a um aspecto secundário, embora importante, do comportamentlo de uma criança psicótica e nâo se fêz a menor tentativa de lidar com a condição psicótica primária. Além do interesse que decorre dos resultados da aplicação de treinamento aversivo a uma facêta limitada de comporta­ mento, êste estudo foi também valioso por permitir que se fizesse uma comparação entre dois métodos de controle. Pode-se argumentar que o emprego de trauma físico apre­ senta sérios problemas éticos tanto para o paciente como para o terapeuta e, até onde esses argumentos são válidos, torna-se importante para o terapeuta procurar formas alter­ nativas de estimulação aversiva. De fato, poder-se-ia argu­ mentar que o treinamento aversivo só pode ser considerado como proposição viável quando todos os outros caminhos foram explorados e considerados falhos. O fato de os pacien­ tes a quem se aplicar êsses métodos serem voluntários aos quais se ofereceu tratamento e cuja cooperação se pediu tem pouca relação com o problema, pelo menos porque os pacien­ tes muitas vêzes têm mêdo de recusar tratamento devido a algumas dificuldades hipotéticas que a recusa poderia criar. No caso aqui relatado evidentemente não havia possibilidade de obter o consentimento do paciente para o tratamento, por isso a questão ética precisava ser decidida pelas circunstân­ cias do caso e dependia da integridade dos terapeutas. O paciente, um menino cego de nove anos chamado Sam, vinha recebendo tratamento de seu estado psicótico havia vários anos. Seu comportamento autolesivo incluia bater a cabeça em paredes e pisos, dar pontapés e murros em si pró­ prio e bater o queixo contra seu ombro; iniciara-se de manei­ ra branda aos quatro anos de idade. Sua visão estava com toda probabilidade tão severamente prejudicada que, a não ser por alguma discriminação de claro-escuro e de movimen­ tos com o ôlho direito, êle era efetivamente cego; sua fala limitava-se a umas 20 palavras de gíria. Contudo, parecia claro que êle apreciava e procurava ativamente contato com outras pessoas, pois agarrava-se a elas, procurava fazer com que o abraçassem e subia-lhes ao colo, esforçando-se para obter o mais íntimo contato físico. Deixado sozinho, gritava,

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chorava, debatia-se e entregava-se a sérios atos de autolesão. O tratamento nessa fase foi orientado para o controle desses atos autolesivos. Observações do desejo de contato físico de Sam com outras pessoas sugeriram fortemente que um meio de estimulação aversiva seria privá-lo dessa forma de satisfação. Por isso planejou-se um regime no qual duas assistentes andavam e conversavam com o paciente, segurando-lhes as mãos e pro­ curando proporcionar um pouco do contato físico que êle claramente achava desejável. No que foi descrito como ses­ sões de controle, tôda tentativa de autolesão era ignorada pelas assistentes ; durante as sessões experimentais, por outro lado, o contato físico era interrompido enquanto continuasse êsse “ mau” comportamento. Em outras palavras, os períodos experimentais críticos eram uma tentativa de apresentar condição aversiva (punição) como conseqüência de comporta­ mento autolesivo. Três resultados muito importantes surgiram dessa parte do estudo. O primeiro foi que a chamada condição aversiva produziu claramente dramática redução das tentativas da criança para ferir-se. Em segundo lugar, parecia que tal comportamento estava apresentando certo declínio mesmo quando havia ausência da condição aversiva (retirada de contato físico). Em terceiro lugar, as lamúrias e choros típicos observados no período de controle estavam cedendo lugar a comportamento mais atencioso — e mesmo sorriden­ te — nos dias experimentais. Contudo, os pesquisadores es­ tavam então preocupados com a possibilidade de o progresso, com o emprego do regime antes descrito, não ser suficiente­ mente rápido para impedir que a criança destruísse comple­ tamente o pouco de visão que lhe restava. Nessa altura obteve-se permissão paterna para substituir o condiciona­ mento aversivo anteriormente usado por dolorosos choques elétricos. O novo regime de tratamento foi realizado no quarto de Sam. Os pesquisadores, junto com um médico, conversavam agradàvelmente com a criança que ficava deitada em sua cama com os pés presos. Diziam-lhe (com que grau de com­ preensão não foi revelado) que, se continuasse a ferir-se,

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receberia choques e que êstes doeriam. Em seguida, toda ten­ tativa que Sam fazia para ferir-se era acompanhada por um choque na parte inferior da perna direita. Êste regime foi continuado intermitentemente, sendo que nos períodos entre a estimulação aversiva a criança se distraia com brinquedos e era agradàvelmente entretida pelos pesquisadores, que elo­ giavam prodigamente todos os seus movimentos não lesivos. As tentativas de autolesão apresentaram novamente subs­ tancial declínio e as atividades diárias de Sam fora da situa­ ção de prova tornaram-se conseqüentemente maiores. De fato, observou-se que seu gosto por passeios, equipamentos de parque infantil e jogos simples pareceu aumentar sensi­ velmente e que êle começou a beneficiar-se claramente do ambiente mais estimulante que se lhe podia oferecer. Os resultados do estudo indicaram que tanto a retirada de contato físico como o choque elétrico produziram imediato e substancial declínio no comportamento perigoso de Sam e, igualmente importante, êsses processos causaram significa­ tiva melhora em sua responsividade geral e no gôsto por seu ambiente. Além disso, tais modificações pareceram ter longa duração. Permanece sem resposta a questão de saber se a técnica aparentemente menos bárbara de retirada do contato físico teria sido por si só suficiente. Talvez seja fácil criticar o emprego de choque elétrico para controlar essa infeliz crian­ ça, mas ao mesmo tempo poder-se-ia argumentar que as lesões infligidas por Sam a si próprio eram suficientemente graves para justificar medidas extremas. Por outro lado, pode-se também considerar um intrigante ponto lógico; se a punição resultante do comportamento de Sam causou as modificações mencionadas, por que a punição auto-aplicada não produzia a menor mudança? O relatório parece, sem dúvida, indicar que as atividades autolesivas da criança eram às vêzes infinitamente mais dolorosas do que o choque elé­ trico; por que, então, o comportamento não se extinguiu de maneira natural? Certamente a punição auto-aplicada neste caso preenchia uma condição importante para a extinção dêsse comportamento, isto é, a ação de esmurrar e dar pon­ tapés resultava em dor imediata e aguda. Não podemos por­

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tanto invocar a espécie de argumento envolvido na exposição de Mowrer sôbre o “ paradoxo neurótico” , isto é, que as con­ seqüências punitivas de um ato neurótico são em geral dis­ tantes demais para se associarem ao ato propriamente dito, enquanto as conseqüências recompensadoras (por exemplo, a fuga da ansiedade) são imediatas e por isso bem aprendi­ das. Dispomos agora de muitos estudos nos quais se aplicou condicionamento aversivo de uma ou outra espécie para modificar algum aspecto de comportamento no paciente psiquiátrico gravemente enfêrmo, e alguns dêles serão men­ cionados em capítulo posterior. Todavia, o valor do treina­ mento aversivo é igualmente bem documentado numa varie­ dade de casos menos graves, como gagueira, obesidade e hábito de fumar. Meyer e Crisp (1964) fizeram relatório sôbre a aplicação de tratamento aversivo como meio de controlar obesidade em dois casos. Uma das pacientes, mulher solteira, de 26 anos, tinha acentuadas dificuldades nas relações interpessoais e considerou-se que seu problema nesse aspecto talvez se tor­ nasse menor se pudesse ser induzida a perder pêso. A outra paciente era mulher casada, de 51 anos, cujo excesso de comer parecia relacionado com a infelicidade causada pela infidelidade de seu marido. Foram elas colocadas em sala isolada, equipada com telas que só permitiam visão de um dos lados para outro. Um gráfico de pêso adornava uma parede da sala, e nêle apare­ ciam fotografias de uma mulher obesa, nas escalas superio­ res de pêso, e uma mulher esbelta e atraente, no pêso dese­ jável. “ Alimento de tentação” (aquêle pelo qual a paciente sentia maior desejo) era exibido por variados períodos de tempo, mas tôda tentativa de aproximar-se dêsse alimento era combatida com choque elétrico. O*alimento dado de acôrdo com a dieta recomendada à paciente, naturalmente, nunca era acompanhado por choque. Quando deixaram de ocorrer tentafivas de aproximar-se do “ alimento de tenta­ ção” , retiraram-se os elétrodos que aplicavam o choque, em­ bora se dissesse à mulher que suas reações ainda continua-

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riam a ser observadas através da tela. Gradualmente se pro­ porcionou à paciente maior liberdade social e dietética. Obteve-se aparente sucesso com a primeira paciente, pois durante as seis semanas de tratamento ela perdeu cêrca de dez quilos e continuou a emagrecer mesmo depois de obter alta. Em um exame seis meses depois verificou-se que seu pêso atingira um nôvo e estável nível de aproximadamente 60 quilos. A segunda não reagiu a tratamento aversivo, per­ manecendo seu pêso virtualmente inalterado e, talvez ainda mais significativo, piorando sua condição psicológica; ela se tornou agressiva, crítica e desconfiada, insistindo em retirarse do hospital. Posteriormente pareceu haver uma clara rela­ ção entre seu estado de ânimo e seu pêso, associada a perda de pêso a depressão e hipocondria, enquanto os aumentos pareciam ter efeito contrário. Meyer e Crisp acentuam que houve' entre as duas mulheres muitas diferenças evidentes, qualquer das quais poderia ter determinado a diferença de reação ao tratamento. Embora não seja possível desemaranhar e identificar uma ou mais das características que produziram a diversidade de resul­ tados nessas pacientes, o estudo serve para lembrar-nos que variáveis assim; importantes existem e que não podemos presumir responsividade universal com base na aparente semelhança do distúrbio a ser tratado. A dificuldade consiste, naturalmente, em tentar predizer quais pacientes serão de fato beneficiados por essa forma de terapia. Franks e outros (1966) relataram uma tentativa bem sucedida de predizer o resultado de um estudo de con­ dicionamento aversivo de fumante. O processo nessa expe­ riência consistiu em fazer o indivíduo fumar grande número de cigarros — considerado aversivo — e deixar que respi­ rasse ar fresco como reação alternativa e de fuga. A obser­ vação ulterior dos nove voluntários submetidos a essa nova forma de terapia, revelou que quatro haviam deixado com­ pletamente de fumar, um estava fumando menos e um pas­ sara a fumar cachimbo. Dois absolutamente não reagiram ao tratamento e foi impossível estabelecer contato com o paciente restante, Os resultados do tratamento não foram,

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portanto, especialmente animadores e, além disso, não se encontrou prova de qualquer relação entre a personalidade do paciente, as medidas de condicionamento em p reg a is e o resultado terapêutico. Outra utilização interessante de condicionamento aversivo é exemplificada pelo tratamento, por Mees (1966), de um paciente com fantasias sádicas. Um jovem de 19 anos fôra encaminhado para tratamento psiquiátrico depois de ter ata­ cado uma mulher com a intenção de realizar uma fantasia sádica. Nessa época êle era considerado esquizofrênico paranóide e expressava-se pouca esperança de que se recuperasse dessa condição. De fato, a partir dos 12 anos, o paciente se preocupara com a idéia de amarrar mulheres e feri-las, e ocasionalmente se vestira com roupas de baixo femininas. Suas fantasias eram alimentadas pelo consumo de “ violentas e sádicas revistas de detetive e sensacionalismo... reforçado por estimulação sexual e masturbação". O tratamento consistiu em aplicar choque elétrico sempre que o paciente dava sinal de haver criado uma dessas fanta­ sias. Êste tipo de terapia foi continuado por um período de 14 semanas, assumindo o próprio paciente grande parte do encargo de aplicar o choque e registrar suas reações. Na 8.a semana tornou-se muito mais difícil criar fantasias sádicas e notou-se uma tendência de tais fantasias se desfazerem e serem substituídas por outras, heterossexuais. Contudo, o processo de mudança foi mais gradual do que abrupto. Seis meses após o término do estudo, o paciente só pôde relatar umas poucas fantasias abortivas que não incluíam ferimen­ tos em mulher e durante êsse tempo renovara uma relação heterossexual satisfatória com uma sua amiga. De especial interêsse no estudo é o emprêgo de condiciona­ mento aversivo com respeito a acontecimentos mentais ou comportamento mental, isto é, acontecimentos que não podem ser diretamente observados pelo terapeuta. Evidentemente isso apresenta sério risco, pois não há garantia de que o paciente fará um relato acurado, em especial quando êle é presumivelmente bem motivado para preservar suas expe­ riências interiores deleitáveis. É difícil, porém, ver de que outra maneira se poderia ter realizado o estudo, a menos que

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se pudesse tomar alguma medida objetiva de excitação sexual, a ereção, por exemplo, como correlação das fantasias. Outro ponto relativo a êste caso é que as fantasias do pacien­ te antes do tratamento incluiam a presença dêle próprio ves­ tido de mulher e sendo ferido; poder-se-ia argumentar que o uso de punição (terapia de aversão), especialmente autoaplicada como muitas vezes era, talvez fôsse contra-indicado. Naturalmente, seria possível que tal tratamento só conse­ guisse transferir tôdas as fantasias de ferimento para o próprio paciente. Esta breve análise dá idéia da amplitude de distúrbios tratados e da variedade de métodos usados no tratamento pelo condicionamento aversivo. Percebe-se que a qualidade da pesquisa diferiu grandemente e que a substância da con­ tribuição variou igualmente. Em geral, êsses métodos pare­ cem ter sido empregados com êxito modesto, embora os resultados não nos permitam ser complacentes. A êsse res­ peito é importante observar que não se pode julgar o resul­ tado simplesmente, a partir dos índices de recuperação men­ cionados, mas deve êle ser avaliado contra o fundo da contri­ buição relativamente má dada pelas terapias alternativas existentes. Os distúrbios considerados haviam geralmente resistido a outros meios de tratamento, acrescentando-se a isso que houve muitas vêzes parcialidade na amostragem de. pacientes, de modo que só os casos mais. recalcitrantes e os distúrbios mais intratáveis foram recomendados para terapia aversiva. Neste contexto, êxito modesto é realmente êxito! É também pertinente acentuar que raros dos pesquisado­ res, que atualmente utilizam êsses processos, parecem endos­ sar a opinião de que terapia aversiva é suficiente por si só. Sem dúvida, ocorrem casos em que o bloqueio do comporta­ mento mal adaptativo parece causar a adoção espontânea de hábitos alternativos e aceitáveis, mas a tendência agora parece ser a de dar ênfase à necessidade de proporcionar meios especiais pelos quais se possa adquirir uma reação nova e adaptativa. Vimos exemplos disso nos estudos cita­ dos, como o ensino de relaxação para combater a ansiedade de alcoólatras ou o treinamento de homossexuais para reagir

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a estímulos heterossexuais. Só novas pesquisas poderão re­ velar até onde êsses métodos se mostrarão adequados, mas o seguimento de pacientes parece sugerir que os ganhos^feitos muitas vezes podem ser mantidos dessa maneira. Também em outros aspectos, parece achar-se incorporado no tratamento pelo condicionamento aversivo maior refina­ mento de técnica e prática. Isso se revela de duas maneiras principais, uma das quais é a introdução de controle sôbre as variáveis que a experiência geral mostrou importantes; estudos de McCulloch e seus colegas indicam essa orienta­ ção. A segunda refere-se à tendência de explorar o condi­ cionamento aversivo como método suplementar de tratamen­ to, a ser usado judiciosamente no trato de algum aspecto limitado de comportamento mal adaptativo que não seja tratável por outros métodos conhecidos. A aplicação dêsses processos a certos problemas em pacientes psicóticos teste­ munha tal tendência. Em suma, o quadro geral a respeito da terapia de aversão não é desencorajador apesar dos numerosos problemas en­ volvidos.

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CAPÍTULO

XII

Alguns Problemas da Terapia de Aversão

O c ã o vira-lata é amarrado com correias e sujeito a fortes choques elétricos dos quais não pode escapar. Posteriormen­ te, é colocado em uma caixa com dois compartimentos sepa­ rados por unía barreira; num, o animal recebe choques a menos que escape deles ou os evite saltando a barreira. Quando colocado nessa caixa o cão reage aos primeiros cho­ ques uivando, correndo furiosamente e manifestando outros sinais de aflição, mas êsse comportamento logo dá lugar a uma aparente aceitação passiva; o animal desiste, pára de correr e espera silenciosamente o fim de cada forte corrente intermitente. Compare-se êsse comportamento ao de outro animal, submetido a regime semelhante, mas que, quando amarrado pelas correias, tinha oportunidade de escapar ao choque executando alguma atividade. Quando êle é posterior­ mente colocado na caixa não demora muito a aprender a saltar a barreira e evitar completamente o choque.

Poder-se-ia chamar de mal adaptativo o comportamento do primeiro cão na caixa; êle deixa de executar a ação óbvia para escapar e evitar a estimulação nociva. O segundo, por

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outro lado, demonstra uma reação adaptativa. Presumivel­ mente o tipo de comportamento do animal depende de sua experiência anterior, isto é, de ter ou não tido oportuitidade de aprender a escapar ou evitar choque. Essa experiência, de Seligman e Maier (1967), tem certas implicações claras e importantes, a mais convincente das quais talvez seja não resultar o estímulo aversivo necessariamente no desenvolvimento de comportamento adaptativo. De fato, diante de forte estimulação aversiva pode haver a espécie de inerme aceitação que foi demonstrada pelo primeiro animal descrito. Muito parece depender de treinamento anterior. Poderíamos argumentar, portanto, que a terapia de aver­ são só pode ser bem sucedida na medida em que o permita a experiência anterior. Talvez a história de pacientes que não se beneficiaram com essa forma de tratamento tenha sido de contínua exposição a punição inevitável. Naturalmente, não se imagina que tais indivíduos hajam tido uma história de choques repetidos, mas uma história com situações insu­ portáveis, às quais parecia impossível escapar. O tratamen­ to dado a uma criança no lar, por exemplo, pode caracteri­ zar-se por punição intensa e inevitável, e a incapacidade de um marido abandonar o lar e a família, apesar da contínua punição imposta por uma esposa impertinente, pode ser uma situação semelhante. Isto é, naturalmente, especulativo. Todavia, considere-se a descoberta de Richter (1957) de que ratos selvagens ten­ diam a abandonar-se e afogar-se fàcilmente quando coloca­ dos em tanque de água do qual não havia meio de fuga, a menos que o pesquisador permitisse repetidamente que os ratos saíssem do tanque. Quando a possibilidade de escapar se tornou evidente, verificou-se que os ratos selvagens so­ breviviam até umas 60 horas antes de afogar-se. De fato, experiência e anedota parecem confirmar muitas vêzes que a aceitação passiva pode ocorrer em condições nas quais comumente esperaríamos um premente impulso biológico de es­ capar e um comportamento de acordo com essa necessidade. Em outra investigação dêsse fenômeno coercitivo, Selig­ man, Maier e Geer relataram que, dependendo de quão crô­ nica seja a passividade mal adaptativa, podem adotar-se vá-

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rios métodos para lidar com a situação. Em síntese, em casos leves parecia eficaz arranjar uma situação em que fuga e evitação pudessem ocorrer com extrema facilidade; nos casos crônicos, parecia necessária a produção à fôrça de uma reação de fu ga í*). Os pesquisadores argumentam que po­ deríamos considerar êsses casos de comportamento mal adaptativo resultado da aprendizagem de que quaisquer reações que ocorressem (em uma situação de choque inevitável) não teriam êxito para terminar a punição. A terapia poderia portanto consistir em forçar o. animal a perceber a possibili­ dade de as reações de fuga e evitação serem bem sucedidas. A experiência citada é uma das muitas em que a punição não levou automàticamente à redução na freqüência de uma anor­ malidade, testemunhando êsses resultados aparentemente paradoxais os complexos problemas envolvidos. Não deveria surpreender-nos serem insustentáveis quaisquer noções sim­ ples sôbre a natureza e aplicação de treinamento aversivo. Naturalmente, podem identificar-se às vêzes certas razÕe3 óbvias para o malogro da terapia de aversão. Eysenck, por exemplo, acentuou que pelo menos um terapeuta relatou o emprêgo, com alcoólatras, de um processo que violava o que tal­ vez seja um dos princípios mais fundamentais do condicio­ namento. O malogro desse treinamento, no qual a ignorân­ cia contribuiu para a ineficácia do resultado, de maneira ne­ nhuma se reflete sôbre a conveniência de tratamento aversivo. Contudo, acontece também que, em alguns estudos, pouca atenção se deu à propriedade da seqüência temporal de estí­ mulos; e ficou amplamente demonstrado que a apresentação de estímulos ou acontecimentos durante o condicionamento é fator crucial para a obtenção de resultados favoráveis — ou mesmo quaisquer resultados. Isso foi especialmente verda­ deiro quando se utilizou aversão química, na qual a ação aversiva da droga não pode ser controlada nem de longe com a precisão que acompanha o emprego de choque elétrico. Reichman considerou as vantagens da aversão elétrica sôbre a química e os pontos por êle acentuados indicam bastante ( * ) Puxar o animal sôbre a barreira até a zona livre de choque, por exemplo, para mostrar que a fuga é possível.

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claramente que o primeiro método tem muito mais a recomen­ dá-lo. Uma das grandes vantagens é a precisão de controle que o choque elétrico permite; o momento do início, a p u ra ­ ção da aplicação e a intensidade da estimulação podem ser julgados de maneira que é impossível quando se usam aversivos químicos. Drogas, especialmente quando seu uso é prolongado, podem ter também efeitos secundários, perigosos, que não ocorrem com o emprego de choque elétrico. Mesmo quando êsses efeitos não são potencialmente nocivos, o empre­ go de drogas pode exercer influência adversa sôbre a capaci­ dade do paciente para adquirir e conservar a aprendizagem, ao passo que nenhum desses problemas resulta da estimula­ ção elétrica. Finalmente, a aplicação de choque é sem dú­ vida* tècnicamente mais fácil no sentido de serem necessárias menos formalidades e menos pessoas. Contudo, outro problema nessa forma de terapia é que a percepção ou apreciação de um estímulo aversivo pelo pa­ ciente pode diferir da avaliação normal. Quando se empre­ gam reforços positivos (recompensas), várias experiências tornam claro que aquilo que o experimentador considera re­ compensador pode não ser assim avaliado pelos seus pacien­ tes. O mesmo provavelmente se aplica a punições; qual será, por exemplo, a reação do paciente masoquista ao impacto do choque elétrico? Como é possível, segundo demonstrou Pavlov, que cães possam sacudir a cauda e (aparentemente) demonstrar prazer, quando sujeitos a estimulação extrema­ mente dolorosa? Evidentemente êsses problemas reclamam minucioso exa­ me das condições em que a punição parece produzir resulta­ dos variáveis. Excelente análise do nosso conhecimento atual a respeito dessas condições foi oferecido por Church (1963). Começa êle acentuando que o termo “ punição” tem sido fre­ qüentemente usado em ligação com vários processos provàvelmente muito diferentes, de modo que o resultado variado das experiências poderia ter sido decidido pelo processo de punição adotado. Chama também atenção para a existência de várias teorias psicológicas diferentes sôbre punição, mais uma vez se concluindo que as teorias se baseiam em condi­ ções especiais e diferentes, empregadas no trabalho experi­

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mental. Contudo, apresenta interesse especial a análise que Church faz da prova efetiva a respeito do resultado variado de estimulação aversiva. Geralmente se tem considerado importante a contigüidade da ação e da punição por essa ação: para atingir o máximo de eficácia a punição deve ocorrer imediatamente após o ato. Geralmente falando, os estudos sôbre êsse problema parecem sugerir que existem três diferenças principais entre punição contingente e não contingente: 1 — o primeiro processo pro­ duz maior supressão da atividade punida; 2 — parece haver menos efeito sôbre outras reações (isto é, o efeito se limita mais à atividade punida apenas); e, 3 -— o comportamento aprendido em resultado de punição contingente é mais sus­ cetível de extinção (perda). Essas descobertas indicam a importância da cóntingência como parâmetro de punição, sendo as descobertas pormenorizadas claramente de interesse para o terapeuta de comportamento, pois é importante ser o seu estímulo aversivo aplicado, ou não, como conseqüência imediata de algum comportamento. Resultados igualmente experimentais examinados por Church indicam que, quanto maior o intervalo entre reação e punição, menos eficaz será a última na supressão da rea­ ção, Outra variável parece ser a intensidade da punição apli­ cada. Aqui, as indicações geralmente sugerem que a punição muito intensa tem o maior efeito na supressão de alguma peça de comportamento; embora isso possa ser verdadeiro em ge­ ral, outras indicações mostram que a punição intensa tem mais probabilidade de desorganizar uma reação do que su­ primi-la. Beech (1960), por exemplo, descobriu que forte choque elétrico aplicado a movimentos mal adaptativos de pa­ cientes com cãibra dos escrivães podia resultar em exacerba­ ção, e não inibição das reações indesejáveis, Aqui talvez muita coisa dependa de ser a reação ao estímulo aversivo compatível com a produção de uma reação alternativa adaptativa. Se o choque impede a ocorrência de uma reação dese­ jável, sua eficácia é evidentemente diminuída ou completa­ mente negada; por outro lado, se o choque se mistura de ma­ neira muito natural com alguma reação adaptativa (por exemplo, se impele o paciente a correr quando essa reação é

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apropriada), é claro que essa forma de punição será prova­ velmente útil. Outra questão importante, de acôrdo com a análise de Church, é a descoberta de que a experiência anterior de pu­ nição pode produzir um estado de adaptação no qual estímu­ los aversivos posteriores deixam de ser eficazes como supres­ sores. Certas indicações sugerem não apenas que a anterior estimulação nociva e branda (por exemplo, exposição a choque elétrico fraco) pode produzir diminuição da suscetibilidade a punição intensa posterior, mas também que essa estimula­ ção nociva e branda pode, às vêzes, servir para aumentar a fôrça do comportamento punido. Esta espécie de resultado levou Mowrer a postular que é a punição de um ato de evitação que pode levar a tais efeitos paradoxais. Acha êle que se o paciente animal ou humano aprendeu a executar alguma atividade como meio de evitar ansiedade, a punição, que sim­ plesmente eleva ainda mais o nível de ansiedade, fará com que ocorra de nôvo a reação de evitação. Em outras pala­ vras, mais ansiedade leva a mais reação da espécie que an­ teriormente resultou na evitação de sofrimento. Em vista dessas dificuldades, devemos abandonar o em­ prego de condicionamento aversivo? Em particular devemos abandonar o emprego de tais métodos nos casos em que sus­ peitamos seja o sintoma um ato de evitação? A prova tirada de experiências sôbre êsse ponto infelizmente é equívoca. Já se disse que “ punição" é têrmo empregado para descre­ ver o princípio básico de vários processos diferentes, e que esses processos podem produzir resultados um tanto diferen­ tes. Portanto, até onde a prova experimental permite, deve­ ríamos fazer nossa escolha de acôrdo com as espécies de re­ sultados que podemqs esperar quando usamos uma ou outra técnica determinada de punição. Solomon e Bruch (1956) ofereceram a espécie de análise que proporciona certa base sôbre a qual tomar tais decisões, e foi essk prova que Feldman e MeCulloch consultaram ao planejar uma parte de seu estudo sôbre homossexualidade. Das seis principais técnicas que consideraram, só uma parecia oferecer a espécie de van­ tagens que estavam procurando; trata-se do método de apren­ dizagem antecipatória de evitação, descrito no capítulo ante13

