Luciano Pereira Da Silva - A Astronomia Dos Lusíadas.pdf

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Luciano A. Pereira da Silva Professor da Universidade de Coimbra

A ASTRONOMIA DOS

LUSÍADAS

COIMBRA IMPRENSA DA UNIVERSIDADE

1915

Separata da Revista da Universidade de Coimbra. Vol. lí-iv

ÍNDICE GERAL

Páginas

ix-xv

Prefácio]

Gap.

I

Gap.

II

— Camões apreciado por Alexandre de Humboldt

3-5

— o «Tratado da Sphera» de Pedro Nunes 1.

O

7-18

Tratado da Sphera, traduzido por Pedro Nunes para iniciação na sciência astronómica

De Sphaera

7-8

8-10

de Sacrobosco

2.

Fontes da obra

3.

As Teoricae novae planetarum de Purbáchio.

Trechos

da tradução da Teórica do Sol por Pedro Nunes.

Gap.

III

—O

10-16

4.

Obras de Pedro Nunes.

5.

A Margarita

são

triplo

Es-

céu e orbe

fera,

Necessidade da sua reimpres16-18

.

Philosophica

18

movimento da oitava esfera

19-2

2.

movimento do céu estrelado no Tratado da O 5/?/ier<2 de Pedro Nunes Explicação deste triplo movimento nas Teóricas de Pur-

3.

O mesmo movimento

1.

triplo

,

-^1-23

báchio

resumido no Reportório dos tempos

de André do Avelar 4. 5.

.

O mesmo triplo movimento nos O triplo movimento, de rotação

.

—Âs

23-26 26-28

Lusíadas diurna, precessão e nu-

tação da Terra

Gap. IV

19-21

28

29-37

estrelas 1.

Estrelas fixas e erráticas.

2.

Nascimento

O

Sol considerado

estrela de luz própria e

ocaso das estrelas

como

única

29-35

35-37

qA astronomia dos Lusíadas

VI

Páginas

Gap.

V—A

esfera

As

^9-47

definições da esfera, segundo Euclides e Teodósio,

Canto

A Gap.

VI

no

X

39-41

esfera, símbolo da Divindade

41-47

— A grande máquina do mundo 1.

Evolução das

2.

O

leis

49-70

astronómicas até à

da gravitação

lei

de Newton

5.

As onze esferas da região etérea Gomposição das esferas planetárias A região elemental. Os quatro elementos

6.

A

3.

4.

Gap.

Vil— o

49-52

globo de Tétis, transunto reduzido do Universo

71-74

74-80 80-83 '

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

.

;

.

.'

.•

;

'.,

2.

A

.

...

climas

.^..

.

.

'

.,

.,.

......

altura do polo

^

'

,

.

.

.

.

.

.

.

.

»v;,

.

7

..

;

.

.

,

.

.

Gruzeiro-do Sul.

.

.

.

.

r.

.

.

.

.

103-107

.

109-148

.

.

.

X—A

12-123

.

123-127

dia

....

127-129 129-136

136-148

...

.

.

.

.

.

149-174

149-171

antárticos frios e os ardores equatoriais.

em Dante e Gamões máquina do mundo

.

.

.

.

.

.

:

.

.

.

3.

As observações astronómicas matutinas na

'

171-174

175-226

....

2.

.

.

'

A O

.

duplo movimento da oitava esfera

175-181

181-19^

do

ilha

Purgatório 4.

109-112 1

Origem portuguesa desta conste-

astronomia 1.

98-103

.

lação

Gap,

95-98

..

.

astrolábio plano dos gregos

— Novo céu ... 2.

87-93

,

...

....

O

.

;

.

6.

.

.•

.

.,...;

Regimento da altura do polo ao meio

.

;

.\

5.

Os

83-86

93-95

estações,

Regimento da Estrela do Norte

O

...-'.

cinco zonas

4.

1.

.

.

86-87

signos do zodíaco

O astrolábio náutico. A pesagem do Sol

3.

.

.

horas

— o astrolábio 1.

IX

66-68

68-70

71-107

Influição de signos ede^ estrelas

Gap.

....

zodíaco

As Os As As Os

-

57-63

63-66

situação geográfica de Portugal

O dia O mês O ano O tempo

Gap. VIII

52-57

.

193-196

As observações astronómicas vespertinas

.

...

5.

O

catálogo de Ptolomeu

6.

A

hipótese do Gruzeiro do Sul::

7.

A

hipótese da Ara, segundo Rizzacasa

.

.

.

.

.

.

.

.

.

196-199 199-203

204-215

.

..

.

.

.

.

21 5-221

índice gefal

vii

Páginas 8. 9.

A A

hipótese da Ara, segundo Angelitti

.

.

.

*

.

hipótese de serem fictícias as quatro chiare stelle e as três facelle

10.

221-222

Conclusão.

tuguesa do Cruzeiro do Sul

índice remissivo das estâncias comentadas

Colocação das estampas

222-225

Súmula da demonstração da origem por225-226

227-228

229

PREFACIO

Quanto mais

se

estudam os Lusíadas, mais evidente

se torna a

verdade com que o poeta, ao terminar o último canto, diz:

Nem me falta na vida honesto estudo Com longa esperiencia misturado, Nem engenho, que aqui vereis presente, Cousas que juntas se achão raramente.

Com

A

efeito,

ele aliava

ao seu engenho poético

este respeito emite o escritor inglês sr.

recente e a propósito da estada de

opinião

Camões em Coimbra,

num

livro

a seguinte

parte dos poemas, mais tarde escritos, foram compostos

longe de bibliotecas,

numa época em que

um

des; apesar disso, ele mostra e mitologia clássicas,

da

literatura^ de Portugal,

*

vasto saber.

^:

«A maior

iri

um

K. G. Jayne,

história,

Espanha

«Most of the poems written

os livros

eram preciosida-

completo conhecimento da literatura

da geografia, da astronomia, e ItáHa.

later in his life

A

e

sua familiaridade

were composéd

far

from

das

com

libraries,

an age when books were luxuries yet he shows an intimate knowledge of classical ;

literature

and mythology, of history, geography, ástronomy and of the literatures

of Portugal, Spain and

Italy.

His familiarity with at least nineteen Greek and Latin

some of them must have been read in the origThis learning must have been acquired at Coimbra; it is a testimonial not only to his diligence and power of memory, but equally to the thoroughness with which Coimbra had realised the ideais of Human-

authprs has been demonstrated, and inal, as

ism».

they had never been translated.

K. G. Jayne, Fj5go da

pág. 253.

Gama and

his successors^ 1460-1580,

London,

1910,

!;

qA astronomia dos Lusíadas

X

dezanove autores gregos alguns deles

devem

testemunho não só do seu estudo

da perfeição

O e

no

original, pois

não tinham nunca

Este saber deve ter sido adquirido

sido traduzidos. é

pelo menos, está demonstrada; e

e latinos,

ter sido lidos

com que Coimbra

e

realizara os ideais do

nosso estudo mostra que Camões tinha

um

pecial, pois o

do campo Elegia

é

e

Humanismo».

conhecimento claro

seguro dos princípios fundamentais da astronomia,

fessava no seu tempo.

em Coimbra,

da sua memória, mas também

como

Ele tinha até por esta sciência

ela se pro-

um

gosto es-

que sobretudo inveja aos que gozam a vida tranquila

poderem

dedicar-se à astronomia,

como manifesta na

III 1:

Ditoso seja aquelle que alcançou

Poder viver na doce companhia

Das mansas ovelhinhas que criou Este

bem

facilmente alcançaria

As causas naturaes de toda cousa

Gomo

se gera a

chuva e neve

Os trabalhos do

E

sol,

fria:

que não repousa

•,

porque nos dá a lua a luz alhêa,

Se tolher-nos de Phebo os raios ousa:

E como tão depressa o Ceo rodêa; E como hum só os outros traz comsigo; E se he benigna ou dura Gytherêa.

Bem mal pode entender isto que digo, Quem ha de andar seguindo o fero Marte, Que sempre os olhos traz em seu perigo.

O

livro de iniciação

na sciência astronómica era, no seu tempo, a

Sphaera de Sacrobosco, de que corriam várias edições latinas comentadas. O Tratado da Sphera- de Pedro Nunes, publicado em i537,

contêm

a

Não era porém a priOs manuais náuticos, chamados

tradução portuguesa desta obra.

meira vez que ela era traduzida.

Regimentos, que usavam os nossos marinheiros, eram acompanhados dum Tratado da spera do mundo, que era a obra de Sacrobosco,

como

vertida para português,

1

e i54)

Éa

Elegia que começa

também nos

se vê

no Regimento da Biblioteca de

«O poeta Simonides

referimos.

fallando», a que adiante (págs, i53

Prefácio

Munich

e

*

se limitou

xi

no Regimento da Biblioteca de Évora,

porem as

em

Pedro Nunes não

Acrescentou ao texto original anota-

a traduzir.

ções que o modificam

Camões são

As

vários pontos.

ideias astronómicas de

do texto de Sacrobosco, com as modificações contidas

Assim o Tratado da Sphera deste

nas notas de Pedro Nunes. tre

'

ilus-

matemático pode considerar-se a principal fonte astronómica dos

Lusíadas.

Se a Sphaera era o

livro destinado aos

que queriam abordar o

es-

tudo da astronomia, os Reportórios dos tempos dirigiam-se ao grande público, que neles encontrava os dados astronómicos necessários à

vida prática e as tão apreciadas indicações de astrologia judiciária

sobre as várias influências de signos e planetas.

O

Reportório dos

tempos de Valentim Fernandes, cuja publicação começou pelo ano de i5i8 era

e

que parece

bem

ter sido a primeira

A

conhecido do poeta,

obra portuguesa deste género,

Chronographia o reportório de

tiempos de Jerónimo Chaves começou a publicar-se

O

1548.

em

Reportório dos tempos de André do Avelar

à morte de Camões, mas

em

Sevilha

los

em

é já posterior

grande parte tradução do

livro

de

Chaves.

As lar,

ideias fundamentais astronómicas expostas nesta obra por

bem como

as que se

nada ao ensino

conteem na sua Sphaerae

universitário, são as

o sistema astronómico do poema Universidade

e

o

mesmo que

é

desti-

iitriíisque,

mesmas dos Lusíadas.

Ave-

Assim

o que Pedro Nunes professava na

aqui continuou depois professando

André

do Avelar.

Não há que nico, cuja obra

1543,

A

censurar o poeta por não seguir o sistema de Copér-

De

repolutionibiis

orbium

coelestiiim foi publicada

em

doutrina copernicana, longe de ser logo aceite, foi até ao fim

do século XVI objecto de grande discussão. Só no século xvii ela foi definitivamente adoptada depois que Galileu inventou a luneta, com a qual se viram as fases de Vénus, os satélites de Júpiter

e as

man-

chas do Sol, que tornaram manifesto o movimento de rotação do globo solar.

Não

se pode exigir de

Camões o que não

fez o célebre mate-

mático Pedro Nunes, que, conhecendo a teoria de Copérnico, continuou seguindo a de Ptolomeu,

* Regimento do estrolabio e do quadrante. Tractado da spera do mundo. Reproduction fac-símilé du seul exemplaire connu appartenant à la Bibliothèque royale

de Munich. Munich, Gari Kuhn, desta formosa reprodução.

1914,

Deve-se ao

sr.

Joaquim Bensaúde a

iniciativa

qA astronomia dos Liísíadas

XII

Nem

podem

se

como

aceitar apreciações

a de Oliveira Martins

que, depois de transcrever as estâncias X, 8i e

«Mas é,

se a

cosmographia

é phantastica, a

por via de regra, verdadeira»

A cosmografia lomeu não que

foi

21, diz:

geographia pelo contrario

*.

dos Lusíadas não

uma pura

I,

fantasia, foi

A

é fantástica.

uma

doutrina de Pto-

verdadeira teoria scientífica,

admiravelmente aos cálculos astronómicos

se prestava

e se

man-

emquanto esteve de acordo com os resultados da observação. foi abandonada. Tal é o destino das teorias scientíficas, que,

teve

Depois

sendo simples resumos dos factos observados, se vão modificando

com

o aperfeiçoamento dos meios de observação

novos e

factos.

E

Newton marcam

E

mica.

e

o conhecimento de

assim que os nomes de Ptolomeu, Copérnico, Kepler as transformações sucessivas da sciência astronó-

continuar-se-há,

sem que, nos

séculos futuros, as nossas teo-

de agora possam ser classificadas de fantásticas.

rias

A

astronomia

dos Lusíadas representa a sciência do tempo, que Camões adquiriu

com o As

seu «honesto estudo». indicações astronómicas são sempre feitas pelo poeta

forma bela

e concisa, e

com

perfeito rigor.

E

numa

notável, sob este triplo

aspecto, a primeira parte de V, 24:

Mas

ja

o Planeta que no ceo primeiro

Habita, cinco vezes apressada,

Agora meyo Mostrara,

rosto, agora inteiro

em quãto

o

mar cortava

a

armada.

Acabamos por averiguar que Camões exprime este facto verdadeiro: nos quatro meses, decorridos entre a partida de Lisboa e a chegada à Angra de Esta passagem nunca

foi

devidamente explicada.

Santa Helena, cinco vezes a lua passara de quarto crescente a lua Folheando as cheia, como explicamos no Cap. vii (págs. 74 a 80). páginas do lunário contido no Almanach perpetimm de Zacuto, obra

famosa impressa

em

Leiria

em

na tábua relativa ao ano de 1497 É a informação assim colhida. pela verdade e

1496, o poeta fixou a sua atenção e

exprimiu naqueles quatro versos

um

exemplo notável do seu amor do interesse que os fenómenos celestes lhe mere-

ciam.

1

Oliveira Martins,

1891, pág. 235.

Camões, os Lusíadas

e a

Renascença em Portugal, Porto,

Prefácio

xiii

investigações que fizemos a propósito de V, 14:

As

Ia descuberto

tínhamos diante

La no novo Hemispério nova estrella Não vista de outra gente, que ignorante Algús tempos esteve incerta

delia,

levaram-nos ao reconhecimento da origem portuguesa do Cruzeiro do Sul, que

deixamos demonstrada nos Capp. ix

e x.

A descoberta

desta

constelação e do seu uso náutico revela o saber dos nossos marinhei-

Camões

ros.

enaltece este honroso facto, que importa tornar

bem

co-

nhecido.

Julgamos que deixa completamente esclarecidas todas as passagens astronómicas do poema este nosso trabalho, para o qual serviu de incentivo entendermos que os Lusíadas

devem

tados para o ensino da cosmografia nos liceus.

No

também

ser aprovei-

nosso curso de

«Mecânica celeste» da Universidade, que começamos pela história das sucessivas teorias astronómicas até ao aparecimento da

de Nev^ton,

lei

costumamos ler, a propósito do sistema de Ptolomeu, a bela descrição da máquina do mundo do canto X. Assim, em vez de fatigarmos os

com uma árida exposição de excêntricos e epiciclos, os conservamos atentos com prazer e vivamente interessados, sob a influência da arte admirável com que o poeta resume a concepção ptolomaica. discípulos

Analogamente

«O

se

pode proceder nos

zodíaco», se mostra

No

liceus.

como nos Lusíadas

todos os factos fundamentais da astronomia.

Gap.

vii,

intitulado

encontram descritos

se

As

diferentes noções

elementares desta sciência poderão ser introduzidas a propósito da leitura das estâncias

dade dos alunos,

que a

ellas se

eles aceitarão

com

referem.

Despertada a

curiosi-

A

leitura,

prazer a explicação.

por exemplo, da estância V, 24, atrás citada,

é excelente

ocasião para

a explicação das fases da lua.

E

Camões segue a doutrina de Ptolomeu e poema não pode já servir para auxiliar o estudo da

natural objectar-se que

por isso o seu

A objecção não tem valor. Os pedagogistas modernos entendem que o aluno tem de percorrer, nas suas linhas gerais, o

cosmografia.

mesmo caminho que sciência.

Em

a

humanidade seguiu na elaboração de qualquer

vez de ser

um

recipiente passivo de teorias já feitas,

levado a tomar uma atitude de investigador activo, inteem bem observar os fenómenos e formular êle próprio as leis naturais. É o processo de redescoberta. Assim, na astronomia, a

deve

êle ser

ressado

observação directa dos fenómenos celestes levá-lo-há primeiro à con-

cepção ptolomaica. mente.

A

concepção copernicana virá depois natural-

Qá astronomia dos Lusíadas

XIV

O

método de investigação

desperta

rio»

meios

*.

um

chamado «método de

directa,

laborató-

interesse e entusiasmo difíceis de obter por outros

Para o seu emprego não

nido de bons telescópios.

Basta

Gomeça-se por observações à

vista

um

necessário

é

um

observatório

mu-

lugar de vistas desobstruídas.

desarmada,

com

feitas

instrumentos

elementares, construídos na localidade ou nas oficinas do estabeleci-

mento de ensino,

se as há.

Por

viii,

isso

no Gap.

astrolábios de

O

astrolábio está naturalmente indicado.

págg. 124 e 126, explicamos a construção dos

Os problemas que navegadores são um bom exercício. Os alunos

madeira que iam nas nossas naus.

preocuparam os nossos

Assim aprendem

fazem, a princípio, observações simples.

colhem,

em

primeira mão,

um bom

a ver, e

cabedal de conhecimentos astro-

nómicos, que lhes revela os princípios fundamentais do movimento dos astros.

E

a leitura das passagens astronómicas do nosso

cional constituirá

O

um

poema

do volume, alem de

útil

uma

para consultas, fornece

O

canto

V

o que contêm o

é

na-

ensino assim conduzido.

hidice remissivo das estâncias comentadas, que se junta no

nómica dos Lusíadas. 22,

num

forte estímulo,

firn

estatística astro-

número máximo^

com 19. No Gama: a armada

de estâncias comentadas, seguindo-se o canto X,

V

canto

descreve-se a maior parte da viagem do

vai de Lisboa à ilha de S. Tiago, passa o equador, toca na

Santa Helena, dobra o Gabo, surge

em Moçambique.

Angra de

Tão

extensa

navegação explica o maior número de observações astronómicas deste

O

mínimo pertence ao canto IX, que não chega a aparecer no índice; nele tem lugar a chegada à Ilha dos Amores, e as ninfas fizeram esquecer os astros. Em compensação o canto X adquire, com a descrição da máquina do mundo por Tétis, uma grande importância astronómica. Os cantos I, II, III e VI concorrem com 9 esNo tâncias cada um, os cantos IV e VIII com 4 e o VII com 3. poema há mais referências astronómicas, de que nos não ocupamos, canto.

por dispensarem comentário.

Gomeçámos

a publicar a

Universidade de Coimbra,

1

número de

«The laboratory method of instructíon

astronomical teachers that there a

Astronomia dos Lusíadas na Revista da i.°

is

little

is

191 3.

growing

Tendo conversado

in favor so rapidiy

occasion for any plea in

its

behalf.

with It is

recognized fact that lhe direct investigation of celestial phenomena gives a vivid-

ness and reality to the subject and arouses interest and enthusiasm difficult to obtain by any other means.

and provide no means

Indeed, to require the study of the heavenly bodies

for observing

them

is

somewhat like restricting the student Mary Byrd, Á laboratory man-

of botany to text-books and to pictures of plants». ual in astronomy, Boston, 1899.

Prefácio

em

xv

'

setembro de 191 2, na praia de Ancora, com o

Rodrigues acerca de leituras que a incitou-nos ele a

amor

começarmos

tal

respeito

a publicação.

E

sr. Dr. José Maria andávamos fazendo,

com

depois,

pelo poeta que tão notavelmente se tem revelado

em

aquele

trabalhos

da importância das Fontes dos Lusíadas, acompanhou-nos sempre com os seus conselhos e indicações.

O

sr.

da língua

Dr. Gonçalves Guimarães, latina,

tigável, gosta

prestou-nos

um

com o

seu profundo conhecimento

auxílio precioso.

Trabalhador

sempre de ajudar, com o seu muito saber, os que

infa-

tra-

balham.

O

sr.

Frederico

Oom,

Sub-director do Observatório Astronómico

de Lisboa, que à sua grande competência de astrónomo reúne

um

vivo entusiasmo por Camões, prestou-nos da melhor vontade, sempre

que a

Ao

êle

recorremos, o seu valioso concurso.

nosso querido mestre

e

eminente matemático

sr.

Dr.

Gomes

Teixeira também temos que agradecer o interesse com que acompanhou a publicação do nosso trabalho, chamando-nos a atenção para

os estudos do Prof. Angelitti sobre a astronomia do Dante. Feito a par

dum

serviço universitário muito intenso, não pode dei-

xar de ter este trabalho faltas

e

incorrecções que muito agradeceremos

sempre que nos sejam indicadas.

A ASTRONOMIA DOS LUSÍADAS

Ves aqui Etérea,

a grande

&

Assi foy do saber

Que

lie

Quem Globo,

sem

cerca

&

machina do mundo,

elemenlal, que fabricada alto,

principio,

em

&

profundo,

& meta

limitada,

derredor este rotundo

sua superíicia tam limada,

He Deos, mas o que he Deos ningué o entende, Que a tanto o engenho humano não se estéde. Os Lusíadas, canto X, estância

8o.

:

Camões apreciado por Alexandre de Humboldt

O 1769

grande naturalista alemão Alexandre de Humboldt, nascido

em

em

Berlim, onde morreu

em

1869, publicou, nos últimos anos

da sua vida, a célebre obra Kosmos, formoso quadro de todo o

mundo

físico,

turais e

fruto

do seu profundo conhecimento das sciências na-

da sua vasta erudição

de estudo

literária,

adquiridos

nas suas conhecidas viagens.

e

subordinados ao

do homem —

^,

título

— Reflexo

No

do mundo

cujo assunto é «o sentimento

numa

longa vida

primeiro dos capítulos

exterioí"

na imaginação

da natureza nas diferentes

épocas e nos diferentes povos», ocupa-se dos Lusíadas.

A

crítica

que faz do talento de Gamões para descrever a natureza, que vou tentar traduzir, socorrendo-me o

do poeta,

é

mais possível dos próprios versos

como segue

«Aquela pecuHar concepção da Natureza, que tem a sua origem na própria observação, brilha, no mais alto grau, na grande epopeia na-

como que um aroma de

cional

da literatura portuguesa.

flores

da índia através de todo o poema, escrito sob o céu dos

picos,

na gruta de Macau

e

Respira-se

nas ilhas Molucas.

tró-

Não me compete

confirmar a ousada opinião de Frederico Schlegel, segundo a qual

Camões «excedem muito Ariosto em colorido e riqueza de imaginação» como observador, porem, da Natureza, posso os Lusíadas de

;

acrecentar que, nas partes descritivas dos Lusíadas, nunca a inspi-

ração do poeta, o ornato da linguagem ou os suaves acentos de me-

lancoHa prejudicam a precisão na pintura dos fenómenos físicos; antes,

como sucede sempre que

a arte brota de fonte pura,

realçam

a viva impressão de grandeza e verdade dos quadros da Natureza.

São inimitáveis

em Gamões

as descrições da eterna correlação entre

qA astronomia dos Lusíadas

4 Céu

e

Mar, entre as nuvens multiformes, os seus processas metereo-

lógicos e os diferentes estados da superfície do superfície

esta

Oceano.

Mostra-nos

ora quando brandos ventos a enrugam

as curtas

e

ondas brilham, espelhando os raios de luz que nelas brincam; ora

quando os navios de Coelho pestade, lutam tido próprio

com

Paulo da Gama,

numa temerosa Camões

os elementos desencadeados.

do termo,

um

combateu no sopé do Atlas e

e

Como

grande pintor marítimo.

em

observou nas costas da índia

e

no sen-

guerreiro,

no mar Vermelho

terras de Marrocos,

no Golfo Pérsico; duas vezes dobrou o Cabo;

é,

tem-

e,

durante i6 anos,

da China, com o profundo sentimento

da Natureza de que era dotado, todos os fenómenos do Oceano. Descreve o eléctrico fogo de Santelmo (Castor

Pólux dos antigos

e

marinheiros gregos) «o lume viuo, que a marítima gente tem por santo»; descreve a ameaçadora tromba

um

«leuantarse no ar

em

seu desenvolvimento sucessivo: vê

&

vaporzinho

sutil

fumo», «e do vento trazido,

rodear-se», donde desce o delgado cano que se vai acrecentando e se alarga

vem

quando «os golpes grandes de agoa em

si

chupaua»; a nu-

negra, que sobre ele se espessa, despois que de todo se fartou

O

pé que tem no mar a

E

pello ceo

si

recolhe,

chouendo em fim voou

Porque coa agoa a jacente agoa molhe:

Aas ondas torna

Mas

as

ondas que tomou:

o sabor do sal lhe

tira,

&

tolhe.

«Vejão agora os sábios na escriptura», diz o poeta

bando quási Natura»,

gão por



até dos

di-lo

modernos tempos) «que segredos sam

que, guiados «so por puro engenho

falsos,

*(e

&

zom-

estes de

por ciência»,

«jul-

ou mal entendidos» os casos que contam os rudos marinheiros

Que tem por mestra

«Mas O

a longa experiência.

do inspirado poeta para descrever a Natureza não se manifesta só nos fe*nómenos isolados; brilha igualmente quando talento

abrange grandes massas

duma

vez.

O

terceiro canto desenha,

poucos traços, a configuração da Europa desde as regiões mais

do norte até ao reino Lusitano

e

em

frias

ao Estreito que «se ennobrece co

extremo trabalho do Thebano». civilização dos

Faz constante alusão aos costumes e povos que habitam esta tão recortada parte do mundo.

Da Moscóvia, do Império da Alemanha Reno

e «outras varias

nações que o

frio laua», passa rapidamente para os deliciosos

Hélade: «que criastes os peitos eloquentes,

e os juízos

campos de de alta fan-

Cap. I

No décimo

tasia».

Gama

a

mundo

uma

— Camões apreciado por oAlexandre de Humholdt

e

um

canto alargam-se os horizontes.

monte para

alto

Tétis conduz o

desvendar os segredos da machina do

lhe

o curso dos planetas (segundo o sistema de Ptolomeu).

como

visão no estilo de Dante; e

movimento, expõe por

fim,

trata já de descrever só a

do mundo

e

É

de todo o

é o centro

quanto se

terrestre,

Não

das suas produções.

se

Europa, como no canto terceiro; todas as

são passadas

Cruz

terras de Santa

Terra

a

na descrição do globo

sabia dos países então descobertos

partes

5

em

revista,

sendo até nomeadas as

(Brasil) e as costas descobertas

por Magalhães,

porem não na lealdade». «no feito com «Se louvei Gamões principalmente como pintor marítimo foi para significar que a vida terrestre o tinha atraído menos intensamente. Já Sismondi nota, com razão, que o poema inteiro não contêm vestígio verdade português,

de qualquer observação sobre a vegetação tropical e o seu aspecto

São apenas mencionados os perfumes e produtos comerciais úteis. O episódio da ilha encantada oferece sem dúvida a fisionómico.

mais deliciosa pintura duma paisagem; mas a vegetação

como

exige

uma

Ilha de

é

formada,

Vénus, de «mirtos, cidreiras, limões odorí-

feros e romãs»: tudo próprio

do clima da Europa do

sul.

No maior

dos navegadores marítimos de então, Gristóvão Golombo, encontramos

mais gosto pelos bosques das costas, mais interesse pelas formas do reino vegetal;

mas Golombo

escreve

um

roteiro, e nota nele

as im-

pressões vivas de cada dia, emquanto que a epopeia de Gamões glorifica

onde,

Pedir às línguas dos

os grandes feitos dos portugueses.

genas nomes de plantas

como sobre um fundo de quadro,

indí-

na descrição duma paisagem

e introduzi-los

se

movessem

os personagens,

pouco podia tentar o poeta habituado a sons harmoniosos». Eis o que diz Humboldt.

Esta opinião, de tão eminente autori-

dade, traduzida do alemão para português por

melhor do que nós, devia

ler-se,

quem

o saiba fazer

desacompanhada de comentários, em

todas as edições escolares dos Lusíadas.

A

descrição da grande máquina do

mundo,

a

que Humboldt chama

visão no estilo de Dante, aludindo, naturalmente à subida do poeta

com

Beatriz, no Paraíso, através dos nove céus, é o trecho astronómico

mais importante dos Lusíadas. ferências a factos astronómicos

Mas por

todo o

poema há muitas

sempre sob uma forma bela

re-

e precisa.

JTO^Í!^^

iRatado Da fpbera coinai£beciíc3DoSo!ioa ií.ua.^bop:imeiroííuroDa

^

Geograpbiaoecíwdio Pto iomeo iflerãdrino. £íradoa nc»iamcn uuvatim cmlingosgcm pÊiioS>oiíro2 Pero JSun^CofmograpbooslRef oô

íoão bo tcrccf K) ocfte nome noíTò se nbo:.e acrecérados wmuírss annota ções

-z

figuras

perqucimfsfmlm&m

fepodcm entender. C^temooustratâdos qo iriefiiio dou os quacsfe x^craráo todas as pjíndpaes to: fc5 fob:ea.c.a.rtSí»cimrear.Êm

Dunidasoanauegaçáo.cóasiáuoasDo inouiinentçjoofolnfua oechnação. So R.egiméto òa altura afíiaojímm^micc

ítionosoutrostempos

COM

PREVILEGI

Z'íííísmM!y^'^^íe:^;é?;í:-'^m^^^f:ji^^'.^Mr^^^^

Frontispício do Tratado da Sphera, tirado do exemplar existente na Biblioteca Nacional de Lisboa.