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rior. Esta técnica, ao contrário de algumas das outras exa­ minadas, pareceu produzir aprendizagem eficiente, assim como alta resistência a extinção. Ambas são qualidades cla­ ramente desejáveis, pois não só esperamos, por motivos óbvios, conseguir rápida aquisição de uma reação aversiva, mas também pretendemos evitar qualquer perda subseqüen­ te do comportamento recém-adquirido. A preocupação com a freqüência de recaída após tratamen­ to por treinamento aversivo também levou Feldman e McCulloch a examinar outras condições que conforme sugere a prova experimental, têm possibilidade de compensar êsse resultado. Considerou-se um total de nove variáveis para controle, tendo-se em vista resistência a extinção. Primeiro decidiu-se espaçar as provas e por êsse meio evitar a espécie de “ inibição de fadiga” mencionada em seções anteriores dêste livro. Em outras palavras, fêz-se uma tentativa de pro­ porcionar prática espaçada e não maciça. Segundo, deu-se atenção à determinação de um' nível ideal de choque que pro­ duzisse aprendizagem eficiente, mas não “ bombardeasse o paciente com níveis de choque muito elevados” . Considerouse também ser importante a variação no nível de choque e o emprêgo de nível alto de choque imediato, mais do que aumentos graduais no nível. Já se demonstrou que o pri­ meiro dêsses pontos está associado com resistência a extin­ ção, embora não seja inteiramente clara a relevância do úl­ timo ponto em relação a êsse objetivo. Também se considerou relevante para êste estudo a conti­ guidade, da maneira discutida anteriormente neste capítulo, assim como o princípio de reforço intermitente. Além disso, julgou-se importante realizar o tratamento em condições que aumentassem a “ saliência perceptual” do estímulo (isto é, o grau em que os estímulos usados causam impacto sôbre o paciente sem interferência de outras fontes irrelevantes) para o qual se devesse dirigir a atenção do paciente. Outra condição ft>i a de variar ao acaso o tempo entre a apresen­ tação de um quadro ao paciente e sua remoção. Isto, se­ gundo acreditaram Feldman e McCulloch, parecia estar de acordo com descobertas experimentais que sugerem que uma

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demora variável não prejudica a aprendizagem, mas aumenta a resistência à extinção. Finalmente se dedicou atenção à variação das coftdições de estímulo durante o processo de treinamento. Desta ma­ neira, segundo acreditavam êles, o tratamento seria paralelo à vida real no sentido de ser realístico e variado. Seja qual fôr a explicação para o êxito da utilização do princípio de variabilidade, a prova empírica indica uma associação entre êsse processo e resistência à extinção da nova aprendizagem. Poder-se-ia, com razão, esperar que a atenção por êsses refi­ namentos de processo experimentalmente derivados aumen­ tasse o índice de sucesso do treinamento aversivo. Nesses aspectos, estudos mais recentes representam considerável pro­ gresso em relação aos relatos anteriores a respeito do empre­ go de punição em terapia. Contudo, apesar do crescente re­ finamento que resulta do conhecimento mais minucioso da operação e influência de certas variáveis, existem claras la­ cunas em nossa compreensão da punição. Tais lacunas le­ varam Church a propor a questão de saber se devemos ou não empregar a punição em todas as nossas tentativas de controlar comportamento. Pondo de lado todo argumento moral, a resposta deve por certo depender da constância com que se podem obter resultados seguros. Está fora de dúvida que a punição é freqüentemente empregada: 99 por cento dos pais incluídos em um inquérito afirmaram que batiam em seus filhos, embora apenas uns 50 por cento achassem que a punição causava algum bem. É possível, naturalmen­ te, que a punição não tenha sido eficientemente aplicada nesses casos ou tenha tido função diferente da que se supu­ nha, sendo usada simplesmente para aliviar os sentimentos dos pais. Contudo, parece que a punição é capaz de produzir modificações no comportamento, seja isoladamente, seja em combinação com outro processo, para apressar a eliminação de alguma reação indesejável. Por outro lado, certas indicações sugerem que punição so­ zinha pode ter apenas efeito temporário e que sua retirada leva ao restabelecimento do comportamento indesejável. É bem possível que, em certas ocasiões, a punição seja útil so­ mente como meio de suprimir temporariamente um tipo de

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comportamento a fim de que outro possa substituí-lo (isto é, suspender uma reação mal adaptativa para que possam im­ plantar-se reações adaptativas). É claro, porém, que seus efeitos nem sempre são tão limitados; por exemplo, Klee (1944) descobriu que um rato pode preferir morrer de fo ­ me a tentar resolver um problema no qual uma punição ou recompensa imprevisível possa resultar de seus esforços. Church acentua também a existência de indicações que mostram a possibilidade de a punição ter efeitos secundários infelizes. Sears, Maccoby e Lewin (1957) relataram desco­ bertas de acordo com essa possibilidade, mostrando seu es­ tudo que os pais que empregavam considerável punição pa­ reciam ter filhos com mais problemas de comportamento, es­ pecialmente na área da agressão. Naturalmente, é possível que a agressividade natural da criança levasse ao uso mais freqüente de punição, que crianças-problema tivessem paisproblema, ou qualquer outra alternativa que não aquela que sustenta que a punição causa agressão. No entanto, vários te­ rapeutas relataram que o treinamento aversivo de travestis parece freqüentemente acompanhado pelo desenvolvimento no paciente de atitude belicosa e hostil. Parece que essa al­ teração no comportamento não é duradoura — pelo menos ate onde indica a observação clínica — , mas não há certeza de que seja assim. Também Bandura (1963) e seus colegas apresentaram prova muito convincente de que a participação vicária em atividades agressivas aumenta o comportamento agressivo da própria criança, podendo essa prova também re­ comendar cautela no uso indiscriminado de processos de punição. Problema de espécie muito diferente surge em relação à validade do ponto de vista geralmente aceito pelos terapeu­ tas de comportamento, a saber, que o tratamento de aversão é mais adequado para aplicação a anormalidades aprendidas. Sem dúvida, implícita ou explícita, em suas discussões sôbre o tratamento de aberrações sexuais está a noção de que tais anormalidades foram aprendidas de alguma maneira (em­ bora isso represente mais uma presunção do que um f a t o ) ; admitir essa premissa não implica necessàriamente que os mecanismos e processos de aprendizagem investigados em am­

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biente de laboratório sejam de modo algum relevantes. De fato, como acentuado em capítulo anterior, é muitas vêzes difícil explicar as extravagâncias e flutuações no desenvol­ vimento do distúrbio de um paciente por qualquer raciocínio simples baseado em um paradigma da teoria de aprendiza­ gem — o paciente muitas vêzes não ‘"se enquadra” muito bem na teoria. Não é refutação adequada desta crítica ar­ gumentar que a minuciosa história da aprendizagem, se exis­ tisse, confirmaria a relevância de certos princípios de con­ dicionamento ou aprendizagem para a compreensão das ex­ travagâncias e vicissitudes de alguma anormalidade. A ausência de prova sôbre êste ponto não torna mais nem me­ nos plausível atribuir o distúrbio a “ aprendizagem” . Uma possibilidade, além da simples afirmação da relevân­ cia da aprendizagem e de condicionamento, é formular uma teoria mais ou menos minuciosa da qual se pudessem tirar deduções testáveis. Tal tentativa foi feita por McGuire e outros (1965) ém relação com desvio de comportamento sexual. Acentuam êles que a idéia de que as anormalidades sexuais possam ter sido aprendidas está longe de ser nova, mas geralmente era aplicada a uma única experiência isolada. A importância de uma primeira experiência para “ estampar” um padrão de comportamento sexual foi reiterada mais re­ centemente por Jaspers (1963), mas êle acrescenta que só esse “ acidente” não poderia explicar o desenvolvimento de uma anormalidade, caso contrário tais problemas seriam tão generalizados quanto os próprios acidentes. Em suma, po­ demos dizer que, embora as experiências iniciais de homos­ sexualidade possam ser comuns, um relativamente pequeno número de pessoas expostas a elas parece adquirir essa forma de desvio. Qualquer explicação de desvio sexual precisa por isso incluir mais do que “ primeira experiência” ou a noção de “ primeira experiência” ou “ aprendizagem em uma prova” . McGuire e seus colegas argumentam que um exame feito por êles de casos de desviados sexuais sugeriu que tôda apren­ dizagem envolvida ocorre depois da primeira experiência. O que a primeira experiência (isto é, exposição a sexualidade anormal) oferece para o desenvolvimento de comportamento desviado é, de acordo com essa opinião, o material para uma 189

fantasia que acompanhe masturbação posterior; atividades sexuais na presença da fantasia em muitas ocasiões subse­ qüentes asseguram o fortalecimento dessa ligação. Pode-se naturalmente perguntar por que fantasias heterossexuais não ficam fortemente ligadas a atividades masturbatórias, pois presumivelmente os estímulos para tais fantasias são fàcilmente acessíveis — são, de fato, difíceis de evitar em qual­ quer cultura liberal. A teoria proposta por McGuire susten­ ta que isso acontece em virtude de a primeira experiência ser “ real” (em oposição à natureza “ irreal” de histórias, pia­ das e outras formas de estimulação), dando isso à experiên­ cia valor aumentado como fantasia masturbatória, A maioria de seus sete pacientes relatou que a primeira experiência desviada foi seu primeiro contato efetivo com a sexualidade. A teoria sustenta também ser possível descobrir freqüen­ temente que uma experiência heterossexual aversiva ou sen­ timentos de inadequação social ou física contribuíram para a consolidação do comportamento desviado. Essas experiên­ cias e esses sentimentos podem levar o paciente a sentir que a vida sexual normal não lhe é possível, forçando-o assim a voltar às anormalidades de conduta nas quais anteriormente encontrava satisfação. Todavia, a primeira experiência e as fantasias a que assim se dá proeminência provàvelmente pas­ sam por mudança e modificação. Certas sugestões na fanta­ sia podem, por uma razão ou outra, tornar-se proeminentes e ser acentuadas por estarem presentes em uma situação de alívio sexual (geralmente masturbação). Dessa maneira, por ênfase seletiva, os desenvolvimentos e mudanças que podem ocorrer no curso da aquisição de comportamento desviado podem levar a um resultado que apresente pouca semelhan­ ça com a primeira experiência, tendo antes propriedades úni­ cas e idiossincráticas. Esta teoria tem evidentemente certa atração, especialmen­ te porque tenta explicar algumas observações clínicas aparen­ temente importantes, já realizadas. Contudo, quando consi­ deramos as “ deduções” tiradas dessa teoria por McGuire e seus colegas, o quadro é bem menos satisfatório. De fato, em sete dentre oito casos o que se chama de deduções não constitui mais do que declarações de possibilidades razoáveis,

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indicadores de prova simplesmente compatíveis com as pro­ posições teóricas ou conclusões que não parecem derivar da consideração das próprias proposições teóricas. É interessante notar que os autores da teoria acima con­ sideram que “ seria antiético testá-la diretamente, transfor­ mando um indivíduo normal em desviado” . Rachman (1966) preocupa-se evidentemente menos com tais considerações, como mostra seu estudo de fetichismo sexual. A posição que êle parece adotar é bàsicamente a mesma acima referida, isto é, que o comportamento desviado pode resultar de um processo condicionador fortuito, de modo que é possível pro­ duzir, mediante condicionamento, um modelo de fetidusmo sexual. A questão é saber se experimentalmente se pode de­ monstrar que ocorre excitação sexual, pelo condicionamento, como reação a estímulos “ neutros” ; Rachman acentuou que tal demonstração só indica que essa associação pode ser feita, não que todos os fetiches ou reações sexuais anormais devam ter-se iniciado dessa maneira. Três jovens psicólogos solteiros apresentaram-se como vo­ luntários para a experiência e, por motivos éticos, o objetivo do estudo foi-lhes explicado antecipadamente. A reação a ser condicionada era excitação sexual, como se manifesta por alterações no volume do pênis (ereções) do paciente, sendo tais alterações medidas por um pletismógrafo especial que transformava essas reações em deflexões registradas eletrica­ mente. Os estímulos a serem condicionados eram botas — pelo menos, um diapositivo fotográfico de um par de botas pretas de mulher, da altura dos joelhos. A técnica envolvia a apresentação das botas durante 15 segundos, o que era seguido um segundo depois por diversos diapositivos mostrando uma atraente mulher nua. Êste úl­ timo estímulo era exposto por um período de 30 segundos. Repetia-se a seqüência até que ocorresse uma reação condi­ cionada de excitação sexual (aumento do volume do pênis) diante das botas isoladamente — sendo cinco dessas reações sucessivas o critério escolhido na experiência. Além disso, examinou-se a possibilidade de uma reação “ generalizada” tentando a reação do paciente a outros tipos de calçado: botas

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curtas marrons, sapatos pretos de saltos altos e baixos, assim como sandalias marrons e douradas. Em síntese a experiên­ cia detinava-se a investigar a possibilidade de a excitação sexual ser condicionada para objetos neutros. (isto é, ante­ riormente não sexuais) e determinar se, sendo possível obter tal associação, existe prova de alguma espécie de extensão ou generalização para estímulos semelhantes anteriormente neutros. O critério para uma reação condicionada às botas pretas até os joelhos (aumento seguro do volume do pênis) foi al­ cançado em um total de 24 a 65 provas; os três pacientes apresentaram indicações de generalização dessa reação, mas só para os sapatos prêtos. Naturalmente, é possível que provas adicionais produzissem com o tempo maior genera­ lização. Um dos aspectos mais importantes dêsse estudo refere-se, porém, aos resultados da tentativa de extinguir essa capaci­ dade de reação recém-adquirida. Repetida apresentação do estímulo das botas sem o estímulo original para excitação sexual (mulheres nuas) deveria resultar em progressiva per­ da da capacidade de reagir ao primeiro. Isso de fato ocor­ reu, perdendo-se a excitação sexual condicionada em 10 a 39 provas. Contudo, a reação extinta mostrou sinais de recupera­ ção quando se realizou reavaliação alguns dias mais tarde, isto é, a tendência a ficar sexualmente excitado à vista de botas pretas estava novamente presente. Na segunda ocasião, obteve-se a extinção com maior facilidade, no sentido de serem necessárias menos exposições às botas para eliminar excita­ ção diante dêsse objeto de fetiche (embora fôsse necessária uma sessão de extinção a mais para um dos três pacientes, que demonstrou maior resistência a perder a reação condi­ cionada). A resposta à pergunta relativa à possibilidade de adquirir a anormalidade de fetichismo sexual pelo processo de condi­ cionamento parece ter sido claramente estabelecida nesse es­ tudo. Ainda é naturalmente duvidoso se o fetichismo ou qual­ quer outra reação sexual desviada realmente surge ou não, dessa maneira, mas essas descobertas parecem dar certa plau­ sibilidade à explicação do terapeuta de comportamento para

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a origem de tais distúrbios. Isso é talvez reforçado pela de­ monstração de que a reação condicionada se comporta de acordo com princípios de laboratório bem documentado^, por exemplo, o de que provas sem reforço (sem recompensa) le­ vam à extinção, mas parece seguir-se recuperação espontânea da reação extinta. Mesmo sem a demonstração experimental dêsses fenômenos de condicionamento por Rachman, o tera­ peuta de aversão tem oferecido, com freqüência, tratamentos de “ reforço” como processo padronizado, destinado-a com­ pensar a recuperação espontânea de um hábito suprimido; as descobertas de Rachman parecem justificar essa prática, A presunção de . que é preciso aprender o comportamento antes que se possam fazer tentativas de tratamento por desaprendizagem não é, naturalmente, essencial ao emprêgo de terapia de aversão. O comportamento mal adaptativo adqui­ rido por outros meios que não o processo de aprendizagem (por exemplo, por trauma físico no cérebro) também poderia ser sensível a essa espécie de tratamento. Evidentemente há limites para sua utilidade em tais casos, sendo limitação im­ portante a acessibilidade de reações adaptativas alternativas. Por exemplo, a presunção geralmente feita pelo terapeuta de comportamento, em seu tratamento de desviados sexuais por terapia de aversão, é que reações alternativas (isto é, com­ portamento sexual heterossexual adaptativo) se seguirão ou poderão ser ativamente criadas; contudo, alguns casos desta espécie talvez não justifiquem tal presunção. Entretanto, o terapeuta deve nesta fase estender a aplica­ ção de seu modêlo e seu tratamento até limites razoáveis; só assim é que se pode apreciar o pleno alcance da terapia de aversão. Três considerações, resultantes do material apre­ sentado neste capítulo e no precedente, indicam que se deve tomar essa linha de ação. Primeiro, embora a prova a res­ peito de tratamento aversivo não se tenha mostrado inteira­ mente favorável, não se mostrou também completamente des­ favorável, e o fator mais animador é que essa forma de tra­ tamento parece dar resultados onde outros tratamentos não dão. Segundo, há boas razões para crer que os malogros do condicionamento aversivo podem freqüentemente atribuir-se a interpretações errôneas a respeito de princípios importantes

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ou ao emprego de processos relativamente sem refinamento. A abordagem empregada, por Feldman e McCulloch indica o grau em que se podem introduzir importantes refinamen­ tos. Terceiro, a prática de tratamento aversivo e sua apli­ cação para compreensão da etiologia, desenvolvimento e remoção de sintomas pode ser submetida a prova experimen­ tal, sendo animadoras, embora atualmente modestas, as rea­ lizações nesse sentido. Poder-se-ia argumentar que há igualmente considerações irrecusáveis do lado negativo. Primeiro, como vimos, há vá­ rias teorias a respeito da operação de treinamento aversivo, fator que tende a pôr em destaque as incertezas envolvidas no emprêgo das técnicas — se não compreendemos perfeita­ mente como funciona a punição, como podemos usá-la e con­ trolar o comportamento da maneira mais eficiente? As pro­ vas indicam também que o emprêgo de punição envolve tantos problemas e paradoxos, que não permite excesso de confian­ ça nesta altura; até que se possa prever com precisão o re­ sultado da aplicação de punição, devemos avançar com grande cautela. Poder-se-ia também dizer que a aplicação do que, pelo menos rio valor aparente, são processos simples deve inevitàvelmente considerar-se deficienté num ambiente tera­ pêutico que provàvelmente envolve complexos processos psi­ cológicos. Poderá um dia a punição, usada de qualquer ma­ neira simples, bastar para produzir comportamento adaptativo socialmente aceitável em casos nos quais a situação é claramente de extrema complexidade?

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CAPÍTULO

XIII

Condicionamento Operante Com Incentivos Positivos

O p a c ie n t e psicótico está sentado, calado e imóvel, tal como permaneceu durante quase 20 anos de sua vida em hospitais. Não há sequer um murmúrio de resposta às perguntas que lhe são feitas, nem ao comportamento de outras pessoas; êle fica sentado passivo, exatamente na posição em que o colo­ caram. Quando o pesquisador tira do bolso alguns cigarros, um pacote de goma de mascar cai acidentalmente ao chão; os olhos do paciente movem-se para onde caiu a goma e de­ pois voltam à sua posição anterior, fitos para a frente. A imobilidade não é mais absolutamente completa.

O experimentador combina ver o paciente três vêzes por semana, visando a ampliar o âmbito da responsividade míni­ ma que demonstrou. Durante as duas primeiras semanas o tempo é gasto em segurar um tablete de goma de mascar diante do rosto do paciente até haver um movimento de seus olhos em direção a êle; quando isso acontece, a goma é dada ao paciente. No fim da segunda semana, seus olhos voltamse imediatamente para a goma de mascar no momento em que esta é erguida.

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Nas duas semanas seguintes, exige-se mais responsividade antes de dar a goma. Ao fim da primeira sessão notam-se movimentos espontâneos dos lábios; quando isso ocorre, ofe­ rece-se logo a goma de mascar ao paciente. No final da ter­ ceira semana a goma produz movimentos tanío dos lábios como dos olhos e então o pesquisador fixa um nôvo alvo, a vocalização. Ao fim da quarta semana o paciente está pro­ duzindo não só movimentos labiais, mas também uma voca­ lização gutural. Na quinta e sexta semanas fazem-se tentativas de levar o paciente a tornar clara a vocalização e, com esse propó­ sito, o investigador pede-lhe repetidamente que profira a pa­ lavra “ goma” . Ao fim de seis semanas, o paciente diz de repente “ goma, por favor", e logo mostra certa disposição de responder a outras perguntas simples. Um pouco mais tarde parece ter adquirido o desejo de fazer perguntas espontâneamente; pergunta, por exemplo, a um atendente vo­ luntário se quer jogar tênis de. mesa com êle, dizendo “ pin­ gue-pongue” . Restaurou-se um grau de comportamento ver­ bal nesse paciente anteriormente mudo. Êste caso, citado por Isaacs e outros (1960), exemplifica o método de condicionamento operante, no qual se obtém con­ trole do comportamento pelo deliberado e sistemático arranjo das conseqüências(* ). Neste exemplo, um reforço positivo, ou recompensa, é a conseqüência predeterminada do comporta­ mento (virar os olhos, movimentar os lábios etc.) e, como a experiência indica, formas mais complexas de comportamento podem ser criadas ou modeladas a partir de começos tão simples. Será evidente^ para o leitor que “ aprendizagem” tem aqui uma significação especial, pois o comportamento evocado já consta do repertório de reações do paciente. Pede-se a êle, não que aprenda a produzir a reação, mas que altere a fre­ qüência com que ocorre o comportamento. O objetivo, em outras palavras, não é ensinar o paciente a falar — presu­ mimos que êle tenha conservado essa capacidade — , mas con( * ) Deve-se acentuar que, embora mutismo em distúrbios graves pos­ sa ceder com êsses processos, outros problemas possivelmente mais centrais em distúrbios psicóticos talvez ainda perdurem.

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seguir que a fala ocorra freqüentemente e com segurança nas condições apropriadas. O processo de flp*pnfli7íagfím Hpppndn.. pnrtawtA de- ^‘atos emitidos ou operantes” (Skinner, 1938) que o pesquisador não faz acontecer e, assim, distingue-se do condicionamento clássico no qual, por exemplo, o ato de o cão erguer a pata é deliberadamente provocado pelo investigador. Em suma, aqui devemos esperar n aparecimento rift rftao&ft-mi .do -comportamento desej adq, paja. que.„passaim}s^e£©í^á-te-' ( recom­ pensá-lo) e, promovendo tal cans&qüpnriaj fortalecer -aquele comportaiaejito>,.jio se.ntido^d&^tofjiá~k> maio freqüente. No caso mencionado, porém, surgem certos problemas. Por exemplo, quando o pesquisador pede ao paciente para dizer a palavra “ goma” , poder-se-ia argumentar que isso não pa­ rece envolver “ reação livre” , da qual se escolherá algum com­ portamento determinado para recompensa. Muito pelo con­ trário ; a reação que o paciente deve fazer é claramente espe­ cificada pelo experimentador. Poderíamos também indagar se o processo bastante complicado de movimentos dos olhos para vocalização é realmente necessário. Se o é, como sugere a no­ ção de “ modelagem de reação” (ou o método de “ aproximação sucessiva” ), poderíamos esperar que houvesse alguma ligação lógica entre os vários comportamentos evocados. Por exem­ plo, esperaríamos que o treinamento do paciente para fazer movimentos de olhos tornasse mais provável a emissão de sons guturais; se tal não ocorresse, poderíamos igualmente começar com o “ fortalecimento” daqueles sons. Contudo, os resultados são claramente de considerável interesse. Aqui temos um paciente mudo e imóvel que após umas 18 sessões de condicionamento operante, se torna vocal e geralmente mais responsivo. Isso por si só é notável, independentemente do tempo que dure a nova faculdade. A proposição central no condicionamento operante é, pois, essencialmente simples; diz que as conseqüências que se se­ guem a determinada peça de comportamento influenciam a ocorrência futura dêsse comportamento. ObsérVãÇâõ^ülnum parece testemunhar a validade dessa proposição, pois o com­ portamento que. é recompensado, (positivamente reforçado)

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parece ocorrer com maior freqüência. Por outro lado, a ação de punições e reforços negativos poda"produzir niaiõrtm me­ nor freqüência de reação, dependendo da maneira como_se aplica tal tratamentor Geralmente, uma reação õu compor­ tamento é fortalecido por punição" se lgva~ à i emoção~dg dor, isto é, fuga da punição e a conseqüência. Contudo, se algum aspecto do comportamento leva a puniçào de jna-nek1»- éireta, podemos esperar que o comportamento sejar enfraquecido. Êste duplo papel do reforço negativo foi demonstrado de maneira clara por Goldiamond e seus colegas (1965), usando gagueira como anormalidade a controlar por processos ope­ rantes. Numa primeira experiência, pediu-se aos pacientes que lessem em voz alta durante 90 minutos, os primeiros 30 dos quais eram usados simplesmente para registrar a fre­ qüência com que ocorria gagueira. Depois, durante o segundo período de 30 minutos, fazia-se uma tentativa de aplicar um estímulo aversivo (ruído desagradável) imediatamente após cada bloqueio da verbalização, enquanto nos 30 últimos mi­ nutos se realizava simples registro de dificuldades verbais para examinar o impacto do período de punição. Os resultados foram inequívocos. Não apenas a gagueira se reduziu significativamente durante o período de punição, mas também essa modificação pareceu estender-se muito pela seção final de tempo quando não se aplicou a menor punição. Outras observações indicaram, porém, que a modi­ ficação não foi permanente e que a gagueira mostrava ten­ dência de voltar ao nível anterior ao tratamentq. Talvez pouco mais se pudesse esperar de tratamento tão curto. Em uma segunda experiência, usou-se reforço negativo ou punição em um contexto de fuga. Providenciou-se para que a atividade de gagueira desligasse um ruído incômodo e o resultado foi significativo aumento nas dificuldades de voca­ lização. Em outras palavras, fazer da fuga à punição conse­ qüência da gagueira produz resultados absolutamente opos­ tos aos obtidos quando a punição é a conseqüência. Essas duas experiências em conjunto mostram claramente que po­ demos considerar a gagueira como comportamento operante no sentido de sua freqüência poder ser modificada ou altera­ da por suas conseqüências; as duas maneiras também mos-

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tram como se pode usar punição ou reforço negativo para produzir resultados diferentes e opostos. Até recentemente, porém, o emprego de incentivos pbsitivos (recompensas) recebera relativamente pouca atenção, provavelmente porque, embora as recompensas pareçam exer­ cer poderosa influência no comportamento, é difícil identi­ ficar um membro dessa classe de “reforço” bom, seguro e amplamente aplicável. Por outro lado, confiamos mais em que um choque elétrico produza resultados seguros e seja universalmente percebido como punição por todas as espécies, idades e sexos. Tão evidente distinção entre êsses dois tipos de reforço provàvelmente constituiu empecilho no sentido de impedir plena exploração da área de “recompensa”. A pesquisa na área conhecida como “condicionamento ver­ bal” talvez tenha contribuído muito para alertar os psicó­ logos para o valor de recompensas. Isso, em certo sentido, está relacionado com uma técnica de vendas, com a qual mui­ tos estão familiarizados, isto é, fazer o freguês dizer “sim” a perguntas, o que é bastante fácil se elas forem: “Você

Figura.

5.

Máquina de condicionamento operante para uso com crianças.

Por A se introduzem pequenos doces na máquina. Se a criança consegue executar certa tarefa, as luzes (C) acendem-se. Pode ajustar-se a , máquina, para oferecer doces (pelo tubo B) após o acendimento de uma ou mais luzes.