Dimensões do

original,

sem margens:

o'",255

Xo'",i69

o

Para bem

I.

das,

se interpretarem os trechos astronómicos dos' Lusía-

eram

preciso ver quais

é

em

Tratado da Sphera de Pedro Nunes

as ideias fundamentais da astronomia

Portugal no século xvi.

No tempo

de Camões

i525?-

(n.

— m.

i58o) a grande autoridade

na sciência astronómica era o professor da Universidade Pedro Nunes, cujas obras lhe

em

Sal

niiis é

deram reputação europeia.

nome

i5o2, o seu

latino era Petrus

o título do capítulo que

de r astronomie

dii

moyen

Sobre as épocas

Machado na

em

Delambre

Nascido

Nonius

em

Alcácer do

Salaciensis.

lhe consagra

A^o-

na sua Histoire

âge.

que leu na Universidade, diz Diogo Barbosa

Biblioteca Lusitana:

«A

perspicácia do juizo, e a

madu-

reza do talento lhe facilitarão a compreensão das sciências aplicando-se

na Universidade de Lisboa às Faculdades de Filosofia

e

Medicina,

e,

recebendo nesta as insígnias Doutorais, ditou aquela pelo espaço de

em

três

anos que finalizarão

cias

aprendeu as disciplinas Matemáticas

fessor,

o de i533.

Ambicioso de novas

em

sciên-

que saiu consumado pro-

sendo o primeiro mestre que ditou Matemáticas

em

a Univer-

sidade de Coimbra, de que se lhe passou provisão da Cadeira a i6

de Outubro de 1644, e nela jubilou a 4 de Fevereiro de 1562».

Dentre as obras de Pedro Nunes, o Tratado da Sphera, publicado

em

iSSy, ano da transferência da Universidade de Lisboa para

bra, era naturalmente o livro lido pelas pessoas que a astronomia

mesmo

diz

como

parte integrante

Coim-

queriam conhecer

duma boa educação

geral.

Ele

na dedicatória ao infante D. Luis:

Vendo eu que ho tratado da sphera: & Theorica do sol & da Lua: com ho primeiro liuro da Geographia de Ptolomeu: sam aquelles «...

.

qA asironomia dos Lusíadas

(V

em Cosmographia deseja Por nam carecerem disso os que nam sabem latim

princípios que deue ter qualquer pessoa que

saber algfia cousa.

ho

em

tirey

nosso lingoagem.

Acrecentei-lhe alguas anotações p^ra

que mays facilmente se podessem entender. tratados que

compus sobre

Puslhe ao cabo

&

a Carta de marear:

hias

ho regimeto da

porque não sou tam confiado de minhas cousas que cresse

altura:

que per

as

si

quereriam ver:

&

jndo nesta cõpanhia algúa hora per

acerto se abrira ho liuro nelles».

No

Capitulo

iiij

— Dos

Bosco, a respeito do

«

.

.

&

circulos

das causas dos eclipses do Sol

&

mouimentos dos Planetas:

da Lua

movimento do



,

lê-se

&

no texto de Sacro-

sol:

Assi que destes dous mouimentos resulta ho seu mouimento

.

no circulo dos signos de Ocidente pêra Oriente pello qual anda todo

em trezentos & sesenta & cinco dias: & quasi hum dia porque lhe falece húa cousa pequena que

o circulo dos signos a quarta parte de

não he sensiuel

.

Pedro Nunes

«Não posso

.

.

faz, à

margem,

a seguinte anotação:

crer q este autor ignorasse quãto vay nisto que ele

diz ser insensiuel.

A

»

Mas

fala c6 principiai esy).

Sphaera de Sacrobosco

nos estudos astronómicos.

era,

no século

o livro de iniciação

xvi,

Camões, que tão bem sabia os princípios

fundamentais da astronomia, não podia deixar de conhecer o Tratado

da Sphera do nosso célebre cosmógrafo

Este livro

e professor.

foi

pois, naturalmente, lido pelo poeta; o certo é que as ideias funda-

mentais nele expendidas são as que se encontram no poema.

Para

se

compreender a importância deste interessante

livro, pre-

cisamos conhecer, ainda que rapidamente, a sua origem.

2.

O

renascimento da astronomia na Europa resultou do conhe-

cimento das obras dos árabes que, desde o século

ix,

vinham sendo

os cultores da sciência dos astros.

Foi Almamon, califa de Bagdad desde 814 a 833, traduzir,

quem mandou

do grego para árabe, a Grande Sintaxe Matemática de

Ptolomeu, único dos astrónomos da antiguidade cujas obras chegaram até nós.

O

próprio

Desde então

Almamon

a obra é conhecida pelo

nome de Almagesto.

fez observações astronómicas,

obliquidade da ecHptica, que achou

ser de 23°33'.

determinando a

Cap. II

O

—O

Tratado da Sphera de T^edro U^iines

g

astrónomo árabe Albaténio vivia pelo ano de 88o.

célebre

Este príncipe compôs tábuas astronómicas, referidas ao meridiano de Aracta, para substituir as de Ptolomeu.

tronomia cujo

título

na tradução

é,

Scientia Stellarum.

e

em

um

tratado de as-

— Mahometis Albatenii de

Hiparco (i6o antes de Cristo), comparando

suas observações da Espiga da Virgem século antes,

Escreveu

latina:

com

as que Timócatis fizera,

Alexandria, viu que as estrelas

mudavam

as

um

de posição

em

pareciam avançar lentamente de ocidente para oriente

relação

aos pontos equinociais, descobrindo assim o movimento de precessão

dos equinócios, que teve o

era de

nome de movimento dos auges

Segundo Ptolomeu (140 depois de

fixas.

i

grau

em cem

anos.

sessenta anos e quatro meses.

Cristo),

e

das estrelas

este

movimento

Albaténio achou que era de

grau

i

em

A obliqíiidade da eclíptica era, segundo

Albaténio, de 23^35'.

O

astrónomo Alfragano, que parece

ano de 950, adquiriu celebridade com os seus Elementos de astronomia, de que se fizeram

três traduções

O

latinas.

ter vivido pelo

título

em

da obra,

latim,

é:

Muhamedis Alfragani Arabis chronologica et astronómica Elementa. Segundo o comentador Christmann, Alfragano não fez mais do que copiar Ptolomeu e Albaténio.

O

astrónomo Thebit ben Chora

dação, que

foi

é o autor

da hipótese da trepi-

adoptada durante muito tempo, influindo nas tábuas

astronómicas até Tycho-Brahe.

qúidade da eclíptica

e

a

Para explicar a variação na

obli-

desigualdade no movimento das estrelas

fixas relativamente aos equinócios,

das antigas observações, imaginou,

que

ele

em

deduzia da comparação

cada equinócio,

um

círculo

cujo raio era de 4°i8'43''; o ponto equinocial verdadeiro estava na

circunferência deste pequeno círculo, percorrendo-o

com movimento

uniforme; deste movimento de trepidação ou de acesso resultava que as estrelas pareciam dente,

por

com

ser,

aparece

velocidades desiguais.

ir

A

recesso,

hipótese da trepidação acaba

mais tarde, abandonada, mas

com

e

ora para oriente ora para oci-

o movimento de niitação,

uma

hipótese semelhante re-

descoberto por Bradley

em

1728.

Esta hipótese da trepidação da esfera das estrelas por Pedro Nunes no seu opúsculo tationes.

É

— In

fixas é tratada

theoricas G. Piirbachii anno-

objecto da última anotação, intitulada: «De

motu octauae

sphaerae, secundum Thebit».

renovamento dos estudos astronómicos começa na Europa com a tradução do Almagesto, mandada fazer, em i23o, do árabe para A versão directa do grego para latim, pelo imperador Frederico II.

O

latim só foi feita no século xv, por Trapezuntius.

IO

astronomia dos Lusíadas

^li

A

Sp}iaei\2

de Sacrobosco

mais antiga das obras de astronomia

é a

produzidas na Europa, que chegaram até nós. era

um

nome

frade inglês, nascido

em

João de Sacrobosco

Halifax ou Holiwood, donde o seu

Tendo

Joannes de Sacro Bosco ou de Sacro Busto.

latino

es-

tudado na Universidade de Oxford, veio para Paris, atraído pela fama

da sua Universidade,

em

rendo

Ptolomeu

1256.

e aí

e as Matemáticas, morresumo do Almagesto de

ensinou a Filosofia

Sacrobosco compôs

um

dos Elementos de astronomia de Alfragano, que intitulou

e

De Sphaera.

uma

Este livro adquiriu

tal

celebridade que, durante

trezentos anos, não se conheceu outro nas escolas.

em Veneza em

primeira vez

O

De Sphaera

tratado

em liiigoagem

Foi impresso pela

1497.

de Sacrobosco

pelo doutor Pedro

foi

tirado noiwnente do latim

Nunes em

Já havia outras

1537.

Existe na biblioteca de Évora

um

Spera do mfido tirada de latim em lifigoage português.

O

traduções portuguesas.

Bensaúde descobriu outra, mais

Mas

está tratando de publicar.

antiga, na biblioteca de a

Entre elas ha

uma

sr.

margem

texto,

Joaquim

Munich, que.

versão de Pedro Nunes

tada de anotações que se lêem na

completando ou corrigindo o

Tratado da

acrecen-

é

das páginas, explicando,

segundo as ideias do seu tempo.

bastante extensa «sobre as derradeiras palauras do

Capitulo dos Climas^^. nas quais Sacrobosco afirma que a largura dos

aproximam do polo. Como todos vinham repetindo, desde Ptolomeu, esta asserção sem a

climas deminue à medida que se os autores

provarem. Pedro Nunes traduzida para latim

Sphaera.

Na

faz a sua

veio

e

demonstração.

acompanhando

biblioteca da Universidade há

Esta anotação

um

exemplar da

Joannis de Sacro Bosco Emeudata, Lutetiae, i557», onde essa anotação

trema verba

com

o título:

((

Sphaera

se encontra

uPetri Nonii Salaciensis Annotatio in ex-

capitis de Climatibus. Elia A^ineto interprete», tendo

fim esta nota:

foi

várias edições latinas da

no

«^'ernaculo sermone scripsit hoc Nonius. id est. His-

pano Portogallico». Pelo tempo

3.

rei

em

de Castela, reunia

que Sacrobosco ensinava

em Toledo

tempo, cristãos, mouros

e judeus,

Tábuas Afonsinas, publicadas em rei Afonso, o sábio, começaram a Ordeu,

em

i8()3.

Os

em

Paris,

Afonso X,

os astrónomos mais hábeis do seu

de cujos trabalhos resultaram as i252.

Os

livros

ser publicados

magníficos in-fólios teem por

Rey D, Alfonso X de y comentados por Dou Manuel Rico y

astronómicos do

em Madrid, título:

de Real

Libros dei

saber de astronomia dei

Çastilla^ copilados, ano-

tados

Sinobas.

Foi

em

1460 que apareceram as Teóricas dos planetas de Pur-

BACHio, livro famoso que teve

um

sucesso igual à Esfera de Sacro-

Cap. II

—O

Tratado da Sphera de ^edro V^ines

da Áustria

e

1423

Peurbach, nos confins

em

A

Régio ou Regiomontanus.

Viena de Áus-

sucessor o célebre astrónomo JoÂo

e

MíiLLER, de Koenigsberg,' donde o seu

são as

em

da Baviera, ensinou as Matemáticas

onde teve por discípulo

tria,

em

Jorge Purbáchio, nascido

bosco.

nome

latino

Joannes de Monte

obra mais considerável de Purbáchio Theoricae nouae planetariim, onde

Teóricas dos planetas,

tentou corrigir Ptolomeu e os astrónomos de Afonso X.

seguem

pela teórica do Sol, a que se

netas superiores, de triplo fixas,

Vénus

Começa

as teóricas da Lua, dos três pla-

de Mercúrio; termina

e

ii

com

o estudo do

movimento da oitava esfera, onde estão situadas as estrelas também chamada Firmamento. Purbáchio retoma a opinião

da solidez dos céus, rejeitada por Ptolomeu. Esta obra de Purbáchio teve o

sendo muitas vezes reproduzida

mesmo

comentada.

e

com

dores distingue-se Pedro Nunes,

destino da de Sacrobosco,

Entre os comenta-

o seu opúsculo

— In

theoricas

G. Purhachii annotationes aliquot, publicadas, segundo Diogo Bar-

em

bosa,

Coimbra,

Universidade

em

1546.

A

edição existente na Biblioteca da

de iSyS, juntamente

é

tione nauigandi.

Depois de fazer

um

com

diz

Delambre, a respeito de Pedro Nunes:

les

commentateurs de Purbach,

«Malgré ces inexactitudes peu importantes, plus soigneux;

du moyen

il

De Arte

a obra:

resumo de todo

il

atque ra-

este comentário,

est encore de tous

celui qui etait le plus

géomètre

est aussi le plus instructif» (Histoire de

et le

Vastronomie

âge, Paris, 18 19, pág. 280).

As Teóricas de Purbáchio foram consideradas como uma

conti-

nuação da Esfera de Sacrobosco, preparando para o estudo dos livros de

uma

como

Tem

Ptolomeu.

No

Observatqrio Astronómico de Coimbra existe

em Veneza em iSig, damos uma reprodução.

edição das duas obras conjuntas, publicada se vê

na última página, de que adeante

no frontespício o

Sphaera Mundt, que

título

se repete,

mais des-

envolvidamente, no alto da primeira página:

«Sphaerae mvndi gompendivm foeliciter inchoat. Nouitiis adolescentibus: ad

dam additum tígio

impetrantibus

:

astronomicam rempublicam capessen-

pro breui rectoque tramite a vulgari ves-

semoto: loannis de sacro busto sphaericum opusculum vna

additionibus nonnuUis littera

Contraque Cremonensia

ín

A

sparsim vbi intersertae

cum

sint signatis.

planetarum theoricas deliramenta loannis

quam vtiHs: Nec non eorundem motus planetarum accuratissimae

de monte régio disputationes tam acuratissimae Georgii purbachii:

in

•theoricae: dicatum opus

vtili serie

contextum: fausto sidere inchoat».

di astronomia dos Lusíadas

12

As com o

começam no

Teóricas, última parte do livro,

verso da folha 3o

Thcoricac noiíae planetarum Georgii Piirbachii astro-

título:

nomi celebrai issinii.

Pedro Nunes

faz

uma

Em

cousa semelhante.

continuação do Tra-

tado da Sphera, traduz as Teóricas de Purbáchio,

duas primeiras,

do Sol

a teórica

mas

limita-se às

da Lua, naturalmente por julgar

e a

em cosmographia deseja Transcrevemos o começo da teórica do sol

para «qualquer pessoa que

isso suficiente

saber alguma cousa».

A palavra

para se fazer ideia da constituição dos céus dos planetas.

auge indica «o ponto no ecentrico que mais o auge do sol é o seu apogeu, o ponto

da

em

se

achega ao firmameto»

que mais se afasta do centro

no fac-simile, que damos junto, da primeira

terra. Veja-se a figura

página da Teórica do Sol

e

da Lua, onde

Do

se lê

Sol

«A esphera do sol he composta de três particulares ceos: sam per tal arte situados: que a face de fora do mais alto concêntrica ao mundo: mas a face de dentro he ecentrica.

os quaes deles he

O

mais

baixo ceo delles he pello contrairo: porque a face de fora que he a

&

conuexa he ecentrica:

Mas

a cõcoua que he a de dentro he concétrica.

&

o terceiro ceo jaz antre estes dous:

partes se achega ao concauo do mais alto:

&

uexo do debayxo.

ho seu conuexo per todas

&

ho seu concauo ao con-

do meo per ambas suas faces

assi fica este ceo

ecentrico K

«Chamasse concêntrico ao mundo aquelle ceo que te ho mesmo mundo: & ecétrico cujo centro he fora do centro do mudo.

centro q o

«Portanto os dous primeiros ceos: parte

E

concêntricos.

sam

&

ecentricos:

porq com seu mouimento leuã o auge. do

parte

sol:

cha-

mãse deferentes do auge do sol: mas pore o terceiro ceo he de todo ecentrico: & porque mouendose leua consigo ho corpo do sol: que no mesmo ecentrico esta pregado: chamasse por esta razam ceo deferente do

sol.

«Estes três ceos tem dous centros: porque a face conuexa alto:

&

a

concaua do mais bayxo tem

vniuersal do

mudo.

PoUo qual toda a

assi de qualquer outro

cauo do mais

1

A

alto

&

brãco do

meo ho

:

centro que he ho

inteira esphera

do

planeta he concêntrica ao mundo:

sol

& bem

mas ho

con-

conuexo do mais baixo juntamente com ambas as

anotação à margem diz

o cetro do ecétrico

hum mesmo

domais

:

«O ponto

.a.

he ho centro do

mudo &

os dous pretos representa os deferentes do

ecentrico ou deferente do Sol».

:

o ponto

Auge do

sol

.b.

&

o

mm DA DO SOL E' IVâ DE LATIM EM LINGOAGEMTER HO DOCTCP. PÊRO NVNEZ*\ mà»f

[iráèiaiiiifiiiiiíiiiiiítiíi

THECTvICA

DO

SOL.

terc0ceo0:o0 quaee

fòm per tal arre firiia-

úo^tqm^Uctuíoz^mmmútomkB be coiicciirrícaaômiíndo:fti00afac€oeDcntro

becccniTfe3*0maí0b9Í]roceooe{fe0|>epe! loccntraíro:pd2qiic a faccDefoaa couiic)ta

que

fc)eâ

Ixccxnmcat^t acocouaqueíjeaoí

t)ciitroí?ccoficêrríca*Ma0 orer(XÍrocec

aiitrc€f}c64)ou0Ml?ofciiccniic]cop€r

rodae partee

fe

act^cga

p; ao

coiicawo0om3Í0alro:*tl?oftiicoíicaooaocofwe^oD0C>£ba|;i:o*'r' afTifícacftecco oomco per aríibaéfiiaafaceseccnfríco

bt

lx>

emito

rã 00 oéíéreii

UB t)o%n%t cooomcoba eccitiríra ou-

defereme

ch?^

CC^n^íTecenccfitrícoao miiiid0aquclkccoq«e íc |o inefíno centro3„omtiiido:^eciTícocõ|oceiiiro|^foáiK)remr0t>onw^

CPo^fanto O0DOII0 pmicíro0ceô0:partc toi ecerimcoe t a par íecc»icmmccH5.E|^iqcpmfeiimomiiicitolaiáo3«0eoofol:*^

';immms:S'^Sh^i:S:&i&à:í'mi:í

Dimensões do

áZã^és&M:^:tsãi:SíÂí:j&/Zii:fí'J-;.

original,

sem margens:

o'",252

X o'",i40

Cap. II faces do ceo do

—O

Tratado da Sphera de ^edro \N^ines

meo: tem outro

i3

chama

diferente centro q se

centro

do ecentrico.

«Os deferentes do auge do

sol

fazem seus próprios mouimêtos tam

concertados: que sempre a parte mais delgada do ceo mais alto: anda

& em hum mesmo

sobre a mais grossa do ceo mais bayxo:

tempo

fazem suas voltas: conforme ao mouimeto da oytaiia esphera de que

E

abaixo falaremos. ecliptica

mouimento sam

os poios deste

os poios

deferente do sol: na face da

mesma

ecliptica

«Mas ho deferente do Sol anda cada

dia

continuamente se volue.

ordenadamente per seu

próprio mouimento: segundo a socessam dos signos .l.noue

&

da

da oytaua esphera: por quanto ho auge do ecentrico que he

meudos

quasi oyto segundos daquella circunferência que se faz sobre ho

&

centro do ecentrico:

passa pollo centro do corpo do

Este último período

tradução do seguinte:

é

corpus deferens motu próprio super suo centro riter

«Sed orbis solare eccentrici regula-

s.

secundum sucessionem signorum quotidie

sol».

minutis et octo

.lix.

secundis fere de partibus circumferentiae per centrum corporis solaris

Pedro Nunes traduz

vna reuolutione completa descriptae mouetur». aqui regulariter por ordenadamente; para

designar o movimento

uniforme emprega indistintamente os adjectivos: igual, regular ou ordenado.

Assim no verso de Camões, Que também

nelle

tem curso ordenado,

Os Lusíadas, canto X, estância

87.

curso ordenado quer dizer movimento uniforme.

em que Kepler publicou a sua obra De stella uma época nova na história da astronomia, o planetas decompunha-se em movimentos simples, cada

Até ao ano de 1609 Martis, que marcou

movimento dos

um

dos quais era circular

e

uniforme.

assim também através da idade média,

movimento

Assim e

o

circular e uniforme, explicando os

dos astros,

foi

na antiguidade,

se fez

mesmo

fez Copérnico.

O

movimentos observados

o princípio fundamental da astronomia teórica até

Kepler.

O

primeiro planeta de que trata Purbáchio

é

o Sol, que ocupa a

quarta esfera, entre a de Vénus e a de Marte:

O

claro olho

do ceo no quarto assento. Os Lusíadas, canto X, estância

A nem

teórica

equante

do Sol

nem

entre os dois céus

é a

8^.

mais simples, não havendo nela a considerar

epiciclo.

O

movimento próprio do

chamados deferentes do auge do

sol executa-se

sol

(marcados a

J4

C^ astronomia dos Lusíadas

como

preto na figura), deferente do

em

screvendo

O

entre dois muros.

céu intermédio, chamado

desliza entre os dois de ocidente para oriente, de-

sol,

cada dia

um

ângulo de bg'

uma

o sol, que assim executa

e

quási

arrastando consigo

8'',

em

revolução completa

365 dias

e

um

quarto, aproximadamente.

Mas

o centro b do deferente do sol não coincide

da Terra.

Como

que damos

um

sol

O

ângulos desiguais hag Q lak.

menor que

iguais

cd

e

Terra

em

a,

com o centro a na anotação da página, de

mãs correspondem-lhes no

iguais cbd e ebf;

guio hag e

e se lê

em fac-simile, a arcos iguais cd e ef do decorrespondem no seu centro b os ângulos

fragmento

do corpo do

ferente

na figura

se vê

mundo a

ângulo iak é maior que ebf;

Enquanto pois o

cbd.

centro do

e

os

o ân-

sol descreve os dois arcos

ef do seu deferente, parece ao observador, colocado na descrever arcos desiguais da eclíptica. O plano do cír-

culo que descreve o centro do sol intersecta na oitava esfera a circun-

ferência que é a eclíptica da oitava esfera, linha

O é

ponto c

é o

auge do

auge (Oppositum augis);

O

seu perigeu.

o ponto

é

O

sol, visto

em

ou a sua maior longura; ponto

e é

o contrário do

que menos dista da Terra, o

da Terra, atinge a máxima velocidade no

mínima no apogeu. A hipótese do excêntrico explica assim desigualdade do movimento próprio do sol, com um movimento uni-

perigeu a

sol (Aiix solis),

o ponto de maior distância à Terra.

média do zodíaco.

forme

E

e a

em

torno

o que se

dum



ponto situado fora do centro da Terra.

no texto:

«Certamente poys que ho sobre ho centro do se segue

mesmo

sol pello

mouimento de seu deferente moue: daqui

deferente ordenadamete se

que sobre qualquer outro ponto se moua desigualmente.

portanto ho sol sobre ho centro do desiguais:

&

mundo em

da roda do zodíaco anda partes desiguais».

Purbáchio, enumerando os orbes que planeta,

diz

E

tepos iguais faz ângulos

a respeito

do Sol

«Luna habet orbes quattuor periores Marte, Júpiter

e

et

e

compõem

a esfera de cada

da Lua: «Sol habet

vnam sphaerulam».

Os

três

orbes»,

planetas su-

Saturno teem três orbes, como o Sol:

secundum Nas teóricas de Vénus e Merhabet orbes cum epicyclo», e «Mercurius

«Quilibet trium superiorum três orbes habet a se diuisos

imaginationem trium orbium Solis». cúrio lê-se:

«Vénus

três

habet orbes quinque et epicyclum».

Pedro Nunes culares ceos»; e

em

si

diz:

«A esphera do

começa

quatro ceos».

a teórica

sol

da

he composta de três parti-

lua:

«A esphera da Lua tem

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:

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Cap, II

Traduz pois

—O

Tratado da Sphera de ^Pedro ÍNjines por céus;

oy^bes

usa a palavra esfera para designar

e

Este uso distinto dos termos é

o conjunto dos céus de cada planeta.

próprio

duma

exposição didática.

Camões emprega mente, como

i5

as palavras: esfera, céu e orbe,

é natural

num

mas

indistinta-

poeta, que tem de atender primeiro ao

ritmo do verso.

No

canto segundo, Vénus sobe à sexta esfera, que é a de Júpiter,

depois de recebida na terceira, que a

é a sua,

para lhe pedir que proteja

armada portuguesa: Ia penetra as Estrellas luminosas, Ia

na terceyra Esphera recebida

Auante passa,

&

la

no sexto

ceo.

Pêra onde estaua o Padre se rnoueo. Os Lusíadas, canto

Aqui céu

No décimo

esfera.

estância 33.

teem a mesma significação que Pedro Nunes

e esfera

dá ao termo

TI,

canto, descrevendo o globo, «tran-

sunto reduzido» do mundo, diz Tétis: Qual

a matéria seja

nam

se enxerga,

Mas enxergasse bem que está composto De vários orbes, que a diuina verga Compôs, & hum centro a todos so tem posto. Os Lusíadas, canto X, estância

78.

Nestes versos os orbes são todos concêntricos ao mundo.

Mas

Tétis continua adeante:

Em

todos estes orbes, differente

Curso veras, nus graue,

&

noutros leue

Ora fogem do centro longamente, Ora da terra estam caminho breue. Os Lusíadas, canto X,

Agora não há.

os orbes são excêntricos.

Na

estância 90.

Parece haver contradição, mas

primeira estância, os orbes são as esferas completas; na

segunda os orbes são os céus excêntricos dos planetas.

Na a

transcrição que atrás fizemos da teórica do sol, sublinhamos

passagem: «toda a

inteira

esphera do sol

outro planeta he concêntrica ao mundo».

&

bem assi de qualquer Vimos com efeito o con-

junto dos três céus do sol contido entre duas superfícies esféricas concêntricas ao

mundo;

cada planeta. e

a décima;

e

o

Além das estas

mesmo

sucede

com

o conjunto dos céus de

sete esferas planetárias,

há a oitava, a nona

são concêntricas, não contendo mais

dum

céu,



(1.4

astronomia dos Lusíadas

Sobre as dez esferas móveis está

do Empíreo, imóvel

a

Camões, abrangendo, na estância 78, toda

e concêntrica.

máquina do mundo, con-

a

sidera a esfera de cada planeta no seu conjunto; os orbes são as onze esferas e portanto são todos concêntricos.

Na

uma

estância 90, Camões, que acaba de fazer

meração de todas ticular os seus

admirável enu-

as esferas planetárias, passa a considerar

movimentos

céus deferentes dos planetas, os quais

teem curso

variável, desde o

deferente de Saturno, o mais grave, que faz a sua volta

do epiciclo da Lua, o mais

até ao deferente

em

Todos

27 dias e 8 horas.

leve,

em

3o anos,

cuja revolução se

estes deferentes são,

como o do

longamente do centro do

Sol, orbes excêntricos; ora estão afastados

mundo, no ponto do auge; ora estão caminho trário

par-

Já nos dois primeiros versos se refere aos

raterísticos dos planetas.

faz

em

distingue então os céus excêntricos, ca-

e

breve,

no ponto con-

do auge.

Enquanto ao movimento dos dois céus deferentes do auge do diz

Pedro Nunes que «em

hum mesmo tempo fazem

sol,

suas voltas:

conforme ao mouimeto da ojtaua esphera de que abaixo falaremos y>.

Mas depois não fala. Ora Purbáchio diz com

efeito: «& aeque cito circumeunt (orbes secundum mutationem motus octauae sphaeE ocupa-se, na verdade, da rae: de quo poster ius dicendum erity>. teórica da oitava esfera nO capítulo final intitulado: De motu octauae

augem

deferentes

Solis)

sphaerae.

Como Pedro Nunes do

traduz apenas os dois primeiros capítulos,

sol e

da

lua,

não chega a ocupar-se do movimento do

mamento, o que

faz

em

outras obras.

teóricas

Adeante tratamos deste assunto

4.

Tendo traduzido

em

especial,

a Teórica do Sol e

Purbáchio, faz Pedro Nunes,

da geografia de Ptolomeu.

em

E

fir-

da Lua de

a Teórica

seguida, a versão do primeiro livro

acrescenta por fim dois tratados origi-

nais seus sobre a carta de marear.

No scrito

Observatório Astronómico da Universidade existe

com

mente os

um manu-

a tradução francesa destes dois tratados, tendo respectiva-

títulos:

((Traité

que

le

Docteur Pierre Nunes

douttes de la navigation» e «Traité que

mographe du Roy notre naviguer avec

le

le

fit

sur certaines

Docteur Pierre Nunes cos-

Sire a faict pour la deffence de la carte de

regiment de

la haulteur».