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quer um bom modelo, não quer?” ou “ Acho que você sabe o que quer, não sabe ?” Esperando que a resposta “ sim'" tenha sido firmemente arraigada por seus esforços, o vendedor pode tentar então obter essa mesma resposta para a pergunta final e mais vital. O condicionamento verbal provàvelmente tem mais ou me­ nos a mesma base que essa técnica de vendas; produz-se uma verbalização e o pesquisador dá uma recompensa. Isso deve estimular o uso cada vez mais freqüente da reação desejável. Mas qual é a recompensa? Parece ser semelhante nas de­ monstrações de laboratório e no contexto de vendas; é o emprêgo do que conhecemos como “ reforços sociais", isto é, pa­ lavras como “ bom” , “ ótimo” ou sorrisos, gestos e outros si­ nais de calorosa aprovação. São os intangíveis em cuja obten­ ção parecemos trabalhar grande parte de nosso tempo — pro­ curamos aprovação social ou pelo menos seus símbolos e a freqüência das atividades pelas quais se obtém tal aprovação aumenta! Pode-se ver que há três passos na argumentação. Primeiro, estamos ansiosos por obter aprovação social, tan­ to quanto por obter alimentos e bebidas, sexo etc.; segundo, é fácil manipular os símbolos de aprovação social, por exem­ plo, sorrisos e gestos de aprovação; e, terceiro, a aprovação social, como conseqüência de uma ação, aumenta a freqüên­ cia com que tal ação ocorre. Contudo, deve-se incluir mais um ponto para completar um quadro que se ajusta perfei­ tamente nas concepções de condicionamento operante, isto é, que essa aprovação não só fortalece a reação específica de que é conseqüência, mas também uma classe de reações cor­ relatas. O que o “ condicionador” verbal operante tem em mente é que oferecer uma recompensa por uma ação belico­ sa não só torna essa reação mais freqüente, mas também estimula a expressão de outras reações belicosas. Igualmen­ te, pode-se esperar que a aplicação sistemática de aprovação social a um tipo de reação de “ interêsse” demonstrado por uma criança anime várias reações de “ interêsse” . Os estudos até agora realizados parecem testemunhar a potência de reforços sociais simples. Certas indicações mos­ tram que tais recompensas são capazes de influenciar até mesmo o paciente esquizofrênico retirado, que freqüentemen­

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te dizem notoriamente insensível a estimulação social. Tais descobertas evidentemente revelam uma ampla variedade de recompensas fàcilmente acessíveis, que podemos empregar para animar o aumento da freqüência dêsses comportamentos desejáveis. Uma das implicações do que dissemos parece ser, porém, de grande importância. Voltemos mais uma vez ao exemplo do comportamento de gagueira para exemplificar este ponto. Em interessante artigo, Shames e Sherrick (1968) tentam estabelecer as razões para considerar essa anormalidade como forma de comportamento operante, isto é, que qualquer ín­ dice contemporâneo de gagueira resulta de condicionamento passado e será portanto suscetível de modificação e mudan­ ça por processos semelhantes. Acentuam que repetições de fala são extremamente comuns em crianças pequenas, de modo que, dependendo das conseqüências que se seguem a êsse comportamento, o gago pode ser estimulado ou desestimulado. Uma das possibilidades que citam é a da criança forçada a repetir uma pergunta várias vêzes antes de obter resposta; quando chega finalmente, a resposta é, em certo sentido, recompensadora para a criança — que obteve aquilo que pre­ tendia — , mas a recompensa ou reforço positivo dependeu da repetição. Com o tempo isso poderia levar ao aumento da freqüência de repetições (talvez semelhantes às encontrardas entre gagos) porque, durante certo prazo, se considerou recompensador tal comportamento. A questão é que, enquanto um “ modelo médico” tende a argumentar em favor de uma “ doença” subjacente na gaguei­ ra, o “ modêlo de condicionamento” sustenta que existe certa continuidade entre os estados normal e anormal, mas que o equilíbrio foi desfeito na direção da anormalidade pela his­ tória condicionadora do paciente. Não se pode ainda deter­ minar até onde o último modêlo se aplica ao campo das per­ turbações psicológicas, mas é significativo que os defensores dessa abordagem se mostram muito ativos em oferecer uma explicação de condicionamento para os fenômenos de distúr­ bio mental até agora considerados como questões essencial­ mente médicas. Por exemplo, até recentemente não se con­ sideravam a apatia e o retraimento de pacientes esquizofrê­ 14

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nicos nem mesmo possivelmente relacionados com o trata­ mento ou treinamento que tais indivíduos pudessem ter rece­ bido no lar ou em hospital; tais idéias são agora freqüente­ mente expressadas e algumas das crenças do “ conceito de doença” estão sendo desafiadas pelas provas empíricas de la­ boratórios de condicionamento operante. Êsse ponto foi sustentado por Ullmann e outros (1964), ao relatarem a descoberta de que associações verbais de pacien­ tes esquizofrênicos podem ser alteradas e modificadas por pro­ cessos operantes. A técnica empregada nesta experiência consistia em dar recompensa social (um gesto de aprovação, um sorriso, ou “ hum-hum” ) quando se faziam associações comuns com palavras, mas negar reforço às declarações mais incomuns ou bizarras dos pacientes. Os resultados foram ani­ madores no sentido de mostrar que associações normais ten­ diam a ceder lugar a outras mais comuns. Os autores do relatório acentuam que isso representa importante demons­ tração do grau de controle que se pode obter sôbre um dos principais sintomas de distúrbio esquizofrênico, sendo sur­ preendente constatar que associações desordenadas reagem rapidamente a reforços sociais de espécie simples. Além disso, um grupo de controle que não recebeu reforço algum, nega­ tivo ou positivo, tendeu a apresentar redução no número de associações normais durante o período de exame. Para os autores isso sugeriu que o reforço social é importante não só para mudar reações verbais, mas também para mantê-las. É, de fato, muito interessante observar que em grande parte do trabalho inicial na aplicação de condicionamento operante a anormalidade psicológica deu-se na área das grandes psi­ coses. Sob tal aspecto, esta abordagem tem história bem di­ versa da terapia de inibição recíproca. Podemos ver essa ênfase dada aos problemas mais sérios e intratáveis igualmente em estudos nos quais se aplicou con­ dicionamento operante ao campo da deficiência mental. Tais processos foram também fàcilmente aplicados a anormalida­ des de tôda espécie entre crianças. Essas observações suge­ rem que tais técnicas talvez sejam mais adequadas quando existe alguma dificuldade ou problema de linguagem envol­ vendo comunicação verbal. Fora dessas situações extremas a

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aplicação de métodos operantes às vêzes faz que nos pergun­ temos se o comportamento desejado seria ou não mais fàcilmente obtido simplesmente informando-se o paciente *xio que era necessário — e do que aconteceria se a reação não ocor­ resse! Naturalmente, é possível argumentar que não se po­ deriam obter certos desempenhos senão por treinamento sis­ temático — qualquer treinador de tênis testemunha esta ver­ dade — , mas parece razoável examinar a possibilidade de estimular um comportamento por meio de linguagem antes de voltar-se para o treinamento mais complicado e demorado muitas vêzes envolvido no condicionamento operante. Um exemplo de treinamento operante aplicado a um pro­ blema de tratamento difícil provém de Neale (1963). O paciente nesse estudo, um menino de nove anos, era encoprético(*) havia 18 meses, e um ano de tratamento, tanto hos­ pitalizado como fora de hospital, não produzira a menor me­ lhora em sua tendência de sujar-se ou em seu comportamento agressivo. Iniciou-se então um processo de treinamento ope­ rante que consistia em levar a criança ao banheiro quatro vêzes ao dia. Qualquer sucesso que acompanhasse essas visi­ tas era recompensado com elogios e um doce, assim como com seu registro em livro especial na presença da criança. Se esta não defecava depois de ficar alguns minutos no banheiro, não se exigia que continuasse seus esforços. Por outro lado, quando se sujava, não havia a menor punição ou recrimina­ ção; simplesmente lhe davam uma calça limpa para vestir. No devido tempo achou-se possível abandonar a rotina das visitas ao banheiro e confiar na apreciação do próprio pa­ ciente quanto à necessidade de defecar; contudo, uma visita “ bem sucedida” ao banheiro ainda era recompensada. Três meses depois de iniciado o tratamento, êsse menino estava “ limpo” , assim como demonstrava lenta mas firme melhora em seu comportamento geral. Em consequência, recebeu alta no hospital. Em uma verificação feita poucos meses depois de sua saída do hospital, ainda permaneciam as melhoras conseguidas. ( 0)

Incontinência nos movimentos intestinais.

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Na experiência acima poder-se-ia argumentar que o pro­ blema era muito mais circunscrito e direto do que freqüente­ mente acontece. De qualquer maneira, a criança em questão era sensível a instruções e demonstrava também certo grau de cooperação e interêsse em obter contrôle dos intestinos. Ter sido o problema resolvido pelo simples expediente de ar­ ranjar certas contingências (para que recompensa se seguisse a “ sucesso") não diminui, porém, o valor das descobertas, es­ pecialmente quando tratamentos anteriores haviam deixado de produzir efeitos benéficos. Ainda assim, as tentativas de aplicar condicionamento operante a casos mais difíceis levan­ tam novos e mais sérios problemas. Além de tudo, a aplicação dêsses processos pode exigir do terapeuta qualidades quase sôbre-humanas de moderação. Uma das crianças autistas (psicóticas) vistas por Ferster e DeMeyer, por exemplo, deixava os pais desesperados por des­ pir-se imprevistamente, destruir móveis, fugir de casa e en­ tregar-se a comportamento autolesivo. Não é de admirar que o comportamento do pai em relação ao filho de oito anos fôsse muitas vêzes rigoroso, variando desde severas punições até a construção de uma jaula onde a criança podia ser co­ locada para limitar suas atividades. Como colocar uma criança assim numa situação na qual o condicionamento ope­ rante tenha probabilidade de dar resultado? Estão essas crianças fora do alcance de qualquer tentativa de conseguir contrôle pela manipulação de seu ambiente? Lindsley (1956) relatou suas tentativas de colocar sob cer­ to grau de contrôle alguns aspectos do comportamento de pacientes psicóticos. Sua experiência foi realizada em um aposento mobiliado simplesmente, exigindo-se do paciente que puxasse uma alavanca para obter recompensa, sendo tôda a administração controlada automàticamente. Observou êle que 90 por cento de seus pacientes estavam tão debilitados pela doença que era difícil fazê-los puxar a alavanca e que, mesmo quando êsse comportamento ocorria e era devidamen­ te recompensado, os ritmos de reação eram baixos e extrema­ mente variáveis. Notou-se também que havia acentuada ten­ dência a desenvolver reações estereotipadas, que persistiam apesar dos esforços feitos para mudá-las. King e outros

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(1960) (*) também dedicaram certa atenção a pacientes es­ quizofrênicos muito retraídos, tentando desta vez criar for­ mas mais complexas de comportamento, desde o simples puxar de alavanca do estudo de Lindsley até comunicação social e resolução de problema. As recompensas pelas quais trabalhavam êsses pacientes eram cigarros, doces e a proje­ ção de interessantes diapositivos coloridos. Esta investigação teve interêsse mais do que comum porque ofereceu oportuni­ dade para comparar o valor do condicionamento operante (oferecimento de recompensa dependente da produção do comportamento desejado) com outras situações — terapia verbal, terapia recreativa e uma situação “ sem tratamento” Os resultados dessa comparação foram claramente favoráveis aos processos operantes, tendo os pacientes que receberam êsse tratamento demonstrado mais verbalização, menos re­ sistência a qualquer tratamento necessário, aumento de in­ terêsse na terapia ocupacional e maior proporção de transfe­ rências para enfermarias de “ melhora” . A possibilidade de controlar até certo ponto o comporta­ mento de pacientes psicóticos crônicos foi igualmente de­ monstrada por Hutchinson e Azrin (1961), embora nesta ex­ periência também se estudasse apenas atividade motora sim­ ples. A tarefa do paciente era puxar uma alavanca e a reação era reforçada por cigarros ou doces, recebendo êle instruções no sentido de “ obter tudo quanto você quiser levar de volta consigo para a enfermaria” . A princípio cada puxão na ala­ vanca proporcionava uma recompensa ao paciente, mas, com o tempo, empregaram-se outros esquemas de reforço, de mo­ do que o paciente precisava trabalhar mais tempo para obter recompensas. Observou-se que, enquanto no comêço todos os pacientes apresentaram índices muito baixos de reação, grandes aumen­ tos ocorreram com o passar do tempo. Além disso, desde que o pesquisador não passasse muito depressa para um es­ quema que exigisse muitas reações de puxar alavanca para ( * ) KING, G. S., ARMITAGE, S. G .( e TILTON, J, B. (I 9 6 0 ), A Therapeutic Approach to Schizophrenics of Extreme Pathology: An OperantInterpersonal Method, J. Abn. Soc. Psychol., 12, 276-86.

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obter uma recompensa, o paciente continuava produtivo mes­ mo quando só se davam doces e cigarros depois de 300 puxões. Podemos fazer duas observações importantes sobre êsse es­ tudo. Em primeiro lugar, é claro que os resultados não indi­ cam mais do que a possibilidade de o comportamento de esquizofrênicos crônicos ser sensível a métodos operantes. Há uma distância muito grande entre demonstrações simples da influência de doces e cigarros sôbre o ato de puxar alavanca e as implicações terapêuticas mais cruciais. Em segundo lugar, deve-se notar que os pacientes utilizados nesse estudo eram os que estavam preparados para aceitar doces e cigarros como recompensa, de modo que, embora os resultados sejam interessantes e possam ter importantes implicações, é bem possível que só pacientes já socialmente responsivos tenham probabilidade de reagir bem a êsse tipo de tratamento. Até certo ponto Robertson (1958) endossou essa conclu­ são, pois atribuiu seu malogro no condicionamento de três esquizofrênicos mudos à incapacidade de descobrir uma re­ compensa pela qual êsses pacientes trabalhassem. Em estudo posterior (1961) com 24 pacientes psicóticos, Robertson acentuou novamente a necessidade de procurar formas ade­ quadas de reforço positivo, descobrindo que alguns de seus pacientes reagiam a elogios, enquanto outros pareciam exigir recompensas mais tangíveis. De fato, chegou mesmo a decla­ rar que obtinha o resultado mais produtivo com êsses pacien­ tes informando-lhes não só qual a recompensa que podiam obter, mas também que reação ou comportamento seria ne­ cessário. Isso sugere serem pré-requisitos a cooperação e a compreensão da parte do paciente. Estudos semelhantes aos citados foram realizados com crianças mentalmente retardadas, sendo também seu objeti­ vo estabelecèr em princípio se o comportamento de indivíduos aparentemente fora do alcance de outros métodos seria ou não influenciado por técnicas operantes. Num dêsses estu­ dos, de Bijou e Orlando (1961), um grupo de 46 deficientes de baixa categoria recebeu a tarefa de acionar uma alavanca para obter doces como recompensa. O resultado foi mais ou menos igual ao obtido com psicóticos em outras experiên­ cias citadas.

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Novamente, poder-se-ia dizer que o valor de tais demons­ trações é muito limitado em termos de implicações terapêuti­ cas diretas, embora já se haja demonstrado a responsividade de indivíduos retardados, mesmo quando de inteligência mui­ to baixa, fora da estrutura de condicionamento operante. Contudo, existe geralmente em tais estudos mais do que a simples observação de aumento de responsividade quando se oferecem recompensas, e talvez seu verdadeiro valor resida na descrição mais precisa das condições em que a aquisição é mais eficiente e duradoura. Sob esse aspecto, poder-se-ia dizer que o condicionamento operante, tanto em têrmos de experimentação pura como aplicada, tem-se preocupado mui­ to com tal descrição e, em conseqüência, tem qualidade for­ temente empírica. Nem tôda terapia de condicionamento operante se relacio­ nou com condições psicológicas mais sérias. Um dos estu­ dos a respeito de um problema menos complexo, embora geralmente reconhecido como resistente a tratamento, é re­ latado por Bachrach e outros (1965). A paciente, mulher de 37 anos, sofria da condição relativamente incomum cha­ mada anorexia nervosa, cuja característica saliente é a recusa em ingerir quantidades adequadas de alimento. Quando re­ cebida para tratamento, pesava apenas 21,300 kg. Foi des­ crita pelo autores do relatório como “ . .. tão caquética e en­ colhida sobre seu esqueleto que dava a impressão de uma múmia m^l preservada que tivesse recebido repentinamente o sôpro da vida” . Não surpreendia que fôsse incapaz de ficar em pé sem ajuda. Oito internamentos anteriores em hospitais gerais não haviam conseguido melhorar-lhe a condição e, de fato, seu estado físico geral era tal que inspirava grande preocupação quanto a sua sobrevivência. O objetivo neste caso era obviamente restaurar o comportamento de comer o mais depressa possível; o método adotado na tentativa de controlar sua alimentação foi o de condicionamento operante. A paciente foi transferida para uma “ cela experimental nua” e disseram-lhe que cada uma das três pessoas encarre­ gadas de seu tratamento tomaria uma refeição com ela cada dia, sendo essas refeições servidas em sua “ cela” . O regime

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(do qual não foi informada) consistia em reforço verbal de qualquer movimento associado ao ato de comer, desde apa­ nhar um pedaço de alimento com seu garfo até engolir um pouco dêle. Os reforços a princípio limitavam-se aparente­ mente a falar-lhe sôbre alguma coisa pela qual pudesse in­ teressar-se, sempre que ocorria algum movimento de comer. No entanto, durante todo o tempo dêste regime, se exigia cada vez mais “ r^sponsividade a comida” antes de dar a re­ compensa. Posteriormente, quando se devia dar reforço por crescentes quantidades de comida consumida, introduzia-se um rádio, televisor ou gramofone na situação como incentivo adicional. Se a paciente não produzia a reação desejada, nada se fazia para proporcionar seus prazeres e ela era sim­ plesmente deixada até o momento da refeição seguinte. Ainda mais tarde, quando o aumento de peso da paciente pareceu justificá-las, introduziram-se outras formas de re­ compensa, como as de poder comer junto com outros pacien­ tes, dar passeios e receber visitas. Dois meses depois de iniciado o tratamento, a paciente teve alta, pesando 6,300 kg a mais do que ao ser internada; o problema então passou a consistir em assegurar que o progresso continuasse fora do rigoroso regime hospitalar. Neste caso a família foi suficientemente cooperativa para tentar reproduzir as condições existentes no hospital e, quan­ do por fim dispensada de supervisão, a paciente pesava 40 kg. Relatou-se a essa altura que ela estava socialmente bastante ativa e demonstrando muito maior interesse por sua aparên­ cia. Alguns meses depois arranjou um emprêgo do qual gostava muito e, embora permanecesse extremamente magra, parece não terem ocorrido mais sérias perdas de pêso. Neste caso confiou-se grandemente, é claro, na manipula­ ção de incentivos positivos (reforços), embora se deva notar que se julgou necessário colocar a paciente em condições de “ privação” para que essas recompensas atuassem eficazmen­ te. Êste ponto é importante em muitos estudos de condicio­ namento operante, como vimos em experiências anteriormen­ te mencionadas, parecendo razoável supor que um dos fato­ res cruciais na obtenção de bons resultados é identificar e remover todos os reforços que estejam operando no sentido 208

de manter o comportamento mal adaptativo. Êste foi o caso, por exemplo, no estudo mencionado antes a respeito de con­ trole de comportamento difícil em pacientes, quando o refor­ ço de atenção pelo pessoal de enfermagem pareceu ser a re­ compensa que mantinha mau comportamento. O plano geral é portanto de concepção muito simples; eliminar os reforços que mantêm a reação indesejável e proporcionar outras “ re­ compensas” como conseqüência de comportamento bom e de­ sejável ; contudo, essa tarefa pode ser, e muitas vezes é, bem mais difícil do que parece à primeira vista. Naturalmente, poder-se-ia argumentar que, embora uma generalização de comportamento adaptativo pareça acompa­ nhar o trato de reação específica (por exemplo, a restaura­ ção do comportamento de comer levou a aumento da socia­ bilidade e da elegância pessoal), não sabemos exatamente como opera o processo de generalização. Até onde continua a extensão? Que atividades serão atingidas? A generaliza­ ção será sempre “ para melhor” , no sentido de melhorar o comportamento, e não de produzir qualquer prejuízo? A essas e outras perguntas semelhantes não podemos res­ ponder, apesar de aqueles que empregam esses métodos afir­ marem que será influenciada uma classe de comportamentos e não um único comportamento específico. A questão é esta: que classe? Uma reação específica pode fazer parte de uma classe estreita de “ comportamento de luta” , que, por sua vez, faz parte de uma classe maior de “ reações assertivas” e assim por diante. Parece de fato que grande parte da do­ cumentação sôbre melhora geral em seguida a tratamento es­ pecífico por técnicas operantes tem acentuado sabor post hoc; é sempre possível argumentar retrospectivamente que o com­ portamento específico tratado fazia parte de uma classe de “ reações cooperativas” ou de algum outro grupo de compor­ tamentos desejáveis. Contudo, acontece às vezes que os investigadores se dis­ põem deliberadamente a recompensar uma classe de reações, sendo um dêsses estudos relatado por Azrin e Lindsley (1965). Aqui, puseram crianças pequenas normais a prati­ car um jogo que exigia esforço cooperativo de quaisquer duas delas antes que acendesse uma luz vermelha e se desse 209

um doce. Infelizmente não se fêz a menor tentativa de ava­ liar a cooperação fora da situação experimental e não é pos­ sível concluir que essa experiência haja demonstrado a co­ operação entre crianças em sentido geral. Nesse estudo, de­ finiu-se cooperação como uma atividade relativamente espe­ cífica em um jogo que estava sendo praticado, mas evidente­ mente surgem problemas se a atividade não é rigorosamente especificada. Esta dificuldade aparece muitas vêzes quando o pesquisador age com a intenção de reforçar uma classe de reações; julgar o que é ou não uma reação hostil, ou honesta ou cooperativa poderia apresentar problemas apreciáveis nu­ ma situação de “ reação livre" quando se permite que as rea­ ções ocorram sem a menor tentativa de planejar seu apareci­ mento. As tentativas de empregar condicionamento verbal no curso de conversação livre corporificam exatamente essa di­ ficuldade. Em interessante estudo, Krasner (1964) propôs-se exami­ nar de maneira incomum a influência de generalização. Pri­ meiro tentou, recompensando as respostas de mulheres a um questionário médico, produzir nas atitudes delas uma mudan­ ça em sentido favorável à ciência médica. Depois, demons­ trou que para uma paciente atuar ou não em alto nível num teste “ médico" (fôrça de apreensão e persistência em man­ tê-la) dependia de ter ela sido ou não submetida a processo de condicionamento verbal. Em outras palavras esse estudo demonstrou que pode ocorrer, de maneira previsível, alguma generalização, de forma verbal ou outras formas de compor­ tamento. O trabalho experimental relatado neste capítulo será con­ cluído com a citação do resultado de dois outros estudos nos quais se usou condicionamento operante, com emprego de reforço positivo (recompensa), em casos de perturbação bran­ da. Daí pode-se ter uma idéia da variedade de anormalida­ des que receberam atenção com o emprego dessas técnicas. No primeiro estudo, Burchard e Tyler (1965) descreve­ ram a aplicação de condicionamento operante a comporta­ mento delinqüente em menino de 13 anos. Êste menino, Donny, fica institucionalizado em vista de seu comportamento incontrolável, que abrangia atos de destruição, incêndio pre-

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meditado, crueldade e furto. Várias formas de terapia haviam sido completamente mal sucedidas. É interessante notar que um desses tratamentos, “ terapia regressiva” (estimular vir­ tualmente o menino a comportar-se como bebê e trata-lo de­ liberadamente dessa maneira), não produziu mudanças per­ ceptíveis para melhor. Uma análise do comportamento de Donny sugeriu forte­ mente que seus atos anti-sociais eram mantidos por suas con­ seqüências recompensadoras, em têrmos de atenção dos fun­ cionários, admiração de outros meninos na instituição e assim por diante. A terapia evidentemente envolveria a remoção dessas fontes de satisfação e a redisposição de contingências, de modo que só o bom comportamento fôsse recompensado. Empregou*se combinação de recompensa e punição na qual atos anti-sociais causavam imediata transferência para um quarto de isolamento por certo período de tempo, enquanto que para cada hora de bom comportamento Donny recebia uma ficha que podia gastar de diversas maneiras que lhe fôssem agradáveis. Mais tarde, no decorrer do tratamento, como é habitual em tais estudos, as exigências para obter recompensas foram se tornando progressivamente mais ri­ gorosas. O resultado foi um declínio gradual, mas firme, tanto na freqüência como na gravidade do comportamento anti-social dêsse menino. Poder-se-ia argumentar que Donny simples­ mente aprendera a controlar seus impulsos nas condições par­ ticulares obtidas e que, se deixado sôlto na sociedade, as con­ tingências da instituição deixariam de ser eficazes. Esta é, sem dúvida, uma proposição razoável, especialmente se con­ siderarmos que muitas vêzes se encontra bom comportamento entre prisioneiros que, após obterem seu livramento, mostram imediata tendência a cometer outros crimes. Resta ver se o emprego de recompensa e punição é ou não capaz de produzir resultados melhores em têrmos de genuína conversão — em oposição a uma simples discriminação entre o que é possível na prisão e fora dela. Poder-se-ia também dizer que a utili­ zação de processos operantes em casos como este é mera recapitulação de regras práticas óbvias e bem comprovadas que não exigem o menor conhecimento psicológico especial.

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Até certo ponto êste comentário contém pelo menog um grão de verdade, mas o fato é que meninos como Donny parecem apresentar problemas de controle a pais e instituições; por mais simples e óbvios que possam ser os métodos de condi­ cionamento operante, sua aplicação sistemática e vigorosa aparentemente produz resultados efetivos que outros méto­ dos não ensejam. Um estudo de Hart e outros (1964) exemplifica a contri­ buição dada por processos operantes ao controle de pertur­ bação muito pequena. Os pacientes nesta experiência foram dois meninos de jardim de infância, Bill e Alan, de quatro anos, que demonstravam exagerada tendência a chorar. Seu comportamento de chôro foi julgado “ operante” pelos inves­ tigadores, isto é, dependente dos efeitos do ambiente social e mantido por êles, em lugar de resultar de qualquer estimu­ lação dolorosa. Isto parecia indicado pela observação da pro­ fessora de que as crianças tipicamente chamavam a atenção de um atendente adulto antes de chorar, e o chôro aumentava ràpidamente de volume até receberem atenção. As crianças eram fisicamente bem desenvolvidas e mentalmente acima da média, mas suas reações a pequenas batidas e frustrações insignificantes poderiam caracterizá-las como extremamente infantis para sua idade. Na opinião dos professores interes­ sados, tanto Alan como Bill se beneficiariam com a diminui­ ção da tendência para romper em lágrimas. Decidiu-se empregar uma combinação de não reforço para comportamento de chôro e recompensa quando tal comporta­ mento não ocorresse. Na prática, isso equivalia a ignorar o chôro “ operante” , simulando completa indiferença, enquan­ to todo comportamento julgado apropriado, em seguida a uma queda ou frustração, seria recompensado com atenção e apro­ vação. O resultado da aplicação desse regime foi que, em uma semana, o chôro “ operante” praticamente desapareceu nas duas crianças. Os estudos examinados começam a formar um quadro de processos operantes e, como vimos, os resultados são muito animadores. Além disso, parecem oferecer, mesmo nesta fase inicial de desenvolvimento, uma concepção alternativa da per-

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turbação psicológica relativa à que intervém no que geral­ mente se chama abordagem “ de doença". Os estudos de pa­ cientes psicóticos são de particular interesse nesse sentido, havendo razões para acreditar que alguns aspectos do com­ portamento de tais pacientes são tão “ operantes” quanto o chôro de Bill e Alan. No mais das vêzes, naturalmente, a possibilidade de modificar êsse comportamento pela alteraçào das contingências é a única prova oferecida de que o comportamento mal adaptativo resultou de certos processos de condicionamento. A inferência, em tais casos, é que se deu pouca oportunidade para o desenvolvimento de reações normais e adaptativas; que os esquemas de reforço (recom­ pensa) foram tais que se exigia excessivo desempenho para a obtenção de recompensa; que a punição deformou as in­ fluências da recompensa; ou que se haviam oferecido refor­ ços positivos para reação mal adaptativa. Ocasionalmente, como vimos, um ou outro dêsses mecanismos parece ter ope­ rado de maneira a causar o desenvolvimento de comporta­ mento anormal. O mais surpreendente resultado do exame das provas sôbre condicionamento operante em um contexto aplicado talvez seja o singular sucesso que parece resultar do emprêgo dêsses métodos. A surpresa talvez resulte principalmente da obser­ vação de que medidas aparentemente tão simples podem pro­ duzir importantes mudanças de comportamento, mas nesse sentido é importante chamar mais uma vez a atenção para os limitados aspectos do comportamento que foram até agora postos sob controle. É ainda duvidoso se os desempenhos conseguidos seriam sustentados ou generalizados de maneira satisfatória em outros aspectos de funcionamento. Também duvidosos são a possibilidade-de o paciente discriminar entre vida real e situações de laboratório, e o papel que a lingua­ gem e o pensamento conceituai poderiam desempenhar na obtenção dos resultados. Por outro lado, apesar dos problemas e dificuldades apre­ sentados pela abordagem de condicionamento operante, a simplicidade e o caráter direto dessa terapia têm uma qua­ lidade revigorante que confirma certas presunções comuns. Impressiona particularmente, em certo sentido, o grau de

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vigor e meticulosidade com que tais processos são geralmente conduzidos, envolvendo muitas vêzes certo grau de controle muito incomum sobre o ambiente do paciente. Em resumo, poder-se-ia dizer que o condicionamento ope­ rante, apesar de sua curta história no campo da terapia, prestou animadora contribuição não só em têrmos de suas técnicas terapêuticas, mas também pondo em dúvida noções tradicionais a respeito de perturbações psicológicas. Con­ tudo, o pleno potencial e valor dêsses métodos só podem ser avaliados por mais estudo e experimentação.