Há também uma

cópia

manuscrita de todo o Tratado da Sphera.

Exemplares impressos deste Tratado conhecemos apenas o da Biblioteca Nacional de Lisboa, e

sabemos que há

um

exemplar na

:

Cap. II

—O

Tratado da Sphcra de ^edro [N^nies

Academia das Sciências de Lisboa

Biblioteca da

ly

e

outro na Biblioteca

uma

edição de todas as

de Évora.

O

governo português devia mandar fazer

obras de Pedro Nunes, pondo-as assim ao alcance dos estudiosos,

enriquecendo a literatura matemática nacional

menagem merecida

a este

homem

ilustre

uma

prestando

e

ho-

de sciência do século xvi,

que, não se ocupando da astronomia apenas sob o ponto de vista pura-

mente especulativo, teve principalmente à arte de navegar, colaborando

dum povo

função histórica

Ele

mesmo

de navegadores descobridores.

tomara

se

a

em defensam da carta de maaltura do polo em todo tempo

&

vindo ao seruiço do muito escrarecido

príncipe o Infante

maticas: lhe

em



em

&

demostração

euora: dey a

híía folha

muito excelete

Anrique: pêra o instruir nas sciências mathe-

disso figura

fiz

anno de .i533. escripto

vista as suas aplicações

sol»

E

«...

«Como

em

o seu saber na realização da nossa

o declara no «Tratado

rear», no capítulo

que ouuer

com

de papel:

do polo da dita cidade

el

&

ja tarde:

em

E

plano.

Rey nosso senhor

despois no

o regimento

perante sua alteza tomey a altura

pouco tepo antes do

sol posto:

&

achey q era .38. grãos & quasi hú terço. porque ate ora o mais do tempo fuy doente: & o dito regimento q assi escreui: tinha necessidade de algua mais decraração pêra se poder praticar ho não comu-

E

niquey a todos: posto q meu desejo sempre fosse & he: tirar-se de minhas letras algum fructo pêra esta arte de nauegary>.

A

arte de

navegar

é objecto

da sua obra De Arte atque ratione

naiiigandi libri duo, de que existe na Biblioteca da Universidade a edição de

Coimbra de

Na Imprensa

em

1573.

da Universidade de Coimbra começou a fazer-se,

18 14, a reimpressão do

como consta do

vol. vii

Tratado da Sphera de Pedro Nunes,

do Registo das férias dos

que traba-

oficiais

lharam nas obras impressas por conta da casa, que nos mostrou o actual director sr. dr.

um

como

Joaquim Martins Teixeira de Carvalho, assim

papel avulso do arquivo, onde se

por concluir, principiadas

da Sphera scrito,

que

—O já

Astronómico.

tem

em

lê,

numa

não está na biblioteca da Imprensa,



Tratado Nunez MS.» Este manu-

várias épocas, «Pêro

original está nesta Biblioteca; é

Hsta de obras

é o

do Observatório

Infelizmente a reimpressão interrompeu-se, e

nem

exis-

as meias folhas impressas, a que se refere o registo das férias.

O

sr.

Francisco Maria Esteves Pereira publicou, na Revista de

Engenharia Militar (maio de 191 2

1

a fevereiro de 1912), o

«Tratado

qA astronomia dos Lusíadas

7(9

em defensam com

fazer

da carta de marear», dando o exemplo do que há a

as outras obras

do ensigne matemático.

Temo-nos ocupado do Tratado da Sphera como

5.

livro

lido

por Camões.

Vamos e

citar

uma

outra obra que se ocupa

que devia ser do conhecimento do poeta.

também

E

a

&

PHiCA totius Philosophiae Rationalis, Naturalis

de astronomia

Margarita PhilosoMoralis principia

diatogice duodecim libris complectens, de Gregório Reisch, prior de

uma

Os

Cartucha, perto de Friburgo.

do triuium: Gramática, Dialética

e

três primeiros livros

quadriuium: Arimética, Música, Geometria

nomia

é pois o objecto do livro

e

Na i535.

Astronomia.

Esta pérola

vii.

pédia do tempo, era universalmente conhecida

e

tratam

Retórica; os quatro seguintes do

e

A

astro-

filosófica, enciclo-

apreciada.

Biblioteca da Universidade existem as edições de i5o4, i5i7

Esta última edição, de Basileia,

é

revista pelo professor

Orôncio Fíneo, do Colégio Real de França, o mesmo contra quem Pedro Nunes escreveu o opúsculo De erratis Orontij Finoei, Regii Mathematicariim Lutetiae Professoris,

Da Margarita

Philosophica reproduzimos adeante, duas gravuras

que, ilustrando o assunto de que nos ocupamos, teem teresse de serem coevas de Camões

pladas.

e,

também

o

in-

naturalmente, por êle contem-

o

I

O

.

triplo

movimento da oitava esfera

capítulo primeiro do

Tratado da Sphera começa pela

defi-

nição da esfera, e continua depois:

«Duas diuisoes ha da sphera: a primeira he sustancial gíãda he acidetal. .s.

em

a

Sustãcialmete se diuide a sphera

nona que he o primeyro mobile:

que se chama o firmameto:

fixas

netas.

Das quaes

q mais

se

híãas

& em

sam mayores:

em

&

a da lua he a

.ix.

a se-

spheras

a sphera das estrelas

sete spheras de sete pra-

&

outras menores: segundo

chega ou se aparta do firmameto.

de Saturno he a mayor

em

&

E

por tãto a sphera

menor como na

figura pa-

recera».

Esta constituição da «machina do mundo» por nove esferas, cer-

cando a Terra, sobre as quais assenta o Empíreo,

poema do começo do século xiv. Pedro Nunes faz, a esta passagem do

é a

do Paraíso de

Dante,

guinte anotação, na

«Chamasse

margem da

fixas

texto de Sacrobosco, a se-

página:

porque estão sempre

em

híãa

mesma

distancia de

e híí soo ceo q he o oytauo: o qual per razam chama firmamento & amostrãsenos estas estrellas sempre per huas mesmas figuras & guarda o mesmo sitio as quaes cousas nã ha nos planetas. E segúdo a comu escola dos astrólogos a nona esphera não he primeiro mobile mas segundo & ho decimo he ho

nos por estaré todas delias se

primeiro:

não

mos

se

&

nestes doz^s ceos de cima nã ha estrellas

comprehende

os seus

pello sentido se

mouimentos na

.8.

&

por tanto

não per razã porq experimenta-

que não sam próprios a

ella».

Qá astronomia dos Lusíadas

20

Temos nona, que

pois, agora, é

mais

uma

A

esfera.

oitava é envolvida pela

nona esfera pela décima, que

é o

«machina do mundo» dos Lusíadas, poema do século

xvi.

o segundo móbil;

e a

primeiro móbil.

Tal

é a

Camões segue

Na

a

«comu

escola» dos astrónomos do seu tempo.

folha seguinte, lê-se no texto:

«Junto da regiam dos elementos: esta logo a regiam celestial cida:

&

pello seu ser

mouimento

Sam

circular:

Tmudauel he

&

liure

de toda mudança:

te

lú-

contino

chamaranlhe os philosofos Quinta essência.

noue spheras como acima dixemos

:

conuem

a saber.

Sphera

da LGa: de Mercúrio: de Vénus: do Sol: de Mars: de Júpiter: de Saturno: das estrellas fixas:

de cima cerca as debayxo. derradeiro ceo:

&

&

&

a

Tem

&

do derradeiro ceo

cada

híía

das

dous mouimetos ho primeiro he do

fazse sobre os dous cabos do eyxo

&

Antartico: começa de oriente: vay a ocidete

.s.

polo Artico

torna outra vez a

Ho outro oriéte: & este mouimeto parte per meo ha eqwmocial. mouimento he das spheras debaixo: contrairo ao primeiro per oblico: tem próprios eyxos sobre que se faz: os quaes esta apartados dos primeiros per .23. grãos & .33. meudos. Mas o primeiro mouimento moue & leua com seu ympeto todallas outras Spheras & em hú dia E porem ellas sem embargo deste mouimento: andão em contrayro. A oytaua Sphera em cem annos hum grão: & a este segundo mouimento parte cõ sua noite faze per derredor da terra húa reuoluçao.

meo ho zodiaco. debaixo do (\ua\ cada hú dos pranetas tem própria sphera: em a qual anda per próprio mouimento contra o mouimento do derradeyro ceo: & em diuersos espaços de tempos fazem suas reuoluções. Saturno em .3o. annos: Júpiter em .12. Mars em dous. .365. dias: & quasi seys oras. em Vénus & Mercúrio quasi eni Sol outro tanto tempo, a Lua em vinte & sete dias & oyto oras». per

:

Tendo observações posteriores mostrado desjgualdades no movimento da oitava esfera, introduziu-se a hipótese dum terceiro movimento Por isso Pedro Nunes corrige o texto e, com ele, um segundo móbil. de Sacrobosco, com esta anotação que vem completar a anterior: «Isto

segundo a opinião de ptolomeu porq os astrólogos q depoys este mouimeto de occidete pêra oriete pella ordê

fora acharam que

dos signos pertence a nona esphera:

grão mas

em

200.

hú grão

&

.28.

&

que nã he

em cem

anos hú

minutos de sorte que e 49. mil

anos falando naturalmete se cõprira sua reuoluçao. próprio a oitaua he o da trepidação q se faz

em

E

o mouimento

.7000. annos».

Cap. III

— O triplo mopimento da oitava

Adeante, na parte do Capítulo segundo intitulada



luros

lê-se

,

E

«... ^^

meon

ho arco do coluro que esta antre o pÕto do grãos:

.xxiij.

he

— Dos

dous co-

no texto:

a equinocial he a

lomeu

21

esfera

.xxiij.

mayor declinação do

sol: a

&

meudos.

grãos

cinquoenta

&

.xxxiij.

& hum

solsticio estiual

qual he segundo Pto-

Mas segundo

Al-

meudos...».

Pedro Nunes nota:

«Em

nosso tepo he

.23.

grãos

& meo & o

mouimeto da trepidaçã

da oitaua Sphera causa esta diuersidade por quanto ho

sol níjca se

aparta da ecliptica da oytaua sphera».

Aqui

está a trepidação da oitava esfera a explicar diferenças obser-

vadas na inclinação da ecliptica sobre a equinocial (equador).

E

não

há mais referências a este movimento no Tratado da Sphera.

Na

2.

teórica do sol anuncia-se que se tratará

oitava esfera,

do capítulo

mas Pedro Nunes, como



do movimento da

dissemos, não faz a tradução

de Purbáchio, que começa assim:

final

«De motu octauae sphaerae. Octauae vero sphaerae ad cuius motu: vt saepe dictú

es/:

orbes

Vnus

qiiiáo.

diurnus: quo in die naturali semel super polis

mudi

deferêtes auges planetarz/m mutantz/r: triplex inest moUis. a prío mobili reuoluit^/r.

semper

.s.

Alter a nona sphaera q seaindiim mobile vocatz/r: qui

est seciíndum successione

signorum cõtra motu primil super

polis zodiaci regularis: ita vt in qz//buslibet .cc. annis

& xxviii r

minuta

tabulis

arietis

fer progreditwr. hic

appellatur.

primi mobilis

Et

es/

&

arcz/s

motus

angiíí

Tqtúus

vocatt/r siue accessus círculos paruos arietis

^

A

&

í

gradu

&*stellarwm fixarz/m

zodiaci primi mobilis íter caput

í

Superfícies

superfície

az/tew es/ sibi propriz/s: qui

&

vníí

caput arietis nonae sphaerae.

nãque eclipticae nonae sphaerae sewper est primi mobilis.

per

recessus octauae sphaerae:

eclipticíie

motus trepidatiÕis

&

fít

super duos

cÕcauitate nonae sphaerae aequales super pricipia

librae eiusde perscriptos: ...»*.

oitava esfera

porem, com a qual se movem, como muitas vezes se tem

os céus deferentes dos auges dos planetas,

municado pelo primeiro móbil;

é

tem

um

triplo

movimento.

o movimento diurno, pelo qual faz

dito,

Um é-Jhe co-

uma rotação em

;

22

Qyi

Para não alongar

astronomia dos Lusíadas

da Sphaera Mundi apenas

a citação, extraímos

estas primeiras linhas, onde fica definido o

A

movimento de trepidação.

eclíptica e a linha equinocial cortam-se nos dois pontos equinociais:

o princípio de Aries

t (Caput

Arietis) e o princípio de Libra =^

Librae), pontos de entrada do Sol nos signos respectivos. ciso distinguir a eclíptica de

da nona

cada

uma das mesmo

três esferas.

décima estão sempre no

e

A

as linhas dos poios respectivos.

em

(Gaput

Mas é preAs eclípticas

plano, coincidindo portanto

nona esfera move-se dentro da

modo que a eclíptica da nona esfera desliza dentro da da décima, no mesmo plano, e o ponto de Aries desta nona esfera, que num momento coincidiu com décima

torno da linha dos poios da eclíptica, de

o ponto de Aries da décima, avança, relativamente a este, para oriente,

tornando a vir coincidir

O

com

ele

no fim de 49:000 anos.

plano, porem, da eclíptica da oitava esfera, no qual o sol faz

com o plano das outras duas; mas como em volta de uma posição média,

o seu curso anual, não coincide

dum

oscila

e

outro lado dele,

num movimento

de acesso

Os

e j^ecesso.

princípios de Aries e Libra

da nona esfera são os pontos equinociais médios; os pontos equinoverdadeiros são os princípios de Aries

ciais

que descrevem dois pequenos círculos,

em se

um

torno dos da nona, movendo-se

move

Na

pelo sul da eclíptica

num

Libra da oitava esfera, período de 7:000 anos,

deles ao norte, enquanto o outro

fixa.

damos uma repro-

última página da Sphaera Mundi, de que

dução,

que

e

vem uma cial

e

a

e

é

também

a página final

figura ilustrativa do eclíptica

das Teóricas de Purbáchio,

A

movimento de trepidação.

equino-

da nona esfera, designadas respectivamente por

«Equinoctialis» e «Eclíptica fixa», cortam-se nos dois pontos equinociais

Te—,

fixos nesta esfera.

Os

dois círculos menores,

com movimento

tro nestes pontos, são os descritos,

com

cen-

uniforme, pelos

pontos equinociais da esfera das estrelas fixas; os restantes dois culos

máximos representam duas posições extremas da

eclíptica

cír-

móvel

mundo num dia natural. Outro é-lhe comunicado pela nona se chama segundo móbil; é um movimento regular, em torno dos poios do zodíaco, segundo a sucessão dos signos, em contrário do primeiro grau e 28 minutos aproximadamente. movimento, avançando em duzentos anos

torno dos poios do esfera, a

que também

i

Chama-se nas tábuas movimento dos auges

e das estrelas fixas.

É

o arco do zo-

díaco do primeiro móbil entre o princípio de Aries do primeiro móbil e o princípio

de Aries da nona esfera, pois a superfície da eclíptica da nona esfera está sempre

na superfície da eclíptica do primeiro móbil.

chama

se

O

movimento de trepidação ou de acesso

terceiro

porem

e recesso

é privativo dela

da oitava esfera;

e exe-

cuta-se sobre dois pequenos círculos na concavidade da nona esfera, iguais, descritos

sobre os princípios de Aries e Libra desta

mesma

esfera.

tnabat.Hiac matum rcquuntóc omncs Sphacras inferiores in motibus Tuisj íca vc refpcétu humseclípcicçmobilis íinc auges defercncium & declinacio/ nes eartun fcmper inuanab iles. Tbeonca vitima oétauçfphçrç*

%

*'/*«>,

«í.

>*

m <JA/ :i»*.

>

Pol*mad(fept.

1

\r ,

poPeílíj)t<.í;te.

*i

/7

^

^^T^^f' CrHocquo(5p(;deraIisfcientiç (íngalarcopafctttum. Impreffutn Venf eiíâ lacobõpêtiú dcLcucho.Anno Salncis.M.D.xix.Die vero.xxiiii.Decêbn8 i;

A B C D

E F

Página

com uma

figura ilustrativa

final

Omaesfnnc quatcrni.

da Sphaera Mundi,

do movimento de trepidação da oitava esfera,

nas dimensões do original

— O triplo

Cap, III

2 3

No meio

da oitava esfera. eclíptica

movimento da oitava esfera

da nona esfera

e

da figura estão marcados os poios da da equinocial, pelos quais passa o coluro

dos solstícios, princípios de Câncer

^

e

dos pontos equinociais verdadeiros move-se,

aro

duma roda em

enquanto o centro,

torno do eixo, descrevendo fixo

Assim cada como um ponto do

Capricórnio %.

um

um

pequeno

círculo,

na eclíptica da nona esfera, se move com esta

ao longo da eclíptica da décima.

Como

quarenta e nove é sete vezes sete, depois de executados

movimentos de trepidação da oitava esfera sobre os pontos equinociais do segundo móbil, o princípio de Aries do segundo móbil tem sete

percorrido toda a circunferência da eclíptica do primeiro, completando-se e

uma

rotação do segundo móbil, isto

das estrelas

é,

o movimento dos auges

fixas.

Os números

Foi Ricius {A. Ricii,

7:000 e 49:000 são sabáticos.

de motu octauae Sphaerae, i52i) que explicou a origem deles,

atri-

buindo-os ao astrónomo judeu do rei Afonso de Castela, o rabi Isaac

Abensid, cognominado Hazan ^

Moisés preceituara que, decorridos

anos de cultivo das terras, se não semeariam os campos

seis

podariam

as vinhas

no sétimo ano.

nem

Este era o ano sabático.

se

De-

corridos sete anos sabáticos, seguia-se o ano quinquagésimo, o ano

do

O

jubileu.

rabi Isaac, estendendo estes preceitos, a que atribuía

significação cabalística, aos feras,

estabeleceu

trepidação e

um

um

movimentos

da oitava

lentos

e

nona

es-

período de 7:000 anos para o movimento de

de 49:000 anos para o movimento dos auges e das

estrelas fixas.

Assim,

na' dificuldade

lentos, ter-se hia,

da determinação precisa de movimentos tão

segundo Rício, recorrido à Bíblia:

«Contarás também sete semanas de annos,

que fazem ao todo quarenta

e

isto é, sete

vezes sete,

nove annos» (Levitico, xxv,

8)

e,

em

vez de semanas de anos, contaram-se semanas de milhares de anos.

3.

No

seu comentário à obra de Purbáchio

tarum G. Piwbachij annotationes

— dedica

— In theoricas plane-

Pedro Nunes duas anota-

ções ao capítulo final que se ocupa do movimento do firmamento,

respectivamente intituladas:

Annotatio prima»

e

Annotatio secunda». tulo quarto

«De

«Octauae sphaerae triplex inest motus.

«De motu octauae sphaerae secundum Thebith.

Do mesmo

solis declinatione»

assunto se ocupa

do

livro

também no

capí-

segundo da obra De arte

atque ratione nauigandi.

1

Bailly, Histoire de

rastronomie moderne, Paris, 1785, tom.

lambre, Histoire de rastronomie du

moyen âge,

pag. 379.

i,

pag. 299; De-

:

24

agronomia dos Lusíadas

C/^

Esta teoria do triplo movimento da oitava esfera, adoptada por

depois dele,

agora

ate

foi lente

É

Coimbra.

por André de Avelar, que,

a ser professada

Pedro Nunes, continua

da cadeira das matemáticas na Universidade de

o autor do Repertório dos tempos o mais copioso que

saio

a

conforme à noua reformação do sancto Papa

lu\,

Gregório XIII, que teve as edições de i585, lõgo, 1594

No

e 1602.

Observatório Astronómico existem as edições de Lisboa de i585

ambas por Manuel de

i5qo,

e

Lira, sendo esta última muito rara, a

ponto de Inocêncio duvidar da sua existência.

Nesta edição de lõgo

Do

lê-se, a respeito

dos céus superiores, o seguinte

oitauo ceo, no qual estão situadas as

estrellas Jixas,

a que por outro no-

me chamão Firmamento. Tit. XXVII.

«O

oitauo ceo quanto a nos,

& terceiro na

estão situadas as estrellas fixas,

disséramos deferente

maramlhe estrellas

nem

&

os Gregos Aplanes, que quer dizer

que nelle estão guardam sempre entre

achegandose,

com

ordem natural, he onde chamado firmamento, como se

nem

&

trazedor de estrellas firmes,

sem si

erro,

& todas

estrellado, cuja superficie

chama de

distancia,

estam neste oitauo ceo, chamado

exterior he contheuda no nono,

alem dos dous mouimetos que tem do decimo

próprio se

Cha-

porque as

mesma

a

sua interior contem o septimo: a grossura deste ceo

legoas.

fixas.

apartandose huas das outras, como faze os

planetas, de que ja falamos,

tambê

foy

trepidação, ou de acesso,

&

&

sam 26980824.

&

nono: o seu

chegando

recesso,

alguas vezes ao Polo Árctico, que he o Norte, apartandose do Antárctico:

&

que he o Sul,

outras chegandose do Antárctico,

&

apar-

tandose do Árctico, sobre próprios Poios, que são os princípios de

Aries Aries

hus

& hbra da nona Sphera, ao redor dos quaes & Libra, com seu mouimento descreve húas

piquenos

círculos,

Acaba sua reuolução

cujos

semidiametros

destes círculos piquenos

maneira que de seus grãos caminha cada qual mouimento tem

também

Do noueno ('O a

noueno ceo

em

são

em

Ceo.

quanto a nos,

Tit.

&

noue grãos.

de

7000. annos:

de

20. annos, quasi híj grão, o

os outros orbes inferiores

que Ptolomeu chamou Primeiro móbil:

1

*

o principio do seu circunferências de

.

.

.

».

XXVIIL segudo na ordem natural, he

& elRey

Deve ser diâmetros, porque os semidiametros são de

dõ Afonso cõsidera

4"i8'43'^

Cap. III

— O triplo

&

te es-

por sua grande diaphanidade lhe chamarão Christalino:

outros dizé q neste ceo estão as agoas q se lêem do

&

25

Este segado a opinião dos Astrólogos não

per Segudo móbil. trelas,

movimento da oitava esfera

segundo o cantar dos

três

moços, Bnedicite aquae

do Génesis:

i.

qiiae

super caelos

Beda, q estas agoas se ouuessem aqui guardado para innundação do diluuio: outros affirmão q se puserão

Algus dizem segiído

sunt.

&

subtis.

ou

estrellas

&

&

causam:

&

transparétes,

Cristallino,

&

da grande quetura

aqui, para teperança

ceo

traz

estas agoas estar

dize

por

fogo q o mouimento do

isto algús

chamarão

&

pola grande transparecia

mui

claras,

a este ceo

mui

Aqueo,

Te

diaphanidade sua.

dous mouimêtos, hú he alheo causado da decima Sphera ou Primeiro

em

móbil,

espaço de 24. horas, outro mouimento

Oriente sobre os Poios do Zodiaco, próprio, o qual acaba 200. an.

I.

quartos:

&

g. 28.

m.

cõ este

em

&

te

de Occidente pêra

pola linha Eclyptica, q he seu

espaço de 49000. an. quasi: moue-se cada

9. seg. 47. ter. 46.

mouimeto leua

chamase mouimento dos auges,

&

trás

quar. e cada dia 4. si

os

ter. e 20.

orbes inferiores:

8.

estrellas fixas, o qual se faz

&

com

certa equação segundo he notório aos tabulistas».

Da

decima Sphera, ou primeiro móbil. Titulo

XXIX.

«A decima sphera em quanto a nos, & primeiro móbil quanto à ordem natural, he a que cumpre seu mouimento próprio, em espaço

& ios

&

tempo de

vinte

&

quatro horas, de Oriente a Poente, sobre os po-

do mundo, â qual como a senhora obedecem todos os outros orbes Neste orbe como tambe no nono não ahi

ceos

es-

Ale destes dez ceos mouiueis q dissemos, os theologos poe chamão Impyreo, que quer dizer ceo de

trellas.

outro mais supremo, ao qual

fogo aceso, pelo seu grande resplandor,

&

nelle esta a

Estes dois título

&

&

este he fixo

q não

se

moue,

lugar dos beauenturados».

títulos relativos à

nona

e

decima

esfera,

sobre o oitavo céu da edição de i585, são

títulos 21,

puesto

morada

assim como o

mera tradução dos

22 e 23 da Chronographia o repertório de los tiempos, com-

por Hieronymo de Chaues astrólogo y cosmographo, de que

vimos apenas a edição de Lisboa de iSyô, existente na Bibhoteca da Universidade,

mas de que

se fizeram várias

impressões anteriores,

começando pela de Sevilha de 1548. A teoria do movimento triplo do firmamento atravessa terada, todo o século XVI, nos.

A

em

obra de Copérnico

Portugal.

— De

Não deve

pois, inal-

isso surpreender-

reuolutionibus orbium coelestium

::

di astronomia dos Lusíadas

20 foi

publicada

em Nuremberg em

i543; as suas ideias, porem, que

tinham sido as da escola de Pitágoras, só no século

O

a ser geralmente aceitas.

nicano

mas

foi Galileu,

O

triplo

movimento da oitava

nas estâncias 85, 86

A

décima esfera

ligeiro logo

e



começaram

grande propugnador do sistema coper-

o seu principal argumento

pela primeira vez, foi dirigida para os astros

4.

xvii

87 do canto

em

a luneta que,

i6io.

X

esfera é descrito por

Camões

dos Lusíadas.

na estância 85

é introduzida

foi

;

é o círculo

que corre

por baixo do Empíreo imóvel:

Em

fim que o

sumo Deos, que por segundas

Causas obra no mundo, tudo manda

E

tornando a contarte das profundas

Obras da mão diuina veneranda,

Debaxo deste circulo onde as mundas Almas diuinas gozao, que nam anda, Outro corre tam leue & tam ligeiro,

Que não

se enxerga,

he o Mobile primeiro.

Este movimento do primeiro móbil leva

com

seu ímpeto todas as

Isto

exprime o poeta na

movimento diurno.

esferas interiores: é o

primeira parte da admirável estância 86:

Com

este rapto

Vão todos

&

grande mouimento,

os que dentro

tem no seyo

Por obra deste, o Sol andando

O

&

dia

noite faz,

com

Debaxo deste leue anda outro

Tam

Nos

&

lento,

sojugado a duro freyo.

Que em quanto Phebo,

de luz nunca escasso

Dozentos cursos

elle

faz,

da

hum

liltimos quatro versos descreve o

trelas fixas, próprio

em

lento,

a tento

curso alheyo

em

200 anos

mente, o que, sendo menos de grau grau, e chama-lhe

um

passo.

O

movimento dos auges

Como

da nona esfera.

49:000 anos, anda

i

grau e

passo.

e

e es-

esta faz a sua revolução

28 minutos aproximada-

num um passo

meio, o poeta arredonda

cristalino,

ou céu áqueo, dá

enquanto o céu deferente do Sol dá 200 voltas.

Comunicando-se o movimento de cada esfera às que dentro tem no há a

em

cada céu, o movimento que lhe

é

próprio

dos que lhe são alheios, provenientes das esferas superiores.

Assim

seyo,

distinguir,

o curso próprio do sol é o seu movimento anual que ele tem no excêntrico, seu deferente, na quarta esfera; e o seu é curso alheio,

causado pelo primeiro móbil.

movimento diurno

:

Cap. III

A

mopimènto da oitava esfera

como Camões reúne

Note-se sempre scientífico

— O triplo

27

à formosura dos versos o rigor

das doutrinas do seu tempo.

com

oitava esfera,

o seu movimento de trepidação, é descrita na

estância 87:

Olha estoutro debaxo, que esmaltado

De corpos lisos anda, & radiantes, Que também nelle tem curso ordenado,

E nos seus axes correm scintilantes Bem ves como se veste & faz ornado Co

largo cinto douro, que estrellantes

Animais doze traz afigurados

Aposentos de Phebo limitados.

Os trelas,

corpos

lisos e radiantes,

que esmaltam o oitavo céu, são as

Como

de que nos ocuparemos no capítulo seguinte.

es-

as estrelas

estão fixas neste céu, quando o poeta diz que nelle teem curso orde-

nado, significa apenas que elas são levadas no movimento regular próprio do firmamento; e que se trata do céu, indica-o na palavra também. alheio que o primeiro móbil

no seio; turno,

e

comunica

movimento próprio ao oitavo estrelas teem o movimento

a todos os orbes que dentro

tem

teem mais o movimento alheio que o segundo móbil, por seu

comunica a todas as esferas interiores; mas não teem só estes

dois movimentos,

mento.

As

A

teem também o curso ordenado, próprio do firma-

palavra seus, aplicada no verso seguinte aos eixos

em

volta

dos quais as estrelas correm scintilantes, acentua que se não trata de curso alheio.





no plural, axes Camões dizendo eixo, como na estância 84 do Canto VI: ,

refere-se aos extremos

do

Relâmpados medonhos nam cessauão, Feros trouões que vem representando Cair o ceo dos exos sobre a terra,

Consigo os elementos terem guerra.

Os

eixos do céu, que aqui significa toda a

os extremos do eixo do

máquina celestial, são mundo, poios do movimento diurno. O céu

ameaça desprender-se dos poios

ártico e antártico, e

desabar sobre a

terra.