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CAPÍTULO

XIV

Condicionamento Operante Com Incentivos Negativos

D ic k y , criança psicótica de três anos e meio, apresentava um sério problema de controle. Seus acessos de cólera deixavamno “ prêto, azul e sangrando” ; negava-se a dormir se o pai ou a mãe não estivesse à beira de sua cama; não comia nor­ malmente ; e tinha desenvolvimento social e intelectual muito mau. Além disso, em resultado de certos defeitos visuais, era essencial que usasse óculos, caso contrário ficaria par­ cialmente cego, mas êle se recusava fazê-lo. Wolfe e seus colegas (1964) decidiram que Dicky devia ser hospitalizado para possibilitar tentativas satisfatórias de controlar êsses comportamentos demolidores.

O processo adotado no caso dos acessos de cólera consis­ tiu em fazer Dicky voltar a seu quarto e lá fechá-lo sempre que ocorresse aquêle comportamento. Poj: outro lado, bom comportamento fazia que fôsse sôlto. Aqui, portanto, os acessos de cólera tinham uma conseqüência punitiva, enquan­ to o bom comportamento produzia conseqüências sociais re­ compensadoras, inclusive contato com outros, atenção dêstes etc. Os primeiros quatro meses de tratamento pareceram

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não causar o menor efeito sobre a freqüência com que a crian­ ça se comportava mal, mas os investigadores puderam expli­ car de várias maneiras essa falta de sucesso. Argumenta­ ram, por exemplo, que os atendentes encarregados de levar Dicky a seu quarto em seguida a uma manifestação de có­ lera, com muita freqüência se mostríavam tão solícitos e contritos que o mau comportamento era recompensado em lugar de punido. Seguiu-se aplicação mais vigorosa do princípio de puni­ ção, que começou a produzir resultados positivos, e o grave comportamento autodestrutivo desapareceu quase completa­ mente. Mais uma vez ocorrerá ao observador que a técnica é essencialmente simples e que a quantidade de energia dis­ pensada é a única verdadeira diferença entre o que se está chamando de tratamento e a espécie de senso comum que todo mundo demonstra. De fato, muitas vêzes os pais podem queixar-se de ter experimentado combinações de pu­ nição e recompensa sem o menor êxito; assim, por que isso daria resultado com outros? Geralmente, em tais casos, des­ cobriu-se que o reforço — negativo ou positivo ( * ) — não fora aplicado rigorosa ou sistematicamente por prazo sufi­ cientemente longo. A essência do condicionamento operante parece, de fato, ser o puro pêso do esforço dedicado à apli­ cação dêsses princípios. Naturalmente, pais e outras pessoas muitas vêzes defrontam com problemas de natureza mais técnica que militam contra sua eficiência na obtenção de controle por êsses meios. Por exemplo, podemos necessitar de considerável aptidão e experiência para identificar e iso­ lar as recompensas que sustentam alguns comportamentos (• ) Refôrço positivo descreve a situação na qual um acontecimento em seguida a um comportamento torna mais provável a ocorrência dêsse comportamento em ocasiões futuras. Refôrço negativo pode ter duas im­ plicações: que o comportamento pode enfraquecer-se quando seguido de algum acontecimento incomodo (pu nição), no sentido de sua oconência tomar-se menos provável, ou que pode ser fortalecido pela retirada ou re­ moção de algum estímulo incômodo (fu ga e evitação). Consideram-se ge­ ralmente a punição, fuga e evitação como estreitamente relacionadas e re­ presentativas dos vários efeitos comportamentais de condições aversivas. Estudos teóricos e experimentais indicam que essa é uma área complexa e difícil, na qual há lugar para o emprêgo de têrmos mais precisos d o que é necessário neste livro.

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indesejáveis, assim como para localizar reforços eficazes para comportamento desejável. Da mesma forma, raramen­ te o controle completo do comportamento pode ser consegui­ do por pais atarefados e, seja como fôr, que pensariam os vizinhos de pais que investissem contra uma criança e a fechassem por longos períodos de tempo? Além disso, com muita freqüência há sérios desacordos entre pai e mãe quan­ to a punição pu recompensa apropriada, com conseqüências evidentes. É claramente possível fazer muito mais em nome da terapia do que em nome da paternidade ou maternidade. O uso de reforço negativo recebeu certa atenção nos Ca­ pítulos XI e XII, e alguns dos exemplos nêles citados pode­ riam considerar-se como de condicionamento operante. Por outro lado a terapia de aversão muitas vêzes abrange mais do que condicionamento operante livre, envolvendo mais ti­ picamente certo grau de condicionamento clássico. Esta dis­ tinção pode à primeira vista parecer pouco importante, mas há boas razões para manter a distinção entre processos de condicionamento operante e clássico. Condicionamento clássico é a expressão empregada para descrever a situação na qual se usa um estímulo para evocar alguma reação (como o choque elétrico na pata de um cão para obter a reação de erguer a pata). Tendo assegurado assim a ocorrência do comportamento desejado, o pesqui­ sador tenta formar associação entre um nôvo estímulo (co­ mo um som) e a reação de erguer a pata. Essencialmente o método envolve o emprêgo de um estímulo já reconheci­ damente capaz de produzir a reação desejada. Por outro lado, no condicionamento instrumental (operante), o pa­ ciente deve produzir a reação correta — seja por acidente ou de propósito — tirada de seu próprio repertório de rea­ ções antes de obter reforço. Em outras palavras, no último processo alguma atividade do animal (e não do pesquisador) é instrumental para a obtenção de recompensa ou fuga de uma punição etc. Êsses dois métodos podem parecer iguais no sentido de serem apenas meios de assegurar aprendizagem, isto é, uma reação de tipo específico a um estímulo determinado. Ape15

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sar disso, os psicólogos não são acordes quanto a se tratar, ou não, de tipos de aprendizagem basicamente iguais ou completamente diferentes. Como atualmente empregados, os métodos parecem ter certas características individuais, embora nem sempre seja fácil examiná-los em forma “ pura” , pois a maioria das experiências importa inevitàvelmente al­ gum condicionamento clássico e algum operante ou instru­ mental. Esta composição dos dois métodos pode ver-se nas expe­ riências terapêuticas já mencionadas, especialmente quando se obteve uma reação do paciente à fôrça, para que pudesse ser punida. A única coisa que parece possível é distinguir entre os estudos nos quais se deu ênfase a condicionamento clássico e aqueles nos quais dominaram reações instrumen­ tais. Historicamente parece que a ênfase “ clássica” ocorreu principalmente em relação com os primeiros estudos de trei­ namento aversivo, por exemplo no tratamento de alcoolismo, onde se forçava uma reação de vômito pela administração de uma droga emética. A grande maioria dos estudos mais recentes tendeu a dar decidida ênfase a métodos operantes. Talvez possamos apresentar mais um ponto antes de pas­ sarmos a mencionar os resultados da aplicação de reforço negativo em ambiente de condicionamento operante. É que existem raros exemplos, se é que existe algum, do uso isola­ do de punição ou fuga de punição; quase invariavelmente 09 pesquisadores consideraram apropriado incluir também al­ gum refôrço positivo para a produção de uma reação adaptativa. Um dos raros estudos envolvendo a aplicação relativa­ mente “ pura” de punição é o de Sylvester e Luversedge (1960). Relatam eles o tratamento de 39 casos de cãibra dos escrivães e datilógrafos, empregando métodos engenho­ sos para assegurar que a punição (choque elétrico) depen­ desse da produção de uma reação mal adaptativa. Nos casos de cãibra dos escrivães, por exemplo, uma análise de com­ portamento revelou a presença de duas anormalidades dis­ tintas, tremores e espasmos, e pareceu necessário atacar ca­ da uma separadamente. 218

Para lidar com tremor, perfuraram-se orifícios de diâme­ tros variados numa chapa de metal e pediu-se ao paciente que introduzisse um estilete em cada furo, a começar do maior. O aparelho era construído de tal modo que qualquer grau acentuado de falta de firmeza colocava o estilete em contato com a beirada da chapa de metal, o que completava um circuito elétrico, resultando em choque na mão do pa-

F ig u r a 6. Aparelho para contrôle de tremor. O estilete de m etal A é introduzido em cada orifício com a maior firmeza possível. Qualquer oscilação coloca o estilete em contato com a chapa , com ­ pletando assim um circuito e dando um choque elétrico através dos elétrodos B.

ciente que não escrevia. Dessa maneira os choques acom­ panhavam, naturalmente, reações mal adaptativas (tremo­ res), enquanto o contrôle firme evitava a punição. Quando se obtinha domínio no furo maior, o paciente passava a ten­ ta r maior contrôle, usando outros furos de tamanho decres­ cente. Outro aparelho empregado para lidar tanto com es­ pasmo quanto com tremor consistia em uma lâmina de metal sobre a qual se afixava uma fita cuja forma se assemelhava aos contornos da escrita. Qualquer tendência a desviar-se da trajetória da fita, enquanto se traçavam os contornos com estilete de metal, resultava automàticamente em choque 219

elétrico como antes. Por esse meio, esperava*se que o pa­ ciente aprendesse a controlar tremor e espasmo numa situa­ ção de “ quase escrita". Tipos particulares de espasmo evi­ dentemente exigiam consideração especial. Para tratar um espasmo do polegar» que resultava em excessiva pressão sôbre a caneta, dotou-se a pena de um contato de mola; qual­ quer pressão excessiva fechava o contato e produzia choque elétrico. Êsses métodos para fazer que um estímulo aversivo (cho­ que) dependesse da produção de movimentos motores mai adaptativos foram extremamente bem sucedidos; deram-se como curados 29 dos 39 casos tratados que apresentaram acentuada melhora ou recuperação completa. Cinco dêsses pacientes recaíram posteriormente, mas os demais pareceram preservar seus ganhos no seguimento, apesar de estarem em empregos que exigiam que escrevessem durante substancial parte do dia. Embora grande a proporção de curas em relação a malo­ gros, Sylvester e . Liversedge procuram explicar o êxito in­ completo de seus métodos por uma de três maneiras. Pri­ meiro, pareceu-lhes que os pacientes que deixaram de reagir bem ao tratamento eram psicologicamente anormais (isto é, em outros aspectos além do sintoma de que se queixavam), tendo como característica principal alto nível de ansiedade. Os autores não entraram na significação disso, mas o ponto será abordado um pouco mais adiante neste capítulo. Uma segunda possibilidade resultava da observação de que os pa­ cientes que malograram haviam tido sua dificuldade por pra­ zos mais longos do que os que reagiram bem ao tratamento. Sylvester e Liversedge sugeriram que isso talvez indique ha­ ver a perturbação tido tempo de generalizar-se em uma es­ pécie de ansiedade total, que, por sua vez, agravava as cãi­ bras e tremores. Em terceiro lugar, argumentaram êles que de certas maneiras suas técnicas foram inadequadas para li­ dar com as extravagâncias da sintomatologia com que defrontaram, fôsse por ter havido alguma demora na apli­ cação do choque depois de ocorrer uma, cãibra ou por alguma outra razão.

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A relação entre presença de ansiedade e falta de reação à punição também foi notada pelo autor dêste livro (1960). Com base no emprêgo dos métodos de Sylvester e Liveirsedge para tratamento de cãibra dos escrivães, sugeriu-se que todo comportamento acompanhado de ansiedade será exagerado pelas condições que sirvam para aumentar o nível existente de ansiedade. Em outras palavras, se a ansiedade é em parte responsável pela produção do sintoma (digamos, cãibra dos escrivães), os choques elétricos que aumentem a ansiedade simplesmente piorarão as coisas. Um dos pacientes neste estudo, por exemplo, foi tratado com a caneta especialmente adaptada, anteriormente referida, e durante três semanas de tratamento apresentou aumentos no número de pressões excessivas de 48 para 132. Êste resultado sugere fortemente que a punição estava piorando, e não melhorando, as coisas. Conseqüentemente, mudou-se o regime de tratamento dêste paciente para uma abordagem de inibição recíproca. Com essa forma alternativa de terapia obteve-se considerável pro­ gresso. Tais resultados levantam importante questão sôbre o uso de punição; contra-indica a presença de ansiedade o emprêgo de forte reforço negativo? Se geralmente aconte­ cesse isso, muitas perturbações psicológicas estariam fora do alcance dessa espécie de tratamento e o reforço negativo só poderia ter realmente aplicação em pessoas normais sofrendo de maus hábitos, em lugar de sintomas. Ferster (1958) também argumentou contra a punição como meio eficaz de conseguir mudança ou modificação de compor­ tamento, embora não seja contrário à interrupção de reforços positivos. Os últimos, em seu entender, permitem que apa­ reçam outros comportamentos que, se adaptativos, poderão ser recompensados e assim estimulados; punição direta, por outro lado, tende a resultar em bloqueio temporário do com­ portamento a que é aplicada. A retirada da contingência de punição simplesmente liberta novamente o comportamento — que não é modificado pela punição. O ponto importante, de acordo com Ferster, é criar situações que enfraqueçam e não simplesmente bloqueiem o comportamento indesejável; po­ demos consegui-lo retirando o paciente de situações nas quais o comportamento mal adaptativo é reforçado positivamente.

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Em certo sentido, ambos os métodos são formas de controle aversivo, mas só um dêles cria as condições adequadas para modificação e mudança de comportamento. Ferster acentua também que a punição pode muitas vezes produzir efeitos perturbadores indesejáveis sôbre aspectos de comportamento que pouco ou nada têm a ver com a reação mal adaptativa, Esta perturbação do repertório individual de comportamento normal poderia, portanto, interferir ativa­ mente na aquisição de reações novas e mais apropriadas. Em certo sentido, êsse pareceu ser o resultado da aplicação de choque às cãibras de pacientes no estudo do autor dêste livro — o comportamento tornou-se em geral antes mais desorga­ nizado do que mais controlado. Ferster inclina-se a acentuar o grande valor do reforço po­ sitivo, especialmente por meio da manipulação de “ agentes sociais” . Argumenta que a maioria dos reforços humanos ocorre em ambiente social (isto é, em situações de relação interpessoal) e a implicação é que são mais comuns, mais potentes e mais fáceis de manipular do que forças biológicas, com tanta freqüência empregada. Em geral, êle parece pen­ sar mais em recompensas sociais do que em punições, figu­ rando entre elas aprovação, elogio, afeição e respeito, em­ bora não exclua o emprêgo de punições sociais, como multas, críticas e encarceramento. A validade dessas opiniões deve, naturalmente, ser determinada por experiência, isto é, com­ parando-se a eficácia de reforços sociais com a de reforços biológicos no controle da homossexualidade. O problema bá­ sico dos reforços sociais mais refinados é, naturalmente, serem menos fáceis de especificar e controlar de maneira pre­ cisa (que é “ elogio” , por exemplo?) e, para seus efeitos, evidentemente dependerem muito mais de condicionamento anterior. Todos os ganhos em têrmos de refinamento podem muito bem ser anulados por perdas resultantes disso. O uso bem sucedido de um estímulo primário aversivo foi, porém, relatado em contexto incomum e interessante por Heckel e outros (1962). O problema era eliminar os longos silêncios em psicoterapia de grupo, especialmente durante o período de “ aquecimento” no início de qualquer sessão te­ rapêutica. Naturalmente, há dois pontos de vista sôbre o

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Valor de silêncios; para um, êle interfere na eficácia do tra­ tamento — não falar significa efetivamente que não está havendo terapia — enquanto o outro sustenta que os* silên­ cios prestam valiosa contribuição em vários sentidos de que não precisamos tratar aqui. Contudo, aceita como razoável a primeira dessas opiniões, convém naturalmente eliminar os períodos de silêncio até onde possível. O processo foi colocar os pacientes experimentais (pacien­ tes em continuado tratamento de psicoterapia de grupo) nu­ ma sala à prova de ruído, com ar condicionado e intfroduzir um ruído desagradável quando se notavam silêncios de mais de dez segundos. Continuava-se o estímulo até que algum membro do grupo começasse a falar; mais uma vez, portanto, a punição (ruído aversivo) tornava-se dependente de uma reação indesejável (silêncio), enquanto a fuga da punição resultava da atividade apropriada (falar). É interessante notar que os pacientes da experiência não receberam infor­ mação alguma a respeito do que se estava fazendo e a toda pergunta sôbre o ruído respondia-se-lhe que devia ser defeito no funcionamento do equipamento de gravação em fita. Antes de aplicar a condição aversiva a freqüência dos pe­ ríodos de silêncio e a quantidade de tempo assim passado eram em média substancialmente maiores do que durante o curso de tratamento. Esta tendência foi subseqüentemente verificada mesmo depois da remoção da condição de ruído, parecendo possível que tenham ocorrido algumas mudanças permanentes e semipermanentes. Uma das facêtas intrigan­ tes destes resultados experimentais foi, porém, que nenhum dos pacientes teve conhecimento da relação entre silêncio e punição, embora, pelo que se pôde ver, seu comportamento tivesse mudado em resultado dêsse arranjo, Se pode ocorrer aprendizagem, especialmente da espécie operante, sem per­ cepção, é ainda uma questão calorosamente debatida por psi­ cólogos rivais, mas as indicações até agora obtidas sugerem que a percepção da parte do paciente é muito mais rara do que indicam os relatórios experimentais. Para que seja ou não descoberta, a percepção depende muito da intensidade e relevância de qualquer interrogatório subseqüente. Contudo, na medida em que esse seja um fenômeno válido, teria natu­

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ralmente claras aplicações terapêuticas. Informou-se em certas ocasiões, por exemplo, que alguns indivíduos são re­ sistentes a condicionamento verbal, deixando de usar a rea­ ção reforçada assim que percebem a relação entre ela e o reforço. Poder-se-ia chamar isso de tendência de “ negati­ vismo” e sem dúvida alguns pacientes parecem tê-la em alto grau. Na medida em que se pudesse mudar tal comportamen­ to sem percepção do mecanismo envolvido, tais pacientes tal­ vez demonstrassem menor resistência a qualquer processo de modificação. Quando o paciente não demonstra antagonismo à mudança de seu comportamento, talvez seja relevante perguntar se um pedido verbal não teria produzido exatamente o mesmo resultado que o processo de condicionamento operante. Os silêncios, na experiência citada, não estão sob controle volun­ tário? É essencial aprender a evitar o período de silêncio por métodos operantes — porque dessa maneira êles serão preservados por mais tempo do. que se feito um pedido ou dada uma ordem? A maioria dos comportamentos ticrá de fato, como a tacada de golfe, imune a mudança ou modifi­ cação por meio de linguagem? Outro estudo empregando reforço negativo envolveu um menino de cinco anos que persistentemente chupava o dedo. Aqui se poderia dizer que, mesmo que um apêlo verbal seja temporàriamente bem sucedido, a criança se esquecerá e reiniciará seu hábito quando ninguém estiver perto para cor­ rigi-la. Em várias ocasiões exibiram-se à criança desenhos animados, com evidente prazer para ela, que todavia chupou o dedo continuamente durante tôdas essas exibições. O plano do pesquisador foi utilizar a retirada dessa experiência agra­ dável como conseqüência punitiva branda do comportamento de chupar o dedo. Conseguiu-se isso facilmente fazendo que um observador apertasse um botão que eliminava o som e a imagem dos desenhos, sempre que o menino chupava o dedo; quando ele tirava o dedo da bôca a exibição do filme era reiniciada imediatamente. Os resultados foram de considerável interêsse por duas razões principais. Primeiro, na terceira sessão, após ter visto cada desenho 13 vêzes, a criança retirou-se, dizendo que já

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vira o suficiente. Isto não é surpreendente; é surpreendente, porém, constatar que a decisão de retirar-se não aparece muito comumente nos relatórios publicados sôbre condiciona­ mento operante. O ponto é, naturalmente, que em alguns contextos os resultados só podem ser tão bons quanto a mo­ tivação do paciente. O segundo ponto mais importante tem consideráveis im­ plicações já mencionadas; é que o paciente pode começar a discriminar eficientemente entre as condições em que a pu­ nição depende e não depende da produção da reação mal adaptativa. Os pesquisadores demonstraram muito claramente que durante uma condição de punição havia tendência à su­ pressão do hábito de chupar o dedo e durante as primeiras exibições de controle (nas quais foi suprimida a punição) também pareceu ocorrer certa supressão. Nas sessões se­ guintes, porém, sempre que retirada a punição, o hábito de chupar o dedo voltava pronta e fortemente. Êste resul­ tado sugere que a criança discriminava ràpidamente entre condições em que podia e em que não podia entregar-se à sua agradável ocupação, mesmo quando as condições eram se­ melhantes (isto é, durante exibição de desenhos animados). Tal discriminação tornar-se-ia, naturalmente, muito mais fá­ cil fora da situação de filme, quando o impacto da punição deveria ser ainda menor. Tais discriminações devem cons­ tituir importante limitação ao uso de processos de condicio­ namento operante. O intrigante é essa diferenciação não apa­ recer com mais freqüência em relatos da aplicação dêsses processos. Barrett (1962) também ofereceu alguns resultados interes­ santes do emprêgo de condicionamento operante no tratamen­ to de tiques múltiplos. O paciente neste estudo, homem de 38 anos, caracterizava-se por diversos espasmos motores que afetavam bôca, olhos, rosto, pescoço, ombros, peito e abdo­ me, considerados êsses espasmos de origem neurológica e in­ sensíveis a qualquer tratamento convencional. Estabeleceu-se que o índice normal de tiques do paciente era de 64 a 116 por minuto e a primeira experiência indicou que um ruído incômodo afetava êsse ritmo. Ruído contínuo pareceu au­ mentar um tanto o índice de tiques, enquanto ruído depen-

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dente do aparecimento de um tique (punição) obteve êxito no sentido de reduzir o índice de tiques para 40 por minuto. Música contínua, da escolha do próprio paciente, também re­ duziu o nível de tiques mais ou menos no mesmo grau que a condição de punição descrita. Contudo, quando se provi­ denciou para que os tiques interrompessem a música, o índice dêles caiu ainda mais, para cêrca de 15 a 30 vêzes por mi­ nuto. Punir o paciente, eliminando o som da música quando ocor­ ria tique, foi nessa experiência claramente mais eficaz do que a aplicação de um ruído incômodo, o que mostra a im­ portância da escolha de reforço apropriado. O testemunho do paciente apoiou essa conclusão a respeito da diferente efi­ cácia das duas punições. De fato, uma das descobertas mais importantes neste estudo foi que o ruído incômodo não pro­ duzia no índice de tiques efeitos maiores do que “ esforços constantes de autocontrole” . Isto é duplamente interessante: sugere não apenas que a punição operante pode, em certas ocasiões, ser pouco melhor do que um pedido para que “ pro­ cure esforçar-se” , mas também que esforços de autocontrole podem ser eficazes na redução da freqüência do aparecimen­ to de alguma anormalidade. No mais das vêzes o ponto de vista operante sustenta que o controle sôbre desempenho pelo exercício de fôrça de vontade não é comparável ao que se pode conseguir por punição contingente. Logicamente, embora não tècnicamente, é difícil distinguir entre a aplicação de punição pela produção de reação inde­ sejável e omissão de recompensa. Muito freqüentemente, como indicam os estudos citados neste capítulo e nos anteriores, omissão de recompensa ou recusa de reforço positivo tem sido usada de preferência à aplicação direta de algum estímulo incômodo. Contudo, embora se possa entender o impacto sôbre o paciente como punição em ambos os casos, o primeiro parece criar um clima psicológico diferente. A privação de certas recompensas, como cigarros, alimento, contatos sociais etc., bem pode produzir, como Ferster parece sugerir, condi­ ções nas quais há menos interferência na evocação de uma reação adaptativa. A última experiência que citaremos neste 226

capítulo trata de um exemplo dessa espécie de treinamento de omissão. A paciente, chamada Laura, era menina de nove* anos, deficiente mental, que adquirira tendência a vomitar algum tempo depois de ter sido mandada para uma escola especial. Tratamento por drogas não teve o menor efeito sôbre êsse problema que, em poucos meses, se tornara tão freqüente que obrigou a suspender seu comparecimento à escola. Wolf e outros (1965), investigando essa criança, acharam que a reação da professora aos vômitos de Laura proporcionava a recompensa que levava ao crescimento e manutenção do pro­ blema. Aparentemente, sempre que ocorria vômito, a pro­ fessora mandava Laura para seu dormitório, o que talvez fosse recompensador para a criança, por tirá-la de uma si­ tuação de que não gostava. Com base nessa presunção ou “ palpite” , os pesquisadores decidiram executar um programa de retirada de reforço po­ sitivo. Consistia em ignorar o comportamento de vômito, continuar a dirigir a aula como de hábito e, só depois de terminada esta, deixar que Laura voltasse para o dormitório. O índice de vômitos flutuou consideravelmente nesse regime, chegando em certas ocasiões a ser de 21 vômitos num dia, mas houve progresso. Ao fim de seis semanas de treina­ mento a anormalidade atingiu a freqüência de zero e perma­ neceu nesse nível. Observou-se, incidentalmente, que o inte­ resse de Laura pelas atividades escolares também aumentou ao mesmo tempo que seus acessos de cólera diminuíram, concomitantemente com a redução do comportamento de vômito, de modo que o resultado foi altamente animador. O material apresentado neste capítulo mostra, até certo ponto, tanto o valor como os deméritos do reforço negativo. Certos resultados de experiências são muito auspiciosos e, considerados exclusivamente em termos pragmáticos, parece haver razão para acreditar que tal treinamento poderia de­ sempenhar valioso papel no tratamento de distúrbios psico­ lógicos. De fato, qualquer exame da literatura mais amplo do que o feito aqui torna claro que êsses processos estão fi­ cando menos experimentais e se tornando aplicação rotineira de métodos anteriormente bem sucedidos.

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Contudo, vimos que em relação a essas técnicas surgem certos problemas* de caráter às vêzes técnico e às vêzes mais teórico. Para começar, a anormalidade psicológica muitas vêzes parece flutuar e variar de um modo que sugere impro­ vável qualquer ligação simples entre comportamento aberran­ te e certos reforços. Se um modêlo operante é de fato válido, os reforços devem ser com freqüência altamente complexos e complicados. As explicações post hoc ou os palpites expe­ rimentais aparentemente simples encontrados na literatura de condicionamento operante pouco fazem para afastar a sus­ peita de que as reações humanas têm determinantes com­ plexas. Algumas dessas complexidades são reveladas pelas expe­ riências consideradas neste capítulo, por exemplo no uso de linguagem para orientar as reações de pacientes, na apre­ sentação e negação de informação sôbre a natureza do trata­ mento, no papel de cooperação e motivação do paciente, no papel da ansiedade e no problema da percepção de contingên­ cias de comportamento e conseqüente reforço. Além disso, cumpre dedicar atenção à dificuldade de des­ cobrir reforços negativos apropriados, pois, como vimos, al­ gumas punições podem ser mais eficazes que outras e algu­ mas podem ter pouca ou nenhuma vantagem em comparação com o autocontrole. Além disso, o paciente pode não apre­ sentar a esperada generalização da melhora a outras situações fora do laboratório e pode, realmente, discriminar de manei­ ra eficiente circunstâncias nas quais se pode produzir a rea­ ção mal adaptativa e aquelas em que não se pode. Seria menos do que justo tirar outra conclusão que não a das descobertas de condicionamento operante oferecerem excitante perspectiva para o tratamento de distúrbios psico­ lógicos; seria irresponsabilidade negar a existência de pro­ blemas importantes. Aqui também, só mais pesquisa e ex­ periência poderão levar-nos a uma avaliação adequada e só­ bria dessas técnicas.

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CAPITULO

XV

Processos de Pensamento e Terapia de Comportamento

O p a c ie n t e espera numa sala de tratamento escura, usando sapatos especialmente adaptados através dos quais receberá choques elétricos. Numa abertura iluminada logo começam a aparecer palavras, uma de cada vez, que o paciente lê em voz alta. Apressa-se em dizer as palavras “ bar alegre” , “ so­ domia” , “ na cama com um homem” e “ pulsos oscilantes” , pois embora cada palavra ou frase seja seguida por um choque elétrico, êle sabe que choque ainda mais forte se seguirá a qualquer tentativa de demora.

O paciente é um homossexual, ansioso, tenso, irritável e deprimido por causa de sua vida sexual anormal, da qual se sente profundamente envergonhado. Deseja mudar e o processo a que está .sendo submetido é parte da terapia des­ tinada a bloquear-lhe a “ responsividade homossexual” e criar interêsses heterossexuais. O ponto importante a con­ siderar, além de saber se essa técnica clescrita por Thorpe e outros (1964} é ou não benéfica, consiste no emprego de com­ portamento simbólico em oposição a comportamento real; o paciente não se entrega a verdadeiras atividades homosse­

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xuais, mas aos símbolos delas. Em outras palavras, o com­ portamento, se é que podemos chamar de “ comportamento” o que acontece, é complexo, internalizado e inobservável. Evidentemente o processo descrito tem consideráveis vanta­ gens sôbre o que exige estímulos da vida real; os símbolos de uma ampla variedade de distúrbios talvez possam ser fácil e eficientemente apresentados em forma de linguagem, sendo possível que isso tenha a mesma eficácia de dar choques no homem por causa de atividades homossexuais declaradas. Esta tendência a afastar-se do comportamento real ( isto é, declarado) é agora comum em terapia de comportamento e deve levar-nos a perguntar se podemos legitimamente em­ pregar as teorias e os conceitos da terapia de comportamento ao que parece ser situações novas e diferentes. A questão está ligada à capacidade que tenha o modêlo de condiciona­ mento para lidar com processos mentais. Sem dúvida, terapia de condicionamento parece envolver processos que se tornam cada vez mais “ mentalísticos” , distanciando-se muito essa tendência da ênfase tradicional do behaviorismo, que acen­ tuava a importância de atividades observáveis. Será possível sustentar, como freqüentemente parecem fa­ zer em aplicações simples de princípios de condicionamento, que “ sinais” adquirem significação por serem condicionados às reações manifestadas diante de objetos reais? A dificul­ dade é que sinais muito raramente evocam as mesmas reações que o objeto real; a palavra “ aleijado” tem para o leitor uma significação que talvez não inclua o comportamento de man­ quejar; um sinal dizendo “ zoo” não inspira necessàriamente o leitor a fazer imitações de animais. Por outro lado, talvez seja justo dizer que um sinal ou símbolo pode evocar a dis­ posição de reagir de certa maneira conhecida, isto é, de uma maneira que no passado esteve associada ao objeto real. Ainda assim, na aplicação de terapia de comportamento defrontamos com o problema de cognição ou pensamento. Evidentemente o homem não é apenas um feixe de reflexos condicionados; êle é capaz de atividade complexa que geral­ mente consideramos prova de “processos superiores” e que rotulamos de “ raciocínio” , “ insight” , “ resolução de proble­ ma” , “ pensamento” e assim por diante. É duvidoso se tais

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atividades são ou virão a ser, no futuro, redutíveis à com­ plexa operação de numerosos processos de condicionamento. O que sabemos, porém, é que podemos obter a soluçãp cor­ reta de um problema aparentemente sem necessidade.de pas­ sar pela cega espécie de tentativa e êrro que grande parte do condicionamento operante parece envolver. Tomemos como exemplo uma experiência que parece su­ gerir que mesmo ratos são capazes de apresentar indicações de comportamento pensado. Nesta experiência uma mesa é dividida por uma repartição de tal maneira que o rato pode ver o que está do outro lado, mas não pode passar para lá. O animal pode também explorar a sala e descobrir ao longo de um conjunto de pontes um caminho que, finalmente, leva à parte da mesa antes inacessível. Agora o rato dispõe de dois itens de informação: “ sabe” que pode descer de uma parte da mesa e “ sabe” também que pode, usando pontes, subir até a outra parte da mesa. Quando, colocado na pri­ meira parte, vê comida na parte inacessível, como se com­ porta? Nesta experiência o rato junta as duas peças de informação, desce da mesa, corre pelas pontes e sobe ràpidamente à parte da mesa onde o espera o alimento. Isso parece sugerir certa espécie de atividade racional e consciente que não depende do tipo de processo de reforço mecânico ca­ racterística de muitas experiências de condicionamento. O problema foi reconhecido pelo teórico da aprendizagem por “ tentativa e êrro” ; a solução que ele dá se baseia geral­ mente num processo interno de tentativa e êrro que foge à observação porque ocorre dentro do sistema nervoso. Por mais satisfatória ou insatisfatória que tal explicação possa futuramente mostrar-se, a moderna teoria de aprendizagem foi forçada a atribuir maior ênfase e importância a aconte­ cimentos internos. Isto faz surgir mais um problema. Muito do que vimos no comportamento de pacientes, e grande parte do que êles di­ zem, parece recomendar maior ênfase às “cognições” do que ao comportamento declarado. Mudando o comportamento de um paciente, podemos produzir modificações nesses aconte­ cimentos internos? Comportamento declarado e pensamento estão tão inextricàvelmente ligados que um arranjo de contin­

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gências que extinga atividades homossexuais leva automàti­ camente a mudanças em acontecimentos internos, isto é, na maneira como o paciente pensa a respeito de homossexualida­ de? Evidentemente, há ocasiões em que existe certa discre­ pância entre o que fazemos e o que pensamos. A questão é: até que ponto importam tais discrepâncias e o que podemos fazer em relação a elas? Wolpe, às vêzes, parece convencido de que mudanças comportamentais (isto é, em comportamento declarado) são a única coisa necessária. Adotando essa opinião, recorre ao apoio de Festinger, que, diz ele, foi incapaz de descobrir uma única experiência na qual uma mudança em cognição tivesse levado a mudança em comportamento declarado. Na medida em que seja correta essa opinião, poder-se-ia seguir que a única coisa que precisamos fazer é mudar o comportamento declarado, para que as idéias mudem no mesmo sentido. Existem, porém, muitas experiências indicando que mudan­ ças no comportamento externo são provocadas por mudanças em processos cognitivos. De fáto, a literatura está repleta de exemplos de tais mudanças nos campos da psicologia so­ cial, percepção e aprendizagem. Em psicologia social, por exemplo, numerosas experiências indicam que podemos con­ seguir mudanças em comportamento declarado do tipo de preconceito fornecendo informação sôbre o objeto do precon­ ceito. Também no campo da percepção, podemos mudar im­ pressionantemente o comportamento em relação a objetos no campo visual de um indivíduo mostrando-lhe que deixou de considerar certas sugestões; as subseqüentes reorganização perceptual e modificação comportamental parecem ser efe­ tuadas pelo que se poderia chamar de “ insight” e não por tentativa e êrro. Igualmente, uma experiência realizada por Maier (1931) (.*) sugere a relevância de processos cognitivos na modificação do comportamento. Em resumo, esta experiência exigia que os pacientes construíssem dois pêndulos com certos aparelhos que lhes eram fornecidos. Os resultados mostra( * ) MAIER, N. R. F. (1 9 3 1 ), Reasoning in Humans U. The Solution of a Problem and Its Appearance in Consciousness, J. Compar. Psychol 12, 181-94.

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ram com clareza que dizer simplesmente ao paciente qual o problema, ou mesmo acrescentar uma sugestão sobre a ma­ neira de montar o aparelho, era muito menos bem suqedido do que oferecer um item de informação crítica. N essa expe­ riência o necessário, a fim de obter comportamento bem sucedido, era um meio de reorganizar o conhecimento rele­ vante para atender às experiências do problema. Tomemos outro exemplo, talvez mais conhecido: se nos propõem a tarefa de ligar três fileiras de três pontos, usando apenas quatro linhas, podemos demorar muito tempo para resolver o problema, a menos que nos digam que podemos

F iG U R a 7 . Solução do problema dos nove pontos, A solução depende de como se aborda o problema. Trecua-se editar a pre­ sunção de que é necessário trabalhar dentro dos limites formados pelos pontos.

sair dos limites dos pontos. Êste item de informação faz que nosso comportamento mude quase imediatamente de mal para bem sucedido. Tomemos agora um exemplo clínico de como o “ insight” poderia alterar o comportamento de mal adaptativo e mal sucedido para apropriado e útil. Pediram ao autor que in­ vestigasse um caso de insucesso universitário com vistas a decidir como se poderia tratar o caso. O môço em questão 16 233

tentara fazer o mesmo curso universitário em três ocasiões anteriores, sendo tôda vez reprovado no fim do primeiro ano, apesar de ser muito inteligente e ter um lastro educacional inteiramente adequado para o curso universitário que esco­ lhera. As investigações sugeriram que o jovem se caracte­ rizava por objetivos acadêmicos absolutamente irrealísticos que, apesar de suas reais capacidades, eram inatingíveis. Pa­ recia que essas aspirações auto-impostas se haviam tornado tremendo empecilho a sua carreira acadêmica, pois, como invariàvelmente falhava em atingi-las, tornava-se ansioso e de­ primido. Êste estado, por sua vez, afetava-lhe a capacidade de estudar, o não estudar eficientemente prejudicava ainda mais a capacidade de aproximar-se de suas metas, e o resul­ tado final era completo e lamentável malogro. Sem entrar nos pormenores experimentais da investigação, a teoria acima exposta a respeito da natureza de seu distúr­ bio foi apoiada por observação experimental. Êsses resul­ tados foram então discutidos com o paciente, ao mesmo tem­ po que êle recebia conselho sobre como conduzir-se no futuro. Até onde se pôde ver, êle seguiu êsse conselho, que consistia essencialmente na sugestão de que devia trabalhar e orientar-se para a obtenção de uma nota modesta (e não de um primeiro lugar). A informação dada e a diretiva oferecida com base nessa informação pareceram modificar o comportamento do paciente, pois êle teve pouca dificuldade em fazer todos os três anos do curso universitário, ao fim do qual foi aprovado com nota modesta. Naturalmente não se pode argumentar que o resultado foi sem dúvida atribuí­ vel ao conselho e à informação dados; evidentemente pode­ ríamos dar outras explicações, mas é forte a possibilidade de o “ insight” ter sido útil neste caso, confirmada esta con­ clusão pelos comentários do próprio paciente. Contudo, Wolpe e outros terapeutas de comportamento não ignoraram completamente o valor de uma abordagem mais cognitiva. Como acentuado no Capítulo III, reafirmação e explicação são preliminares recomendadas no tratamento por inibição recíproca e são mesmo consideradas por Wolpe vitais ao êxito de tal tratamento. Significa isso que Wolpe acredita que, embora só os princípios de condicionamento

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sejam úteis para livrar o paciente de ansiedade não desejada, bastem medidas superficiais e não sistemáticas no que se refere a falsas crenças, sistemas não adaptativos de valor e assim por diante? A julgar pelos trabalhos que publicou, esse parece ser realmente o caso. Se doença neurótica fôsse simplesmente uma questão de ansiedade não adaptativa — em lugar de ansiedade mais cognições não adaptativas — talvez a ênfase de Wolpe fôsse correta. Em tal caso, natu­ ralmente, não haveria necessidade de Wolpe justificar essa ênfase argumentando que mudanças no comportamento pro­ duzem mudanças em cognições. A defesa do “ insight” em terapia comportamental foi feita por Peterson e London (1965), que opinam parecer ele pelo menos útil, mesmo que não seja necessário para efetuar mu­ dança. Acreditam que o descaso e a desconsideração pelo “ insight” entre terapeutas de comportamento (mais aparen­ te do que real, na opinião dêste autor) são em parte reação à ênfase excessiva que lhe deu a psicoterapia tradicional e, em parte, um acidente histórico. O último ponto refere-se às origens da terapia de comportamento em estudos de labo­ ratório com animais, nos quais “ insight” e percepção tendiam a ser (com algumas notáveis exceções) postas de lado em favor de comportamento diretamente observável. Peterson e London adotam a opinião de que perturbação psicológica é geralmente acompanhada por ignorância ou idéias errôneas a respeito das origens e dos efeitos do com­ portamento mal adaptativo e que a “ mudança conceituai per­ tinente” pode facilitar alteração de comportamento. Às vezes, argumentam êles, nem sequer é necessária a contigui­ dade entre comportamento e reforço; o simples fornecimento de informação pode levar a uma mudança conceituai que, por sua vez, influencia o comportamento do indivíduo. É possível que em alguns casos o nôvo comportamento adap­ tativo seja recompensador e por isso seja reforçado, mas o impulso para mudança pode ainda resultar da organização do pensamento do paciente a respeito de sua situação. Tendo em mente essa dupla orientação, Peterson e London relatam o tratamento de Roger, menino de três anos cujo único problema era a incapacidade de defecar com a “ fre­

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qüência ou segurança” geralmente consideradas normais. Uns cinco dias separavam cada eliminação fecal, e isso preo­ cupava os pais, o médico e também Roger, pois a defecação era, então, muito dolorosa. O comportamento de retenção fecal parecia ter-se origina­ do de maneira fortuita e através de uma combinação de cir­ cunstâncias. Em parte, parecia que a criança tendia a ab­ sorver-se tanto no brinquedo a ponto de adiar as necessárias visitas ao banheiro; em parte, como Roger era o terceiro filho na família, sua mãe deixara de ser tão cuidadosa com os processos eliminatórios; e ainda, quando a mãe percebeu a dificuldade de Roger para defecar, o próprio ato tornara-se doloroso, o que reforçava a relutância da criança em executar novamente essa função. Realizou-se com êxito o tratamento em três curtas ses­ sões. Na primeira, o terapeuta usou o que se descreve como “ canto hipnoidal” , no qual se fazia forte sugestão de que todos queriam que Roger “ fizesse cocô,, e que tal comporta­ mento agradaria a todos, além de fazer Roger ficar “ real­ mente bom” . Ao chegar em casa, a criança foi imediatamente ao banheiro e defecou, após o que sua mãe a elogiou prodi­ gamente e a presenteou com um doce. Êste processo foi repetido em outras duas sessões terapêuticas, ao fim das quais o nôvo comportamento pareceu suficientemente estabe­ lecido para ser mantido por elogios e doces ofertados só pela mãe. Esta pareceu de fato uma decisão bem fundada, pois nenhuma recorrência do problema se notou em um ano de seguimento. Êste, pelo menos superficialmente, pareceu ser um caso em que o “ insight” nas conseqüências de um comportamento anormal resultou em mudança. Sem dúvida, a aplicação for­ mal de refôrço (recompensa) só ocorreu depois do primeiro acontecimento eliminativo, de modo que devemos supor que foi a sugestão do terapeuta que motivou o comportamento. Naturalmente, poder-se-ia argumentar que situações imagi­ nárias apresentadas a Roger pelo terapeuta naquela primeira sessão foram de fato numerosos ensaios de refôrço por bom comportamento, isto é, na imaginação, se criaram as condi­ ções para efetiva aprendizagem, pois a criança foi levada a 236

visualizar um ato eliminativo seguido por uma sensação de prazer. De um ponto de vista prático, não importa realmente muito que isso seja um exemplo de “ insight” ou de -eondicionamento operante “ internalizado” , embora seja difícil re­ finar e desenvolver essa forma de terapia enquanto não pu­ dermos explicar o resultado de maneira satisfatória. Contudo, dois pontos principais resultam da consideração desse caso. Primeiro, é evidente que se usou o têrmo “ insight” neste caso para explicar certos resultados obtidos por métodos que estão longe de ser precisos. É bem difícil para o terapeuta de comportamento manter a ficção de que aquilo que está fazendo tem a precisão de uma experiência de labo­ ratório, mesmo quando controlada a operação de muitos fa­ tores importantes e cuidadosamente especificados os estímu­ los a aplicar. Êsse não parece ser o caso no tratamento de Roger; o uso de um “canto hipnoidal” , as sugestões feitas e outros aspectos da terapia não parecem derivar de estudos de laboratório da mesma maneira como, digamos, a prática de terapia de inibição recíproca deriva de princípios de con­ dicionamento. Sem dúvida existe prova de que o “ insight” produz mudanças de comportamento, mas existe também ne­ cessidade de levar cuidadosamente em conta os fatôres que parecem importantes na produção do comportamento de “ insight” . Poder-se-ia argumentar que qualquer tentativa não sistemática e ingênua de empregar “ insight” não só repre­ senta uma abdicação de tratamento científico e experimen­ talmente baseado, mas também reproduz uma condição de psicoterapia, tratamento que parece relativamente ineficaz. Felizmente, a literatura psicológica está repleta de traba­ lhos experimentais relevantes sobre processos cognitivos; a tarefa deve consistir em joeirar e confrontar essa informação, dela tirando as generalizações possíveis a respeito de modi­ ficação e mudança de estados cognitivos. Uma informação dessa espécie parece estar facilmente acessível sob a forma de fatôres associados a mudanças em atitudes sociais (por exemplo, preconceitos) e crenças. Tais indicações também incluem um relato das influências que militam contra a pos­ sibilidade de modificação, e êsse conhecimento seria igual­ mente valioso. Não se afirma, naturalmente, que as desco-

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bertas dos psicólogos sociais, a êsse respeito, se aplicariam necessàriamente ao tratamento de cognições mal adaptativas (processos de pensamento) de indivíduos neuróticos t. outros psicologicamente perturbados; tal afirmação envolveria a presunção de certa continuidade entre as idéias falhas de indivíduos normais e o pensamento perturbado de pacientes psiquiátricos. É, porém, razoável investigar a possibilidade de existir entre problemas e métodos das duas áreas seme­ lhança consideràvelmente suficiente para interessar os tera­ peutas. No nível mais básico, os métodos usados pelo psicólogo so­ cial para efetuar mudanças de atitude parecem envolver a apresentação de pr«va conflitante com cognições existentes. Poder-se-ia dizer isso de outra maneira; é como se pedíssemos à pessoa interessada que fizesse uma predição com base nu­ ma atitude existente. Se confirmada a predição, pode man­ ter-se a opinião, crença ou atitude; se a predição estiver em conflito com os fatos, a primeira tende a modificar-se para harmonizar-se com os últimos. Tomemos, por exemplo, a noção mantida, com base em preconceito, de que todos os negros são sujos, preguiçosos, musicais e estúpidos. Tal preconceito só pode ser mantido enquanto não submetido a prova — podemos continuar acreditando que isso é verdade enquanto evitarmos os fatos ou os deformarmos de alguma maneira. Todavia, sustentar êsse preconceito significa que temos uma predição implícita a fazer, isto é, quando encon­ trarmos um negro o consideraremos preguiçoso, sujo, musical e estúpido. Suponha-se que, por acaso ou propositadamente, surja uma situação na qual nos apresentem irrefutável prova diretamente contrária a nossa predição? O que às vezes pa­ rece acontecer nessas circunstâncias é que as atitudes mos­ tram tendência a mudar na direção de uma diminuição do preconceito. A questão é esta: podem tais mudanças ocorrer no caso de idéias desviadas mantidas por pacientes psicolo­ gicamente perturbados? O autor tentou fazer exatamente isso. O paciente, neste caso, era um travesti com idéias bem desenvolvidas a res­ peito de sua “ feminilidade essencial” . Acreditava que seus contornos físicos eram arredondados de uma maneira que o

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fazia parecer feminino, que seus interesses eram mais carac­ terísticos de mulheres e assim por diante. De fato, em muitos sentidos ele tentava justificar sua anormalidade corqportamental com idéias dessa espécie e achava que sua única es­ perança era uma operação para mudança de sexo. A estra­ tégia adotada foi a de levá-lo a fazer uma predição específica baseada nas crenças que tinha a seu próprio respeito, ficando afinal estabelecido que uma prova adequada seria seu julga­ mento de roupas femininas elegantes. Na prova utilizaram-se fotos de modas recortadas de revistas, que o paciente colocou pela ordem de mérito. Em seguida, vários funcionários, ho­ mens e mulheres, foram chamados à sala onde o paciente estava esperando, e cada um selecionou as mesmas fotos de acôrdo com sua ordem de mérito pessoal. A predição do paciente antes da experiência foi que sua ordenação parti­ cular se assemelharia mais à de mulheres do que à de homens; nisso estava absolutamente errado. Sua seleção correspondeu muito bem à dos funcionários do sexo masculino e foi com­ pletamente diferente da classificação feita pelas mulheres. O paciente mostrou-se disposto a reconhecer como certo o resultado dessa demonstração, mas infelizmente, por várias razões, não foi possível continuar a experiência e examinar o resultado de “ provas em contrário” mais sistemáticas e intensivas. Uma dificuldade, naturalmente, é obter uma pre­ dição clara que se possa submeter à prova decisiva. Em outro estudo, Shapiro também investigou a possibili­ dade de invalidar crenças falsas, desta vez em paciente es­ quizofrênico. Sustenta-se comumente, é claro, que crenças anormais manifestadas por êsses pacientes não são passíveis de modificação pela apresentação de prova colidente. Sem dúvida essa presunção parece geralmente verdadeira; por exemplo, o paciente que acredita que seus médicos são agen­ tes comunistas parece não aceitar a prova muito considerável que o ambiente hospitalar oferece da palpável falsidade de suas crenças. No estudo de Shapiro o paciente expressou a convicção de que certa máquina, localizada em algum lugar no hospital, estava influenciando seus pensamentos e, por isso, pesquisador e paciente deram busca completa nos lu­ gares onde poderia estar guardada a máquina. Embora ne­

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nhuma mudança evidente ocorresse nas crenças do paciente em resultado da busca inútil, ele começou a expressar peque­ nas dúvidas, dizendo, por exemplo: “ E se realmente não fôr verdade ?” Também neste caso a investigação não foi continuada, sendo impossível dizer que resultado poderiam ter tentativas de invalidação mais sistemáticas e intensivas. Interessante abordagem do problema de mudança cogniti­ va, em alguns aspectos relacionada com os estudos citados, foi desenvolvida por Festinger (1957) e outros. Em resumo, essa abordagem sustenta que o homem tende a adquirir, a seu próprio respeito e do mundo que o cerca, um conjunto de cognições organizadas e integradas, que dão significação e estabilidade à vida. Algumas dessas cognições são “ consonantes” , enquanto outras são “ dissonantes” . Consonância descreve situação na qual uma idéia está de acôrdo com ou­ tra, por exemplo, quando ter idéias políticas fascistas implica tendência a ser favorável a castigo corporal. Por outro lado, dissonância descreve situação na qual uma idéia implica o oposto de outras — as predições de duas idéias chocam-se frontalmente. Define-se a dissonância cognitiva como um es­ tado de tensão psicológica que tem fôrça motivadora; em tal estado o indivíduo tende a procurar um meio de reduzir a tensão ou dissonância. Vários meios podem, naturalmente, usar-se para diminuir a dissonância que exista, como oferecer recompensa pela exe­ cução de algum comportamento não apreciado ou aumentar de alguma maneira o gôsto de proceder em dissonância. Con­ tudo, a teoria de dissonância cognitiva sustenta que, embora grandes recompensas possam reduzir a dissonância, isso não leva necessàriamente a maior mudança em atitudes. Mudan­ ças reais e duradouras,'dizem, só podem ocorrer colocando-se as atitudes de acôrdo com o comportamento. A solução deve ser interna; as cognições devem mudar e não simplesmente permitir que incentivos ofereçam novas razões para a pessoa comportar-se de determinada maneira. De fato, essa teoria sustenta que quanto maior a recompensa ou o incentivo para mudar o próprio comportamento, menor será a verdadeira mudança interna. Em tal aspecto, vê-se que essa opinião diverge flagrantemente de uma simples opinião de reforço,

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segundo a qual recompensas maiores levam a mudanças maiores. Vejamos agora dois dos estudos experimentais defívados do modelo dissonante cognitivo. Numa experiência, Kelman (1953) ofereceu recompensas diferentes a estudantes secun­ dários norte-americanos como incentivo para que escrevessem um ensaio a favor de uma revista de histórias em quadrinhos de que não gostavam. Descobriu que os que receberam uma pequena recompensa, pela qual tinham de competir, apre­ sentaram a maior mudança de atitude em relação à revista. Por outro lado, aqueles a quem se ofereceu recompensa gran­ de e a certeza de obtê-la apresentaram menores mudanças reais de atitude. O argumento aqui é que os estudantes do primeiro grupo foram forçados, pelas circunstâncias do au­ mento de dissonância, a adotar verdadeira mudança de idéia — precisavam convencer-se do valor da revista — enquanto os outros simplesmente escreveram seu ensaio para obter a recompensa grande. Em experiência semelhante, Brehm e Cohen (1962) fize­ ram predições sobre a maneira como poderiam mudar a ati­ tude em relação a uma tarefa maçante e demorada. Aqui se constatou que, quando era grande a fôrça coercitiva para obter submissão na execução da tarefa, os pacientes manti­ nham quanto a esta uma atitude menos favorável do que quando a fôrça coercitiva era pequena. Em outras palavras, quando só se usava um pouco de persuasão para realizar a tarefa, os pacientes eram forçados a reconstruir suas cognições, no sentido de que tinham de justificar perante si pró­ prios a participação na tarefa. Fôrça coercitiva potente tendia a causar uma submissão sem correspondente mudança de atitude. Essas experiências sem dúvida parecem relevantes para qualquer tentativa de produzir mudanças cognitivas no indi­ víduo psicologicamente perturbado, podendo muito bem ser compensadoras as tentativas sistemáticas de aplicar a teoria dissonante. Para isso precisamos naturalmente prestar cuida­ dosa atenção aos pormenores das condições em que ocorrem mudanças de atitude ; por exemplo, empregando escolha pes­ soal em lugar de coerção e fazendo que seja necessário es-

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fôrço para adoção de uma posição discrepante. Contudo, tanto a teoria como as experiências de dissonância cognitiva foram severamente criticadas sendo imprudente a esta altura fazer mais do que explorar sua possível utilidade no campo da anormalidade psicológica. Abordagem bem mais ortodoxa, embora ainda muito cog­ nitiva, foi proposta por Homme (1965), que descreveu o que êle chama de “ operantes da mente” . De fato, Homme dedica consideração ao condicionamento operante de acontecimentos mentais, mas, como êsses acontecimentos não são diretamente observáveis, prefere chamá-los de “ coverants” (covert operants) (*). Acentua, porém, que vários problemas importantes resul­ tam dessa aplicação especial de condicionamento operante. Em primeiro lugar, é perfeitamente claro que os “ coverants” são mais difíceis de perceber e que ficamos reduzidos à de­ pendência completa das introspecções do paciente. Em se­ gundo lugar, podem surgir dificuldades na seleção de refor­ ços. Além disso,, como não existe agente externo que possa aplicar adequadamente o reforço, o próprio paciente precisa ser o “ administrador da contingência” — êle mesmo deve providenciar a apropriada produção e reforço de aconteci­ mentos mentais para si próprio. Êste último ponto apresenta ainda outra dificuldade: onde vai o administrador da contin­ gência buscar reforço para comportar-se de maneira apro­ priada? A tarefa parece pressupor alguma espécie de auto­ controle. Homme argumenta que se obtém a solução do problema de controle de reforços recorrendo ao “ princípio de Premack” . Êste declara que um comportamento de probabilidade mais alta (mais provável) tende a reforçar positivamente um com­ portamento de probabilidade mais baixa, de modo que para fazer que determinado comportamento tenha mais probabi­ lidade de ocorrer basta providenciar para que êle seja ime­ diatamente seguido por um de alta probabilidade. Tomemos um exemplo simples dêste princípio. Se desejamos estimular (* )