Se

se tratasse

se executa o

Mas na

em igual sentido, em torno dos quais

da nona esfera, os eixos seriam,

os poios boreal e austral da eclíptica desta esfera,

movimento dos auges, que

lhe é próprio.

estância 87 descreve-se o oitavo céu, cujo

prio se executa

em

movimento pró-

torno dos pontos equinociais médios

são portanto os pontos de Aries

mento de trepidação.

e

;

os seus axes

Libra do cristalino, poios do movi-

i\V

Cí/

astronomia dos Lusíadas

Tétis, que está explicando ao

Gama

o globo, transinnpto redii\ido

do mundo, mostra-lhe, nos quatro primeiros versos desta oitava, as estrelas radiantes, levadas

no movimento de acesso

e

recesso do

mamento, apontando-lhe os poios deste movimento, centros dos menores percorridos pelos equinócios verdadeiros, tava esfera e móveis com ela.

culos

Camões, que parece

com que

ter tido

um

modelo à

cír-

na

fixos

oi-

vista, tal é a precisão

exprime nestas estâncias, não se esquece de chamar a

se

atenção para pontos tão importantes

como são

os equinócios médios,

como é natural em quem, como Tétis, mostra um globo onde podem ver os movimentos dos diferentes céus.

Na

fir-

se

segunda parte da estância 87 segue-se a formosíssima descrição

do zodíaco, de que nos não ocupamos agora.

No

5.

sistema de Copérnico o movimento diurno do firmamento

é resultado fixas

passou a ser

terra que descreve eclíptica.

O

O

movimento dos auges e explicado pela mudança de direcção do

da rotação da

um

terra.

em

cone circular

É

eixo da

torno da linha dos poios da

equinócio da primavera, origem de contagem das longi-

tudes celestes, retrograda por isso sobre a eclíptica, dando

completa, não

estrelas

em

49:000 anos,

uma

volta

mas em 26:000 anos aproximadamente.

o movimento át precessão dos equinócios, que aumenta a longitude

das estrelas.

A

hipótese do

movimento de trepidação, imaginada para

explicar

diferenças de observações erradas, acabara por ser abandonada.

No

século XVIII Bradley descobre o

movimento de nutação.

Desde

então a recta generatriz do cone de precessão passa a ser apenas

posição média do eixo da terra,

em

uma

torno da qual o eixo verdadeiro

descreve o cone de nutação.

O

equinócio médio retrograda sobre a eclíptica

secular de precessão.

O

com

equinócio verdadeiro executa,

o

movimento

em torno do em quanto

médio, oscilações cuja ampHtude não excede 18 segundos, o equador se inclina de 9 segundos para sição média, sendo o período deste

um

e

outro lado da sua po-

movimento de

18 anos e

^

apro-

ximadamente.

A

este

movimento chamou-se

— de

nutação, do latim niitare, os-

cilar.

E um

resurgimento do antigo movimento de trepidação, embora

muito reduzido

e

modificado.

IV As

I.

No tempo

estrelas

de Camões a palavra estrela tinha

uma

significação

mais extensa do que hoje tem, porque abrangia também os planetas.

Na Margarita nos referimos, Tract.

I,

no capitulo que

lê-se,

Cap.

«Stellae

Philosophica, enciclopédia do século xvi, a que já

xix),

omnes tam

Todas erráticas rias),

&

ocupa das estrelas (Libri

vii,

o seguinte:

siue planetae (quae in

naturae, motus,

se

íixae (quae in

firmamento sunt)

quam

erraticae

septem orbibus planetarum consistunt) eiusdem

figurae

cum

suo coelo sunt».

as estrelas, quer fixas (as que estão no firmamento), quer

ou planetas

(as

que estão situadas nas sete esferas planetá-

teem a mesma natureza, movimento

e figura

que os seus res-

pectivos céus.

As estrelas fixas, embutidas no firmamento, guardando sempre as mesmas posições relativas, teem o triplo movimento da sua esfera. Os planetas, alem do movimento que a oitava esfera comunica a todas as inferiores,

teem o movimento próprio dos seus céus, variando de

posição relativamente às estrelas fixas; são estrelas erráticas.

Gamões

fala

com

toda a propriedade quando

chama

planeta Vénus:

Mas

ja a

amorosa

strela scintilaua

Diante do Sol claro, no Orizonte

Mensageira do

A

terra,

&

dia,

&

visitaua

o largo mar,

com

leda fronte.

Os Lusíadas, canto VI, estância

85«

estrela ao

.

:

2A astronomia dos Lusíadas

3o

A

Lua, correndo apressada,

no seu movimento mensal, Mas

através das constelações zodiacais,

um

é

planeta:

o Planeta que no ceo primeiro

ja

Habita, cinco vezes apressada,

Agora meyo Mostrara,

rosto, agora inteiro

em quato

o

mar cortaua

a

armada.

Os Lusíadas, canto V, estância

E a

mais próxima da

a estrela errática

24.

uma

terra, e é

das estrelas

que Camões alude no quinto verso desta estância: Ouuiolhe estas palauras piadosas,

A

fermosa Dione,

&

comouida,

Dantre as Nimphas se vay, que saudosas Ficarão desta súbita partida: Ia penetra a^ Estrellas luminosas. Ia

na terceyra Esphera recebida

&

Auante passa,

no sexto

la

ceo.

Pêra onde estaua o Padre se moueo. Os Lusíadas, canto

A

estância 33.

formosa Dione, partindo de junto do Gama, penetra as esferas

da Lua

e Merciírio,

é

recebida na sua,

esferas do Sol e de Marte, para

Nesta oitava, a palavra à esfera das estrelas

De

11,

ir

passa avante, através das

e

com

ter

na sexta

Jiípiter

estrelas designa planetas;

a.

esfera.

deusa não chega

fixas.

todas as estrelas, quer fixas, quer erráticas, só o Sol tem luz

própria; as outras são luminosas pela luz que dele recebem.

O

Sol, tendo,

alem do movimento que a sua esfera recebe do

mamento, o curso anual próprio do seu e

por isso

um

Que

estrela errática,

tempo o lúcido Planeta,

as horas

vay do dia distinguindo,

Ghegaua aa desejada,

A

& lenta Meta,

luz celeste aa gentes encobrindo.

Os Lusíadas, canto

II,

estância

i.

lúcido planeta é a única fonte da luz celeste.

luminosos os outros planetas;

É

uma

planeta: Ia neste

O

céu, é

o que

vamos

com

A

sua luz faz

a sua luz brilham as estrelas fixas.

ver.

Comecemos por uma o sábio.

fir-

No tomo

v,

opinião ilustre do século

parte

nomia dei Rey D. Alfonso



i.^,

xiii,

a de Afonso,

da obra Libros dei Saber de Astro-

X de

Castella,

Madrid, 1867, de que





vêem publicadas aLas vindictas ó el centiloquio Alfonsiy> Vindicias são, como as define o compilador Sinobas, «todos aquellos

falámos,

IV—qAs

Cap.

3l

estrelas

dichos, opiniones y frases escritas en los libros dei Saber de Astro-

nomia por

cem

pluma

la

Na

mismo Rey D. Alfonso».

dei

primeira das

Afonso sobre as figuras das

vindicias, que exprime a opinião de

constelações, lêem-se estas linhas, a pág. 169:

«Ca

et llanos. et

As

.

.

.

sinon cuerpos redondos, et fuertes la

el

».

na opinião do

estrelas são pois,

rijos e lisos,

si

apareiados para rescebir luz dei Sol. assi cuemo

Sol rescibe de Dios



non son en

las estrellas

rei

Afonso, corpos esféricos,

que refletem a luz do Sol, como o Sol

reflete a luz

que

recebe de Deus.

Vejamos a opinião geral sobre

da Margarita Philosophica, atrás citado,

pítulo

abaixo da passagem que

&

(dta

&

existunt,

Est enim

differút.

retentiua,



no século diz-se,

No

xvi.

stella

&

ca-

algumas linhas

transcrevemos:

quae coelorum partes sunt, necessário cum

stellae

eiusdem naturae

tiua

este assunto

&

ab

tantum densitate

ipsis

et

coelis

raritate

densior orbis sui pars, luminis solis recep-

Orbis uero

propterea potentiae uisiuae obiecta.

in alijs partibus (quia rarior)

lúmen uersus ipsum proiectum non

corporans, luminosus aut lucidus non

fit,

nec cuiuis colori

in-

subijicitur,

ideo uisibilis non est».

As

estrelas,

como

partes dos céus, necessariamente são da

mesma

Cada

estrela

natureza que eles, distinguindo-se apenas na densidade.

uma

é pois

solar, e

parte mais densa do seu céu, receptiva e retentiva da luz

por isso exposta à potência

visiva.

Nas

outras partes

porem

o céu, não incorporando (por mais rarefeito) a luz sobre ele pro-

não se torna luminoso

jectada,

quer cor, sendo por isso

nem

lúcido, e

não está

sujeito a qual-

invisível.

A mesma

opinião se encontra na Sphaera Mundi, folha 14, verso:

«Et

quod

scito

stella est

& idos

lucet sicut

magis

inter partes

quam reUquae

pars densior sui orbis figurae rotundae:

diaphanum condensatum: sui orbis:

partes.

etiã sicut

& galáxia

in stellis

est pars lúcida

quasi densior est

Sic quoque partes lune nÕ sunt vniformiter

lucidae».

E

deve saber-se que

céu, de

À

forma redonda;

via láctea é

uma

uma

estrela é

a sua face luz

uma como

parte mais densa do seu

um

diáfano condensado*

parte mais lúcida do seu céu;

é,

como nas

estrê-

:

qA astronomia aos Lusíadas

J2

também um pouco mais densa do que as restantes partes. também as partes da lua não são uniformemente lúcidas. Esta mesma teoria vamos ainda encontrar em André de

Assim

las,

Avelar.

Transcrevemos do Repertório dos tempos, edição de i585:

Da

& forma

matéria

das estrelas.

Titulo. 54,

«Diz Aristóteles no liuro

de caelo cap.

2.

as estrelas estão compostas, he a

&

mais densa

mediãte o qual se

q a

mesma

de madeira,

&

a

&

a

q a dos ceos, saluo q he a claridade dos raios do

assi

&

porque a claridade

como

reter

vem assi como o nò da taboa, he mais denso hum como outro se chama, & diz matéria rezam porque de dia não se vem as estrelas, he

sol,

taboa,

mesma

&

apta para receber

deq

que a matéria

7.

lume do

sol

he maior

&

ofusca a menor, assi

o lume de hua candea diãte de híia fugueira ou lume grande:

forma das

lugar

estrelas, he

dito de

ja

redonda como o mostra o Phylosopho, no

&

maneira de húa bola mociça,

donda como dissemos da Lua, &

assi se

perfeitamente re-

entenderá do Sol

&

mais

Planetas».

Nas

um

edições de 1894 e 1602, Avellar acrescenta

— Se

intitulado

em

tem as estrelas próprio lume,

novo capítulo

que chega a esta

conclusão

mas

«...

lume próprio seria supérfluo o

se as estrellas tiuerão

que recebessem do Sol, logo hase de dar

gem, que he o lume que do Sol corpos

&

obra

estrellas

com

&

os lugares

em

tem própria

sem

que se

influencia

Marte aquenta, lume,

&

&

sae, o qual recebido

mesturado

6i

diz,

A

porque a

& escuro,

luz :

diíFerentes

abranda a cera, endurece,

do Sol

se

podem entender

em

Saturno

s.

que

esfria,

em

ou podemos entender, que tem

com

estrelas ao

efeito

o do Sol».

ao declinar da teoria.

passam

ori-

como vemos por

que não basta a conseguir seu

perfeiçoado

as estrelas

comparação das

em

&

que as estrellas tem próprio lume

Assiste-se nestas linhas

momento em que luz, como o Sol.

&

conforme a este sentido

na Líía humidece

mas tem pouco

ser

so principio,

diuersos effeitos assi

experiência, que a luz do Sol enrarece,

condensa o barro,

hum

Aproxima-se o

a ser definitivamente fontes de

nó da tábua

é .repetida

por Avelar

:

IV — qAs

Cap.

39

estrelas

no seu interessante livrinho Sphaerae utriusque

^,

demonstrar o movimento diurno do firmamento, a

&

«Igitur

caelum

in

quo ipsae

eodem motu mouebitur ab

As

stellae (ac

nodus

quando foi.

29,

trata

in tabula) existunt

oriente in occidentem».

são pois, através do século xvi, consideradas

estrelas

de

r.

como

núcleos de condensação da matéria de que os céus são compostos,

brilhando

com

Lusíadas.

E

do Sol.

a luz recebida

o que se



também nos

Assim, na estância 87 do canto X, Olha estoutro debaxo, que esmaltado

De corpos lisos anda, & radiantes, Que também nelle tem curso ordenado,

E

nos seus axes correm scintilantes,

como

as estrelas são corpos lisos,

recebem do Sol; brilham com Meyo caminho

E

as Estrellas

Tinham o

E

espelhos, radiantes

a luz

que

lu\ alheia:

a noite tinha andado,

no Geo co a

largo

Mundo

alheia.

lu:^

alumiado,

so CO sono a gente se recreia. Os Lusíadas, canto

Camões

com

O

estância 60.

no seu tempo, não atribuindo

reflecte a opinião corrente

luz própria às estrelas.

11,

mes],Tio faz

Ariosto

(n.

1474

— m.i 533),

no Orlando Furioso:

Rinaldo, ch^ di gloria e di splendore Gli ha,

como

il

sol le stelle, illuminati.

Canto

-

O poeta

diz

XXX,

estância 90.

que Reinaldo iluminava os irmãos com glória e

es-

plendor, como o sol às estrelas.

1 Sphaerae utriusq; tabeliã, ad Sphaerae huitis mundi faciliorem enucleationem. Autor e Andrea d'Avellar Olysiponensi, Artium, ac Philosophiae Magistro, & publico

íp Conimbricensi Academia Mathematum professore. Conimbricae, Apud Anton. Barrerium Typ. Reg. Anno Dni i5g3. Há um exemplar na Biblioteca da Univer-

sidade. 3

.

34

G/^

O mesmo

astronomia dos Lusíadas

conceito exprime Dante na descrição do anoitecer,

com

que abre o vigésimo canto do Paraíso: Quando

colui che tutto

Deiremisperio nostro

Che

Lo

si

il

mondo alluma

discende,

giorno d'ogni parte

il

che sol

ciei,

Subitamente Per molte

di lui

si rifa

luci, in

si

cnn'íiima.

prima s'accende,

parvente

che una risplende

Desce o Sol no horizonte, fenece o dia muitas luzes, estrelas fixas

e planetas,

em

'

*.

o céu reaparece

e

uma

que

com

só, a luz solar,

resplandece.

O mesmo Trat.

de

II,

quadrivío

Paltra

è,

si è,

.

.

.

xiv,

do trívio

e

correspondendo a aritmé-

può comparare alParismetica per due pro-

si

che dei suo lume tutte

le altre stelle

E

che Focchio nol può mirare.

sono nelParismetica,

nano

Cap.

do Sol:

Tuna

si

sete sciências

as sete esferas planetárias,

«E'l cielo dei sole prietadi:

Dante compara as

// convíto,

com

tica à esfera

No

adeante, no verso 3o do canto XXIII.

chè

dei

suo

lume

s'informano;

queste due propietadi

tutte

le

scienze

s'allunii-

»

como o

*A arimética ilumina as outras sciências

Gomo

Dante

seu tempo,

em

e Ariosto,

sol às estrelas.

Camões põe nos seus versos

as ideias do

que predominava a concepção geocêntrica do mundo,

de Ptolomeu, e a luneta estava por inventar.

Contudo temos

visto o verso:

—E

as estrelas no Céu, co a luz

— interpretado, como significando: — E as estrelas no Céu, com a Lua — citando-se a passagem do Sonho de Scipião, de Cícero, alheia

2

j

{De Re publica,

vi,

i6):

«ex quibus erat ea

(stella)

tima a caelo, citima terris luce lucebat aliena» Faria e Sousa cita

Parece-nos

1

bem que

se faz de

esta passagem,

ul-

sem mais comentário.

a sua intenção é apenas fazer notar a analogia

Quando aquele que todo

que o dia por toda

mente

também

minima, quae

^.

o

mundo

a parte se extingue,

novo aparente

|

ilumina

|

do nosso hemisfério desce,

o céu, que antes só ele accende,

por muitas luzes,

em que uma

|

|

subita-

resplandece.

|

2 J.

Barbosa de Betencourt, Subsídios para a leitura dos Lusíadas^ Paris-Lisboa,

1904, Pág. 5o. •^

«uma das quaes

era essa pequenina estrela que, sendo a ultima contando do

ceo, e a mais próxima da terra, luzia

com

luz alheia>\

:

IV — oás

Cap.

35

estrelas

da expressão Ince aliena, aplicada à Lua, coni a expressão co a Ini alheia, aplicada

No

por Gamões às estrelas.

comentário à estância x,.87, Faria

trelas são corpos

lisos,

reflectores

da

Sousa explica que as

e

Esta

luz solar.

é

que

es-

é a «luz

alheia».

As

2.

condensadas da substância dos seus céus,

estrelas, porções

são por eles arrastadas nos seus movimentos:

Da Lua

os claros rayos rutilauao,

Polas argênteas ondas Neptuninas,

As

Estrellas os

Ceos acompanhauão

Qual campo reuestido de boninas. Os Lusíadas, canto

estância 58.

I,

acompanham o firmamento; os planetas são levados nos céus respectivos. Assim o intervalo de tempo, que separa duas passagens superiores consecutivas duma mesmo estrela fixa pelo meridiano, é um dia sideraL tempo duma rotação completa do priAs

estrelas fixas

meiro móbil, menor, cerca de quatro minutos, que o dia solar médio.

No

segundo verso da estância VII, 6o:

O dá nos o poeta

ceo volubil

uma

com perpetua

roda,

bela e concisa definição do dia sideral, que é o

período da roda perpétua do céu polúbil, período constante, metro natural

do tempo.

Como, enquanto o céu dá uma para oriente

eclíptica,

na.

volta, o Sol se

move de

ocidente

o dia solar é maior que o sideral, e este

curso próprio do Sol, através das constelações zodiacais, faz variar o aspecto do céu estrelado no decorrer do ano.

Quando uma

tem o seu ocaso cerca duma hora depois do

podendo

Sol,

estrela

distinguir-se

na claridade dos liltimos raios solares, diz-se que o seu ocaso é heliaco; se nasce cerca

heliaco.

No

duma hora

antes do Sol, diz-se que

tem nascimento

antigo Egito o nascimento heliaco de Sírius, tendo lugar

na época das cheias do Nilo, era celebrado com festas religiosas. Distinguem-se ainda os nascimentos

e

ocasos cósmicos e crónicos.

Estas distinções não teem grande importância na astronomia,

No Tratado da Sphera

teem-na para a interpretação dos poetas.

Pedro Nunes

como nacem e

é este e se

assunto objecto do Capítulo

põem

da deferêça dos climas

«Ho poetas:

nacer

&

e

os Signos.

Da

mas

iii,

intitulado

deferença dos dias

e

de

— De

noytes:



ho por dos Signos he

segundo os Astrólogos.

em

Os

duas maneiras: segundo os

poetas fazem três deferenças

;

di astronomia dos Lusíadas

36

&

no nacer

&

Cósmico: Crónico:

no por dos signos.

Na-

heliaco.

cimcto cósmico se chama quando algú signo ou estrella: sobe de dia sobre ho horizõte da parte de oriete.

diz ter

Do

este

em

cada

hum

sol pella

&

nacimento se chama próprio principal

dia

menhã

de cada dia.

qual temos enxepro nas georgicas onde se ensina a fazer a se-

menteira das Favas

&

ho signo de Tauro.

Diz assi:

do milho no verão: quando ho

&

em

abrir

dãdolhe lugar a cõstellaçã canis

Nacimento crónico ou temporal he

põe

sol estaa

Quando ho resprandecete Touro

o ãno cõ seus cornos dourados: se

posto que

nacimêto cósmico per excelência: cõ o qual ho

&

nace:

E

nação seys signos desta maneira: aquelle signo porem se

artificial*

:

quando algum

signo ou estrella: despoys do Sol posto sobe per cima do horizonte da

parte de Oriente: e chamase Crónico porque he de noite.

E

temporal

porque ho tempo dos Mathematicos he despoys que ho Sol se põe. Deste nacimento dezia Ouidio no de Ponto aqueixandose do muito

tempo que auia que estaua degradado. As pleyades com seu nacimento fezeram ja quatro autunos: daua per estas palauras a entender que poys eram quatro autunos quatro annos eram passados de seu Nacimento Heliaco ou solar se diz quando algum desterro signo ou estrella se pode ver: por estar apartado do Sol:

nam

se podia ver:

com

por estar junto

&

antes

Deste nacimento diz

elle.

Ouidio no de Fastis Ia ho Aquário leue com seu cântaro obliquo sayo...».

-

Como em

Ovídio

Vergílio,

e

seguido atentamente por poetas,

um

vasta erudição incluíam

yê-se

o movimento

como Dante

e

das

estrelas

Camões, que na sua

conhecimento muito preciso da astro-

nomia.

Dante

dirige-se,

«Lo giorno

com

Vergílio, para o Inferno

se n'andava)),

{Inferno, canto vii,

como

no começo da noite

principia o canto segundo.

Adeante

verso 98) o poeta repara que meia noite

já vai

passada, Già ogni

stella cade,

Quando mi

descaem cípio



sobre o horizonte as estrelas que subiam quando, no prin-

da noite, se dirigia para a terrível porta.

Camões

1

che saliva

mossi,

Dia

indica o declinar da noite, pelo cair das estrelas de nas-

artificial

acima do horizonte.

op6e-se a noite; é a parte do dia natural

em que

o sol está

:

Cap.

IV — qAs

estrelas'

3j

cimento crónico, quando descreve o sonho de D. Manuel na estância IV, 67:

O

como do nobre pensamento

qual,

Daquella obrigaçam, que lhe ficara

De seus antepassados, (cujo intento, Foy sempre acrecentar a terra charaj Nam deixasse de ser hum so momento Conquistado: No tempo que a luz clara Foge,

A

O

tempo que a

&

as estrellas nitidas

que saem

repouso conuidão, quando caem. lui clara foge

*,

sendo o tempo

do Sol, ou indica o começo da noite ou a noite

como o tempo em que

falta a luz solar.

em que foge a luz dum modo geral,

Pelo que se segue tem de

optar-se por esta liltima interpretação.

Sair, falando das estrelas, é surgir

nascer enfim.

nascem de

As

noite

estrelas que

saem

no horizonte, começar a

nascem de

nítidas.

O

vêem

dia não se

;

subir,

só as que

adjectivo nitidas é importante, por-

que indica que o poeta se refere a estrelas de nascimento crónico. Define-se pois nos últimos versos a parte da noite

que



em

que as estrelas,

de noite nasceram, convidam a repouso, pela sua queda do lado

ocidental do meridiano.

A noite

caminha para o seu

fim.

E

adeante,

na estância 76, terminado o sonho, rompe a madrugada: Estendeo nisto Febo o claro manto Pello escuro Emisperio somnolento:

Veyo a menham no ceo pintando as cores De pudibunda rosa & roxas flores.

*

João Franco Barreto p5e

sição do a que era artigo.

:

Não

As nossas transcripções são ção, Lisboa,

Universidade.

á

hq

clara

em

se justifica tal

vez de a lu^ clara^ fazendo prepo-

emenda.

feitas á-Os LusiadaSy Fac-simile da primeira ediImprensa Nacional, 1899, ^^ ^^^ ^^ ""^ exemplar na Biblioteca da

:

V A

esfera

Spliaera Deus, cujus centrum est ubique, circumferentia nuí^quam.

Nas estâncias 77 a 80 do canto X canta o poeta as propriedades geométricas da esfera. Tétis mostra ao feliz Gama o rotundo globo, transunto reduzido do

em

volta as dez esferas concêntricas móveis

undécima cia

mundo em pequeno volume: no

esfera, o

Empíreo, imóvel.

que constitue a região

mos

Não

se

e,

centro a Terra,

envolvendo estas, a

enxerga a quinta essên-

celestial lúcida (vid. a transcrição

que

fize-

a pág. 20), vendo-se através dos diferentes céus claramente,

no

centro, a região dos quatro elementos, a Terra.

Aqui

hum

globo

vem no

ar,

que o lume

Claríssimo por elle penetraua,

De modo que

Como

o seu centro esta euidente,

a sua superficia, claramente.

Qual a matéria

seja

nam

se enxerga,

Mas enxergasse bem que está composto De vários orbes, que a diuina verga Compôs, & hum centro a todos so tem posto.

A diz

superfície deste rotundo globo, superfície tão limada,

na estância 80,

esfera,

é

uma

com que abre o

superfície esférica.

capítulo

1

como

se

Leia-se a definição de

do Tratado da Sphera de Pedro

Nunes «Sphera segundo Euclides he hú corpo que se causa pello moui-

mêto da çircunferéçia do meo

circulo leuado per derredor ate tornar

.

qA astronomia dos Lusíadas

40

ao seu lugar: estando ho diâmetro quedo.

Segúdo theodosio sphera

hum

&

no

meo

pÔto: do qual todallas linhas leuadas ate a circunferência

sam

he hú corpo maciso recolhido debaixo de hua soo face:

te

A linha dereita q passa pello cetro da sphera

Este ponto se chama cetro da sphera:

iguaes.

&

toca cÕ os seus cabos a

circunferêcia

:

chamase Eyxo

Os

da sphera.

dous põtos

q sã cabos do eixo são poios

do mudo».

Na JPi a 777 etro tTlxo

a

definição de Euclides,

que se chamava a definição

causal, a esfera é perfície de revolução

gerada pelo movimento de

uma

uma

su-

circunferência

em torno do diâmetro; cada ponto da curva generatriz descreve um Tomando círculo cujo plano é perpendicular ao eixo de revolução. a linha dos poios para eixo,

como

podem

que acabamos de fazer,

se indica

no

final

da transcripção

con-

siderar-se os pontos da esfera distri-

buídos

em círculos perpendiculares

ao

mundo, paralelos portanto; seguindo em cada paralelo o mo-

eixo do e,

vimento gerador, vê-se que os pontos vão estando a alturas diferentes sobre o horizonte, erguendo-se até ao meridiano para baixar

em

definição de Teodósio,

seguida.

Na

matemático do

primeiro século antes de Cristo, con-

da equidis-

sidera-se a propriedade tância dos pontos se

da superfície esférica ao centro

;

não se erguem nem

abaixam portanto estes pontos em relação ao centro da

esfera.

São estas duas definições que Camões tão engenhosamente resume no trocadilho dos dois primeiros versos da 2.^ parte da estância 78: Voluendo, ora se abaxe, agora se erga,

Nuca sergue, ou se abaxa, & hú mesmo rosto Por toda a parte tem, & em toda a parte

Começa

No

&

acaba,

em

fim por diuina arte.

A

pa-

superfície de revolução;

não

primeiro verso está resumida a definição de Euclides.

lavra volvendo indica que a esfera é se refere a

movimento da

esfera,

uma

porque a superfície externa do globo

V — qA

Cap.

41

esferd

pertence ao undécimo céu, ao Empírio imóvel. isto é,

curvando-se

em

torno do eixo do

ora se ergue, ora se abaixa

No

em

A

mundo em

um

relação a

esfera, volvendo,

círculos paralelos,

plano horizontal.

A

segundo verso está resumida a definição de Teodósio.

fera não se ergue

nem

se abaixa relativamente ao seu centro.

E

es-

Tétis

pode bem mostrar no globo a propriedade da equidistância, porque, sendo

o seu centro, onde se vê a Terra, está evi-

êle transparente,

como a sua superfície, claramente. Não só na obra de Sacrobosco, mas também nos

dente,

outros Tratados

de astronomia do tempo, era usual darem-se as duas definições con-

como na Margarita

juntamente,

Philosophica,

Tract.

i,

Lib.

vii,

sos

III, De O com o seu engenhoso trocadilho. Da definição de Teodósio resulta que,

se

cortarmos a esfera por

um

plano que passe pelo centro, obtemos

um

círculo de raio igual ao

poeta resumiu-as

Definitione Sphaerae.

Cap.

A

da esfera.

secção feita por

para qualquer ponto da esfera

é

em

dois ver-

um plano passando pelo raio tirado um círculo máximo. A esfera é por

uma superfície de curvatura constante; tem em todos os pontos em todas as direcções a curvatura do seu círculo máximo. E esta

isso e

constância de curvatura que o poeta exprime, quando diz que o globo

«um mesmo forme,

em

rosto por toda a parte tem» e

quando

lhe

chama

uni-

seguida, na estância 79: Vniforme, perfeito,

em

si

sostido,

Qual em fim o Archetipo, que o

criou.

dum ponto qualquer e seguindo um círculo da esfera, mesmo ponto. Na esfera, como no círculo, não há princípio nem fim determinado; e em qualquer ponto o princípio se une com o fim. «E em toda a parte começa e acaba em fim, por divina arte», diz o poeta. Por divina arte quer dizer à maneira de Deus, como Deus. A palavra arte é empregada na mesma accepção do Partindo

volta-se ao

final

da estância

III,

22:

Esta, o velho que os filhos próprios come,

Por decretO; do Geo

Veo

a fazer

Criando a Reino

Em

&

leue,

&

foi

desta arte.