N. T. — Operantes encobertos.

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a freqüência com que nos ocorre certo pensamento desejável, que no momento é acontecimento de baixa probabilidade, po­ demos fazer com que tomar uma xícara de chá (presumivel­ mente um acontecimento de alta probabilidade) dependa de ter aquele pensamento. Ou, para fortalecer o comportamento de relaxação, por exemplo, poderíamos providenciar para que fumássemos um cigarro tão logo estivéssemos relaxados. Em cada caso, a reação a estimular ou fortalecer deve ser se­ guida por um acontecimento que ocorra muito freqüentemen­ te. O processo não objetiva eliminar reações, mas antes aumentar a freqüência de algum comportamento existente. Todavia, poderíamos usar o controle de “ coverant” ao lidar com comportamento não desejado. O necessário aqui seria fortalecer (no sentido de tornar mais provável sua ocorrên­ cia) um comportamento incompatível com a atividade não desejada. Supondo-se que desejemos reduzir o fumo, por exemplo, seria necessário aumentar a freqüência de compor­ tamento incompatível com essa atividade; entre tais “coverants” incompatíveis estão noções sôbre o fumo fazer mal à saúde, causar mau hálito, prejudicar o paladar, acarretar despesas etc. Na prática, o paciente faria uma lista de coisas que acha aversivas em relação ao hábito de fumar (isto é, incompatí­ veis com êsse hábito) e depois escolheria um acontecimento de alta probabilidade como reforço. A seqüência seria então evocar o pensamento aversivo e fazer seguir-se a ele, ime­ diatamente, o comportamento de alta probabilidade, fosse qual fosse. O processo, de acôrdo com Homme, deve resultar no fortalecimento das idéias incompatíveis com o hábito de fumar. Naturalmente, como acentuado, não é particularmente fácil controlar idéias, sendo possível que, inadvertidamente, um “ coverant” antiíumo (por exemplo, “ fumar causa câncer pul­ monar") ocorra exatamente quando estamos para acender um cigarro. Nesse caso Homme aconselha apagar imediatamente o cigarro e deixar demorado intervalo antes de voltar a fumar. Há também o risco de adaptação às propriedades aversivas do “ coverant” , de tal modo que o "slogan” deixe de ter significação real. Para combatê-lo, Homme sugere

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introduzir variedade, por meio de freqüentes mudanças do “ coverant” , inclusive o uso de uma idéia positiva, por exem­ plo: “ Eu me sentirei melhor” e “ Eu economizarei dinheiro” . De fato, Homme cita exemplos da aplicação de condiciona­ mento de “ coverant” a vários problemas, entre os quais, há­ bito de fumar, controle de pêso e falta de autoconfiança. Infelizmente, faltam os pormenores do caso e resultados pre­ cisos, sendo por isso difícil avaliar a contribuição do método nesta fase. A tendência da terapia de comportamento para interessarse mais pelas cognições é também exemplificada pelo que Cautela desenvolveu como *''sensibilidade encoberta” . Tratase bàsicamente da aplicação de terapia de aversão, mas aqui tôda a operação é conduzida em nível imaginário. Em resu­ mo, as medidas preconizadas por êle (1966) são as seguintes. Primeiro, diz-se ao paciente que sua incapacidade de contro­ lar um comportamento aberrante, digamos alcoolismo, resulta do grande prazer que êle proporciona, e que para eliminá-lo será preciso associar a atividade a um estímulo desagradável. Ensina-se depois, o paciente a- relaxar e, quando está em es­ tado de relaxação, pede-se-lhe que imagine a atividade agra­ dável e erga o dedo indicador quando claramente visualizada a cena. No caso da aplicação do método a excesso de bebida, por exemplo, pode-se pedir ao paciente que imagine estar olhando para um copo de uísque, segurando-o e levando-o aos lábios. Nesse ponto, diz-se ao paciente que se imagine enjoado e começando a vom itar. . . o vômito sobe-lhe ao na­ r i z . .. enche-lhe a b ôca... derrama-se pelo chão e . .. e êle não consegue parar de vomitar. Repete-se o processo, tal como na forma mais comum de treinamento aversivo descrita anteriormente. Examinemos agora a aplicação do método a um paciente obeso, na tentativa de controlar excesso de comida. Êste paciente de Cautela, professora de meia idade, certamente comia bem, embora fôsse perceptível que a principal compli­ cação parecia envolver o que ela comia entre as refeições comuns. Enquanto preparava o almôço, por exemplo, comia oito ou nove sanduíches de manteiga de amendoim e geléia, e às vêzes consumia um bôlo inteiro. O processo consistiu

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em relaxar a paciente e depois pedir-lhe que se visualizasse preparando o jantar. Sugeriu-se que durante a preparação da refeição ela estendia a mão para pegar pão, a fim de fazer um sanduíche, mas assim que o fazia começava a sen­ tir enjôo. Em seguida, o vômito lhe subia à bôca e derra­ mava-se sôbre a refeição que ela estava preparando. Quando pudesse visualizar claramente a cena completa, a paciente devia fazer sinal com o dedo. Repetiu-se depois esta cena em várias ocasiões, variando em cada caso a natureza do alimento tentador. Refinamento adicional do processo consistiu na inclusão, entre cada par de provas aversivas, de uma cena que envolvia atitudes mais positivas. Nestas últimas cenas, pedia-se à paciente que visualizasse a si própria sendo tentada a comer um pedaço de bôlo, sentindo-se um pouco enjoada e dizendo “ Oh, eu não quero êsse bôlo” , após o que se sentia mais cal­ ma e relaxada. Esta rotina completa era executada pelo terapeuta e também pela própria paciente, quando em casa. Em pouco mais de três meses o peso dessa senhora “ estabilizou-se” em 60 kg (tendo começado com 90) e ela decla­ rou estar se sentindo “ bem e feliz” . Sete meses mais tarde descobriu-se que mantivera o nôvo nível de peso e que tôda tendência a voltar a seus antigos hábitos de comer em ex­ cesso fora ràpidamente reprimida pela repetição da terapia. A tendência a menosprezar acontecimentos internos é parte da herança do terapeuta de comportamento; de fato, o que deu impulso à psicologia behaviorista foi o descontentamen­ to com as inadequações de outras abordagens psicológicas, que tendiam a realçar a importância de processos ocultos, desafiando assim a análise experimental. Naturalmente, uma coisa é abandonar a “ mentalização” como terreno estéril para ataque experimental, e outra, completamente diversa, é pre­ sumir que processos cognitivos sejam irrelevantes para a explicação do comportamento humano. De fato, o psicólogo de comportamento foi cada vez mais forçado, pelas inade­ quações de teorias baseadas exclusivamente em reações decla­ radas, a modificar e estender sua análise conceituai, para abranger os territórios anteriormente proibidos. Contudo, nem todos os terapeutas de comportamento já estão cônscios

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de que a esfera de atividade mental se está tornando um campo respeitável de estudo; e existe ainda certa resistência a envolver-se nos problemas extremamente complexos dessa área. A preocupação singular, freqüentemente manifestada, é a de que o abandono de uma abordagem totalmente behaviorista (com sua concentração em comportamento decla­ rado) rebaixe inevitavelmente a rigorosa qualidade científica e experimental da terapia; a terapia de comportamento tor­ nar-se-ia indistinguível da psicoterapia. Isso não vai necessariamente acontecer; existem muitos bons estudos experimentais que parecem relevantes nas áreas de resolução de problema, “ aprendizagem de insight” e psi­ cologia social. Não há razão para supor que tais experiências são de qualidade inferior, e certamente não são de menor importância. Em suma, poder-se-ia argumentar que não deve ser difícil resumir as generalizações geradas por essas expe­ riências e aplicá-las mais ou menos da mesma maneira como os terapeutas de comportamento adaptaram as experiências e princípios de Pavlov, Hull e outros. Esta conclusão não- envolve, naturalmente, o argumento apresentado no sentido de as mudanças de comportamento serem o único elemento necessário para produzir mudanças de pensamento. Êste argumento continua sendo em grande parte uma presunção — e uma presunção que êste autor não acredita tenha probabilidade de ser válida. De acôrdo com provas clínicas, parece haver pouca dúvida de que as modi­ ficações no comportamento deixam intatas, muitas vêzes, áreas de anormalidade mental. A questão é esta; se temos um paciente cujo comportamento externo em todos os senti­ dos podemos agora considerar normal, é possível que ele te­ nha uma existência interna anormal? Existe uma relação de um para um entre comportamento externo e aconteci­ mentos mentais?

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CAPÍTULO

XVI

Até que Ponto é Válida a Terapia de Comportamento?

MÃE: “ Por que você está olhando assim?” H a n s : “ Estava só olhando para ver se você também tem um mijador.” MÃE: “ Ê claro. Você não sabia?” H a n s : “ Não. Você é tão grande, eu pensava que seu mijador fosse como o do cavalo.”

Êste pedacinho de conversa, entre mãe e filho pequeno, foi parte da prova considerada por Freud em seu famoso estudo do “ Pequeno Hans” (1950), caso saudado como brilhante êxito em psicanálise infantil. O fato é que esse menino, aos cinco anos de idade, adquiriu acentuado mêdo de cavalos; o problema era explicar essa fobia. A interpretação dada por Freud à sua origem foi que o menino na realidade desejava livrar-se de seu pai e assumir o lugar dele numa relação sexual com a mãe. Afirmou que o mêdo de cavalos decorria da identificação que Hans fazia do pai com um cavalo; sua indisposição para sair de casa

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pareceu a Freud servir ao propósito de permanecer ao lado da mãe. Evidentemente nenhum dêsses mecanismos psicoló­ gicos era diretamente observável — não passavam de infe­ rências de observações do comportamento do menino, inclu­ sive das coisas que êle dizia. De fato, pode ocorrer a muitos que as interpretações apresentadas por Freud são, por sua própria natureza, completamente absurdas Todavia, não estarem elas de acordo com nossa maneira habitual de en­ carar a vida mental da criança não é razão adequada para rejeitarmos de imediato as interpretações. Qualquer critica aceitável precisa basear-se em terreno mais firm e do que a simples convicção de que Freud estava errado. Wolpe e Rachman (1960) dedicaram considerável pensa­ mento ao caso do Pequeno Hans e, baseados nêle, produziram devastadora refutação da análise de Freud. Não é necessário entrar nos pormenores da crítica que fizeram, mas um ou dois dos pontos salientes que expuseram merecem menção. Em primeiro lugar, acentuam inexistir prova de que Hans se sentisse sexualmente atraído pela mãe em qualquer sentido restrito, nem de que tivesse expressado mêdo do pai ou ódio por êle. De fato, os dois pareciam man­ ter relação singularmente boa. Em segundo lugar, Wolpe e Rachman acentuam que o mêdo do menino não poderia ter servido simplesmente à função de conservar a mãe perto, pois, do contrário, como explicar que Hans sentisse mêdo também quando saía a passear com ela? Por essas e outras razões, conclui-se que a explicação dada por Freud é abso­ lutamente anticientífica, forçando-o a recorrer a subterfúgios inaceitáveis, como dizer que uma interpretação é válida quando seguida por melhora, ao passo que, se não ocorre mudança, a interpretação não é aceita. Essa espécie de ar­ gumentação evidentemente nunca nos permitiria refutar a teoria — fôsse qual fôsse o resultado, a teoria permaneceria válida. A razão de citar o estudo do Pequeno Hans é simplesmente esta: enquanto a teoria e os conceitos da psicanálise são fran­ camente intuitivos e geralmente antieientíficos, os da terapia de comportamento pretendem ser experimentalmente baseados e logicamente relacionados com comportamento observável.

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Ser principalmente inferência a explicação dada por Freud à condição fóbica de Hans não constitui verdadeiro proble­ ma; ir essa inferência muito além da prova existente é, por outro lado, questão muito séria — a teoria fica completa­ mente desligada dos fatos conhecidos. Além disso, uma teo­ ria é sem valor a menos que produza deduções comprováveis que possam ser sujeitas a exame experimental. Pelo mesmo motivo, se desmentidas nossas deduções de uma teoria, só teremos um recurso — abandoná-la. Existe pouca dúvida de que grande parte da psicologia mo­ derna se baseia em experiência, diferenciando-se claramente, nesse sentido, da psicanálise e de tôdas as psicoterapias deri­ vadas daquele modelo básico de vida mental. Deve-se admi­ tir também, ainda que relutantemente, que se não aplicarmos os métodos da ciência aos problemas de compreensão e modi­ ficação de distúrbio mental, será impossível progredir. No nível mais básico, se não nos portarmos como cientistas, cor­ reremos o risco de perpetuar sistemas terapêuticos parcial ou totalmente inadequados ( * ) . Afirma-se que as grandes virtudes da terapia de compor­ tamento estão não apenas em ser cientificamente baseada, mas'em ser capaz de produzir resultados que, muito freqüen­ temente, não se podem obter com qualquer outra terapia al­ ternativa. Vamos examinar agora algumas das provas em que se fundam essas afirmações. O ponto de partida na ava­ liação do êxito terapêutico da terapia de comportamento é geralmente uma comparação com os efeitos da psicoterapia e da psicanálise. As opiniões diferem muito sôbre os resul­ tados dos dois últimos tratamentos correlatos. Stafford-Clark (1960) descreve como “ inestimáveis” os métodos e cita es­ (* ) Neste sentido é interessante observar uma troca de opiniões em recente livro sôbre psicanálise, organizado por Goldm an e Shapiro (1 9 6 6 ). U m dos colaboradores, Oresey, sugere q u e a terapia de comportamento po­ deria ser benéfica em certos problemas nos quais a psicanálise falha, Esta sugestão parece categòricamente rejeitada po r Fleming, em capítulo poste­ rior do mesmo livro, o qual, em bora presumivelmente reconhecendo que a psicanálise nem sempre é bem sucedida, rejeita a terapia de comportamento como “engenho má^-co” . Parece que, para Fleming, a teoria psicanalítica tem um valor que supera de muito todos os fatos ou pontos de vista alternativos. 17

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tatísticas mostrando alívio de doença neurótica, em graus va­ riados, em 60 a 90 por cento de casos assim tratados. Eysenck (1960), por outro lado, em exame mais substancial da prova relativa aos efeitos de psicoterapia, concluiu que não existe a menor prova mostrando que èsses tratamentos, freudianos ou outros, facilitem a recuperação de pacientes neuróticos. O ponto mais revelador talvez seja, porém, a tendência de certas conhecidas figuras do movimento psicanalítico para rejeitar tôda afirmação de êxito terapêutico. Por exemplo, Eysenck citou uma declaração do dr. Weinstoek, presidente da Comissão de Coleta de Fatos da Associação Psicanalítica Norte-americana, no sentido de que a associação que êle re­ presenta nenhuma afirmação faz em favor da utilidade te­ rapêutica da psicanálise. Além disso, o dr. Weinstoek decla­ ra que sua organização não pode aceitar responsabilidade pelas afirmações daqueles “ cujo entusiasmo vai além do co­ nhecimento” . Palavras realmente fortes. Também o dr. Glover, preeminente membro do movimento psicanalítico bri­ tânico, declarou que nenhuma significação científica pode atribuir-se a quaisquer impressões ou presunções gerais a res­ peito de qualquer formà de psicoterapia. O dr. Malan, ca­ tegorizada autoridade em conhecida clínica psicanalítica, também opinou que a prova publicada não fornece a menor indicação de que a psicoterapia tenha algum valor, embora êle aparentemente considere que tais métodos são bem su­ cedidos. E finalmente, Levitt (1963), em seu exame muito substancial da prova, conclui que não existe base sólida para acreditar que a psicoterapia ajude a recuperação dos distúr­ bios emocionais da infância. Um grande obstáculo a descobertas sôbre psicoterapia e psicanálise parece ser a relutância dos que aplicam êsses tra­ tamentos em submeter seus métodos a investigação experi­ mental. Talvez haja alguma verdade no argumento de que os métodos e técnicas são complexos demais para serem con­ trolados de qualquer maneira exeqüível. O problema é que não submetê-los a investigação deixa-nos em ignorância com­ pleta do que é valioso e do que não é. Não admira que muitas pessoas sustentem que a psicoterapia é “ uma técnica não identificada aplicada a problemas não especificados com re-

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sultados imprevisíveis” (Rosenthal, 1962). Esta opinião será provàvelmente sustentada com muito vigor por aqueles que não conseguiram obter a cooperação de psicoterapeutáts para realização de provas terapêuticas convenientemente organi­ zadas, quando a terapia de comportamento possa ser testada em comparação com sua mais próxima rival. Essa falta de disposição para expor-se a avaliação crítica deve inevitavel­ mente representar um desserviço à ciência, bem como aos indivíduos que para se livrarem de seus sofrimentos depen­ dem inteiramente de obter respostas rápidas. Esta relutân­ cia tem também a infeliz conseqüência de obrigar terapeutas de comportamento a realizarem provas inadequadas, nas quais a comparação com o tratamento de psicoterapia tem «ido mais simbólica do que r e a l(* ). Evidentemente muitos psicoterapeutas e psicanalistas acre­ ditam que essas formas de tratamento são valiosas; o importunte, porém, é que existe pouca prova que não seja anedó­ tica em favor dessa crença e precisamos obter essa prova. Eysenck propõe o problema em têrmos crípticos: “ Evidente­ mente” , diz êle, “ a terapia de comportamento precisará fazer melhor do que isso.” “ Fazer melhor” deve, naturalmente, envolver a apresentação de prova, de espécie aceitável, de yue a terapia de comportamento funciona (no sentido de pro­ duzir mudanças em padrões anormais de comportamento) pelo menos tão bem quanto qualquer outra forma de trata­ mento. Se os fatos indicarem alguma superioridade da te­ rapia de comportamento, fazer melhor adquire significação ainda maior. Uma linha de provas deriva do número muito grande do que poderíamos chamar estudos anedóticos. Aqui, no mais das vêzes, simplesmente se. referem os resultados da aplicação de uma ou outra técnica de terapia de comportamento. Não existe o menor controle de fatores possivelmente importantes na situação, nenhuma manipulação experimental do distúr­ bio em tratamento e geralmente pequena tentativa de ava­ liar convenientemente o comportamento mal adaptatívo antes (* ) É importante observar que existem numerosas espécies de psico­ terapia. Neste livro, usamos “psicotcrapia” para indicar tratamentos basea­ dos na teoria psicanalítica.

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ou depois do tratamento. Tais relatos têm pouco valor e não são melhores do que as provas apresentadas em favor da teoria e da prática psicanalíticas. Significa isso que o caso isolado nunca pode fornecer prova satisfatória ou acei­ tável? A resposta, evidentemente, é que pode, mas a impor­ tância atribuível aos resultados de uma investigação de caso isolado depende da maneira como se conduziu o estudo. Vários estudos de condicionamento operante produziram dados úteis porque demonstraram os efeitos tanto da apli­ cação como da não aplicação de uma condição crítica. Em tais investigações o processo consistiu em aplicar treinamen­ to operante em diversas ocasiões e suspendê-lo em outras, e mostrar que o comportamento que se estava observando era função de estar ou não presente a condição crítica (treina­ mento operante). Em condições cuidadosamente controladas é possível, empregando êste método de experimentação, de­ monstrar a significação de alguma influência especial. O autor (1960) também empregou o método de manipular as condições de tratamento para mostrar que podemos con­ trolar experimentalmente certos aspectos de comportamento mal adaptativo e que o grau de controle obtido está de acordo com certas predições teóricas. Yates (1958) foi também capaz de demonstrar, em seu estudo de um paciente com ti­ ques múltiplos, que se podia controlar experimentalmente o comportamento de tique em resultado de certas operações psicológicas que se estavam realizando e que o caráter do controle estava de acôrdo com a teoria psicológica. Infelizmente, essas investigações manipulativas são rela­ tivamente raras, mas parecem ter considerável valor no sen­ tido de aumentar nosso estoque de conhecimento a respeito da validade da terapia de comportamento. A essência de tais estudos consiste em fazer uma clara predição de mudanças de comportamento que se seguirão à aplicação de certas ope­ rações; o princípio envolvido é o mesmo que na demonstra­ ção da existência de uma ligação entre a posição de um co­ mutador na parede e a iluminação do aposento por uma lâm­ pada elétrica. Existe, porém, outro meio pelo qual os relatos anedóticos de terapia de comportamento contribuíram com útil prova

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validadora, Em capítulos anteriores mencionamos a aplica­ ção bem sucedida de terapia de comportamento a casos nos quais outras espécies de tratamento não haviam produzido be­ nefício, e tais relatos tendem a sugerir que a terapia de com­ portamento pode prestar contribuição independente ao trata­ mento. Naturalmente, essa espécie de prova é mais difícil de avaliar por numerosas razões e o mais que se pode alegar é serem essas observações compatíveis com a possível supe­ rioridade da terapia de comportamento. Outra linha de indagação sobre a validade da terapia de comportamento refere-se aos relatos de estudos não contro­ lados em grande escala* isto é, nos quais não houve expe­ riências manipulativas da espécie mencionada acima nem tra­ tamento de comparação. Aqui, somos forçados a avaliar os resultados do tratamento com base em um de dois critérios, ou ambos; é o índice de recuperação mais rápido e/ou mais substancial do que sem nenhum tratamento? Wolpe (1958) relatou os resultados de tratamento de ini­ bição recíproca em 210 casos, achando que quase 90 por cen­ to de seu grupo de pacientes foram curados ou muito me~ lhorados em tempo médio de pouco mais de dez meses de terapia. Tanto em têrmos de duração do tratamento como de proporção de sucesso obtido, esses resultados são consideràvelmente melhores do que se não houvesse tratamento algum. Contudo, os resultados de Wolpe são um pouco me­ lhores do que os obtidos por outros terapeutas de compor­ tamento. Os resultados dêsses outros estudos não controla­ dos foram citados em capítulo anterior. Uma investigaçãonão mencionada antes merece, porém, breve apresentação aqui. Êsse inquérito foi sôbre 42 pacientes tratados por mé­ todos mistos de terapia de comportamento (Schmidt, Castell e Brown, 1965). Os resultados embora baseados em peque­ no número de pacientes, parecem fornecer prova da eficá­ cia diferencial da terapia de comportamento em vários tipos de perturbação psicológica. Excluídos os pacientes que não continuaram o tratamento, o índice geral de melhora acentua­ da ou moderada foi de 75 por cento, embora se deva notar que 24 por cento dos pacientes se recusaram a receber mais tratamento. As cifras relativas, incluídos os pacientes que

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recusaram tratamento completo, indicam que os problemas sexuais foram mais sensíveis a métodos de terapia de com­ portamento do que fobias de tôdas as espécies, É difícil resumir e avaliar os resultados dos estudos gru­ pais não controlados de terapia de comportamento. Em al­ guns só se usaram pacientes normais; em outros, emprega­ ram-se várias técnicas de terapia; ainda em outros, diferen­ tes tipos de distúrbio receberam atenção. O quadro geral é, porém, animador, tanto em termos da proporção de casos em que se obteve sucesso como do tempo relativamente curto, necessário para produzir êsses resultados. Naturalmente, pelas razões discutidas em capítulos anteriores, tais estudos não podem fornecer prova conclusiva da validade da terapia de comportamento; só podemos obtê-la a partir dos resulta­ dos de experiências devidamente controladas. São, infelizmente, raros os estudos controlados de terapia de comportamento. De fato, há boas razões para argumen­ tar, como indica o material de capítulos anteriores, que ne­ nhum estudo completamente satisfatório até ago,r,a se reali­ zou. Contudo, no que se refere à prova das investigações existentes, o resultado é em geral favorável à terapia de comportamento. Embora não sejam possíveis conclusões ca­ tegóricas a esta altura, a prova sugere que essas técnicas produzem resultados pelo menos tão bons e mais provavel­ mente melhores do que a psicoterapia de vários tipos. Êste parece ser o caso quer usemos o critério do tempo exigido para conseguir sucesso ou a proporção de sucesso obtido en­ tre os pacientes tratados. As diferenças entre terapia de comportamento e outras formas de tratamento nem sempre são grandes, até onde se pode determinar, mas é espantoso que se possam fazer comparações, em vista da curta histó­ ria da terapia de comportamento. Sem dúvida, a prova exis­ tente anima-nos a acreditar que a introdução de refinamen­ tos e maior aperfeiçoamento — que podemos confiantemente esperar — aumentarão substancialmente a contribuição pres­ tada pelas terapias de comportamento. Podemos também notar, em tal sentido, que essas técnicas parecem ter aplica­ ção decididamente mais ampla do que qualquer das alternati­ vas existentes, variando desde a correção de maus hábitos de

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indivíduos normais até a inibição de certos aspectos de grave comportamento psicótico. Tudo isso parece sugerir que poderíamos estar à beira de um grande avanço na compreensão e no tratamento das perturbações psicológicas. Pelo menos podemos atribuir aos terapeutas de comportamento uma manifestação de entusiasmo e disposição de submeter seus processos a investigação experimental. É com­ preensível que não se possa encontrar uma única experiência que estabeleça a terapia de comportamento como clara e in­ discutivelmente superior à psicoterapia ou psicanálise. A esta altura não podemos esperar mais. Contudo, se é verda­ de que a terapia de comportamento não estabeleceu conclu­ sivamente sua validade em certos sentidos, é também impor­ tante ter em mente que, sob êsse aspecto, a psicoterapia e a psicanálise estão infinitamente piores. De fato, enquanto a experimentação tendeu a fortalecer a causa da terapia de comportamento, em geral serviu para enfraquecer a daqueles tratamentos alternativos. Além disso, existe notável coerên­ cia na direção da prova reconhecidamente fraca que leva Wolpe e outros a concluírem que quando as psicoterapias aparentemente produziram resultados úteis foi por causa de certo condicionamento fortuito no ambiente terapêutico. Con­ cordemos ou não com essa conclusão, o futuro da terapia de comportamento parece certamente mais seguro e mais soli­ damente baseado que o da psicanálise e tratamentos corre­ lates. Além de qualquer consideração de validade em têrmos de valor prático, há várias maneiras pelas quais se argumenta que, no terreno teórico, a terapia de comportamento tem grande pêso de convicção. Parte dessa prova provém de estudos “ análogos” que, embora limitados, pretendem mos­ trar que um modelo de condicionamento de anormalidade psicológica é pelo menos uma proposição viável. Exemplo dessa espécie de experiência foi apresentado em capítulo an­ terior, quando se mostrou possível adquirir reações sexuais incomuns mediante um processo de condicionamento. Igual­ mente, a experiência anteriormente mencionada, na qual mé­ todos de condicionamento operante aumentaram o número de más vocalizações na fala de um indivíduo, oferece uma ana-

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logia de comportamento de gagueira. Além disso, toda a li­ teratura da terapia de comportamento sôbre estudos contro­ lados de eliminação de fobias em indivíduos normais não po­ deria ser mais do que uma coleção de estudos análogos. F i­ nalmente, embora tais relatos tenham relativamente pouco pêso, as explicações de desenvolvimento e remoção de sinto­ mas pela teoria de aprendizagem são exemplos de analogia sem experiência. Estudos apropriados nessa área, muitas vêzes envolvendo a criação de dificuldades especiais em pa­ cientes afora isso normais, evidentemente não são de todo convincentes quando considerados sozinhos; não provam que as anormalidades são adquiridas por processos de condicio­ namento, mas apenas que tais processos poderiam ser respon­ sáveis por seu desenvolvimento. Contudo, aumentam muito o pêso das razões gerais em favor da validade da terapia de comportamento. Experiências análogas acham-se também envolvidas até certo ponto nas origens e derivações da terapia de compor­ tamento. Os primeiros estudos de neurose experimental men­ cionados em capítulos anteriores serviram, em parte, para promover o desenvolvimento dêsses tratamentos, e os estu­ dos com animais de Masserman, Wolpe e outros formaram a base de um sistema racional de terapia para tais perturba­ ções. Em certo sentido, poder-se-ia argumentar que êsses estudos, por sua natureza experimental, constituem base consideràvelmente mais satisfatória para a terapia e a teoria do que os tratamentos alternativos. A psicanálise e as nume­ rosas psicoterapias derivadas da teoria de Freud não resul­ taram de experimentação, mas de observação clínica, e as vantagens e desvantagens disso são evidentes. O principal mérito de uma origem clínica é, naturalmente, que tôda teo­ ria será mais diretamente ligada à doença que procura expli­ car do que quando (como na terapia de comportamento) ela deriva em parte do estudo do comportamento animal de uma espécie neurótica mais duvidosa. Por outro lado, a observa­ ção clínica pode ser enganadora, como vimos no caso da ex­ periência de “ amigdalite” , e parece haver pouca dúvida de que fatores culturais provavelmente levaram Freud a certas conclusões e ênfases que hoje parecem ter sido incorretas.