III,

3o:

o Príncipe Affonso, que desta arte

Se chamaua, do

«Por divina arte»

melhança de Deus.

illustre,

empregada em

igual sentido é

Mas

ligeiro,

no mundo tanta parte.

é

Auò tomando

o nome.

equivalente a «segundo o tipo divino», à se-

42

(òi

No

astronomia dos Lusíadas

uma

Observatório Astronómico da Universidade existe

ção italiana da Esfera de Sacrobosco,

segundo o costume.

Intitula-se Annotationi

Spera dei Sacrohosco, authore M.

em

Florença,

com anotações

Mauro

sopra la lettione delia

tradução

(ad verbum) da Esfera de Sacrobosco,

fiel

compreende Vna Spera Theologica :

Diiiina,

& Christiana

e

Vna Spera

Platónica, con Alcune eccitationi mathematiche, Theologiche

— spera theologica et

parte subordinada ao título

screvemos o seguinte trecho (pág.

margem como estreitamente

em

Impressa

Florentino»

i55o.

Além de uma

Da

tradu-

aditamentos,

e

constituindo

com

& diuiyie.

divina

— tran-

na

i6i), cujo assunto é indicado

um Primo presuppositOy

e

que se relaciona

o que vimos tratando:

«Presupponendo

spera materiale,

la

suoi dieci circuli (come

colli

figura perfeita, alia quale non si puo aggiugnere, o minuire cosa alcuna, & doue il principio è vnito col fine) significare quella diuina & ideale spera intelligibile, qual' è la nuda, pura, di

Dio glorioso

&

nõ se

li

&

benedetto.

II

&

inuisibile essentia

quale essentialmente solo é perfeito,

puo aggiugnere cosa alcuna:

&

è quel cõ

quale

il

cipio è col fine congiúto, anzi è vn' istessa cosa, principio tutte le cose,

eterno

&

non

di se stesso,

&

il

prin-

fine di

ne da se stesso principiato, per esser'

cosi circulo & spera, significare & Platónica, intellettuale spera, delia qu^ile & la circunferência in nessun' luogo».

incomprensibile.

quella intelligibile,

Et

il

il

centro è per tutto,

Começaremos por

notar que a esfera material

com

os seus dez

círculos é a esfera armilar artificial, cujo estudo é o objecto do

segundo

capítulo da obra de Sacrobosco, para, por ela, se entender a esfera celestial.

Assim o

capítulo

ii

do Tratado da Sphera

intitúla-se":



Dos círculos dos quaes a esphera material he composta per que entenComeça-se por estudar a equinocial, segue-se demos a celestial



.

o zodíaco, os dois coluros e o meridiano círculos

&

horizonte, ao t*odo seis

máximos; depois estudam-se os quatro

círculos

menores que

são os dois trópicos e os dois círculos polares.

& diuina,

PresupÕe-se primeiro, na Spera theologica material se

com

pode juntar nem deminuir cousa alguma,

unido com o fim

1

«Ge

qu'ils

que a esfera

os seus dez círculos (como figura perfeita, à qual não

*)

e

onde o principio está

significa aquela divina e ideal esfera inteligível

appelleront Tespace, ce sera cette sphère d'oú

et sur laquelle se passent tous les

Leur espace sera donc sans

phénomènes dont

limites puisqu'on

ils

ils

que

ne peuvent sortir

peuvent avoir connaissance.

peut sur une sphère

aller toujours

Cap. é

pura

a nua,

V—qA

43

esfera

essência de Deus glorioso e bemdito.

e' invisível



essencialmente jc>er/^í/o, não se lhe podendo juntar cousa alguma;

êle é

que o princípio está junto com o íim,

é nele

cípio e fim de todas as cousas,

não de

si

é uma mesma cousa, prinmesmo nem por si mesmo

E

principiado, por ser eterno e incompreensível.

assim o círculo

e a

esfera significam aquela inteligível e platónica, intelectual esfera, cujo

em

centro está

toda a parte

em

e a circunferência

parte alguma.

Na

Encontram-se aqui duas ideias que Camões também exprime.

com

esfera o princípio une-se

em

começa

e

feita, à

qual se não pode juntar

acaba

Deus

feito

«árchetipo que o criou», isto

Da obra

A

tas.

de

é a

material, os quais

Mauro

Assim

na parte do capítulo

mundo

ho qual

tem

redÕdo ha

seja

e

estampas

como

quatro menores,

jun-

a esfera

Deus na esfera

a representação de

teológico, que

termo archetfpo encontra-se

& necessidade.

as duas

para a teologia cristã neste curioso

metade astronómico, metade

este

globo diz Tétis que é perfeito^ qual o

explica minuciosamente; estes círculos signi-

filosofia platónica

«Que ho ceo

é per-

como Deus.

máximos

ficam as perfeições divinas.

lê-se^

figura per-

cousa alguma, como

A segunda é a Esfera teológica e cristã, com-

posta de dez círculos, seis

Sphera

tirar

a parte

Esfera Platónica, cuja explicação se pode ler na

parte inferior da página.

O

é,

nem

Mauro Florentino reproduzimos

primeira

passa da

A esfera é uma

fim por diuina arte».

também do rotundo

;

como em Deus: «em toda

o fim,

i

em

Camões podia

Sacrobosco.

intitulada

livro^

ter lido.

No Tratado da

— Da redondeza do ceo:

três rezÕes.

Semelhãça

.

proueito

.

Pella semelhança se proua ho ceo ser redondo porque

sensiuel: he feito a

nam ha

nem

principio

figura redonda:

em

semelhança do mundo archetypo: fim.

E

por isso ho

a qual não ha principio

nem

mundo

em

sensiuel

fim».

Compare-se com a estância 8o: Ves aqui Etérea,

a

&

grande machina do mundo, elemental, que fabricada

Assi foy do saber alto,

&

profundo,

Que he sem principio, & meta

Quem Globo,

cerca

&

em

limitada.

derredor este rotundo

sua superficia tam limada,

He Deos, mas o que he Deos ningue Que a tanto o engenho humano não

devant soi sans jamais être arrete, et cependant le

bout, mais on pourra en faire

Paris,

Chap.

iii,

le tour».

il

o entende, se estede.

será fini;

H. Poincaré,

on n'en trouvera jamais

La

science et Vhypothèse,

Les géométries non euclidiennes, La Géométrie de Riemann.

Spera Platónica.

Pofen átinque Theologi Pia hbonrà di Dio Óptimo Máximo (enigmaricame i

tonici

tcpercio ) €fícr*corn'un*-centro,& Ia belle^z ancila clrcanfcrcnza.Perche (com^è detto) di rurr c le coíc create. cpmunicata è cíTo eíplicata

ia

bontà

&

&

indluifibi vnoDio,inuiÍibiíc coCçfon le, per j[ qual ruttc h buoncEt GÍTer detto ccrro,ce-

tro de quatro circuli,intorno acílb rcuoluri per la comunica i

ubdileaza j.laqual altro non

c

ch« vn*"ragg!0

dl diuinrtítiei

&

dctti 4. circuli inícrto, quefío tal ragqio Ji diuinita,in tut

te lbcofe,!le forme

dèpingc

&

& dcícriuc: lequali forme nelIa n>ente angélica chiamáno Idce. Neira.nima humana ragioni ò vero forme inrelligibiíi. Nella natura íèmid'elleco« fcNelIa mareriá forme íenfíbi» li. Per cio neili 4. circuíi quat-

tro íplcndori ( dclle 4. dettCr

cofe) apparifcano

.

&lc^

Spera Theologica Chriííiana,& diuína.

^

KíA

O nem

mundo tem

a

aslvonomia dos Lusíadas

forma de

um

rotundo globo, onde não há princípio

tim determinado, à semelhança de Deus, que é

sem

princípio

nem

mundo

sen-

meta hmitada.

O sível

mundo archetypo a sua imagem e

é

Deus,

e]ue

concebe

e

semeliiança; o artífice

executa o é

modelo da própria

obra.

a

No

célebre

«A

similitudine

Commentario á Esfera de Sacrobosco de Clavio, pág. 76 da edição de Veneza de iSgi ^: quidem

sic

fabricatus est ad similitudinem

Maximi nitus.

quo nec

in

Debet

est

argumentatur.

mundi

Mundus

hic sensibilis

archetypi, id est, Dei optimi

principium nec finem assignare,

igitur esse rotundus, ut

lê-se,

cum

nõ possit assignari

sit

infi-

in eo prin-

cipium nequefinis».

«Por semelhança argumenta-se assim.

Este

mundo

sensível foi

fabricado à semelhança do mundo arquétipo, isto é, de Deus Óptimo Máximo, no qual, por ser infinito, se não assina princípio nem fim. Deve portanto ser redondo, para se não poder nele assignar princípio

nem

fim».

Comentando

a

mesma passagem

de Sacrobosco, diz Vineto na

Sphaera Joannis de Sacro Bosco Emendaia, Lutetiae, iSSy, a que



atrás (pág. 10) nos referimos:

«Mundus Archetypus hic dicitur ea mudi forma, quam mente concepit Deus mundum hunc facturus: quae Dei cogitatio eterna est, vt Deus ipsé». «Chama-se aqui mundo arquétipo àquela forma do mundo que Deus concebeu na sua mente para fazer este mundo: a qual cogitação de

Deus

é eterna,

como

ele próprio».

Esta definição não diz

é,

porem,

distinta

da anterior, porque, como

Pedro Ciruello Darocense, no seu comentário, à mesma passagem:

«ydea vero ideia

1

não

í

deo nõ distinguiU/r re ab essentia diz/ma»

se distingue

niinc tertio ab ipso

plar desta edição 2

Petri

«em Deus

a

realmente da sua essência».

Christophori Clauii Bambergensis, S.

Commentarius,

^;

J.,

In

Sphaeram Joannis de Sacro Bosco Há um exem-

Auctore recognitus^ Venetas, i5gi.

no Observatório Astronómico.

Johannis de sacro busto sphere textum vna cum additionibus non aspernandis Ci?'uellt D., Parisiis,

Universidade.

Jehan

Petit^ i5i5. Existe

um

exemplar na Biblioteca da

V — qA

Cap.

Na Margarita

Philosophica, Tract.

«Factus est enim

mundi

mundus

intellectualis archetypi

principium nec

esfera

sensibilis

&

& in

íinis, sicut

i,

^7

Lib.

Cap.

vii,

lê-se:

iiii,

&

ad similitudine

exemplar

ideae mentis diuinae, in quo nec est

Vnde

figura sphaerica,

mente gerens, similique imagine formans.

Tu Mundum

Boetius.

cuncta superno Ducis ab exeplo, pulchrum puicherrimus ipse

Consentiunt Plato

& Mer-

curius trismegistus».

«O mundo

imagem do mundo

sensível foi pois feito à semelhança e

intelectual arquétipo e ideia

da mente divina,

em

que não há princípio

Donde Boécio: Tu tudo dena mente um mundo belo e em semelhante imagem o formas. Nisto concordam Platão e Hermes Trismegisto».

nem

fim, assim

rivas

O Que

como na

figura esférica.

do supremo exemplo, tu que

mundo

arquétipo é pois,

és belíssimo geras

em

última anáUse, o próprio Deus.

as propriedades da esfera reflectem os atributos divinos di-lo o

poeta na expressão «por divina arte», e

com que termina

a estância 78,

no verso — qual em fim o archetypo que o criou — da estância ime-

diata.

Mas

a geometria esférica não desvenda afinal, de

o divino mistério, pois que

, . ,

Que

modo

^

o que he Deus ningue o entende, a tanto

o engenho

humano não

se estede.

satisfatório,

VI

 grande máquina do mundo

No

1.

canto

X

uma

argonautas portugueses

faz Tétis aos

lição

de mecânica celeste segundo a teoria da escola de Alexandria.

O

anima a astronomia grega, dando

princípio matemático que

lugar a observações e cálculos de admirável persistência e subtileza, é a explicação

deus

dos movimentos periódicos dos astros, que

e egípcios se

da lua

e

mostravam

dos planetas, por

aos cal-

tão complicados nas suas observações

uma

sobreposição de movimentos perió-

dicos da forma mais simples, isto

formes.



de movimentos circulares e uni-

é,

Os mais complicados movimentos celestes foram, dentro

dos limites de precisão que permitiam atingir os instrumentos de

observação à vista desarmada, representados e

com grande

sucesso pela aplicação daquele pensamento matemático.

netas

movem-se em

círculos (epicidos) cujos centros se

outros círculos (deferentes) excêntricos

em

felicidade

Os

pla-

deslocam sobre

relação à Terra, colocada

no centro do mundo, resultando da combinação daqueles movimentos as suas estações e retrogradações.

O

complexo sistema

epicíclico de

Cláudio Ptolomeu, de Alexandria, último grande cultor da astronomia grega, é

uma

admirável concepção geométrica do universo que per-

mite a construção de tábuas dos movimentos do planetas.

sol,

As posições observadas confirmam depois

da lua

culadas, provando o superior engenho dos grandes espíritos ticos

A

e

dos

as posições cal-

matemá-

que foram gradualmente desenvolvendo o sistema. teoria

astronómica da

escola

alexandrina é sucessivamente

afinada durante 400 anos de observações e cálculos dos astrónomos árabes.

Cultivado depois pelos astrónomos europeus, o sistema pto-

com o renovamento dos estudos de literatura grega da Renascença, uma nova Alexandria na cidade de Nurnberg, com os trabalhos de Regiomontano e seus sucessores. lomaico tem por fim,

:

Q/i asir anomia

5o

Está então reunido o material

dos Lusíadas

vimentos dos planetas

que permite ao génio de

scientííico

Havendo no conjunto dos mo-

Copérnico a simplificação do sistema.

por todos

ciclos percorridos

eles,

no

mesmo

tempo em que o sol faz a volta do zodíaco, em planos paralelos à eclíptica; e havendo uma estreita dependência entre as posições nesses as posições

ciclos e

do

sol

no seu curso anual, concluiu Copérnico

uma acção comum que não Terra em torno do centro comum

que esses movimentos eram devidos a podia ser senão a translação da dos movimentos planetários: o

sol.

Afirmando a rotação da Terra

movimento em torno do

sol,

Copérnico não se limita a repetir

e

o seu

Samos, que, no terceiro século antes de

as ideias de Aristarco de

Cristo, ensinava já a rotação e translação da

Terra à volta do

Copérnico funda as suas afirmações nas observações

e cálculos

sol.

de

tantas gerações passadas, resumidas na teoria de Ptolomeu, afinada e

completada pelos astrónomos árabes

tema,

Copérnico simplificou-o

;

e

Meditando o

europeus.

tornando-o

heliocêntrico,

sis-

suprimiu

muitos círculos; a rotação da Terra aliviou as estrelas da acção do primeiro

e

Baseado no princípio do movimento

do segundo móbil.

uma combinação

circular e uniforme, o seu sistema é ainda tricos

com

O

livro

de excên-

alguns epiciclos.

De

í^euolutionibus de Copérnico foi publicado

em

1642,

mas durante meio século o sistema conta apenas um pequeno número de aderentes*. Quando por 1570 o astrónomo dinamarquês TichoBrahe visita a Alemanha, encontra aí a aspiração, também dominante

em

França

e

Itália,

por

uma Astronomia

sine hypothesi; a doutrina

de Copérnico não parecia suficientemente justificada pelo material de observação

em

que se fundava; ansiava-se por

uma

larga série de

observações planetárias de maior precisão, que decidisse a contenda dos astrónomos.

Ticho-Brahe, nada inclinado à ideia do movimento da Terra,

mou

sobre

si

essa tarefa.

to-

Observador admirável, conseguindo reduzir

No Reportório dos tempos de André de Avelar, Lisboa, Sgo, fl. 26, v., lê-se também com muitas demonstrações sua (da Terra) immobilidade, ainda que aja auido muitos varões muy doctos, que disseram mouer-se a terra, como foi Pythagoras, & em nossos tempos Copérnico, q disse estar o sol no meyo do mundo 1

i

«proua-se

quieto

suppos

& fixo, & a isto

terra ser a

que

se

mouia,

& ainda

que este doctissimo astrónomo

para suas demonstrações, não he de crer que entendesse ser assi ver-

dade, senão que deu à terra aquelles mouimentos, para milhor conseguir seu intento,

como também o fez Ptolomeo, pondo hua vez Eccentricos, & outra concêntricos com Epiciclos, & de qualquer maneira concluio & aprouou o que queria, que era saber as apparencias dos Planetas». 1602.

O mesmo

se repete nas edições de 1594 e



Cap. VI a

— qA grande

maquina do mundo

5i

minuto os erros das medições instrumentais sem luneta, acumula

I

durante vinte

pequena

um

e

anos, no seu observatório de Uranienburg, na

um

Hveen,

ilha de

vasto registo de observações do planeta

Marte, que, pela sua grande excentricidade, estava destinado a de-

Quando em

cidir a contenda.

clamando no

da febre:

delírio

náo tenho vivido debalde



,

i(5oi,

exilado, morria

em Praga

ex-

ne frustra vixisse videar, creio que

deixava Kepler, que lhe assistia aos

úl-.

timos momentos, na posse das suas preciosas observações, donde o

sistema de Copérnico havia de sair confirmado

dias a duração da revolução sideral de

Sabendo ser de 687

em

torno do

e purificado.

Marte

Kepler, adepto da doutrina copernicana, teve a ideia

sol,

de associar as observações de Ticho duas a duas, reunindo aquelas

que separava à

mesma

da Terra

um

intervalo de 687 dias e que correspondiam portanto

Tomando para órbita aproximada em vir-

posição do planeta na sua órbita.

uma

circunferência, suposição bastante

tude da sua pequena excentricidade, as cordas de ligação daqueles

pares de pontos eram bases de triângulos tendo por vértices opostos as diversas posições de Marte,

que assim pôde marcar por pontos,

por esses pontos, marcados

gem no

uma

terreno,

observação.

A

curva

adopção

na perspectiva de Marte

numa folha de papel como uma com os desvios permitidos pelos

dum

in-

Restava fazer passar

dependentemente de qualquer outra hipótese.

piquetaerros de

excêntrico dava desvios de 8 minutos

e os erros

de Ticho não excediam

minuto;

i

Depois de muitas tentativas,

a órbita circular estava pois condenada.

Kepler, conhecedor da teoria das secções cónicas de Apolónio (280 a.

G.),

acaba por verificar que

uma

às observações

elipse satisfaz

tichonianas.

Em vimento tis.

O

1609 publica Kepler as suas duas primeiras

um

contêm nas

leis

Uma

De

lei

do mo-

stella

Mar-

planetas descrevem elipses

em tempos

liga os

iguais.

A

terceira

lei,

elipse,

a

vão

chamada

tempos de revolução dos planetas com os

pubhcada

em

16 18.

Como

aplicação

com

aplicação

calculou Kepler as Taboas Rudolfinas,

leis,

com

os raios vectores dirigidos do sol para os pla-

e

eixos maiores das órbitas, só foi

das novas

Os

comprimento nos diferentes pontos da

varrendo áreas iguais harmónica, que

concepção geométrica mais bela do universo

de Kepler.

dos focos no sol;

netas, variando de

lei

das áreas, no seu famoso livro

elíptico e a lei

a

sistema de Copérnico é depurado definitivamente dos excên-

tricos e epiciclos.

se

leis,

à navegação; a teoria das cónicas de Apolónio,

dum

valor puramente

especulativo durante tantos séculos, passa assim a auxiliar os pilotos

nas derrotas marítimas.

Das

três leis

de Kepler pôde

Newton deduzir

a lei

da atracção na

'qA astronomia dos Lusíadas

52

razão directa das massas e inversa do quadrado das distâncias, que ele

publicou na sua grande obra Philosophiae Naturalis principia

mathemaíica, Londini, 1687, depois de a

Com uma

anos.

ter

meditado durante vinte

concisão notável diz o professor Bouasse da Univer-

sidade de Tulosa:

((L'ambition du physicien est de reconstruire

le

syllogistique à partir d'un principe assez générab)

Este princípio é hoje, na astronomia, a

da

lei

lei

de Newton.

Da

ele intitulou

Partindo

— Tratado de mecânica

acabamos de fazer

sucinta exposição que

Newton, pedra angular da astronomia moderna,

humanidade na procura de concordância

com

cola alexandrina

foi

sciência, a qual,

leis

resulta que a é

uma

cada vez mais simples

celeste. lei

de

conquista da

mais gerais,

e

o rigor crescente das observações; ela não podia

formulada por

ter sido

da

voie

da atracção newtoniana, pôde Laplace reconstruir o mundo solar

por meio do silogismo que

em

monde par

*.

um

uma

E

homem.



a teoria astronómica da es-

das gloriosas étapes no progredir incessante

segundo Mach

se

2,

pode considerar

um

problema

de mínimo: expor os factos o mais perfeitamente possível com o mínimo dispêndio intellectual. Aquela teoria merece a nossa admiração, e não o desdém daqueles que, familiarizados hoje com a concepção heliocêntrica de Copérnico, se julgam capazes de ter podido dar alguns

conselhos a Ptolomeu.

Do

resumo como

belo

2.

em

sistema ptolomaico não há

língua

nenhuma

a descripção que nos deixou a lira de

Depois dos estudos

feitos

seguir agora mais rapidamente a descrição da

puramente astronómica.

Se

satisfez

do mantimento nobre,

&

na armonia

Virão os altos

doce suauidade,

feitos,

que descobre

Thetis de graça ornada,

Pêra que

As

com mais

felice

Gama

grauidade,

alta gloria dobre,

festas deste alegre

Pêra o

&

&

claro dia

assi dizia.

1

De

2

E. Mach, Die Mechanik in ihrer Entwickelung.

la

méthode dans

máquina do mundo

Restringir-nos hemos, o mais

Despois que a corporal necessidade

E

Camões.

nos capítulos anteriores podemos

que começa na estância 76 do canto X. possível, à parte

tão grandioso e

les sciences, Paris, F.

Alcan.

:

:

Cap» VI Faz

— qA grande máquina do mundo

mercê barão

te

53

a Sapiência

Suprema, de cos olhos corporais Veres, o que nam pode a vã ciência Dos errados & miseros mortais Sigueme firme & forte com prudência Por este monte espesso, tu cos mais Assi lhe diz, &; o guia por hum mato

Árduo,

Nam

duro a humano

difficil,

andão muito que no erguido cume

Se acharão, onde

hum campo

De Esmeraldas, Rubis,

A

vista,

Aqui

trato.

tais

se esmaltaua,

que presume

que diuino chão pisaua

hum

vem no

globo

ar,

:

que o lume

Claríssimo por elle penetraua,

De modo que o

Gomo

seu centro esta euidente,

a sua superficia, claramente.

Neste monte espesso, de mato árduo,

onde

é preciso seguir firme e forte

com

difícil

a

humano

bem

prudência, está

zado todo esse longo trabalho de pacientes observações

em

capacidade

a teoria a

procura das

que regem os movimentos dos astros.

leis

que se chegou,

dum

subido valor, não só pelo trabalho

que custou como pelas benefícios que dela se colhem,

cume, esmaltado de rubis tido, através

e

A

bem

é

o erguido

esmeraldas, chão divino, donde é permi-

do modelo criado, abranger a complicada variedade dos

fenómenos astronómicos, pre vê-los tábuas,

simboli-

e laboriosos

engenho de tantos homens de superior

cálculos, todo esse dispêndio de

E

por

trato,

em

cálculos prévios nas preciosas

conhecidas dos navegadores portugueses.

concepção astronómica da escola de Alexandria era para Ptolo-

meu um modelo puramente matemático;

as suas esferas são apenas

fórmulas matemáticas, auxiliares geométricos para o cálculo das po-

Para os astrónomos árabes, porém, como Alba-

sições dos astros. ténio,

com lestes

as esferas são sólidas,

à

existência física, do vasto

maneira de Aristóteles; são peças,

maquinismo pelo qual os corpos

em movimento.

são postos

Purbáchio, nas suas

adoptou as esferas sóHdas dos árabes,

feitas

as dimensões suficientes para, dentro delas,

rentes e epiciclos de cada planeta.

O

ros é dado ver

Cícero

e

E

a

com

máquina do mundo, que ao

com

livre jogo os defe-

modelo criado para

ção do universo deixa pois de ser puramente geométrico; é físico-mecânico.

Teóricas,

de quinta essência,

terem

ce-

Gama

e

a concep-

um modelo companhei-

os olhos corporais.

Materno contam que Arquimedes, o grande matemático

siracusano, fabricara

uma

esfera de vidro onde se via a constituição

dos céus e sua disposição e movimentos.

Glávio descreve, no seu

:

.

qA astronomia dos Lusíadas

54 Commentario á

esfera de Sacrobosco (pág. 17 da edição citada), esta

admirável esfera onde os globos dos planetas, especialmente os do sol e

da

caminhavam com

lua,

mente como no

movimentos próprios, exacta-

os seus

fera vítrea, realizada pela indústria e arte de

Faria

esfera celeste.

e

Sousa

cita

que mereceu ao poeta Claudiano

Mas no tempo mesmo dos movimentos celestes,

V

o imperador Carlos

sante notícia.

M. Antonii

«Hunc locum, omnibus negotijs bium, siderum

— m.

Coccii Sabellici, ex

sibi

&

&

Paulo Jovio

cantado

com

com

*

mirabili oblecta-

coelestium or-

motu perpe-

huiusmodi machina

nullis retro

neque uisa».

V

passando os seus dias

S. Justo, longe dos negócios e bulício

do mundo, en-

o instrumento admirável onde o insigne matemático Leô-

uma

ncio incluirá astros

illo

omne

insignis,

Sabélico mostra-nos o imperador Carlos

no mosteiro de

ah orbe

atqiie aliis, lê-se

motuíí addito etiam octauae sphaerae

est

interes-

ubi uitam procul ab

delegit Carolus Caesar,

strepitu ageret, instrumento

neque audita

a

i558) no seu retiro no mosteiro

tuo, diuino prorsus artificio, incluserat: seculis,

Arquimedes, imitava

o globo de Arquimedes,

epigrama laudatório.

quod Leonellus mathematicus

in

tus,

um

essa es-

de Camões uma admirável representação como nunca se construirá outra, deleitava

i5oo

(n.

também

Ao sr. Dr. José Maria Rodrigues devemos esta Na coluna ySS do Supplementiim historiarum

de S. Justo.

condito

com que

céu, tal era a perfeição e certeza

representação completa das esferas celestes

e

dos

também o movimento perpétuo nem ouvira falar duma máquina

seus movimentos, juntando

da oitava esfera.

Nunca

se

vira

assim nos séculos passados. Este movimento perpétuo da oitava esfera pidação que lhe é próprio. curso ordenado das estrelas

é

o movimento de

tre-

Podia assim vêr-se neste aparelho o

em

torno dos axes da oitava esfera, os

pontos equinociais médios, poios do movimento de trepidação, a que

Camões

se refere

na estância

87.

Deste famoso aparelho de Leonelo devia Camões

mento.

De

1

É

Teria

ele visto

algum modelo semelhante?

globos terrestres fazia-se no século xvi

o

tomo

terceiro da obra

leae, i56o.

A

de Lisboa.

Parece haver aqui

tium orbium,

:

M. Antonii Coccii

um

«ík

«Sc

um

siderum motú.

.

Opera Omnia, BasiAcademia das Sciências

erro tipográfico onde se lê:

motuu...; — devendo

grande comércio

Sabellici

transcrição é feita do exemplar existente na

tium orbium, siderum

ter tido conheci-



.

provavelmente ser:

.

.

omnê

coeles-

— omne coeles-

A

máquina do Mundo, Lib. VII, Tract. gravura extraida da Margarita Philosophica, (nas dimensões do original)

I,

Cap.

V

Cap. VI

em

— (M grande

máquina do mundo

mas muito

Lisboa, globos muito artisticamente iluminados,

dos,

como

55 erra-

Pedro Nunes no Tratado em defensam da carta

se queixa

de marear:

«Mas

isto

he mais pêra espantar: que fazendose cada dia nesta

cidade: globos muito fermósos:

&

custosos: nos quaes por serem

conformes ao mundo perque andamos

carecerem de

cometem

sciecia: os

:

que os fazem

dobrados erros

nelles

nam

&

cabe nenhiã engano: por

mãdam

os que os

posto que nos taes globos aja muyto ouro:

&

deyras, Alifantes

Gamelos:

fazer:

:

e outras

&

muytas bã-

cousas iluminadas...».

A

máquina do mundo, porem, que Tétis mostra aos portugueses não é feita de cristal, nem de armilas metálicas, nem movida por aparelhos de relojoaria. E um simples «trasunto reduzido» do mundo em pequeno volume, como se diz na estância 79, composto dos quatro elementos no centro e da quinta essência na região os

movimentos naturais;

Um

sciência do tempo.

mortal lograra ver ses fazia

com

celestial, e

tendo

modelo do universo como o concebia a globo, como esse que vêem no ar, nenhum é o

os olhos corporais,

como agora aos portugue-

mercê a Sapiência suprema. Qual

a matéria seja

nam

se enxerga,

Mas enxergasse bem que está composto De vários orbes, que a diuina verga Compôs, & hum centro a todos so tem posto.

Não

se

enxerga a matéria que compõe a parte

porque a

celestial,

quinta essência não pode ser apreendida pelos sentidos, vendo-se através delia a Terra no centro.