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As considerações importantes aqui são a medida em que ana­ logias animais de anormalidade psicológica são confirmadas por experiências correlatas com sêres humanos e o g*au em que os modelos se ajustam aos fatos referentes a nossos pa­ cientes humanos. Parece que tais modelos são simples de­ mais para oferecer uma descrição completa da origem, do desenvolvimento e do estado presente de muitos problemas psicológicos; apesar disso, êsses modelos parecem ajustar-se bem melhor do que qualquer alternativa de que êste autor te­ nha conhecimento. Se tomarmos um único exemplo desse melhor ajustamento, talvez sirva para exemplificar o ponto geral. Talvez tenha ocorrido a alguns que no capítulo anterior se dedicou um pouco de tempo à discussão do valor do “ insight” na produção de modificações de comportamento e poder-se-ia pensar que o que ali se disse constituia reconhecimento da superioridade das terapias de “ insight” , por exemplo, psica*nálise. A consideração importante, porém, é saber “ insight” no quê? ^ o caso do próprio autor oa mecanismos de pertur­ bação a cujo respeito se deu “ insight” ao paciente foram de­ terminados pela experiência; no caso de Shapiro, “ insight” implicou o reconhecimento de determinado fato pelo pacien­ te, a saber, que nenhuma máquina existia realmente no hos­ pital. Êsses exemplos parecem completamente diferentes dos casos em que o “ insight” se baseia numa teoria geral especial, em que as revelações feitas ao paciente envolvem presunções para as quais pouca prova se pode encontrar. A recomenda' ção de Freud ao pai do Pequeno Hans no sentido de que se devia revelar a “ origem” da fobia é exemplo dêste ponto. De fato, se oferecemos “ insights” da espécie que deriva da teoria freudiana, é surpreendente que haja uma insinuação de piora das relações familiares na prova apresentada ante­ riormente neste livro? É compreensível que alguns pacientes, exasperados pelo que acreditam ser interpretações inaceitá­ veis de seu comportamento, achem muito mais aceitável a explicação da terapia de comportamento? (* ) É significativo (* ) A explicação closta exasperação dada pelo terapeuta mais “dinâ­ mico” é que o paciente é incapaz de enfrentar a verdade. A. explicação alternativa é, naturalmente, que a interpretação é incorreta.

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que o professor Mowrer (1959), ex-adepto da psicanálise, tenha concluído que esta forma de terapia é “ não apenas não terapêutica, mas ativamente perniciosa" ? Em contraste, exemplo de uma teoria de “ melhor ajusta­ mento” parece ser apresentado por Wolpe e Rachman em sua reavaliação do caso do próprio Freud, o do Pequeno Hans. Sua explicação é essencialmente simples, parcimoniosa e, até onde se pode ver, leva em conta todos os fatos apresentados, A base principal de sua argumentação é simplesmente que o Pequeno Hans fora de fato exposto ao mêdo na presença de cavalos e que sua fobia podia muito bem explicar-se em têrmos de condicionamento. Nenhuma argumentação com­ plexa sôbre os desígnios sexuais do Pequeno Hans em rela­ ção à sua mãe era necessária. Talvez o exemplo mais convincente de “ melhor ajustamen­ to“ provenha, porém, do elemento de prova mais sistemática e cuidadosamente documentado da literatura da terapia de comportamento. Não existe a menor dúvida de que os pontos de vista psicanalíticos e outros correlatos têm umà predição clara a fazer sôbre os resultados de tratamento sintomático; é que a remoção de um sintoma dará lugar a outro. A pre­ dição está ligada à noção de que uma perturbação psicológica declarada é apenas a evidência exterior de algum complexo interior, a ponta do iceberg, por assim dizer. Daí deve se­ guir-se, naturalmente, que toda tentativa de tratamento sin­ tomático falhará, pois não removerá a verdadeira fonte da perturbação. Só lidando com as “ raízes interiores” do dis­ túrbio podemos esperar efetuar uma “ cura” . A prova aqui é muito convincente; de fato, o aparecimento de novos sin­ tomas para substituir os removidos é raro — e nem mesmo é certo que esses raros casos sejam exemplos de substituição. Além disso, o tratamento sintomático por terapia de compor­ tamento parece muitas vêzes produzir indicações de melhor ajustamento geral, como se os aspectos mais gerais do desa­ justamento tivessem resultado de tentativa falha de lidar com uma área isolada de dificuldade. Naturalmente, a prova está longe de completa, mas a in­ formação e os fatos que temos parecem favoráveis à orien­

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tação da terapia de comportamento, não à do ponto de vista freudiano e outros correlatos. Há razões para duvidar que um modêlo baseado env condi­ cionamento possa explicar completamente o comportamento humano e a perturbação psicológica. Além disso, os teóricos de comportamento estão evidentemente em considerável con­ flito em relação à espécie de modêlo que explicará mesmo os resultados de experiências de âmbito muito mais restrito do que a maioria dos segmentos de comportamento humano. Se essa espécie de dificuldade e desacordo caracteriza as propor­ ções básicas em que se funda a terapia de comportamento, deve-se lançar dúvida sôbre a validade dêsse tratamento? A causa talvez não seja tão difícil de defender como pode­ ria parecer à primeira vista, principalmente porque, embora haja dificuldades — que não devemos subestimar — existe de fato apreciável acordo entre os teóricos. Naturalmente, poder-se-ia também dizer que êsse amplo acordo é característico da teoria psicanalítica. Por outro la­ do, a diferença entre essa causa e a da terapia de compor­ tamento reside mais uma vez na prova experimental. En­ quanto existe prova substancial em favor de condicionamen­ to, dos resultados de reforço parcial (intermitente), da im­ portância de seqüências temporais em estímulos e reação na aprendizagem, e assim por diante, a prova a favor dos con­ ceitos de psicanálise é muito menos satisfatória. Talvez o estudo mais significativo a êsse respeito seja o do dr. Sears (1943), que encontrou relativamente pouco apoio para os conceitos psicanalíticos em seu exame de estudos objetivos relevantes. Finalmente, nesta análise das fontes de prova que, pode-se dizer, proporcionam apoio à terapia de comportamento, de­ ve-se fazer menção de indicações prognosticas, isto é, rela­ ções demonstráveis entre certas variáveis e responsividade ao tratamento por essas técnicas. A existência de relações es­ táveis entre variáveis psicológicas de uma ou outra espécie e o resultado do tratamento evidentemente emprestará subs­ tância às técnicas e contribui para dar-nos confiança em sua validade.

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Reunindo as três fontes principais de provas — as experiências com animais e outras análogas, as comparações de terapia de comportamento com psicoterapia e as experiências manipulativas, e, agora, os estudos de predição — a explica­ ção torna-se razoavelmente completa. Poder-se-ia dizer que a experimentação com terapia de comportamènto forneceu prova a respeito da aquisição de perturbações psicológicas e da efetiva remoção dessas perturbações, e conhecimento de variáveis relevantes na predição de sucesso no tratamento. Contudo, antes de apresentar a prova relativa ao prognós­ tico, devemos acentuar dois pontos. Primeiro, como essa in­ formação recebeu pouca menção em capítulos anteriores, aqui lhe damos ênfase adicional; isto é simplesmente resultado de desatenção anterior e não indicação da importância es­ pecial de estudos prognósticos. Segundo, e apoiando o pri­ meiro ponto, o caráter da prova é talvez o menos substancial de todos aqui considerados. Não é muito surpreendente que as características de perso­ nalidade tenham recebido mais atenção. E o papel da ansie­ dade na responsividade do tratamento é uma das mais óbvias características de personalidade a examinar. Schmidt e outros (1965) relataram que pacientes que reagiram bem a terapias de comportamento de espécie mista tenderam a de­ monstrar em testes psicológicos ansiedade inicial menor do que os que não apresentaram a menor mudança. Esta rela­ ção foi também notada por vários outros investigadores e, até onde se pode ver, a ansiedade é provavelmente um risco especial no que se refere a terapia aversiva. Contudo, mes­ mo quando se usa tratamento de inibição recíproca (que é essencialmente orientado para lidar com problemas de an­ siedade) , existem indicações de que o tratamento é mais lon­ go e mais difícil quando o nível de ansiedade é alto. O caráter e a gravidade da doença também parecem fato­ res de prognóstico. Marks e Gelder (1965), por exemplo, descobriram que agorafóbicos reagiram pior do que outros tipos de pacientes fóbicos, e relataram também (1966) que pacientes com numerosos sintomas parecem ter menos proba­ bilidade de recuperação quando se usa tratamento de inibi­ ção recíproca do que casos que se poderiam descrever como

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monossintomáticos. Além disso, Gelder e outros (1967) apresentam certa prova de que a presença de depressão e queixas hipocondríacas, como parte de uma reação neurótica, tendem a associar-se à falta de melhora. Fatores motivacionais também estão implicados na responsividade a terapia de comportamento, como presumivelmente o estão na maioria das formas de tratamento. Um estudo que parece indicar isso, realizado por Freud (1960), já foi citado em capítulo anterior. A essência da análise feita por Freud das reações de homossexuais à terapia de aversão con­ sistiu em que forte coerção para procura de tratamento, da parte de magistrados, policiais ou parentes, estava associa­ da à falta de melhora. Aqueles que reagiram melhor e nos quais os benefícios do tratamento duraram mais tempo ha­ viam procurado tratamento sem a menor pressão externa. Esta descoberta bem pode estar relacionada com as condi­ ções especiais para efetiva mudança apresentadas por Festinger e mencionadas em capítulo anterior. A prova mais convincente envolveria, naturalmente, algu­ ma demonstração de que poderemos prever os resultados da terapia de comportamento com base no conhecimento de fa­ tos que sabemos implicados no condicionamento. Em outras palavras, se o condicionamento é de fato a base da terapia de comportamento, podemos descobrir mediante certos testes psicológicos se determinado indivíduo será ou não suscetível a essa forma de tratamento? Um modo evidente de fazê-lo seria o estudo da relação entre a aquisição, pelo paciente, de alguma reação condicionada simples em ambiente de labo­ ratório e sua reação ao tratamento. O comportamento em teste de condicionamento predirá o resultado de terapia que implique condicionamento? Estudo dessa espécie foi realizado por Morganstern e outros (1965), utilizando travestis tratados por terapia de aversão. Das várias medidas empregadas nesse estudo, duas são de especial importância. A primeira foi um teste da capacidade do paciente para adquirir uma reação condicionada de piscar o olho, consistindo o processo em lançar um sôpro de ar no ôlho do paciente e associar isso a um som; ter-se-ia prova de condicionamento se, em alguma fase, o paciente piscasse ao

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ouvir o som sozinho. A segunda foi uma simples situação de condicionamento verbal em que o emprego pelo paciente de determinado pronome era recompensado pela palavra “ bomM proferida pelo experimentador, quando ocorria essa reação. A prova de condicionamento aqui seria em termos de significativo aumento do emprego pelo paciente do pro­ nome que fôra reforçado (recompensado). Ésses testes fo ­ ram, naturalmente, aplicados antes de tratamento. Subseqüentemente os pacientes foram divididos em três grupos: os que estavam aparentemente curados, os que ha­ viam recaído depois de uma reação inicialmente boa à terapia e os que não compareceram para terapia aversiva. Nenhuma relação se encontrou entre reação ao tratamento e a facilida­ de com que o paciente adquiria ou perdia uma reação condi­ cionada de piscar o ôlho. Por outro lado, os pacientes curados pela terapia de aversão apresentaram indicações de condicio­ namento verbal, sendo possível que o desempenho nesse tipo de tarefa tenha valor de predição. Êste estudo fornece por­ tanto prova de que pelo menos uma espécie de medida de condicionamento tem relação com uma espécie de terapia de comportamento e, portanto, oferece valiosos dados corroborativos. Eysenck (1965) também chamou atenção para as implica­ ções de outra faceta da personalidade em quaisquer trata­ mentos de condicionamento: a extroversão. Afirm a êle exis­ tir prova de relação entre o grau de extroversão que carac­ teriza um indivíduo e a suscetibilidade dêste a condiciona­ mento; e da aquisição, por uma pessoa extrovertida, de rea­ ções condicionadas mais vagarosamente do que uma intro­ vertida, apresentando, porém, extinção mais rápida de reações já aprendidas. A possível importância dessa pro­ posição para a terapia de comportamento é óbvia; se tivermos um paciente introvertido, poderemos preferir tratá-lo por meio de reaprendizagem, ensinando-lhe comportamento nôvo e mais adaptativo, em lugar de descondicionamento, com o qual tentássemos extinguir ou eliminar seus antigos maus hábitos, Far-se-ia a escolha oposta, naturalmente, no caso de um paciente extrovertido. Todavia, Eysenck vai ainda mais longe, afirmando que a “ condicionabilidade” de um in­

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divíduo pode ser alterada por meios químicos — poderemos, se quisermos, mudar a reação característica de um indivíduo a um teste de condicionamento, daquela de uma pessoa extro­ vertida para a que se assemelha à do introvertido. A defesa da relação entre os resultados da terapia de comportamento e êste aspecto da personalidade do paciente é algo fraca. Morganstern e outros (1905), Paul (1966) e Schmidt e outros (1965) não conseguiram constatar qualquer relevância dessa característica de personalidade para predição de recuperação quando se usa terapia de comportamento. Embora não pos­ samos tirar conclusão firme dessa e de outras provas experi­ mentais, parece que a extroversão, como característica de personalidade, tem significação prognostica duvidosa, o que tende a enfraquecer os elos entre estudos de condicionamento formal e terapia de comportamento. A prova em favor da alteração da “ condicionabilidade” de um indivíduo pela ministração de drogas é, igualmente, mais forte em relatórios acadêmicos do que na literatura da tera­ pia de comportamento. Em seu relato sobre o tratamento de dois casos fóbicos, Meyer (1957) fornece alguma prova tentativa favorável ao ponto de vista de Eysenck, concluindo que “ o emprego de drogas pode facilitar e apressar a tera­ pia de "condicionamento” . Outra prova, apresentada por Young* e Turner (1966), apóia, em parte, a noção de que o curso da terapia de comportamento pode ser alterado pelo emprego de drogas na direção especificada por Eysenck. Nes­ ta área, porém, como em outras, muita coisa ainda se pre­ cisa fazer antes que possamos ter verdadeira confiança no emprêgo de drogas para controlar condicionamento e sua re­ lação com o tratamento. Todavia, como acentuou Eysenck, a área está cheia de possibilidades e está '‘clamando por de­ senvolvimento” . Ficou estabelecida pelas provas que consideramos neste capítulo a causa em favor da terapia de comportamento? A resposta a esta pergunta deve depender da significação que estamos dispostos a atribuir à noção de “ validade” na ava­ liação dos resultados de muitas experiências, alguns bons e alguns maus. Se adotarmos a idéia da existência de muita prova compatível com a idéia de que a terapia de compor­

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tamento produz resultados benéficos, essa parece ser uma conclusão segura; se dissermos que parece haver relação en­ tre um modelo de condicionamento e distúrbios psicológicos, isso também parece razoável em termos da prova existente. Talvez isso baste. Mas devemos sequer tentar impor a “ ver­ dade” da explicação que a terapia de comportamento dá para as origens, o desenvolvimento e a remoção da perturbação psicológica? Essa seria quase certamente uma tarefa inútil e ingrata. A ciência não depende, para seu progresso, da verdade fundamental e inalienável de suas teorias, sendo o objetivo simplesmente descobrir novos meios de organizar os fatos existentes e chegar a formulações que levem a predi­ ções verificáveis. Neste sentido muito há que dizer em favor da terapia de comportamento; desenvolveu-se um modelo com base em certos fatos, êsse modêlo levou à formulação de cer­ tos princípios terapêuticos e produziu certos resultados que estão de acôrdo com predições. Sem dúvida, alguns fatos não são explicados. Evidente­ mente tôdas as predições são confirmadas. Há muitas razões pelas quais isso poderia ter acontecido, entre elas estar erra­ do o modêlo. Se êste fôr o caso, teremos de abandonar o modêlo e precisaremos apresentar alternativa melhor. Nesses termos, a explicação de problemas humanos pelo condiciona­ mento não é sacrossanta — pode ser usada e abandonada quando e como necessário. Enquanto formos capazes de man­ ter uma atitude desprendida e cientifica quanto ao estudo e à aplicação da terapia de comportamento, poderemos ter cer­ teza de que tudo quanto tem valor neste tratamento se tor­ nará conhecido e tudo quanto é redundante será rejeitado.

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CAPÍTULO

XVII

As Razões Contra Terapia de Comportamento

A p a c i e n t e contempla uma fileira de pedaços de papel sôbre a mesa a sua frente. O pedaço marcado com o N.° 10 é poir ela considerado “ muito contaminado” ; êsse é o pedaço que estêve em contato direto com seus cabelos. O marcado com N .° 9 não é tão ruim — só tocou o N.° 10 e por isso está a um passo do contato direto com os cabelos. Quando che­ gamos ao pedaço N .° 1, a “ contaminação” é muito pequena, pois êle está a vários passos da fonte crucial de infecção. A princípio a paciente não consegue sequer tocar o pedaço de papel marcado com o N.° 1, mas com o passar do tempo pode ser induzida a tocar êsse e outros pedaços até, finalmen­ te, pôr a mão sôbre o pedaço N.° 1 0 , sem sentir-se excessiva­ mente ansiosa. Não pode, porém, tocar seus cabelos, pois isso evoca excessiva ansiedade e o “ exercício com papel” não a aproximou de um enfraquecimento da noção de seus cabe­ los estarem contaminados. Ela “ percebe” , naturalmente, que

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tôda noção de cabelos contaminados é absurda, mas, quando forçada, admite que àinda “ acredita’' ser verdadeira( * ) . Paradoxalmente, ela passa muitas horas por dia pentean­ do os cabelos. Como pode acontecer isso, se tocá-los cria an­ siedade tão intensa? A “ contaminação” impede que ela exe­ cute muitos de seus trabalhos domésticos, mas, em certas ocasiões, ela pode suspender suas “ crenças” patológicas por muitas horas seguidas. O ritual de lavar as mãos é fonte de grande dificuldade para ela — acha que precisa lavá-las vá­ rias centenas de vêzes quando entra em contato com um objeto “ contaminado” — no entanto êsse comportamento continua sem redução e até aumenta. Tais pacientes criam sérios problemas para o terapeuta de comportamento, não apenas do ponto de vista de tratamento, mas também do de oferecer explicação satisfatória do com­ portamento observado em termos da teoria de aprendizagem. Duas dificuldades principais são imediatamente evidentes. Primeiro, parece claro que as idéias da paciente a respeito de contaminação conflitam, em certos aspectos, com seu com­ portamento. Segundo, nenhum princípio simples de prazerdor, do tipo que caracteriza o modêlo de condicionamento operante, explica os numerosos paradoxos do funcionamento da paciente; seu comportamento parece tão complexo e va­ riado que não se pode facilmente compreender em têrmos de conseqüências diretas de recompensa/punição. De fato, quanto mais informação se colhe sobre seu com­ portamento, mais confuso se torna o quadro, e é aparente­ mente impossível encontrar um paradigma de teoria de aprendizagem que se ajuste bem. Mesmo quando, em base post hoc, se pode dar uma explicação adequada de seu com­ portamento em têrmos de aprendizagem/condicionamento, freqüentemente descobrimos que em alguma ocasião subse­ qüente o comportamento é oposto ao predito por nossa teoria. (* ) E, sem dúvida, pertinente indagar o que pode significar o termo "crença” em casos como êste. Para esta paciente a “crença” tem decerto imdicações comportamentais ( isto é, ela age como no seus oabolos fôssem onte de sujeira e doença), mas ela sabe, por meio d e considerações pura­ mente lógicas, que isso não pode ser verdade.

Í

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Isso pode atormentar muito o pesquisador — é como se a paciente estivesse disposta a sabotar a teoria ! ( * ) O que se disse demonstra fortemente que o modelo teórico empregado pelo terapeuta de comportamento não permite des­ crição plena e completa de comportamento anormal; algu­ mas observações parecem enquadrar-se, e outras não, nesse modelo. Naturalmente, poder-se-ia dizer que o terapeuta de comportamento não afirma que suas teorias explicam tôdas as anormalidades em todos os pacientes. Mas o fato é que a diferenciação entre as condições que são adequadamente tratadas e as que não o são nunca foi claramente feita pelo terapeuta de comportamento, exceto quanto à declaração de que essas terapias se aplicam a comportamento que foi apren­ dido. Existe aqui o evidente perigo de o argumento tornarse circular; o comportamento foi adquirido por meio de processos de condicionamento se reage favoravelmente ao tratamento, mas pode ser atribuído a outras influências se o paciente não se beneficia. Breger e McGaugh (1965) fize­ ram crítica semelhante à abordagem de terapia de compor­ tamento, sendo pertinente considerar outros pontos que eles acentuaram nesse sentido. Deve-se lembrar que, no capítulo anterior, se argumentou que uma extraordinária virtude reivindicada para a terapia de comportamento é sua posição científica. Isto é categori­ camente negado por Breger e McGauph, que afirmam discutí­ vel a “ respeitabilidade científica” dêsse tratamento. Acen­ tuam que Bandura (1961), descrevendo tratamento de des­ sensibilização, emprega as expressões “ estímulo fóbico” e “ reação de relaxação” , tão mal definidas e carentes de signi­ ficação precisa, que só têm ligação “ remotamente alegórica" com os mesmos termos usados em situação de laboratório. Sem dúvida, é claro que as palavras “ estímulo” e “ reação” descrevem acontecimentos relativamente precisos no labora­ tório e são usadas de maneira consideravelmente mais vaga na situação de terapia de comportamento. O mesmo argu­ mento se aplica ao emprêgo do têrmo “ condicionamento” ; (* ) Deve-se acentuar que, em vista de prova não apresentada aqui a hipótese de "sabotagem ” parece muito improvável.

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deve ser evidente que os rigorosos controles do laboratório pavloviano são muito diferentes da situação em que se pede a um paciente que expresse agressão esmurrando um tra­ vesseiro seguro pela enfermeira, O que o terapeuta de com­ portamento efetivamente faz parece derivar com mais fr e ­ qüência do “ associacionismo” primitivo do que do laboratório experimental pavloviano. Êsses críticos condenaram tam­ bém os apelos à “ moderna teoria de aprendizagem” , como se esta fornecesse um corpo de leis e princípios uniforme e ge­ ralmente aceitável. Acentua-se que na realidade existe con­ siderável desacôrdo entre teóricos de aprendizagem, centrali­ zado principalmente nas questões de processo cognitivo e na conveniência de um modelo de reforço (recompensa e punição). Parece haver pouca dúvida de que noções rudimentares de condicionamento são insuficientes para explicar comporta­ mento humano complexo. Como acentuado em capítulo an­ terior, a moderna teoria de aprendizagem achou necessário enfrentar o problema de comportamento complexo realçando a importância de acontecimentos internos e não observados. Não há dúvida também de que o comportamento nem sem­ pre é função das contingências de recompensa ou punição observáveis. Além disso, existe tendência, especialmente na aplicação de métodos operantes de terapia, para supor que aumento de responsividade é prova de que houve reforço po­ sitivo (recompensa), isto é, define-se reforço em têrmos de aumento de reações e não, como deveria ser, de determinadas condições de estimulo. A generalização pode também constituir problema ao tera­ peuta de comportamento. Como explicar a generalização ou extensão de um distúrbio, de atividade anormal solitária para numerosas outras, e como explicar o fenômeno da melhora geral que pode resultar da eliminação de uma única dificul­ dade isolada? Evidentemente, a menos que se esteja dispos­ to a dar ênfase a cognições, é difícil explicar a generaliza­ ção de “ ser derrubado por um automóvel” para “ ter mêdo de sair de casa sozinho” . Igualmente, relatos de “ pensa­ mentos” de pacientes feitos por terapeutas de comportamen­ to também parecem exigir explicação de espécie mais com­

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plicada do que a simples ligação entre certo estímulo e de­ terminada reação. Breger e McGaugh tomam um caso de Wolpe para ilustrar esse ponto. A paciente era uma 4 ovem e atraente mulher que se sentia infeliz em conseqüência do tratamento casual que recebia de seus amantes; tôdos os ro­ mances tinham o mesmo padrão conhecido, no qual ela se oferecia numa ‘‘baixela de prata” . Logo 0 homem passava a tratá-la com desprezo e a abandonava. Dizia-se que lhe faltava segurança, que era dependente e que dificilmente es­ tava livre de ansiedade e tensão. Breger e McGaugh argu­ mentam que êsse é um caso extremamente complicado, no qual as tentativas de lidar só com sintomas declarados de ansiedade e tensão evidentemente representam apenas uma parte pequena e provàvelmente secundária do quadro total. Em suma, Breger e McGaugh argumentam que teorias for­ mais de aprendizagem de estímulo-reação constituem base insubstancial para tratamento, contendo, como contêm, di­ ficuldades e discrepâncias de tôda espécie que obrigam os terapeutas de comportamento a subterfúgios, como o de cha­ mar respostas a “ tôda espécie de fantasia, imaginária ( * ) e processo de pensamento” , para enquadrá-los num modêlo de condicionamento. O modêlo alternativo que esses críticos apresentam é “ baseado na idéia fundamental de que aquilo que se aprende numa neurose é um conjunto de estratégias centrais. .. orientaria a adaptação do indivíduo a seu am­ biente” , Em outras palavras, é como se o indivíduo formu­ lasse uma espécie de teoria baseada em suas experiências, e seu comportamento fôsse determinado por essa teoria e não pelas próprias experiências específicas. Que vantagens te­ ria tal sistema? Uma vantagem, de acordo com Breger e McGaugh, é que qualquer substituição de sintoma (a substituição de um sin­ toma, que foi removido, por outro) poderia ser fàcilmente explicada como “ substituição de reação" — 0 paciente con­ tinua ainda usando a “ teoria" mesmo que sua expressão te­ nha sido bloqueada de alguma maneira. Em segundo lugar, (* ) Im aginária ( N . E d .).



semelhança

de

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estatuária)

pelo

inglês

imagery

oferece um meio para lidar com processos inconscientes (isto é, falta de percepção ou falta de “ insight” nos mecanismos de comportamento); não existe, argumenta-se, mais razão para supor que se teria noção das próprias estratégias do que para supor que se teria noção das regras de gramática ao falar e escrever. Além disso, evitaria o problema muito real de precisar oferecer uma experiência de aprendizagem específica para todo e qualquer sintoma do paciente — não precisamos mais depender de uma esperiência traumática singular para explicar a aquisição de uma fobia, por exemplo. E, finalmente, ficaríamos livres do problema de precisar pos­ tular duvidosos reforços para a persistência do comportamen­ to mal adaptativo. O modêlo para psicoterapia que B reger e McGaugh ba­ seiam em sua teoria de “ estratégia centrar’ não é diferente do método de invalidação sistemática exposto no Capítulo X V . Sugerem que as medidas preliminares devem envolver cuida­ doso estudo da “ linguagem neurótica” usada pelo indivíduo (com o que querem referir-se às estratégias e aos hábitos específicos mal adaptativos) e que o indivíduo deve ser de­ pois colocado em situações nas quais sua “ linguagem” não seja compreendida. Isso o obrigaria a adotar um nôvo con­ junto de “ estratégias centrais” (presumivelmente adaptativas). Êsses- comentários críticos feitos por Breger e McGaugh provocaram respostas em têrmos igualmente cáusticos dos fa ­ voráveis à abordagem de terapia de comportamento (Rachman e Eysenck, 1966; Wiest, 1967; Evans, 1967). Essas respostas poderiam ser brevemente resumidas da seguinte maneira: primeiro, existe franco reconhecimento de que as teorias e os princípios de aprendizagem não chegam a ofe­ recer plena e completa explicação do comportamento huma­ no; contudo, certos princípios receberam apreciável apoio ex­ perimental e parecem ser úteis na prática. Todos esperam ansiosamente, declara-se, o dia em que teremos algo melhor a oferecer, mas, por enquanto, precisamos contentar-nos com o melhor que temos. Essa parece ser uma resposta eminentemente razoável; nin­ guém cogitaria sèriamente de rejeitar teorias físicas inca-