Mas

enxerga-se

bem que

está

com-

posta de vários orbes concêntricos à Terra; quer dizer, neste globo transparente

podem

feras e, portanto,

distinguir-se os contornos aparentes das onze es-

uma

junta que extraímos da

série de círculos concêntricos,

Margarita Philosophica

e

como na

que mostra, repre-

sentadas por círculos, as sete esferas planetárias desde a da à de Saturno, o

móbil

e,

círculo,

Firmamento, o Céu áqueo ou

finalmente, o Empíreo.

como em

figura

cristalino, o

Lua

até

primeiro

Quando o poeta emprega o termo

85:

Debaxo deste circulo onde as mundas Almas diuinas gozão, que nam anda,



não emprega círculo como sinónimo de esfera; designa a superfície pela curva do seu contorno aparente, pela curva que à vista a está

representando.

:

56

qA astronomia dos Lusíadas Completando

a estância 78, diz o poeta:

Voluendo, ora se abaxe, agora se erga,

Nunca sergue, ou

& hO mesmo rosto & em toda a parte

se abaxa,

Por toda a parte tem,

Começa

&

acaba,

em

fim por diuina arte.

Já vimos no capítulo anterior que no primeiro verso se exprime

que a esfera

é

uma

superfície de revolução,

uma

pelo movimento de

podendo supôr-se gerada

em

semicircunferência

torno da linha dos

poios, subindo e descendo relativamente ao horizonte.

No

segundo

verso está expressa a propriedade da equidistância ao centro, não su-

nem descendo

bindo

um mesmo

a superfície esférica

com

relação a este ponto; e

uma superfície acabando em qualquer

rosto traduz a propriedade da esfera ser

Enfim, começando

de curvatura constante. ponto,,

em e

não tem princípio nem fim determinado, unindo-se o princípio

o fim, por divina arte, isto

semelhança com Deus

é

em

Vniforme, perfeito,

Qual

em

segundo o divino exemplar.

é,

Esta

completada na estância seguinte: sostido,

si

fim o Archetipo, que o criou

Vendo o Gama este globo, comouido De espanto & de desejo ali ficou,

O

Dizlhe a Deosa,

Em

Do mundo Por onde

A

te

em

vas,

&

yras,

&

o que desejas.

tal

qual o concebia a sciência do tempo, divi-

duas regiões: etérea

e

elemental.

«VniuersaUs autem mundi machina sciHcet,

&

elementarem regionem»,

Pedro Nunes

«A tial:

vniuersal machina do

&

in

duo

diuiditur, in

diz Sacrobosco.

Na

aetheream

tradução de

lê-se:

elemental.

A

Mundo

se diuide

em

duas partes.

a qual está

a

Agoa

&

como

centro do

mundo no

per derredor delia ho aar.

logo ho fogo puro que chega ao ceo da lua:-segíído diz Aristóteles

no liuro dos metheoros: porque assi os assentou deos grorioso

E

Celes-

parte elemental he sojeita a cõtinua alteração:

& diuidese ê quatro .s. terra meo assentada: seguese logo

&

dou

aos olhos teus, pêra que vejas

máquina do mundo, assim mostrada ao Gama, como transunto

reduzido do universo, de-se

trasunto reduzido

pequeno volume aqui

sam chamados elemetos: alteram & corrompem & torna a gerar. simprezes que se nam podem partir em estes quatro

pella mistura dos quaes se

& alto.

os quaes hus dos outros se

Sam

os elementos corpos

partes de diuersas formas:

fazem diuersas species das cousas que se

:

Cap.

E

geram. se

VI — cá grande máquina do mundo

hum

cada

E

viuenda de algús animaes.

como

resiste

ha humidade da agoa pêra

todoUos outros afora a terra se

mundo com

centro do

mouem:

seu peso: foge igualmente de

grande mouimento dos estremos:

dallas partes o

5j

dos três cerca de todo a terra per derredor

não quanto a secura da terra

a qual

:

&

fica

to-

no meo da

redonda Sphera. Junto da regiam dos elementos: esta logo a regiam celestial lúcida:

&

pello seu ser

mento

circular:

ímudauel he

&

liure

de toda mudança:

te

contino moui-

chamaranlhe os philosofos Quinta essência».

A distinção entre as regiões etérea e

elemental é indicada na estância

imediata: Ves aqui Etérea,

grande machina do mundo,

a

&

elemental, que fabricada

Assi foy do saber alto,

Que he sem

principio,

Quem

cerca

em

Globo,

&

& profundo, & meta limitada,

derredor este rotundo

sua superficia tam limada,

He Deos, mas o que he Deos ningue o entende. Que a tanto o engenho humano não se estede.

3.

A enumeração

começa agora, da

das onze esferas que constituem a região etérea

periferia para o centro, pelo

está designada por

Empíreo que na

figura

Celum emp/reum.

Este orbe que primeiro vay cercando

Os outros mais pequenos, que em

Que Que

está

com

a vista cega,

Empíreo

se

si

tem.

luz tão clara radiando.

&

a

mente

vil

também

nomea, onde logrando

Puras almas estão de aquelle bem,

Tamanho, que elle so se entende & alcança, De quem não ha no mundo semelhança.

Por baixo do Empíreo imóvel corre o primeiro móbil, a esfera impulsora do movimento diurno, que o poeta introduz na estância 85

Em

fim que o

sumo Deus, que por segundas

Causas obra no mundo, tudo manda

E

tornando a contarte das profundas

Obras da

mão

diuína veneranda,

Debaxo deste circylo onde as mundas Almas diuinas gozão, que nam anda. Outro corre tam leue & tam ligeiro.

Que não

Do

se enxerga, he o

Mobile primeiro;

4)rimeiro móbil diz Sacrobosco:

«Sed primus omnes

alias

58

qA astronomia dos Lusíadas

sphaeras secura impetu suo rapit intra diem,

&

noctem

circa

terram

semeb>.

Pedro Nunes traduz: «Mas o primeiro mouimento moue & leua com seu ympeto todallas outras Spheras & em hiâ dia c5 sua noite da terra húa reuolução»

fazc per derredor

O

*.

poeta canta:

Com

Por obra

O

No

&

este rapto

Vão todos dia

&

os. que

grande mouimento, dentro tem no seyo

deste, o Sol

andando

com

noite faz,

primeiro verso indica-se

a tento

curso alheyo.

com

o adjectivo grande a rapidez do

movimento diurno, de todos os movimentos cidade;

com

celestes o de

maior velo-

a palavra rapto indica-se a sua causa, sendo o primeiro

móbil que arrasta consigo todas as esferas interiores, «omnes sphaeras secum impetu suo

Faria é

e

alias

rapity>.

Sousa parece considerar rapto como substantivo

termo próprio dos matemáticos.

No

Cap.

iii

e diz

que

da Sphaera de Sa-

crobosco lê-se:

«Notandum

etiam, quòd Sol tendens à primo puncto Capricorni

per Arietem usque ad

primum punctum

Gancri, raptu firmamenti

Item iam dictos círculos describit Sol,

describit 182 parallelos

raptu Firmamenti descendens à primo puncto Gancri per Libram us-

que ad primum punctum Gapricorni».

Aqui

com efeito o substantivo rapto, exprimindo o movimento com que o primeiro móbil leva a esfera inteira do Sol a

está

de arraste

dar 182 voltas, enquanto o Sol no seu excêntrico avança debaixo da eclíptica

desde o primeiro ponto de Gapricórnio, por Aries, até ao

primeiro ponto de Gâncer;

outras 182 voltas enquanto o Sol desce

e

do primeiro ponto de Gâncer, pelo signo de Libra, até

'ao primeiro

ponto de Gapricórnio.

Na Margarita

Philosophica, Lib.

vii,

Tract.

do-se do quarto céu, à pregunta do discípulo

— responde-se: 1



«Quemadmodum

No Tractado da Spera do Mundo,

nos referimos na pág.

em

cada vimte e

Gap. xxxi, tratan-

— Gomo

se

move

superiores motu raptus

este céo?

ab oriente

existente na Biblioteca de Munich, a que

mesmo trecho: «Et ho moue consiguo todolos mais debaixo darquatro horas faze huua reuolluçam». Joaquim

10, lê-se a

seguinte tradução do

nono ceo com seu mouimemto arrebata redor da terra:

i,

e

Bensaúde, L' astronomie nautique au Portugal à Vépoque des grandes découvertes, Bern, 19 12, pág. i65.

Cap. VI

— QÁ gy^ande máquina do mundo

per occidentem, redeundo in orientem, in 24. horis, ad

A

mobilis».

como

esfera solar move-se

as superiores

5g

motum com o

primi

movi-

mento de rapto de oriente para ocidente voltando a oriente, seguindo o movimento do primeiro móbil. Parece-nos porem que o poeta emprega rapto como adjectivo, exprimindo com as duas palavras movimento rapto a mesma ideia do

Assim na Chronographia ou reportório dos tempos de André de Avelar, 1594, começa o Cap. lxx: substantivo rapto.

«Debaixo destes doze signos alem do mouimento rapto do Oriente

em

Ponête se moue o Sol de seu meão mouimento per obliquo de

Occidente a Oriente cada dia natural 69. min.

Aqui

está o

rapto, isto

em

é,

movimento diurno do

movimento de

sol

&

8 segundos quasi».

designado como movimento

arraste, proveniente

do primeiro móbil,

opposição ao movimento próprio «per obliquo» na eclíptica.

O

poeta diz analogamente que todas as esferas contidas no seio

da décima esfera vão com

este rapto

com o grande movimento de esfera.

arraste

Hoje o primeiro móbil

é

e

grande movimento,

em

que são levadas por esta

E a rotação da Terra É este «rapto e grande

a Terra.

que produz o movimento diurno dos astros.

movimento»,

este

grande movimento

em

isto é,

que

somos levados no

globo terráqueo, que nos dá a aparência do movimento diurno do

firmamento.

O

verso do poeta ainda tem actualidade, aplicado à

Terra.

Na segunda parte da estância 86 é descrita a nona esfera ou segundo móbil, também chamada Céu Aqueo ou Cristalino, designada na figura por Coelum aqueum. Debaxo deste

leue anda outro lento,

Tam

sojugado a duro freyo,

lento,

&

Que em quanto Phebo, Dozentos cursos

O

faz,

de luz nunca escasso

da

elle

hum

passo.

Cristalino é a esfera propulsora do movimento dos auges e

trelas Jixas que faz avançar

es-

kntamente de occidente para oriente

a

esfera das estrelas fixas e os céus deferentes dos auges dos pknetas.

Executa

em

uma

200 anos

revolução completa i

grau

e

em

49:000 anos, avançando portanto

28 minutos aproximadamente, o que, sendo

menos que grau e meio, o poeta arredonda num grau, como já vimos. Sendo a esfera do sol levada também neste movimento, com ele vão os dois céus deferentes do auge do entre estes dois

como

sol (pág. 12),

mas, deslisando

entre dois muros, avança o deferente

do

sol

no

qA astronomia dos Lusíadas

6o

mesmo do

sentido bq'

8''

quási

e

em

cada

revolução completa se faz

sol cuja

O

ximadamente.

É

dia.

em

seu movimento diurno

este o curso próprio

365 dias é

e

um

curso alheio,

quarto apro-

como

se diz

no quarto verso da estância, proveniente do primeiro móbil.

A

distinção do

movimento dos orbes

e alheio

Assim na obra Quaes-

encontra-se nos livros de ensino do tempo. tiones noiíae in lihellum de

em próprio

celestes

Sphaera Joannis de Sacro Bosco,

in

gratiã

studiosae iiiventutis collectae ab Ariele Bicardo, Parisits, i552, encontra-se, a

tes?»

a pregunta:

14,

fl.

— com

resposta:

a

próprio, seu per

O

se,

&

— «Quomodo mouentur sphaerae caeles-

— «Mouentur

motu

movimento dos auges

duplici motu, uidelicet

alieno, seu per accidens» e estrelas fixas é

motu

*.

actualmente atribuído à

em volta da linha dos poios da eclíptica o precessão em 26:000 anos. E o movimento de pre-

Terra, cujo eixo descreve cone circular de

cessão dos equinócios.

Na

estância 87 é descrita a oitava esfera, o Firmamento,

com

o

seu movimento próprio: Olha estoutro debaxo, que esmaltado

De corpos lisos anda, & radiantes, Que também nelle tem curso ordenado,

E

nos seus axes correm

scintillantes.

Já Vimos que, no século xvi, era ainda doutrina corrente que o sol era a única fonte de luz celeste, a qual as estrelas reflectiam

As

como

os

eram condensações da matéria que constituía como nós do firmamento, esferas de quinta essência condensada, lisas como espelhos, radiantes como

planetas.

estrelas

Eram

os céus.

pois as estrelas fixas

grandes globos de ouro, brilhando à luz do

Na

figura vê-se o

presentando as estrelas

sol.

firmamento esmaltado de pontos radiantes fixas.

re-

Estas estrelas teem os dois movimentos

alheios que ficaram já descritos, provenientes

do primeiro

e

do

se-

Mas teem também o curso ordenado do firmamento, movimento regular de trepidação ou de acesso e recesso, sete vezes mais rápido que o movimento do Cristalino, completando-se em 7:000 anos. Por isso correm scintillantes em seus axes, que são gundo móbil. que

é

o

os eixos próprios da oitava esfera.

poeta os extremos do eixo,

1

E

mais abaixo lê-se:

supra dictú

est.

mouentur motu bilis

motum

:

isto é,

Com

o plural axes designa o

os poios do

movimento de

trepi-

— Primum mobile circumuoluitur spatio 24 horarum ut

Reliquae sphaerae, quò sunt propiores primo mobili, eò uelocius alieno seu diurno, tardius uerò propriis motibus contra primi

etc.«.

Vimos um exemplar

das Sciências de Lisboa.

desta obra na Biblioteca da

mo-

Academia

Cap. VI

— qA grande maquina do mundo

6i

dação, que são os equinócios médios, princípios de Aries e Libra da

nona

deiros

A

em

como já vimos, os equinócios descrevem pequenos círculos com um raio de 4°i8'43''.

esfera,

volta dos quais,

movimento de trepidação acaba por

hipótese do

nada; mas renasce, embora

com

culo xviii

ser abando-

proporções muito reduzidas, no

sé-

movimento de nutação.

o

Na segunda

em

verda-

parte da estância 87 faz o poeta a descrição do zo-

díaco, admirável de beleza e concisão:

Bem Co

como

ves

&

se veste

faz

ornado

largo cinto douro, que estrellantes

Animais doze traz afigurados, Aposentos de Phebo limitados.

Como

comentário a estes versos, leia-se o Reportório dos tempos

de André do Avelar, Lisboa, i585:

Do

Zodíaco.

Titulo 2g,

«Os Phylosophos antiguos cõsiderarã no ceo hum que

de largo



em

diuide

grãos*, por

12.

meo do

qual, passa

circulo maior,

húa

linha,

q o

cÕprido, e deixa a cada

parte seis grãos: ao circulo

marão Zodíaco,

e

^

cha-

a linha dixerão

linha ecliptica

Diuidese este circulo

em

partes iguaes, a q

12.

signos,

&

nome da

hum

cada figura

está cõposto,

delles

chamão toma o

do animal, de q

como

as estrelas do

ou firmamento, o pinião

8. ceo,

semelhão, e porque Zodion

&

em Grego

como animal, por chamou o circulo Zodíaco,

tãto quer dizer

isso se

como

em

se

dixeramos circulo de animaes: cada signo destes, se diuide

3o. partes, a

sam

36o. que

O nado,

1

2

os

que chamão grãos,

em

com que com

o zodíaco, que o cinge

Quer Quer

dizer,

uma zona

dizer, zona.

multiplicando

que se diuide todo o ceo,

largo cinto de ouro, é

e

e

12.

por 3o. resultão

qualquer circulo».

o firmamento se veste

e faz or-

a profusa pregaria de ouro das

esférica de 12 graus de largo.

.

02

:

astronomia dos Lusíadas

C/4

Os

constelações zodiacais.

doze animais estrelantes afigurados sao

as doze constelações do zodíaco, cujas estrelas, pela sua disposição,

pintam

e

semelham

Os aposentos de Phebo

de animais.

a figura

mitados são os doze signos, da extensão de 3o graus cada um, que se divide o zodíaco,

stelações, os quais o sol vai sucessivamente percorrendo

um

em

que se deram os mesmos nomes das con-

e a

vimento anual ao longo da

li-

demorando-se

eclíptica,

espaço de tempo de cerca

dum

No

mês.

em

no seu mo-

cada

um

deles

capítulo seguinte trata-

remos mais especialmente do zodíaco.

A

estância 88 termina a descrição do firmamento

com

a formo-

síssima enumeração das constelações extra-zodiacais: Olha por outras partes

Que

Olha a

E

vão fazendo.

carreta, atenta a Cinosura,

&

Andromeda,



a pintura,

as estrellas fulgentes

&

seu pay

o drago horrêdo

de Gassiopea a fermosura,

do Orionte o gesto turbulento,

Olha o Cisne morrendo que

A

O

Lebre, os Cães, a Nao,

&

sospira, a

doce Lira.

poeta comóve-se evocando as lendas poéticas que deram

desde a Carreta (Ursa maior)

às constelações,

menor)

O

L/ra de Orfeo.

até à doce

que

ele

e a

nome

Cinosura (Ursa

não podia prever era

que, volvidos dois séculos, novas constelações viriam intrometer-se

naquelas, às quais fica,

os

nomes

de:

M. de la Caille, havia de dar, com secura scientíMachina pneumática, Forno chimico, Esquadro e

Regoa, Reticido romboidal.

Na

.

admirável estância 89 iniroduz o poeta as sete esferas plane-

tárias pela sua

ordem, desde a de Saturno até à da Lua: Debaxo deste grande firmamento, Ves o ceo de Saturno Deos antigo, Júpiter logo faz o mouimento,

E O E

Marte abaxo bellico inimigo, claro olho do ceo

no quarto assento,

Vénus, que os amores traz consigo,

Mercúrio de eloquência soberana.

Com Compare-se com

três rostos abaixo

I,

21:

Deixam dos

A

vay Diana.

sete

Ceos o regimento.

esfera do sol fica no meio.

piter e Saturno, por isso

Por cima as esferas de Marte, Jú-

chamados planetas superiores; por baixo

as

esferas de Vénus, de Mercúrio e da Lua, que são os planetas inferio-

:

VI

Cap.

Os

res.

— qA grande máquina do

mundo

três rostos de Diana, são aqui os três rostos

pondentes às três fases: a lua cheia

63 da

lua, corres-

quartos, crescente e min-

e os

guante; na lua nova não há rosto porque a lua se esconde. re-se

com

III,

69: Cinco vezes a Lua

E e

com V,

Compa-

se escondera,

outras tantas mostrara cheio o rosto,

24:

Mas

o Planeta que no ceo primeiro

ja

Habita, cinco vezes apressada,

Agora meyo Mostrara,

No

rosto,

em

agora inteiro

quãto o mar cortaua a armada.

Reportório dos tempos de Avelar, i585, lê-se a

—^Do rosto, «O

forma,

trãsparête,

igualmente denso

&

&

claridade da



64

46

v., tit.

espesso da lua procede de não ser seu corpo

nem

por onde os raios do

Lua

fl.

raro, se não sol

em

partes mais mociço q noutras

sam desigualmente

nella

emcorporados,

ík

daqui nasce aquella figura, que vulgarmente se chama rostos.

Com

4.

a estância

que acabamos de

lêr fica

completa a enume-

como estão representadas reproduzida, da máquina do mundo: o empíreo, ò

ração das onze esferas da região celestial,

na

figura,

atrás

primeiro móbil, o cristalino, o firmamento rias.

Estas onze esferas são concêntricas

analisar

com

Na

todas.

sete esferas planetá-

a Terra.

Resta agora

particular as esferas planetárias, compostas de vários

Já vimos a composição da esfera do

orbes.

como

em

e as

figura junta, extraída da

é constituída a esfera

sol,

a mais simples de

Margarita Philosophica, vê-se

de Saturno, compreendida entre dois

cír-

culos concêntricos, o exterior, que fica logo por baixo do firmamento, e

o interior, que devemos imaginar assente sobre a esfera de Júpiter,

Empregando a linguagem usada para o Sol, diremos que a sétima escompõe de três céus: os dois céus deferentes do auge de Sa-

fera se

turno^ aguarelados a preto na figura; e, entre os dois, o céu deferente

de Saturno ou, mais propriamente, o céu deferente do epiciclo de Saturno, cujo centro (c,

mundi).

triplo

Os

(c.

deferentis)

não coincide com o centro do mundo

céus deferentes do auge de Saturno são levados no

movimento da oitava

esfera.

O

deferente do epiciclo de Sa-

turno deslisa entre estes, segundo a successão dos signos, dois muros, é excêntrico;

dando uma volta completa

em

3o anos.

o ponto mais afastado da Terra

é o

seu

como

entre

Este deferente

Auge (Aux) ou

64

d^ astronomia dos Lusíadas

'

apogeu, o ponto mais aproximado da Terra

Na

iiim Augis).

toda a espessura do excêntrico.

O

corpo do planeta, engastado na

com

circunferência do epiciclo, move-se

este

dum

fazendo-se esta rotação no período

em

se executa

voltas, explicando-se

uma

torno do seu centro,

O

ano.

centro do epiciclo

uma

move-se sobre o deferente excêntrico, dando

Enquanto

o seu perigeu (Opposi-

é

parte superior da figura vê-se o epiciclo ocupando

volta

em

3o anos.

revolução do excêntrico, dá o epiciclo trinta

assim o movimento, ora directo ora retrógrado,

de Saturno ao longo do zodíaco.

O

centro do epiciclo não se move., porém, uniformemente sobre

cujo centro

um

Ptolomeu considera

o excêntrico.

equãtis) está a

(c.

uma

E

centro que o

é

mundo. movimento do centro do epiciclo

do epiciclo de Saturno move-se pois sobre

mas o

um

relativamente a este

é

o centro do equante

;

O

iguais, perto de

2

minutos por dia

parte os equantes observando que,

movimento

em

com

eles,

mente a outro, quando devia

um

teorias de Júpiter e

1

Marte.

ano

tro

Ptolomeu

se desviava

ter estas

do

movimento

centro e uniforme relativa-

duas propriedades

em

relação

centro.

Marte são análogas às de Saturno, sendo

período do movimento do excêntrico de

em

em tempos

Copérnico pôs de

circular e uniforme, pois que o

era, assim, circular relativamente a

As

Saturno.

centro de

o raio do equante

tirado para o centro do epiciclo descreve ângulos iguais

um mesmo

centro

círculo que é o defe-

centro do deferente é apenas o centro de equidistância.

a

O

uniforme.

seu movimento não é uniforme sobre este círculo; o

uniformidade do movimento

princípio do

equante,

distância do centro do deferente

igual à distância deste ao centro do

rente,

chamou

círculo a que

1

2 anos

em

Júpiter e 2 anos

O

sideral,

período do movimento do epiciclo é, em ambos, de como em Saturno, conservando-se o raio tirado do cen-

do epiciclo para o planeta sempre paralelo ao raio do excêntrico

do Sol dirigido para a posição do Sol no netas inferiores,

Vénus

e

Mercúrio,

mesmo

é o raio

instante.

Nos

pla-

do excêntrico tirado para

o centro do epiciclo que se conserva sempre paralelo a esta direcção,

sendo por isso de

i

ano,

como no

excêntrico nestes dois planetas.

A

Sol, o período do

movimento do

revolução do epiciclo faz-se

em

19 meses solares em Vénus, e em 4 meses solares em Mercúrio, aproximadamente. O excêntrico da Lua faz a sua revolução em 27 dias Na teoria da Lua considera-se, além dos dois céus defee 8 horas. rentes do auge da

Lua

céu, por fora destes,

um

quarto

chamado deferente da cabeça do Drago.

Este

e

do excêntrico deferente do

epiciclo,

quarto céu causa a retrogradação da linha dos nodos, à razão de cerca de 3 minutos por dia.

LIBRl

VIL

TRACT

L

Septentrío uel Aquilo

MerídícsuclAuster

A

sétima esfera,

gravura explicativa da esfera de Saturno, extraída da Margarita Philosophica, Lib. Vil, Tract. (nas dimensões do original)

I,

Cap. XXVIIÍ

— qA grande

Cap. VI

máquina do mundo

65





No Capítulo iiij Dos círculos & mouímentos dos Planetas do Tratado da Sphera, depois duma breve descrição dos movimentos do

o seguinte:

sol, lê-se

«Cada hum dos planetas afora ho

^

ou igualador: deferente

com

concêntrico

hum

ferente he

&

deferente

delle declina

no

& nam

circulo

em

&

ecliptica:

a outra pêra o sul: ho

dous lugares

a fígura que

ík

chamasse Drago: porque he larga no meo

O

*.

pêra o sul se chama ho Cabo do drago

sam

&

no qual estando a lua se moue pêra

fím. aquelle encontro

o norte chamasse Cabeça do drago

de qualquer planeta

hum

na superfície da

jaz

pêra o norte:

ho equante encontranse

se faz per este encontro: estreita

equante

.s.

he na superfície da ecliptica: ho seu de-

circulo ecentrico

mas hua metade

três círculos

Equante na lua he

epicíclo.

&

a terra:

tem

sol

iguaes.

^.

outro encõtro do qual dece

Os

E auemos

deferentes

&

equantes

de saber que assi ho

como ho equante de Saturno Júpiter: Mars. Vénus sam ecetricos & fora da superfície da ecliptica: mas ambos estam em híãa mesma superfície. E todo planeta tirando ho sol tem deferente

&

Mer-

cúrio

He

epicíclo.

hum pequeno

epicíclo

circulo

pella circunferêcia do qual he leuado ho corpo

do planeta

na

&

superfície

o centro do epicíclo sempre esta

E

do deferente.

portanto se se

tirarem duas linhas dereitas do centro da terra:

de sorte que recolham antre ellas ho epicíclo de

qualquer planeta

húa pella banda de

a

&

&

a outra pella banda de ocidente: o ponto da banda de que a linha toca ho epicíclo: chamase primeira estação: ho outro ponto da banda de ocidente chamase estação segunda.

E

quãdo ho planeta esteuer

oriente:

em

oriête

O

que esta estacionário. estações:

qualquer destas estações diremos

arco de cima do epicíclo antre as duas

chamase direyção:

remos que esta dereito:

em

&

&

quando ho planeta

duas estações chamase retrogradação:

dizemos que esta retrogrado. retrogradação:

&

A

^

A

lua

&

estando nelle ho planeta

não tem estação direyção

a causa he ho seu

ligeyro».

Nodo ascendente <2. Nodo descendente ^. 5

di-

nem

portanto nunca dizemos q a lua esta estacionaria

dereita nê retrogada:

muy

nelle estiuer

ho arco debaixo do epicíclo antre as

mouímêto no

epiciclo ser

;

:

66

(lA

Os

astronomia dos Lusíadas

epiciclos são de

pequenas dimensões relativamente aos defe-

Estes são os órgãos principais dos movimentos

rentes excêntricos.

dos planetas, como se vê na figura da esfera de Saturno; os epiciclos

Na

são as peças menores do maquinismo.

Camões

planetários

em

não pensando

refere-se apenas aos excêntricos,

descrever os tão diversos movimentos dos epiciclos.

em

Já na estância 89 Tétis, passando netárias,

chama

em

especial,

revista as sete esferas pla-

a atenção para os excêntricos deferentes dos planetas.

Assim, quando diz «Júpiter logo

faz o

movimento»,

é claro

que aponta

na esfera deste planeta, o céu excêntrico deferente do

movimento próprio de Júpiter céus deferentes do auge de Júpiter são levados no triplo movimento no qual

epiciclo de Júpiter,

os

descrição dos movimentos

da oitava esfera,

E

se efectua o

já descrito antes.

que especialmente se consideram os céus excêntricos torna-se

claro na estância 90:

Em

todos estes orbes, diíferente

Curso veras,

níís graue,

«Sc

noutros leue

Ora fogem do centro longamente, Ora da terra estam caminho breue.

Estes orbes são os excêntricos deferentes dos planetas, mais afastados do centro da Terra no auge, ou apogeu, e mais perto dele no

Teem curso mais grave o deferente de Saturno em 3o anos e o de Júpiter em 12; o de Marte faz seu curso em 2 anos e os do ano; o curso mais leve é o da Lua em Sol, Vénus e Mercúrio em

perigeu.

i

27 dias e 8 horas.

Pondo de parte

os epiciclos, peças

menores com tão variados mo-

vimentos, o poeta reduz as esferas planetárias à simplicidade da do Sol; e assim pode manter aquela linha de sobriedade

sendo

5.

feita esta

Na

com que vem

admirável descrição da máquina do mundo.

segunda parte da estância descreve-se a região elemental:

Bem como quis Que o fogo fez,

o padre omnipotente

&

o

ar,

o vento

&

neue,

Os quaes veras que jazem mais a dentro, E tem CO mar a terra por seu centro.

Os

quatro elementos estão dispostos

como

se vê

extraída da Chronographia de Jerónimo Chaves.

abaixo do céu da

lua, o

na fígura

Por

fora,

junta, e logo

fogo puro; por baixo deste o ar, dividido

três regiões

— suprema,

tos, tei^ra e

água, formando o globo terráqueo.

média

e ínfima; e

em

no centro, os dois elemen-

VI

Cap.

Transcrevemos

— qA grande máquina

do mundo

a descrição das três regiões

no Reportório de Avelar, edição de 1694

(fi.

do

ar,

67

como

é feita

52, v.):

«Diuidem os philosophos esta Sphaera do ar em regiões por três propriedades muy notaueis, que nella

três partes,

ou

vem que

são

se

parte superior, inferior

&

meya, a

pella

tem

que

vizinhança,

com

ou

parte,

superior

região

o fogo,

&

pellas

exalações,

q ate ella chegão, quando sobem da

terra, he quente,

ainda que não

secca, tãto se

&

como

o fogo, nesta

fazem as

estrellas,

que vemos correr de de híía parte a

noite

&

outra, tas,

&

&

outros Meteo-

Na

ros.

algus come-

2.

que he

fria,

seca pella distancia,

que tem do fogo,

&

não parar nella as exalações,

nem

chegar

lá a

reflexão dos rayos do Sol se gera a neue, pedra, nuuens, chuuas, tro-

uões, rayos,

& relâmpagos.' Na

terceira,

& mais

baxa de todas, que

& huas fria, & hú-

recebe mayores alterações viuem os homes, animaes, plantas,

vezes está quente,

&

mida, outras quente,

húmida, outras

& seca,

fria,

&

seca-,

outras

vem não somente também da maneira

as quaes variações lhe

dos vapores, que de ca de baxo se leuantão, senão

com que tocão a terra os rayos do Sol, & mais planetas, os quaes donde caem perpendiculares, fazem maior impressão de quentura, que donde caem obliquos, & desguelha». Adiante encontra-se esta expHcação da região do fogo

61, r):

(fl.

«Pois porque os que carece de princípios de phylosophia possão

melhor entender esta região do fogo, dizemos ser semelhante a quentura de

hum

forno, tirando-lhe todo o

neira, que se

não visse

mas com tudo

se lhe

lume que tinha detro em ma-

lume algum, ou cousa que desse

aphcassem algua cousa combustiuel, logo

luz,

se in-

mesma maneira he a região do fogo, que nem he lúnem tem brasa, nem chama, nem matéria, que arda, senão esta

flamaria, pella cida,

nelle

:

:

6S

dos Lusi.iiias

C:/ jstiwu)}}!!.!

como húa grande puré/ a,

subtilidade de ar, à qual se se aplicasse

.S:

algúa matéria terrestre, ou exhalação, logo será acesa, posto caso, que algús neste passo fantasia, philosophia,

Camões

como

&

&

inflamada,

querem chimerizar sua

a elles lhe aprazi>.

descrito a região elemental, esculpida nas portas

já tinha

do palácio de Neptuno,

em W,

e

ii

lo,

12:

\'em se os quatro elementos trasladados,

Em

diuersos officios oceupados.

Ali sublime o Foí:o estaua encima.

Que em nenhua matéria

se sustinha,

D"aqui as cousas uiuas sempre anima,

Despois que Promoteo furtado o tinha:

Logo após

O

elle leue se

inuisibil ar,

Tomou

sublima

que mais asinha

lugar, &:

Algum

deixa no

Estaua

a tcrrj

nem por quente, ou mundo estar vazio.

em montes

frio,

reuestida

De verdes eruas &: aruores floridas. Dando pasto diuerso &: dando uida Aas alimárias nella produzidas

A

clara

Das

forma

jf^^-oj^'

ali

estaua esculpida

entre a terra desparzidas.

De pescados criando vários modos. Com seu humor mantendo os corpos

As Os

transcrições que deixamos feitas dispensam maior comentário. dois elementos, terra e água, constitutivos do globo terráqueo,

estão personilicados

em

Ceres

Ditosa pátria que

Mas

e

Sempre

Neptuno, na estância VIII, 82

tal filho teue.

antes pai, que

em quanto

Este globo de Ceres

6.

todos.

o Sol rodea

&. Xej?tuno,

suspirará por tal aluno.

Tendo começado no Empíreo, «onde logrando puras almas

estão de aquelle

Bem tamanho

^>.

vem

lindar a descrição

máquina do mundo no globo terráqueo, colocado no Neste centro, pousada dos humanos.

Que nam somente ousados se contentam De soffrerem da terra firme os danos Mas inda o mar instabil esprimentam.

da grande

centro.

Cap. VI

— G^ grande máquina do mundo

6g

Colocada entre os dois elementos, no extremo da terra firme a pátria portuguesa, a praia ocidental, sofrendo a fascinação do

fica

mar

instábil: Eis aqui, quasi cume da cabeça, De Europa toda, o Reino Lusitano, Onde a Terra se acaba, & o Mar começa,

E

onde Febo repousa no Occeano. Os Lusíadas, canto III, estância

Quando o

sol

repousa no oceano, é sobre o

lares vão brilhar, entrando Portugal

terráqueo; e

com ele poeta com

20.

mar que

os raios so-

na sombra projectada pelo globo

como Portugal fica no extremo ocidental do continente, Europa inteira imersa na sombra da noite. Por isso

fica

a

o

tanta propriedade outra vez define a nossa situação geo-

gráfica

em

VII, 60:

Hum grande Rei, de la das partes, O ceo volubil com perpetua roda. Da

onde

terra a luz solar coa terra esconde,

Tingindo a que deixou de escura noda,

usando o engenhoso trocadilho do terceiro verso,

vem

um

terra significando a terra firme,

seguir a

mesma

Portugal

fica lá

em

que primeiro

dos quatro elementos, e a

palavra terra designando todo o globo terráqueo.

nas partes onde o céu volúbil (primeiro móbil),

o seu rodar perpétuo, esconde da terra-firme a luz solar globo, cuja

sombra

tinge de escura

nódoa

a terra

com

com

a terra-'

que a luz do

sol

deixou; e esta é a terra-continente, porque o globo terráqueo nunca a luz solar deixa de iluminar, por

em

um

ou outro lado.

Quando

pois

Portugal anoitece, estende-se a noite por todo o continente, o que

resulta

da sua situação no extremo ocidente

o movimento diurno do sol se

vem

;

a escura nódoa,

que com

alastrando para ocidente sobre a

Europa, acaba por cobri-la inteiramente, quando chega à praia

oci-

dental lusitana.

Veja-se no Cancioneiro geral de Garcia de Resende, princeps, i5i6

fl.

96, edição

^:

Eram da sombra da

terra

as nossas terras cubertas

quando parecem desertas •

as abitações

sem guerra

ao tempo que rrepousam os corações descanssados

&

os malfeytores

ousam

cometer mores pecados. (fyngymento damores feyto per Dyoguo brandam). 1

Pág. 44, tom.

III,

da edição da Imprensa da Universidade de Coimbra.

qA asíronomia dos Lusíadas

70

O

tix)CLidilho

de Camões é mais engenhoso, marcando

com

precisão

astronómica a situação geográfica de Portugal, que o poeta deixa definida logo

no segundo verso do imortal poema, que celebra As armas,

Que da

&

os barões assinalados,.

Occidental pray a Lusitana,

Por mares, nunca de antes nauegados, Passaram ainda alem da Taprobana.

:;

:

;

VII

o

I.

o dia. — A

zodíaco

sucessão do dia

da noite

e

foi

naturalmente o facto

astronómico que primeiro impressionou o homem.

Desponta o

sol

no

horizonte do oriente:

Mas assy como a Aurora marchetada, Os fermosos cabellos espalhou, No Ceo sereno, abrindo a roxa entrada.

Ao claro Hiperionio que acordou, Começa a embande.irar-se toda a armada,

E

de toldos alegres se adornou

sobe até ao meridiano, para descer

Vos poderoso

O

Sol logo

em

(I,

59)

seguida:

Rei, cujo alto Império,

em

nascendo, ve primeiro

Ve o também no meyo do Hemispherio,

E quando e

dece o deixa derradeiro

(I,

8)

desaparece no horizonte do ocidente, deixando a Terra envolta nas

sombras da

noite: Nisto Febo nas agoas encerrou,

Co

carro de Christal, o claro dia

Dando cargo aa Irmãa que alumiasse, O largo Mundo, em quanto repousasse

E

(I,

56).

a contemplação do maravilhoso espectáculo, que oferece o céu

estrelado

em

noites claras,

mostrou que também as estrelas se elevam

sobre o horizonte do lado oriental até à sua culminação no meridiano,

para descerern

em ...

A

seguida do lado ocidental:

&

as estrellas nitidas

que

sciern

repouso conuidão, quando caem (IV,

67).

:

dd astronomia dos Lusíadas

'J2

O

céu vai volvendo sem descanso; desfazem-se por fim as trevas

da noite, rompendo de novo a luz da madrugada: Mas ja o Geo inquieto reuoluendo, As gentes incitaua a seu trabalho,

E ja a mãy de Menon Ao sono longo punha

a luz trazendo,

certo atalho

Hiãose as sombras lentas desfazendo,

Sobre as

flores

Quando o

A

Da tempo:

partida da

terra,

ver a frota que no

sucessão do dia

—o

da

dia solar.

em

frio orualho,

Rei Milindano se embarcaua

e

mar estaua

(II,

92).

da noite resultou a primeira medida do

Cinco dias completos conta o poeta desde a

Angra de Santa Helena até à aparição do gigante AdaCabo Tormentório:

mastor, personificação do

Porem ja cinco Soes erão passados Que dali nos partíramos, cortando Os mares nunca doutrem nauegados. Prosperamente os ventos assoprando

:

Quando hua noite, estando descuidados Na cortadora proa vigiando, Hua nuuem, que os ares escurece Sobre nossas cabeças aparece (V,

Esta noite

do

Gama

vembro se lê

e

é

Sy).

novembro de

a de 21 para 22 de

1497.

A

armada

deixou a Angra de Santa Helena na quinta feira 16 de no-

dobrou o Cabo Tormentório no dia

22, quarta feira,

Gama em

no Roteiro da viagem de Vasco da

i4g'j,

como

2.* edição,

correcta por Herculano e Castello de Paiva, Lisboa, 1861, pag. 7:

((E

tanto que tevemos nosos navios aparelhados e linpos e lenha

tomada nos partimos desta

huuma

terra

que era xvi dias de novenbro,

nom

quinta feira pella

manham,

sabendo nós quanto éramos do

cabo de Boa Esperança, salvo Pêro d'Alanquer dizia que ao mais que

podiamos ser seriam

nam

que de noute pasara per

foram de larguo,

domde éramos. sueste, e ao

rança, e

virámos

em em

e

huum

ally

com

nam

vento

por estes respeitos

Pollo qual fomos

em

e

o porque se

elle

manham do cabo, e á popa, e isso mesmo á yda nom eram em conhecimento

dia pella

a volta

do mar com

sull

su-

sábado á tarde ouvemos vista do dito cabo da Boa Espeeste dia

a volta

mesmo virámos em da terra.

foram dezanove dias do mês de cabo, e

do cabo,

trinta legoas. a rree

afirmava era porque partira

o

E

a volta

do mar,

e de noute

manham, que novembro, fomos outra vez com o ao domingo pella

podemos dobrar porque o vento era susueste

e

o dito

Cap. VII

cabo

jaz nordeste sudueste, e

do mar,

e á

em

este dia

jS

mesmo virámos em a volta em a volta da terra. E

noute da segunda feira viemos

á quarta feira ao

com

— O :{odíaco

mêo

dia

pasámos

pello dito cabo ao longo da costa

vento á popa».

A

esta

passagem

faz

Herculano (pág. iSg) o comentário seguinte:

«Pelo computo deste Roteiro o cabo de Boa Esperança

foi

passado

novembro de 1497; pelo que se ha de emendar o que dizem Castanheda, Barros e Góes, que o fazem passado a 20. Quanto ao dia da semana concorda Castanheda com o nosso auctor,

pela

armada

a 22 de

dizendo que fora a

uma

quarta feira; mas a penúltima quarta

feira

de novembro de 1497 caiu a 22 do mez».

Relativamente à partida da Angra de Santa Helena, tanto Casta-

nheda {Historia do descobrimento da índia,

mião de Góes (Chronica de D. Manuel, a 16 de

A

i,

cap.

iii)

como Da-

parte, cap. xxxv) a

fazem

novembro.

narração do poeta concorda

Santa Helena* pletos

i.*

liv.

em

quando na

Tendo partido de o Roteiro. eram decorridos cinco dias com-

com

16 de novembro,

mostrou a figura colossal do

noite de 21 para 22 se

O Cabo começou a quando rompeu a madrugada do

Adamastor.

vêr-se

em

seguida, segundo o poeta»

dia 22:

Ia Phlegon, & Pyrois vinham tirando Cos outros dous o carro radiante,

Quando

Em

O gem

a terra alta se nos foy mostrando

que foy conuertido o gram gigante (V,

dia solar é definido pelo poeta

de

Mombaça para

em

II,

68,

61).

quando conta a

via-

Melinde:

Tinha húa volta dado o Sol ardente,

E noutra começaua, quando viram Ao longe dous nauios, brandamente Cos ventos nauegando, que respiram.

No

Roteiro da viagem de Vasco da

«Estevemos ainda a quarta

e

Gama em i4gj

lê-se, a

quinta feira depois de termos conhe-

cida a malicia e treyçam que estes perros quizeram pôr tra nós.

E

partimos pella

pág. 41:

manham

d'aly

com pouco

em

obra com-

vento, e viemos

1 É preciso não confundir com a Ilha de Santa Helena no Oceano Atlântico Angra de Santa Helena, situada na costa ocidental do continente de África.

qA asironomia dos Lusíadas

7^

Mombaça

pousar de

a julavemto de nós

poUo qual loguo arribámos contra

três legoas,

com

obra de oyto legoas junto

amanhecendo vimos dous barcos

E em

a terra.

em mar

obra de

pêra os avermos

elles

de tomar, porque desejávamos de aver pillotos que nos levasem onde

E

nós desejávamos.

dos ditos barcos

e

tomámollo,

mantimento

mouro honrrado que

e

huma moça, molher

hii

vinha.

todos se lançaram ao mar,

elles

outro se nos acolheo a terra, e na-

e

tomámos achámos dezasete homes

quelle que

milho

e

quando vêo a oras de vespora fomos com huum e

de

ouro

e

prata e muito

huum homem

E

tanto que nós

e

nós hos andámos tomando

com

bates».

O

velho,

chegámos junto com

episódio que o poeta

começa

a contar

na estância 68 teve logar

A

ao amanhecer do dia 14 de abril de 1498, sábado de Aleluia.

mada

os

'

ar-

surgiu a meia légua da vila de Melinde no dia seguinte, domingo

de Páscoa,

O

2.

como

mês.

se lê

na estância 72, de que adiante tratamos.

— A observação

do céu estrelado cedo levou à noção

da invariabilidade das figuras formadas pelas estrelas brilhantes.

Maravilhados contemplavam os

ram-se distinguindo as constelações.

homens o grande

Fo-

astro da noite que, errando através das constelações

kodiacais, ora se via logo após o sol poente reduzido a

arco prateado, ora

como um

o sol desaparecia no ocaso.

um

delgado

quando

disco circular surgindo no oriente

A

lua é pois

um

neta; e a observação das suas fases levou à

astro errante,

adopção de

um

pla-

uma medida

maior do tempo, o mês lunar ou lunação, base dos calendários lunares,

lua

como ainda

que estão

em

diz-se

Quando

mento da lua nova. diz-se

mahometano.

hoje é o calendário

teem a mesma longitude

que estão

em

Quando o

sol e a

conjunção; é o mo-

as suas longitudes diferem de

oposição; é o

junção e a oposição são as si^ígias.

momento da

lua cheia.

A

180% con-

Diz-se que o sol e a lua estão

em quadratura quando as suas longitudes diferem de 90^. Durante uma lunação há duas quadraturas separadas pelas sizígias: o quarto crescente, entre a conjunção e a oposição, e o quarto minguante, entre

o plenilúnio 12 horas e

Em estância

e

o novilúnio.

A

duração

duma

lunação é de 29 dias,

44 minutos.

lunações exprime Camões a duração do cerco de Lisboa na III,

59: Cinco vezes a Lua se escondera,

E

outras tantas mostrara cheio o rosto,

Quando

Ao

a Cidade entrada se rendera,

duro cerco que lhe estaua posto.

:

:

Cap. VII

— O ^odíaco

'75

Foy a batalha tam sanguina & fera^ Quanto obrigaua o firme prosuposto De vencedores ásperos, & ousados,

E

Na

de vencidos,

ja desesperailos.

Chronica delrey D. Affonso Henriques, por Duarte Galvão,

no cap. xxx da edição de Lisboa, 1726:

lê-se

«Durou ho cerquo perto de sinquo me^es,

Quando veyo em que hee ahos vinte

em

do Senhor

rijamente, e

e

dia dos Mártires S. Chrispino, e Chrispiniano,

sinquo dias do

mil cento quorenta

mez de Outubro, andado ha annos, foy a Cidade

e sette

era

muy

com grande determinação combatida,

Entrou-se principalmente por ha porta que ora chamão de Alfama, e

de hy pelas outras portas,

muito mais

fera,

e

depois de entrada foy dentro ha peleyja

quejanda soe antre hirados vencedores,

desesperados, peleyjando jáa hos

e vencidos,

Mouros com estremada desespera-

ção ....... por tanto foy tam grande ha mortindade delles,

ho conto dos que foram mortos, cuydar

quam pouquos

ha

e trazidos

ferro,

e

sobejo

que he escuzado

ficarão».

Esta passagem inspirou evidentemente a estância de que nos ocu-

pamos. lunares.

Note-se que o poeta não diz que se completaram cinco meses

Para

se

observarem cinco luas novas

basta que decorram quatro lunações

e

de cinco lunações incompletas, concorda pois

de cinco meses, marcada pelo cronista.

meses lunares, não porque

elle

e

cinco luas cheias

O

cômputo do poeta,

com

a duração á^ perto

meia.

Aqui o poeta empregou os

fosse investigar as luas do

1147, "^^^ porque estes meses, contados pelo

anno de

fenómeno bem

visível

das fases da lua, se prestam melhor às descrições.

Outro

é

porem o caso quando Camões, em V,

24, conta o

tempo

decorrido desde a saída da armada, de Lisboa, até que, pela primeira vez, foi avistada terra do continente africano na angra a que

o

nome de Santa Helena.

Como vamos

poseram

ver, o poeta exprime-se

com

admirável precisão, mostrando ter exacto conhecimento das luas do

ano de 1497.

A

armada partiu de Lisboa em 8 de da viagem de Vasco da Gama em i4g^, diz,

na pág.

julho de 1497.

a que

O

Roteiro

atrás nos referimos,

i

«Partimos de Restello

huum

sábado, que eram oyto dias do

mês

de julho da dita era de 1497, noso caminho, que Deus noso senhor leixe acabar em seu serviço, Amem».

:

qA astronomia dos Lusíadas

j6

Castanheda, Barros, Góes, Faria o

mesmo

cia

V,

2,

dia da partida

A

*.

Sousa unanimemente assinam

e

na estân-

esta data se refere o poeta

de que adiante trataremos.

Quanto

à

chegada à Angra de Santa Helena,

«Huuma

lê-se

no Roteiro, pág.

mês de novembro, que

quarta feira primeiro dia do

3

foy

Todos os Santos, achámos muitos signaees de terra, os quaees eram huuns golfãoos que naçem ao lomgo da costa. Aos quatro dias do dito mês, sábado ante manhan duas oras, achámos fundo de cemto e dez braças ao mais, e ás nove oras do dia dia de

ouvemos vista de terra,

emtam nos ajuntámos

e

capitam moor com muitas bandeiras

em

mesmo dia do mar, porém nom ouvemos

todos vistidos de festa, e terra na volta

A

este

Pêro d'Alanquer no

huuma grande

batell a

ssumdar

se

bombardas

bem

junto

conhecimento da

ouvemos

O

baya.

e

virámos

terça feira viemos na volta da terra e

terra baixa e que tinha

todos e salvámos o

estemdartes

e

vista

e

com

terra.

d'uuma

capitam moor mandou

achava

bom

pouso, pello qual

a achou muito boa e limpa e abrigada de todoUos vemtos, soomente de

noroeste e ella jaz leste e oeste, aa quall poseram

A quarta

feira

nome Santa EUena.

lançámos amquora na dita baya, onde estivemos oyto

dias alimpando os navios e corregendo as vellas e

A liv. I,

tomando lenha».

narração de Castanheda {Historia do descobrimento da índia, cap.

ii)

concorda com esta do Roteiro,

nica de D. Manuel, part.

novembro que avistaram Mas

ja

i,

Damião de Góes (Chrotambém diz que foi em 4 de Ouçamos agora o poeta:

cap. xxxv)

terra.

o Planeta que no ceo primeiro

Habita, cinco vezes apressada,

Agora meyo Mostrara,

em

rosto, agora inteiro

quãto o mar cortaua a armada,

Quando da Etérea gauea Prompto coa

hum

marinheiro

vista, terra, terra,

brada

Salta no bordo aluoroçada a gente

Cos olhos no Orizonte do Oriente

(V, 24).

Esta estância é geralmente interpretada, entendendo-se que o poeta diz

que tinham decorrido cinco lunações, emquanto o

armada. até

mar

cortava a

colocar cinco meses lunares desde 8 de julho

;Mas como

4 de novembro?

1

Castanheda,

D. Manuel, part.

i,

liv.

i,

cap. 2; Barros, dec.

cap. 35

;

i,

liv. 4,

Faria e Sousa, Asia^ tom.

cap. 2; Góes, i,

nota de Herculano a esta passagem do Roteiro, pág. i33.

part.

i,

Chronica de

cap. 4.

Veja-se a

Cap. VII

É

— O ^odíaco

certo que João de Barros diz {Ásia, dec.

«E

liv.

i,

cap.

iv,

11):

tomou ante de chegar ao cabo de bóa Esque óra chama de Sãcta Helena, auedo cinquo

a primeira terra q

perança, foy a baya a

em

meses q era partido de Lyxbóa: onde sayo

&

77

terra por fazer

aguada

assy tomar a altura do sol».

Mas João de Barros não se refere a meses lunares. mada navegado nos meses de julho, agosto, setembro,

Tendo

a ar-

outubro

e no-

vembro, conta estes cinco meses, embora incompletos.

O

mede o

poeta, porem,

intervalo de

tempo decorrido desde

Lis-

mar

cor-

emquanto o

a Santa Helena, contando as fases da lua,

boa

Ora Camões tinha um conhecimento muito preciso, quer da viagem do Gama, quer da astronomia, para não cometer o

tava a armada.

erro de contar cinco meses lunares desde 8 de julho a 4 de novembro.

Note-se que o poeta se exprime 59, e

V,

dum modo

diferente nas estâncias

Enquanto no cerco de Lisboa

24.

III,

que a lua cinco ve-

diz

ses se escondera e outras tantas mostrara cheio o rosto,

agora diz

que a lua mostrara cinco vezes agora meio rosto, agora rosto inteiro.

Durante o cerco dos «muros Ulysseos» houvera cinco luas novas cinco luas cheias; durante a viagem do

(meio rosto) tes?

e

cinco luas cheias,

Pela ordem

agora inteiro,



em

i

Gama

Quartos crescentes ou minguan-

que o poeta conta as fases,

é claro

e

houvera cinco quartos

— agora meio rosto, ^

O

que se trata de quartos crescentes.

poeta

afirma pois que, desde a partida de Lisboa até à chegada a Santa Helena, cinco vezes a lua passou de quarto crescente a lua cheia. foi

precisamente

isto

o que sucedeu, como vamos

Ora

verificar.

O Almanach perpetimm de Abraham Zacuto, astrónomo de D. João II e

D. Manuel,

foi

em hebreu de

originalmente escrito

1473 a 1478, quando

o autor era ainda professor na Universidade de Salamanca.

ção latina

foi feita

membro da Junta em Leiria, em 1496

por José Vizinho,

A tradu-

dos MatemáExiste

um

exemplar desta edição na BibHoteca Nacional de Lisboa, do qual

re-

ticos, e

publicada pela primeira vez

Na

produzimos a página, que junto damos.

dade de Coimbra

existe a edição de

No Almanach perpetuum 1

Na

*.

Biblioteca da Universi-

Veneza de

i5o2.

de Zacuto encontram-se 3i tábuas de

última folha desta edição le-se

:

«Expl/ciunt tabwle tahulanim

astrorlo-»

mice Raby abraham Zacuti astronomi serenissimi Regis emanuel Rex portugalie cet cu canonibw5 traductis a linga ebrayca in latinu per

discipulum eiw5 actoris opera et arte

viri solertis

mediocri imprêsione cõplete existuwt felicibw5 circuitione 1496 sole existente in i5 g 53

m 35

astris 5

et

magistrum Joseph vizinum

magistri ortas curaqwe sua nõ

ano a pr/ma rerwm etherearwm

pisciuw sub eelo leyree».

1

qA astronomia dos Lusíadas

78

g^BIflcontuntiOKum zoppofitíonum 20

1496

19

«^27^1 iKCSkl IK89Í7I

menfeg

|M|fen]t5

K28|2[

\\6l0\()\

m m [

mátí^

I28I 2

12

34'

aprílÍQ ap2ílí9

I

12

\16

íunP

10

11

í

K

26

)

JlfTfF^

í

37

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1

29' 27

íuní^

28

íunP

11^

to' 22_

Çó

fcpíê 5 58

ôctoB

12

iioueB

!20l

tíCcéB

deceB

J9 19

ocfoB

I

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21

tioijeB

1

9 24

2

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ç^ f 49

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12

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44

22 §4

If9 tf

9 IL II

ííOueB

li li

^eceB

^4f

2S


i

fcbmar

j

febíuar

{1011

^1

I22

20 21 4^

liliLil |if 21I

Página do Aimanack perpetiium de Ábraham Zacuto, edição de Leiria, 1496^

com

«9

5eceB

^20

a

If 2»

40 Í2f

4f8

Ç54 2J

21

«7

fepte

fS

»7

0^

9^9

fept?

f



ii

7

octoB 4

^7

S52 il

29

24

octoB

ÍO

10 22

29

aug9 21

iL

942

2Cf

16

I





8 52 ^ó

8

o çá

1

2|

9'

21

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20

mm

ap2ilt0

29 Ç9 40

I

[M|fen'[B

18

IS

to

2^



\

29

o 32

2

149.7

IÇÇ^W \W0\7\ \\6l\W

menfes

|Í4lT

mai^

|

a tábua das conjunções e oposições da

Lua nos anos de

i4;6 e 1497.

Reprodução fotográfica do exemplar existente na Biblioteca Nacional de Lisboa, nas dimensões do original.

i^

,

VII— O

Cap. conjunções e oposições do sol

e

da

lua,

^odíaco

79

que vão desde o anno de 1478

com os dados necessários para o cálculo das conjunções e em anos posteriores. A página, que reproduzimos, contêm

ao de i5o8, oposições

as tábuas 19 e 20, relativas aos anos de 1496 e 1497.

cada tabela tem cinco colunas



menses

estão indicados os

,

terminando

em

é,

Na

se vê,



primeira, intitulada

meses do ano, começando em março

as luas novas e as luas cheias, sendo os dias contados,

segundo o uso astronómico, de meio dia a meio

dia.

Na

terceira

coluna indicam-se os dias da semana (ítviae) pelos números desde

Na

domingo ao sábado.

a 7, de

e

Na segunda intitulada — dies — estão marem que teem lugar as conjunções e oposi-

fevereiro.

cados os dias dos meses ções, isto

verticais.

Como

quarta coluna lêem-se as horas

e

A

minutos, sendo as horas contadas de o a 24, desde o meio-dia. última coluna, de minutos, serve para cálculos de anos futuros.

1

As

linhas horizontais estão dispostas aos pares entre dois traços, sendo a superior relativa à conjunção e a inferior à oposição.

Da

tabela da direita, referente ao ano de 1497, extraímos o

se-.

guinte quadro, que mostra as fases da lua durante o trajecto da ar-

mada, desde Lisboa

até à

Angra de Santa Helena: Ânno de 1497

Meses

Dias

Dias da semana

do mês



Horas

e

minutos

„„—

Luas

Junho

29

quinta-feira

1%^

22"

lua nova

Julho

i3

quinta-feira

21

40

lua cheia

Julho

29

56

lua

12

sábado sábado

I

Agosto

12

33

lua cheia

Agosto Setembro

27

domingo

9

II

segunda-feira

4

29 58

lua cheia

Setembro Outubro

2.5

segunda- feira

í7

44

lua

IO

terça-feira

22

14

lua cheia

Outubro

25

quarta- feira

3

5i

9

quinta-feira

i5

9

Novembro

Vê-se assim que

foi

lua

lua

lua

nova

nova

nova

nova

lua cheia

nova no dia 29 de junho às 18 horas

22 minutos (tempo astronómico) ou às 6 horas e 22 minutos da

do dia 3o (tempo

civil); e foi

e

manhã

lua cheia no dia i3 de julho às 21 horas

So

qA astronomia dos Lusíadas

40 minutos (tempo astronómico) ou às 9 horas e 40 minutos do dia O quarto crescente foi então no dia 7 pela manhã. 14 (tempo civil).

e

Quando

pois a

armada

em

partiu do Tejo

8 de julho, tinha sido quarto

passagem de meio famosa viagem do Gama.

crescente na véspera; a lua ia portanto na

para rosto inteiro quando começou a

Pela segunda vez mostrou a lua inteiro o rosto

em

pela terceira vez e

de setembro, pela quarta

11

finalrrente pela quinta vez

em

em



regendo as vellas

tomando lenha».

e

em 12 de agosto, em 10 de outubro

9 de novembro, quando os nossos

argonautas estavam

Santa Helena, «alimpando os navios

A

Vê-se que o quarto crescente

tubro.

rosto

lua nova fora

em

26 de ou-

na manhã do dia

foi

e cor-

2

de no-

Quando pois os nossos marinheiros avistaram terra, pelas 9 horas da manhã do dia 4 de novembro, mostrara a lua, dois dias

vembro.

antes,

meio

indo na transição para rosto inteiro, pela quinta

rosto,

mar cortava a armada. Camões conhecia com certeza o livro de Zacuto, que devia ser famoso ainda no seu tempo. Percorrendo as tábuas do lunário, chavez, emqiianto o

mou-lhe naturalmente a atenção a tábua relativa ao ano de 1497. Camões, contando o tempo pelas fases da lua, regista um facto astro-

nómico rigorosamente verdadeiro, como acabamos de mostrar. Na estância 24 do canto V temos pois, mais uma vez, ocasião de admirar o poeta, sábio e artista, unia à beleza e concisão da forma a

como

exactidão scientífica.