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pazes de explicar todos os fenômenos naturais. Naturalmen­ te, devemos estar preparados para abandonar teorias e prin­ cípios que deixem completamente de ser úteis, mas, por outro lado, uma teoria que possa proporcionar algumas predições úteis é melhor do que nenhuma. Existe também pronto reconhecimento de que temos a nossa disposição uma escolha de alternativas teóricas e conceituais, sendo algumas delas de caráter mais “ cognitivo” (isto é, acentuando as qualidades “ pensante” , “ intencional” , “ ponde­ rada” e “ planejada” do comportamento). Todavia, acentuase que os modelos ou sistemas que usarmos ou aplicarmos em terapia deverão depender não tanto de alguma concepção ideal, quanto do que efetivamente se considerar útil. Assim, ar­ gumentar contra o ponto de vista de B reger e McGaugh equi­ vale a dizer que “ embora saibamos que as pessoas pensam, só temos teorias adequadas a respeito de comportamento de­ clarado, de modo que veremos apenas até onde podemos ir empregando essas teorias” . É duvidoso que nesse sentido a reformulação de Breger e McGaugh em têrmos de “ estraté­ gias centrais” seja de maior valor do que as atuais teorias, principalmente porque a atual terapia de comportamento é apoiada por número consideràvelmente maior de provas ex­ perimentais e conhecimento de resultados práticos, enquanto as noções de “ estratégias centrais” são reconhecidamente . .conjeturas fragmentárias iniciais e podem estar erradas.” Seria, naturalmente, errôneo abandonar técnicas de razoá­ vel, embora limitada, validade, a fim de perseguir linhas te­ rapêuticas baseadas em conjeturas. Por outro lado, deve-se admitir que as evidentes deficiências dos modelos mais con­ vencionais de teoria de aprendizagem como completas expla­ nações de comportamento nos levam a procurar alhures, pa­ recendo a ênfase dada por Breger e McGaugh a um modêlo de “ pensamento” constituir lugar razoável onde começar a procurar. Contudo, a crítica de que “ aquilo que a terapia de compor­ tamento faz não é o que prega” , não é convenientemante tra­ tada. Pelas freqüentes referências feitas neste livro, é bas­ tante claro que ainda prevalece a afirmação de Breger e

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McGaugh, segundo a qual grande parte do que acontece em terapia de comportamento não pode considerar-se derivada de princípios da teoria de aprendizagem. Uma coisa é ar­ gumentar que princípios de teoria de aprendizagem têm mui­ to a recomendá-los como base de um sistema terapêutico, e outra, completamente diversa, é dizer que esses tratamentos (como atualmente aplicados) derivam diretamente daqueles princípios e os utilizam. Como vimos, há uma ênfase reco­ nhecidamente forte na alteração do pensamento do paciente nos preliminares do tratamento (e provàvelmente também durante a te ra p ia ); existe acentuado sabor post hoc nas ex­ plicações, baseadas em condicionamento, dos motivos pelos quaia os pacientes se comportam da maneira como o fazem e pelos quais o tratamento foi bem sucedido; existem muitos exemplos de uma espécie de filosofia caseira por trás do tratamento, em lugar de rigorosas e precisas deduções de princípios teóricos. Vejamos um relato de caso que parece conter falhas da espécie mencionada. Apresentou-se a paciente neste estudo (Walton e Black, 1906) sofrendo de afonia histérica crônica — “ incapacidade" de falar' em resultado de causas psicoló­ gicas e não físicas. Seu problema existia desde cêrca de sete anos antes e numerosos tratamentos e hospitalizações não haviam conseguido a menor melhora; na opinião do últi­ mo especialista que a examinara, a paciente “ não voltaria a falar” , embora não descobrisse anormalidade física alguma. O tratamento baseou-se numa espécie de modelo de práti­ ca negativa (ver Capítulo X ) do tipo usado por Yates. Re­ sumidamente, consistia em dizer à paciente que sua voz ne­ cessitava de “ exercício sistemático” para o que ela precisa­ ria ler (ou tentar ler) um livro interessante por períodos de 15 minutos cada vez. Se o volume de sua voz não apresenta­ va aumento de uma sessão para outra, aumentava-se o tem­ po dedicado à tentativa de le r ; por outro lado, quando havia aumento no volume, reduzia-se a sessão de treinamento. A r ­ gumentou-se que qualquer tentativa de usar a voz produzia fadiga e que qualquer esforço associado a êsse estado viria a ser inibido permanentemente, o que, de acordo com Walton e Black, levaria à eliminação do comportamento afônico.

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Primeiro, notemos não existir, no tratamento teoricamen­ te derivado apresentado por êsses autores, a menor razão para que a paciente voltasse a falar. Há melhores razões para supor que a inibição se ligaria a vocalização de qualquer es­ pécie e não a certos misteriosos hábitos de “ antivocalização” . Segundo, é evidente que a motivação foi importante — de­ ram-lhe um livro “ interessante” para ler — e que existiu sugestão, pela explicação dada à paciente de que o “ exercício sistemático” era a única atividade necessária. Além disso, quando a paciente chegou a um plano estável em seu índice de melhora, explicaram-lhe que o sintoma provàvelmente “ satisfazia uma necessidade" em condições de “ stress” . Com efeito, temos aqui um exemplo da aplicação dúbia da teoria, que parece permitir deduções absolutamente opostas às apre­ sentadas pelos terapeutas, assim como do emprêgo de suges­ tão e “ insight” de maneira descontrolada. Chamar êste estu­ do de exercício na aplicação de moderna teoria de aprendi­ zagem faz levantar sérias dúvidas sôbre outras investigações nas quais se pretendem aplicar os mesmos princípios e con­ ceitos. Poder o processo (assim como os ótimos resultados) ser muito melhor explicado por algum outro conjunto de princípios de aprendizagem (por exemplo, condicionamento operante) pouco contribui para eliminar as graves restrições que poderiam fazer-se a algumas aplicações da moderna teo­ ria de aprendizagem. Exemplos desta espécie não são incomuns, embora se deva dizer que a maioria dos estudos é menos passível de crítica do tipo apresentado. Quando ocorrem (muito freqüentemen­ te acompanhados por espantoso índice dc sucesso), criam-se novos problemas para o terapeuta de comportamento. Êle precisa então descobrir por que um tratamento que, por acaso ou desígnio, está em conflito com sua teoria pode produzir os mesmos resultados que haveria se o tratamento fosse ine­ quivocamente derivado da teoria. Relacionada com o problema do “ que acontece” em terapia de comportamento está a diferenciação de Wolpe entre o que chama de “ medos basicamente objetivos” (por exemplo, me­ do da morte, do desconhecido ou de “ perder o juízo” ) e medos neuróticos. Está implícito que os primeiros podem ser pron-

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tamente tratados por meio de reafirmação e explicação, en­ quanto os últimos não podem. Diferenciar assim sem mais explicação é claramente insatisfatório e, além disso, não pa­ rece inteiramente razoável presumir que medidas simples dis­ sipem “ idéias ansiosas". De fato, o próprio Wolpe, em outros contextos, aponta a importância do que êle chajna de “ reações simbólicas verdadeiras” . Num dêsses casos, descobriu que o desejo que a paciente tinha de escapar a uma relação opres­ siva com seu marjdo parecia relacionado com seu medo de ser “ fechada” . Poder-se-ia também dizer que a natureza complexa do tratamento é às vêzes revelada inadvertidamen­ te pelos casos citados em apoio da terapia de comportamento. Por exemplo, Wolpe menciona o caso de um homem tratado durante um período de três anos por causa de seu mêdo de serpentes inofensivas (que presumivelmente não teria pro­ babilidade de encontrar). Tal tenacidade de propósito parece sugerir que o tratamento ofereceu mais do que a oportunida­ de de livrar-se de um mêdo que dificilmente teria probabili­ dade de ser evocado. A argumentação contra a terapia de comportamento po­ deria também incluir crítica às demonstrações práticas de eficácia que vêm aparecendo. Poder-se-ia alegar, por exem­ plo, que só em têrmos de resultados obtidos com pacientes normais houve alguma demonstração realmente positiva de eficácia; quando submetidas ao mesmo teste as fobias de pa­ cientes neuróticos, o resultado não é tão animador. Além disso, poder-se-ia dizer que, no caso de condições psicológi­ cas anormais, só existe prova para uma escala de problemas muito limitada, principalmente fobias. A prova permite que nos juntemos a Rachman e Eysenck na conclusão de que “ . . . convence a todos, salvo os mais parciais trabalhadores, serem os métodos de terapia de comportamento de fato e fi­ cazes na modificação de comportamento neurótico” ? Talvez êsses autores tenham em mente prova indicativa de que algumas perturbações neuróticas parecem ceder a terapias de comportamento de uma ou outra espécie. Nesse sentido, con­ cordaríamos com sua conclusão. O crítico implacável da terapia de comportamento poderia, porém, prosseguir acentuando que os resultados obtidos com

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o emprêgo dessas formas de tratamento são simplesmente produtos de avaliação inexperiente. Existe uma tendência compreensível (embora não desculpável) de superestimar o sucesso de uma forma de terapia em que se tenha fé no mo­ mento; a história da Psiquiatria e da Medicina geral está repleta de curas “ bem sucedidas” que não resistiram a cui­ dadoso exame. Será realístico basear a aceitação de uma terapia na divisão, pelo avaliador presumivelmente parcial, dos pacientes em categorias de “ curados” , “ muito melhora­ dos” e “ não beneficiados” ? Grande parte da prova em favor da terapia de comportamento é dêsse caráter, sendo notável que sempre que se fêz avaliação mais refinada, a tendência se mostrou menos decisiva a favor desses tratamentos. Não são necessários apenas maior objetividade e refina­ mento de medição na avaliação dos resultados de tratamen­ tos; a quantificação segura é também necessária em nume­ rosos outros aspectos da terapia de comportamento. Para ter um exemplo disso, podemos considerar a teoria de ini­ bição recíproca de Wolpe, na qual.se argumenta que a rea­ ção de ansiedade deve ser bloqueada pela experiência de al­ guma reação incompatível, como relaxação ou prazer. De acordo com a teoria, isso significa que, se uma situação evoca 20 unidades de ansiedade, precisamos utilizar pelo menos 21 unidades de relaxação ou prazer para inibir reciprocamente a ansiedade. A questão é que nunca se fêz a menor tentati­ va séria de medir as forças relativas dessas reações; presu­ me-se, a partir dessas reações do paciente, que haja diferen­ ças de uma ou outra espécie. Êsse argumento um tanto cir­ cular é evidentemente muito insatisfatório, mas é difícil, ao pesquisador, avaliar êsses estados de maneira adequada e quantitativa — não existem técnicas fàcilmente acessíveis para fazê-lo, mesmo que acreditemos em alguma dúbia arit­ mética que permita comparar forças relativas de estados de sentimento. A afirmação de Wolpe, de que a supressão de ansiedade não precisa ser completa, mas apenas parcial, não facilita o pro­ blema. Em primeiro lugar, poder-se-ia argumentar que essa admissão mina o princípio fundamental de inibição recíproca (pelo menos em seu sentido original). Em segundo lugar,

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se apenas parcialmente suprimimos a ansiedade (como acon­ tece na maioria dos casos), por que não se fortalece a rela­ ção ou associação entre aquela ansiedade e algum estímulo? Em qualquer caso, existe algum limite ao grau de supressão parcial necessário — e poderia êsse limite ser medido, mes­ mo que conhecido? Não existem respostas para essas per­ guntas. O crítico poderia também exigir explicação para a freqüen­ te necessidade de “ mudanças” nas técnicas de tratamento. Por que acontece isso se todas elas se baseiam num modêlo de condicionamento? Certamente as técnicas diferentes são simples meios alternativos de empregar os mesmos princí­ pios básicos e, portanto, deveriam produzir os mesmos resul­ tados, talvez com algumas diferenças na eficácia. É claro, porém, que em certos casos uma técnica não produziu resul­ tados, tornando-se necessário procurar uma alternativa que produzisse. Isso não lança dúvida sôbre a suposição de que tais terapias partilham uma base comum, e o elemento de “ mergulho ao acaso” na procura entre terapias alternativas não mina a alegada precisão e rigor dos tratamentos? E também, como explicar à ausência de mais paciente^ mos­ trando indícios de aprendizagem discriminativa em condições de treinamento aversivo? Sem dúvida ratos e outros ani­ mais (assim como meninos pequenos) demonstraram capaci­ dade de distinguir entre as condições em que se aplicará pu­ nição e aquelas em que assim não acontecerá. Por que o al­ coólatra ou homossexual aparentemente não consegue discri­ minar entre o que acontece na sessão de tratamento e no mundo real? Precisamos supor que o grosso dos pacientes “ toma a decisão” ou “ mostra a determinação” de vencer seus problemas? Em caso afirmativo, isso não parece envolver mais do que condicionamento direto? Essas são apenas algumas das numerosas críticas que se podem fazer à teoria e à prática da terapia de comportamen­ to; outras foram mencionadas em capítulos anteriores. A pergunta que devemos formular é se êsses argumentos são suficientemente fortes para superar quaisquer das considera­ ções positivas apresentadas. Tôda resposta a esta pergunta deve, a esta altura, ser qualificada. Existe pouca dúvida de

276

que precisaremos vencer muitas dificuldades antes que pos­ samos declarar com confiança que a terapia de comportamen­ to tem papel importante no tratamento de anormalidade psi­ cológicas. Por outro lado, no contexto de muitos tratamen­ tos inadequados, parece que a terapia de comportamento ofe­ rece considerável promessa; até que ponto, dependerá do re­ sultado de futura pesquisa e desenvolvimento.

277

CAPÍTULO

XVIII

Através do Espelho

E x is t e compreensível tendência, especialmente em exposições populares de tratamentos psicológicos, a pintar um quadro algo otimista dos resultados obtidos. A fervorosa esperança de Stafford-Clark de que “ . . . um dia a psicoterapia dessa limitada mas inestimável espécie poderá estar à disposição de todos quantos dela precisarem” parece sugerir um grau de confiança nos bènefícios dêsses métodos, que vai além da prova existente. Sua opinião de que psicoterapia e psicaná­ lise . .baseiam-se em diversas hipóteses que podemos con­ siderar muito bem estabelecidas” parece também em desacor­ do com a dura evidência. Opiniões não podem ser e não de­ vem servir de adequados substitutivos aos fatos, É razoável argumentar que devemos basear nossas conclusões, sobre a relevância e importância de um tratamento, na espécie de prova que consideraríamos necessária para escolher um auto­ móvel — não opiniões, mas cifras referentes a desempenho.

O fato é que existem tais estatísticas a respeito de auto­ móveis, mas não a respeito de pessoas em tratamento. Mais ominosamente, quando existe alguma prova para considerar.

278

a Q».adro não é inteiramente côr-de-rosa. Como vimos em capítulos anteriores, os méritos da psicoterapia não foram ainda estabelecidos e dificilmente se poderia dizer quç. essa terapia produz resultados melhores que os obtidos sem a apli­ cação de qualquer tratamento formal. Se este é de fato um reflexo da situação, poderíamos concordar com a aparente disposição de Stafford-Clark, de dedicar um décimo do tempo gasto em treinamento médico ao ensino de psicoterapia? Na­ turalmente a prova publicada talvez não ofereça um quadro sólido do verdadeiro estado de coisas, sendo bem possível que a psicoterapia tenha muita coisa a oferecer como método para aliviar o sofrimento em doenças neuróticas e outras espécies de doenças psicológicas. Contudo, o ônus da prova recai diretamente sôbre os próprios psicoterapeutas. Em contraste, os terapeutas de comportamento parecem ter-se preocupado muito mais com os problemas de demons­ trar a validade de seus métodos de tratamento. Nesse aspec­ to a energia e o entusiasmo que dedicaram à tarefa foram extraordinários, especialmente quando se considera a histó­ ria relativamente curta das próprias técnicas de tratamento. Tem havido evidente disposição de submeter a terapia de com­ portamento a importantes provas, inclusive a uma análise dos elementos ativos e redundantes que possam estar envolvidos, e a comparações com formas alternativas de tratamento. Não se fêz a menor tentativa de cercar de mistério os métodos da terapia de comportamento e não houve a menor insistên­ cia (como parece haver freqüentemente na psicanálise) na necessidade de preceder de doutrinação a compreensão das técnicas empregadas. Deve-se atribuir aos terapeutas de comportamento pleno crédito pelo vigor que deram ao exame de seus próprios pro­ cessos e, em vista disso, seria menos que justo atribuir excessivo pêso às numerosas críticas que possam fazer-se. Os próprios terapeutas de comportamento mostram-se muitas vêzes cônscios das deficiências de seus métodos e, dispondo de tempo, certamente introduzirão consideráveis melhora~ mentos e refinamentos em seus processos atualmente pouco refinados. De fato, um exame da literatura indica que a te­ rapia de comportamento não se tornou um corpo cristalizado

279

e estático de tratamentos, mas está constantemente sob exa­ me e em mudança. Contudo, a causa a favor da terapia de comportamento, como aquela em favor da psicoterapia, não foi estabelecida além de tôda dúvida razoável. O futuro bem poderá mostrar que elementos de ambas as espécies de tratamento são dignos de preservação e que os melhores resultados se obtêm quan­ do ambos se combinam num único regime de tratamento. Na­ turalmente, fazer tal afirmação não determina que ela se transforme em realidade, e tanto os terapeutas de comporta­ mento como os psicoterapeutas precisam trabalhar àrduamente para demonstrar de maneira clara e inequívoca o valor e a contribuição de seus métodos. Isto provàvelmente só será conseguido pelo trabalho conjunto de representantes dessas duas formas de tratamento, em atmosfera de tolerân­ cia e respeito mútuos, na qual se ponham de lado o precon­ ceito e as alegações especiais, no esforço comum de desco­ brir soluções para problemas importantes. Neste sentido, talvez seja pertinente observar que as críticas de natureza mais séria feitas por êsses “ campos” de terapia rival repre­ sentam obstáculos menores a uma aproximação do que as ale­ gações exageradas feitas ocasionalmente. Por exemplo, a acusação de que a terapia de comportamento descura dos processos de pensamento parece menos prejudicial do que as extravagantes alegações que os protagonistas dessa forma de tratamento tendem às vêzes a fazer. Críticas podem muitas vêzes ser incentivo para experimentar o que tem valor, en­ quanto cega insistência em que só existe uma verdade apenas pode levar a desilusão e rejeição final. Sem dúvida, a tera­ pia de comportamento parece encerrar muita promessa, a tal ponto que grave desserviço se prestaria com exageradas ale­ gações sôbre seu valor. Qual é, então, a tarefa que o tera­ peuta de comportamento precisa enfrentar? Em primeiro lugar, é essencial que mantenha e desenvolva, quando necessário, seu papel como cientista aplicado. Em parte isso implica a necessidade de realçar uma abordagem crítica de suas próprias teorias e tratamentos, de modo que esteja constantemente fazendo perguntas sôbre seu malogro em proporcionar ajuda, em vez de procurar prova que con-

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firm e um ponto de vista existente. Implica também em con­ tínua busca de conhecimento mais extenso e minucioso sôbre os processos que vem empregando, acompanhada por insis­ tência na rejeição de todos os aspectos da terapia que não possam corresponder aos mais rigorosos critérios de eficácia. Para êsse fim parece que a terapia de comportamento pre­ cisa forjar elos mais estreitos com as teorias e experiências de aprendizagem, das quais sustenta derivar. No momento, êsses tratamentos parecem envolver apenas as mais toscas noções de “ associacionismo” e reforço, enquanto os vastos recursos inexplorados da psicologia acadêmica aguardam ain­ da exploração no campo aplicado. É notável que, embora fre ­ qüentemente haja da parte de terapeutas de comportamento, insistência quanto à posse de adequado lastro de princípios da teoria de aprendizagem, as aptidões básicas geralmente exi­ gidas por essas formas de tratamento pouco reclamam no sentido de conhecimento especializado. Em certo sentido, isso é muito bom, pois sugere que o treinamento de terapeutas de comportamento não será necessariamente árduo e longo. Por outro lado, também indica o estádio algo primitivo de desenvolvimento dessas técnicas e acentua a necessidade de aumentar ràpidamente o refinamento. Poder-se-ia esperar que um problema, o do malogro em obter resultado favorável em muitos casos, diminuiria. até certo ponto com maior refinamento dos processos terapêuti­ cos. Os terapeutas de comportamento devem, portanto, de­ dicar suas energias a minucioso estudo da massa de experi­ mentação e teoria referente a funções de aprendizagem, e dela extrair tudo quanto possa ter valor. Só então estaremos em condições de examinar a mais plena contribuição que a terapia de comportamento pode prestar ao tratamento de perturbações psicológicas. Muitos dêsses dados básicos referem-se naturalmente a análise e explicação de comportamento declarado e obser­ vável, parecendo inevitável que se evidenciem lacunas em nosso conhecimento do comportamento interno. A terapia de comportamento precisará conciliar-se com processos cogniti­ vos e pensantes, de um modo ou outro, pois parece que, se assim não se fizer, só seremos capazes de oferecer uma ex19

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plicação parcial de anormalidades psicológicas. Isso não pre­ cisará implicar qualquer sacrifício da atitude científica ou do rigor experimental, pois existe trabalho excelente e rele­ vante no terreno cognitivo. Se o “ insight” parece ser prérequisito importante de mudança, por exemplo, será de con­ siderável interesse a descrição de trabalhos experimentais na resolução de problemas e da natureza da informação que a realização dessas experiências poderá revelar. Pelo menos precisamos evitar a cilada de presumir que a reorientação mental de pacientes com perturbações psicológicas exige ape­ nas atenção rápida e superficial. Se a simples reafirmação e a sugestão fôssem as únicas providências necessárias, essa seria uma descoberta importante, embora surpreendente. O necessário, porém, é completa e perfeita investigação de todos os aspectos da terapia de comportamento, inclusive as tenta­ tivas grosseiras de produzir mudança cognitiva. Existem naturalmente muitos “ subproblemas” que exigirão cuidadosa atenção em estudos futuros, inclusive um relato das várias perturbações que podem ser tratadas pela terapia de comportamento, a influência da personalidade do terapeuta, a importância da relação pessoal no tratamento, o valor de drogas como meio de reduzir a ansiedade ou aumentar a “ condicionabilidade” e assim por diante. Muitos dêsses pro­ blemas foram mencionados em capítulos anteriores. As ques­ tões principais e óbvias são, porém, puramente técnicas: quem vai realizar essa pesquisa necessária, onde será ela realizada e quanto tempo levará a obtenção de soluções satisfatórias? Considerando-se a magnitude dos problemas das anorma­ lidades psicológicas, o volume de tempo de pesquisa e dinhei­ ro que existe é lamentàvelmente pequeno. As investigações sôbre terapia de comportamento são, no momento, fragmentá­ rias, em pequena escala e com escopo inevitavelmente estrei­ to, e, pelo que se pode ver, continuarão assim dentro da estru­ tura existente de prioridades sociais. A perspectiva é som­ bria e ainda mais frustradora quando se considera que um único centro de pesquisa, com pequeno quadro de investiga­ dores experimentais, poderia promover importantes progres­ sos na compreensão e no tratamento das perturbações psico­ lógicas em poucos anos.

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Sobre o Autor H a r o l d R e g i n a l d B e e c h é professor de Psico­ logia no Instituto de Psiquiatria da Universi­ dade de Londres. Nascido em 1925, em Don­ caster, Yorkshire, estudou na Escola Secundária de Mexborough e na Universidade de Durham, diplomando-se em Psicologia no University College, em Londres, e conquistando o título de Doutor em Filosofia no Instituto de Psiquiatria, para o qual entrou em 1953. Em suas pesqui­ sas, interessa-se por perturbações obsessivas e aplicações da terapia de comportamento a dis­ túrbios neuróticos. Colaborou em várias revis­ tas e livros sôbre diversos assuntos no campo da psicologia anormal. É co-autor de Research and Experiment in Stuttering (1968). 0 dr. Beech, que vive atualmente em Kent, Inglaterra, é casado e tem dois filhos.

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Biblioteca PSICO LO G IA E EDUCAÇÃO -

70 -

Volumes publicados:

31. 32. 33. 34. 35. 36. 37. 38. 39.

Idéias Para Vencer Psicoterapia de Grupo História da Psiquiatria

40. 41.

Formação de Líderes

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42.

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43. 44. 45.

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A Saúde Mental da Criança A N ova Juventude Liberdade no Lar E ros e Tânatos — 0 Hom em Contra Si Próprio A Cura Pela Liberdade A m or Contra o Ódio Liberdade na Escola

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Liberdade , Escola , A m or e Juventude

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55.

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Im p re ss o em 1976, pelo m étod o o ffse t, com film e s fo rn e cid o s pelo E d ito r, n a s o fic in a s KM P R E S A G R A F IC A T>A R F JV IS T A D O S T R I B U N A I S S. A. R u a C onde de S a rz e d a s, 38 — T e l. 33-4181/2/3 ( P B X ) 01512 — S a o P a u lo , S .P ., B r a s il para

IB R A S A — In s titu iç ã o B ra -sIIejra de D ifu sã o C u ltu ral S.A . R u a M a jo r Q uedlnho, 300 — T e l. 34->2i632 O .F .P . OlOSO — sao P a u lo , S .P ., B r a s il

Na M esma Coleção:

Fato e Ficção na Psicologia H. J. E y s e n c k

No mesmo estilo, claro e incisivo, d«5 Usos e Abusos da Psicologia, também pu­ blicado pela IBRASA, um dos mais conhe­ cidos psicólogos ingleses analisa neste outro livro fatos essenciais reativos à personali­ dade normal e patológica, aplicação de tra­ tamento especial para as neuroses, assim como formas graves de alcoolismo, compor­ tamento dos criminosos, Além de mostrar muitos fatos verdadeiros, o autor revela muitos enganos que não raro se cometem em nome da Psicologia. O dr. H. J. Eysenck diplomou-se em psico­ logia na Universidade de Londres, após experiência escolar e universitária na Ale­ manha, França e Inglaterra. Trabalhou como psicólogo durante a II Guerra Mun­ dial no Mill Hill Emergency Hospital, foi nomeado professor de Psicologia' na Uni­ versidade de Londres e Diretor do Depar­ tamento Psicológico do Instituto de Psiquia­ tria (Hospitais de Maudsley e Bethlem Royal). Lecionou em muitos países, tendo sido Pro­ fessor Visitante nas Universidades de Pensílvânia e Califórnia. Conhecido principal­ mente por suas pesquisas experimentais no campo da personalidade, escreveu cérca de trezentos artigos em revistas técnicas assim como vários livros, entre os quais “Dimen­ sões da Personalidade”, “A Psicologia da Política", “A Dinâmica da Ansiedade e da Histeria”, “Senso e Contra-Senso na Psico­ logia”, “Verifique Seu Próprio Q I” e “Usos e Abusos da Psicologia”. Compilou recen­ temente um “Manual de Psicologia Anor­ mal”. dois volumes sôbre "Experiências com a Personalidade”, “Experiências com Dro­ gas” e “Terapia do Comportamento e Neu­ roses”. É redator-chefe da revista “Pesqui­ sas do Comportamento e Terapia". Reco­ menda o mais alto rigor científico na realização de experiências psicológicas, não poupando críticas a muito pensamento va­ go atualmente sob o rótulo ae “psicologia”.

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