O

3.

ano.

nomia que

— Foi

ainda no período puramente popular da astro-

observou que, como a

se

Marte, Júpiter

Merciário

estrela da manhã

ceu-se depois que

Mercúrio, Vénus trela

da manhã,

Na

como

Saturno, se deslocavam por entre as constelações

e

também

das estrelas fixas, sendo

ou planetas.

lua, outras estrelas, tais

e

começou por

estrelas erráticas

nomes: Apolo, quando

ter dois

Mercúrio, quando estrela da tarde.

Apolo

e

Mercúrio eram o

teve entre os gregos dois e

como

classificadas

mesmo

Reconhe-

planeta.

Como

nomes: Fósforo, como

es-

Héspero, como estrela da tarde.

descrição da batalha do Salado aparece-nos Vénus

trela da tarde (Vespero)

em

III,

ii5:

Ia se hia o Sol ardente recolhendo,

Pêra a casa de Thetis,

&

inclinado

Pêra o Ponente, o vespero trazendo,

Estaua o claro día memorado,

Quãdo o poder do Mauro grande

&

horredo

Foi pelos fortes Reis desbaratado,

Com

tanta mortindade, que a memoria,

Nunca no mundo

vio

tam gram

victoria.

como

es-

:

:

— O \odíaco

Cap. VII

8i

Dizendo que o claro dia memorado estava inclinado para o poente, trazendo o véspero, não quer o poeta significar que, no dia 3o de ou-

O

tubro de 1340, Vénus fora realmente estrela da tarde.

vem sr.

aqui

como símbolo da

tarde; há nesta estância,

véspero

como observa o

Dr. José Maria Rodrigues no seu notabilíssimo estudo Fontes dos

Lusíadas

*,

Pina

116):

(fl.

«E

tam prospero deu deos aos

este dia

da sua

da Crónica de D. Afonso IV, de Rui de

visível influência

em

fee,

cristaãos contra os jmigos

que tanta multidã delles foy

em

desbaratada como foy da óra da terça

em tam pouco

espaço

que começaram a pellejar

atee véspera que durou a batalha».

Como a

da manhã aparece Vénus ao romper do dia

estrela

armada chega enfim

em

que

à vista da tão desejada terra da índia, depois

da noite procelosa, quando a deusa determina abrandar por amores as iras e os furores dos ventos, mostrando-lhes as ninfas belas, «que

mais formosas vinham que as estrelas» Mas

ja a

amorosa

strela scintilaua

Diante do Sol claro, no Orizonte

Mensageira do

A A

&

terra,

dia,

&

visitaua

o largo mar,

com

De quem foge o

ensifero Orionte,

Tanto que o mar,

«Sc

a chara

Tocada junto foy de medo,

O

também

sol foi

leda fronte

deusa, que nos ceos a governaua.

classificado

armada

&

como

vira,

de ira (VI, 85).

estrela errática,

A

a conta dos sete planetas conhecidos dos antigos.

movimento próprio do trelas, exigiu

um

sol,

que se não vê ao

completando

descoberta do

mesmo tempo que

maior esforço de reflexão.

Observando

as es-

a constela-

ção que segue imediatamente o sol no seu ocaso ou a que o precede

no seu nascimento, concluiu-se que estas constelações não são sempre as

mesmas.

do

sol,

Assim, se o ocaso da constelação de Aries se segue ao

passado tempo esta constelação desaparece nos raios solares

e é a constelação

poente.

O

sol

do Toiro que passa depois a brilhar sobre o

apaga com a sua

está entre a que o precede

luz as estrelas

no seu nascimento

e a

sol

da constelação que

que o segue no seu

ocaso; e verificou-se assim que ele vai percorrendo sucessivamente, de ocidente para oriente, as constelações

a que se deu o

nome de

\odiaco.

A

duma zona da

esfera estrelada

sequência das observações levou

à descoberta da eclitica, círculo do movimento próprio do

1

O Instituto,

vol. Liv, pág. 3o6.

sol, e

com

:

?A ãslronomia dos Lusíadas

Í2

uma nova

o período deste movimento estabeleceu-se

—o

unidade de tempo:

ano.

O dias e

ano, período do curso próprio do

um

cuja duração é de 365

sol,

quarto aproximadamente, é definido pelo poeta

em

V,

2:

Entraua neste tempo o eterno lume,

No

E

Na

Nemeyo truculento, mundo que com tempo se consume

animal

o

andaua enfermo

seista idade

N'ella ve,

como

&

lento

tinha por costume,

Cuj^sos do sol quatorze vezes cento,

Com

A

&

mais nouenta

Quando no mar sexta idade começava

a

com

em que

sete,

armada

corria

se estendia.

o nascimento de Cristo.

Corria pois

o ano de 1497 da era de Cristo, quando a armada partiu do Tejo.

A

mundo pode

explicação das idades do

lêr-se

Transcrevemos da

o reportório de los tieinpos de Jerónimo Chaves.

edição de Lisboa, 1576,

fl.

De

na Chronographia

38:

Ias

edades dei mundo. Título J2.

«Toda

la

vniuersal duracion dei

mudo

Padres en seys interuallos de tiempo,

mundo.

Y

fue diuisa por los antiguos

Edades

a quien llamaron las

dei

esta diuisiõ fue assi hecha cõforme a los seys dias en que

fue criado el

mundo, y

esta es la

cõmun

diuision de Eusébio,

y de

En el tiêpo y duracion de cada vna destas edades ay tan gran diferencia y confusion entre los historiadores, que

todos los historiadores.

no se ha podido tomar certidumbre de su numeracion.

y dos Interpretes, que traduxeron

me

estas dos opiniones

ay dos prin-

^'nos siguen a los Hebreos, y otros a los se-

cipales parcialidades,

tenta

Y

parescio collegir

el viejo el

testamento: y segun

tiempo de estas edades, y Porque con mayor fa-

hazer de cada una delias Catalogo particular. cilidad las

Em

pueda entender

el lector».

resumo, a primeira idade, comparada à infância do homem,

vai desde a origem do

idade, que foi

como

mundo

a puerícia

até ao dilúvio universal.

A

segunda

do género humano, vai desde o dilúvio

Abrahão.

A

comparada à adoA quarta idade, que é compalescência do homem, vai até David. rada à juventude do homem, vai desde o rei David até à transmigraaté ao nascimento de

ção de Babilónia.

A

terceira idade,

quinta idade, que

vai até ao nascimento de Cristo.

A

foi

como

a velhice

do homem,

sexta idade e última vai desde

o nascimento de Cristo até ao último dia, o dia do juízo

final.

Isto

'

Cap, VII

— O lodiaco

83

mesmo se lê no Reportório dos tempos de André do Avelar, em grande parte, tradução do livro de Jerónimo Chaves.

O que

mundo, que com o tempo

é a última, vai

enfermo

O

numa

é,

consome, andando na sexta idade,

Por

velhice adiantada.

isso o poeta o

acha

e lento.

ano

é

também .

.

.

em

em

definido

O

tempo.

X, 86:

quanto Phebo, de luz nunca escasso

Dozentos cursos

4.

se

que

faz,

da

— A descoberta

um

elle

passo.

do movimento próprio do

sol levou

à distinção entre o dia solar e o dia sideral, determinado por duas

passagens sucessivas

maior que o sideral si.

O

duma

no meridiano.

estrela fixa

O

dia solar é

verdadeiros não são iguais entre

e os dias solares

dia sideral, que para nós é o

tempo duma rotação completa

da Terra, era ainda no século xvi o tempo duma rotação do primeiro

O

móbil, a esfera impulsora do movimento diurno.

dia sideral, pe-

ríodo constante, é a unidade natural do tempo.

No Título

3.*^

— Del Tiempo — da Chronographia de Jerónimo Cha-

ves, que atrás citámos, lê-se

2):

(fl.

.

El tiépo ser vn cierto numero y medida dei mouimiento dei primer móbil, considerando en el partes primeras y «... Aristóteles dize

postrimeras.

Y

.

.

:

/

porq entre todos

los

mouimiêtos de

los

cuerpos celestiales,

mouimiento dei Sol era mas notório y comum a todos los vulgares, semejantemente el mouimiento de la Luna: por esta causa la gente y vulgar midio los tiempos cõ estos dos mouimiêtos. Y vnos seguierõ el

el

mouimiêto de

mayor

Luna, y

Y

entendieron cielo,

el

tales

Árabes: y ai principio la Déspues otros siguieron el mo-

tales fuerÕ los

parte de todas las naciones.

uimiêto dei Sol.

primer

la

fueron los Romanos.

tiempo por

el

o primer móbil:

Solos los Philosophos

numero y medida el

dei

mouimiento dei

qual es causa dei mouimiento diurno

y cotidiano, y tambien por ser mas regulatissimo que todos Cielos y Spheras celestes».

É

este

modo

los otros

de entender o tempo, medindo-o pelo movimento do

em

primeiro móbil, que se encontra

III, 22,

quando o poeta

a Lusitânia se tornou Reino ilustre no decorrer do tempo: Desta o Pastor nasceo, que no seu Se vè, que de

homem

Cuja fama, ninguém Pois a grande de

nome

forte os feitos teue,

vira

que dome,

Roma nam

se atreue;

diz

que

^ asironomia dos Lusíadas

84

Esta, o velho que os filhos próprios come,

Por decreto, do Geo

Veo

a fazer

Criando a Reino

No duz

leue,

&

illustre,

foi

desta arte.

quinto verso introduz o poeta o mito do tempo que tudo pro-

tudo consome,

e

&

ligeiro,

no mundo tanta parte,

&

ligeiro,

— «o velho que os

do verso seguinte

leue»

vimos (págs. 26

e 67),

é

com

é definido

filhos

O

próprios come».

o primeiro móbil, que,

mesmos

os

«Geo

como



adjectivos no final

da estância 85 do canto X: Outro corre tam leue

Que não

No

&

tam

ligeiro.

he o Mobile primeiro.

se enxerga,

em lingoage Português por Valetim

(íReportorío dos tepos

fer-

nãdez alemã», que parece ter sido o primeiro dos Reportórios publicados

em

Transcrevemos

português, começa-se por definir o tempo.

do exemplar existente na Biblioteca de Évora, que julgamos ser a edição de 1628

Começa

se

*:

ho reportório

&

em

primeyramete do tempo

geeral

&

que cousa he

«Em bessem

aquelle

& muy

tempo rudo

Por

cota certa algúa: andaua todo entre elles confuso.

creve Aurélio macrobio: nÕ auia entã tempos algús. '

ai se

colhe

nom húa

&

E

alcança.

enxertar por

uarom no

nem

ordem de

agricultura

os antijgos muyto:

pranetas se

fizer

Ao exemplar

&

es-

têpo nó he

em

vêem 528.

|

semear

|

com tempo & numero.

colher

|

&

Certo lou-

&

padre

seu próprio lugar: quãdo dos signos

mençã».

com

Tivemos ocasião de comparar

a edição de i552, existente na Biblioteca Nacional de

as tábuas

do lunário para os anos de i55o a 1600; no exemplar

de Évora vêem estas tábuas para os anos de i528 a i55o. 1

como

de Évora faltam as últimas páginas, que estão substituídas por

o exemplar de Évora

pois ser a de

Ca

hõrrarom no como a deus

páginas manuscritas, copiadas da edição de i552.

Lisboa; nesta

isso

por quanto chegando hay Saturno a regnar por

do tempo: mais largamente

1

ytalia so-

conta ou medida certa que do contino rodeo do ceo se

sua industria alcançou a gente noticia de laurar

&

em

rústico antes que

as getes por ordé semear ne colher: nõ tedo dimensiô

O

A

edição de Évora deve

Reportório dos têpos de Valentim Fernandes é traduzido do

castelhano e dedicado a António Garneyro,

sumo

secretário do rei D. Manuel.

uma edição, em Lisboa em

Do

Repertório de tiêpo original existe na Biblioteca de Évora

corrigida por

Sancho de Salaya, catedrático de Salamanca, publicada

1543.

dução de Valentim Fernandes saragoçano.

é feita

duma

A tra-

edição anterior, devida a André de Ly,

Cap. VII

E

elle

adiante,

quando

— O ^odíaco

do sétimo céu

se trata

85 de Saturno, lê-se:

e

«Outros disserÕ q saturno qz/er tãto dizer como semeador: que foy primeyro q ensinou a semear laurar & prãtar em ytalia: &

por ysso o pintarÕ c5 a fosse na

mão

todas as cousas q o tepo produze

hÕrrarÕ por

áeiis

&

comedo

mesmo

stus filhos: porqwe

as

cÕsume:

&

assi o

dos têpos: he praneta masculino».

Camões conhecia com Fernandes.

elle

certeza o Reportório dos tempos de Valentim

Parece-nos evidente a influência do trecho da definição

do tempo, que transcrevemos, na estância que estamos analisando.

No é

quinto verso está o tempo personificado

porem marcado

em

O

Saturno.

tempo

pelo movimento do primeiro móbil, o céu ligeiro e

leve do verso seguinte.

A

frase contino rodeo

do ceo faz lembrar o

verso:

O

ceo volubil

com perpetua

roda,

que define o primeiro móbil na estância VII, 6o.

Do

livro

do professor Mach, cujo nome

citámos, Conferências scientíjicas populares



noutro lugar (pág. 62)

*,

traduzimos

da conferência intitulada — Natureza económica cas



,

por nos parecer

um

um

trecho

das investigações

físi-

interessante comentário à estância que nos

ocupa:

«Todas as

leis

e conceitos físicos são indicações abreviadas,

que

muitas vezes contêm implícitas ainda outras indicações, a respeito de experiências economicamente ordenadas e prontas para uso.

vidade pode dar a enuncia

dum modo

tais indicações,

A

bre-

cujo conteúdo só raras vezes se

completo, a aparência de entidades independentes.

Não queremos naturalmente ocupar-nos aqui dos mitos poéticos como Lembraé, por exemplo, o do Tempo que tudo gera e tudo devora. fala dum Tempo absoluto, indepenbem como dum Espaço absoluto, con-

remos apenas que Newton ainda dente de todos os fenómenos ceitos

acima dos quais o próprio Kant não poude elevar-se,

ainda hoje são, de vez

gador da Natureza

é

em

quando, repetidos a

sério.

Para o

e

quô

investi-

Tempo apenas a indicação dum fenómeno de outro, e nada mais. aceleração dum corpo caindo livremente é de

cada determinação de

abreviada da dependência

Quando dizemos que

a

9™,8io por segundo, quer isto dizer que a velocidade para o centro

*

E. Mach, Popular wissenschaftliche Vorlesungen, Leipzig, 1910.

S6

qA astronomia dos Lusíadas

da Terra aumentou de (V",8io enquanto a Terra executou mais da sua rotação

o que, por sua vez, só pode reconhecer-se pela sua

*,

posição relativamente a outros corpos celestes.

também senão uma

Em

Terra.

fenómenos

Como

a

^—

A

relação da posição do corpo

velocidade não é

com

a posição da

vez de os referirmos à Terra, podemos referir todos os

um

existe

mesmo

relógio ou

uma

à nossa sensação interna

do Tempo.

correlação entre todos os fenómenos, e cada

pode servir para medida dos restantes, facilmente

se origina o erro

Tempo, independentemente dos

de se atribuir significação ao

um

fenó-

menos».

Se Camões reproduz o mito poético do tempo como entidade inde-

num

pendente, o que é natural

homem

de grande saber que

poeta, logo no verso seguinte,

também

foi,

como

noção rigorosa

se reporta à

do tempo, referindo o intervalo que vai desde Viriato a D. Afonso

Henriques ao movimento de rotação do primeiro móbil, a que hoje corresponde o movimento de rotação da Terra, satisfazendo assim os filósofos antigos,

As

5.

horas.

como

—O

Ia neste

Que

Aristóteles, e os futuros,

em

dia divide-se

como Mach.

horas:

tempo o lúcido Planeta,

vay do dia distinguindo, Chegaua aa desejada, & lenta Meta,

A

No século bém relógios

as horas

luz celeste aa gentes encobrindo

XVI usavam-se no

mar

(II,

i).

os relógios de sol

Havia tam-

^.

de areia para marcar as divisões dos quartos de vigia,

a que o poeta se refere

O

em

Capitam

De

6o:

II,

illustre, ja

cansado,

que arreceia,

vigiar a noite

Breue repouso entam aos olhos daua,

A

1

O

2

Os

dia

outra gente a quartos vigiaua.

tem 86400 (24X60X60) segundos.

defeitos destes rológios são apontados por D. João de Castro

no Roteiro

de Lisboa a Goa, Lisboa, 1882, pág. i83: «... não considerando como os Relógios por onde se regem são feitos em differentes Regiões, e cada hum serue á leuação

do pollo do lugar donde he

meo

feito,

o que

dia; porque, vereíicando as oras

fazião

meo

dia, e

o terceiro

11

oras

C)je

muy conhecidamente

se

mostrou ao

por quatro Relógios, achei que dous delles



,

e

o quarto

1

1

me

oras —: alem disto faz mintir

muitas vezes muito os taes Relógios o variar de suas agulhas, porque,

como quer

que são ceuadas com differentes pedras, e os mesmos ferrinhos seião mais aceiros huns que outros, faz que variem ou nordesteem huns muy dififerente dos outros, e

daquy vem mostrarem o lugar de meo

dia

com

tanta falsidade:

.

.

.».

Cap. VII

Cada quarto de

O

hora.

— O lodíaco

Sj

vigia durava oito relógios ou ampulhetas de

primeiro quarto de vigia da noite era o quarto da prima;

o segundo o da modorra;

e

o terceiro o quarto da alva.

Dom Joam de Castro, da viagem que fi\eram mar Roxo no anno de i54i, Paris, i833, lê-se:

Roteiro de ses

ao

meia

Assim no

os portugue-

«De noute, toda a noute foi o vento Nordeste gallerno: o quarto da Prima gouernamos Alloeste, q o da modorra, Alloeste quarta de Noroeste: Mas o quarto dalua gouernamos todo Alloeste» (pág. 26). «De noute

foi

o vento oeste bonança: toda a noute corremos, ate

o quarto

da prima rendido, com

grande.

A

.8.

as vellas de proa, e vellas da gauia

hiium rellogio do quarto da modorra,

tomamos fundo em

com

todallas vellas: go-

braças, e deshi ate amanhecer, corremos

uernamos sempre

leste,

quarta de sueste» (pág. 271).

da prima em VI,

Assiste-se ao render do quarto

Em

quanto este conselho

No fundo

Com

38:

se fazia

aquoso,- a leda, lassa Frota

vento sossegado proseguia

Pello tranquillo mar, a longa rota:

Era no tempo quando

Do Eoo Emisperio

a luz do dia

está remota,

Os do quarto da prima

se deitauão

Pêra o segundo os outros despertauão.

O tifica

segundo quarto

é

o da modorra, cuja denominação o poeta jus-

na descrição que faz na estância imediata: Vencidos

vem do

sono,

&

mal despertos

Bocijando a miude se encostauam, Pellas antenas, todos

mal cubertos,

Contra os agudos ares que assoprauam:

Os olhos contra seu querer abertos Mas estregando os membros estirauam; Remédios contra o sonno buscar querem, Historias contão, casos mil referem.

Para resistirem à modorra que os acomete, conta então Veloso aos companheiros a história dos Doze de Inglaterra. 6.

Os signos do ^odiaco.

é descrito pelo poeta

Bem Co

— Como



vimos (pág.

61), o zodíaco

na segunda parte da estância X, 87:

ves

como

se veste

&

faz

ornado

largo cinto douro, que estrellantes

Animais doze

traz afigurados.

Aposentos de Phebo limitados.

:

88

qA astronomia dos Lusíadas

O se

zodíaco, zona celeste de 12^ graus de largura, dentro da qual

observam os movimentos dos planetas,

como

No

sabido.

é

Signo n5

«

E

do soL

doze signos,

doze signos

&

q quer dizer signos:

cousa se no casas ou moradas

he de presuponer q todos os doze signos do zodiaco

assi

em

— Dos

q?/er dizer outra

se referem aa natureza

quãdo esta

em

Reportório dos tempos de Valentim Fernandes

no capíailo intitulado

lê-se,

é dividido

Ca segundo o efecto q ho sol faz daquelles doze tal nome poserom os astró-

do

cada casa

sol.

logos ao signo que nos mostra aquella casa atribuyda

&

dente aa condiçam de aquelle animal por a qual se figura

mos

por ordé

O

sol,

em

Por

sol.

como

vere-

cada hu dos signos».

percorrendo a

cessivamente cada

correspon-

um

eclíptica, linha

dos signos que se

chama

isso o poeta lhes

média do zodíaco, ocupa

chamavam também

((Aposentos de

Phebo

su-

casas do

limitados».

São limitados à extensão de 3o graus cada um, perfazendo os doze Junto damos um quadro os 36o graus da volta inteira do zodíaco.

com os seus nomes, latino e português, os símbolos com que se designam, as figuras correspondentes aos seus nomes como se vêem na Chronographia de Jerónimo Chaves, e os graus de longitude em que cada um começa. Os nomes dos signos são os mesmos das constelações zodiacais, os doze estrellantes animais afiguraFoi no tempo de Hiparco que os signos tomaram o nome das dos. dos doze signos

constelações que os ocupavam. cios,

Por causa da precessão dos equinó-

à razão de 5o", 2 por ano, os signos foram-se deslocando para

ocidente sobre as constelações, estando hoje o signo de Aries sobre a constelação dos Peixes.

Os cada

Reportórios do século xvi trazem a descrição minuciosa de

um

dos signos

com

a astrologia respectiva.

relativos aos signos,

pítulos,

Percorrendo os ca-

do Reportório de Valentim Fernandes,

pode-se formar o seguinte quadro das datas das entradas do sol nos signos Aries

11

de março

Libra

Taurus Gemini Câncer

11

de abril

Scorpius

12

de maio

Sagittarius

i3

de novembro

12

de dezembro

1 1

de janeiro

10 de fevereiro.

.

......

Leo

14 de julho

Gapricornus Aquarius

Virgo

14 de agosto

Pisces.

Os

i2 de

junho

14 de setembro 14 de outubro

quatro signos de Aries, Câncer, Libra e Capricornus eram

chamados os quatros signos

marca o

cardeais, porque a entrada do sol neles

princípio das estações.

1

— O ^odíaco

Cap, VII

8g

Aries

Taurus

Gemini

Câncer

Leo

Virgo

\.yjjií

^/

^

^

900

120"

Cancro ou Caranguejo

Lião

Libra

Scorpius t

^



Sagiítariíis

:

240"

Scorpião

Sagitário

Capricornus

Aqiiarius

Pisoes

Capricórnio

Aquário

Peixes

33o«

Os signos de

As

figuras são reproduzidas da

zodíaco.

Chronographia de Hieronymo Ghaqes, Lisboa,

i576,tfl. 161



:

di astronomia dos Lusíadas

gif

No

Reportório de Avelar, impresso pela primeira vez

em

i585,

«conforme à noua reformação do sancto Padre Gregório XIII», encontra-se

(^ti.

entrada

87, v.) a tábua da entrada do sol nos doze signos, sendo a

em

Aries a 21 de março,

causa dos dez dias suprimidos

Camões exprime

a

em

em Taurus

a 21 de abril, etc,

i582.

em

época do ano,

que tiveram lugar alguns

dos acontecimentos que descreve, pela posição do sol na eclíptica,

dicando o signo.

Assim

a batalha

por

de Aljubarrota coincidiu

com

in-

a en-

trada do sol no signo da ^'irgem:

Respondem

trombetas mensageiras.

as

Pífaros sibilantes, &. atambores

Alferezes volteam as bandeiras

Que

variadas

sam de muitas cores

Era no seco. tempo, que nas

eiras

Ceres o fructo deixa aos lauradores, Entra

em

Astrea o SoL no mez de Agosto,

Baco das vuas

Como

se

tira o

vé da tabela, o

sol

agosto, e a batalha teve lugar

Xa

doce mosto \l\\

entrava no signo da

em

Virgem

a 14 de

14 de agosto de i385.

descrição dos signos da Chrono^jraplua de Jerónimo Chaves,

indica-se não so a entrada no signo é,

27).

na constelação do

mesmo nome.

como

entrada na imagein, isto

a

que tem lugar mais tarde, porque

as constelações são deslocadas para oriente, relativamente aos signos,

Lê-se na Chronographia

pela precessão dos equinócios.

[^. 85):

comunmente a los quatorze de imagen ai íin de Agosto».

(vEntra el sol en el signo de Virgo

Agosto, comiença a entrar en

O

la

poeta refere-se sempre aos signos

e

não às constelações.

A

posição do sol na eclitica indicava-se pela sua longitude expressa no signo, e nos graus e minutos

de que

em

do signo

Também nas

^.

seguida nos vamos ocupar,

pelo animal correspondente ao seu nome.

A

data da batalha de Aliubarrota

e

três estancias,

o signo que o poeta designa

é

e

não a constelação.

não so determinada astronó-

micamente, mas relacionada também com factos agrícolas, o que dá aquela estancia

^

A

um

certo sabor de almanach.

transcrição, que

numa

Xo

calendário do Re-

nota anterior fizemos, da última folha do Almanach

perpetuum de Zacuto termina assim: «... 1490 sole existente in i3 g 53 m 35 s pisciuw sub ceio leyree». Terminou-se a impressão do Almanach estando o sol

em

i5»53'35" do signo dos Peixes

140Ó,

como

se

pode

no ano de

14QÕ, isto

e,

verificar nas próprias tábuas de Zacuto.

em

25 de fevereiro de

:

Cap. VII

— O :{odíaco

gi

portorio de Valentim Fernandes há no cimo de cada página dos meses dois versos alusivos aos factos característicos de cada

O

respondente gravura.

Yo

soy

julio

Porq de pa:

O

mês de :

um, com

a cor-

julho diz:

q trillo las eras inchan paneras.

el

se

de agosto:

Yo soy

O

agosto; q

&

Pipas

ç\uavios

:

amano

las cubas.

pêra. el

çumo

de

las vuas.

de setembro:

Yo soy setiebro q de maduras vuas Ago buê vino: hinchêdo las cubas. :

O

poeta indica os dois acontecimentos agrícolas entre os quais

teve logar a batalha: o

Em lugar

II,

em

72,

malhar do

trigo nas eiras e as vindimas.

marca o poeta o dia da chegada a Melinde, que teve domingo de Páscoa, como já dissemos:

i5 de abril de 1498,

Era no tempo alegre quando entraua, de Europa a luz Febea,

No roubador

Quando hum,

E

&

o outro corno lhe aquetaua,

Flora derramaua o de Almathea:

A memoria do dia renouaua, O presuroso Sol, que o Geo rodea,

Em O

que aquelle,

sello

Era quando o

sol

a

quem tudo

pos a quanto tinha

está sogeito,

feito.

começava a percorrer o signo do Touro, onde

estava havia apenas quatro dias, pois entrara nele a

em

no tempo alegre cornucópia.

No

que Flora, deusa das

Yo

Em V,

2, diz

de

abril.

Era

abril:

soy abril: de dulce dormin

Agrada

em

1 1

derramava a sua

Reportório de Valentim Fernandes deíine-se assim,

no calendário, o mês de

foi

flores,

flores hojas:

y aues oyr.

o poeta a época da partida da

8 de julho de 1497.

Nos

armada do Tejo, que

dois primeiros versos indica o mês:

Entraua neste tempo o eterno lume,

No animal Nemeyo

Entraua quer aqui do Lião

quadro

ia ter lugar

atrás.

truculento.

dizer ia entrar.

A

entrada do sol no signo

poucos dias depois, a 14 de

julho,

como

se vê

no

:

g2

cá astronomia dos Lusíadas

,

Andava o

no signo dos Peixes quando a armada, tendo deixado

sol

o rio dos Bons Sinais,

ia a

Emquanto

caminho de Moçambique:

isto se passa,

na fermosa

Casa Etérea do Olimpo omnipotente, Gortaua o mar a gente belicosa; Ia la da

& do Oriente, & a famosa & o Sol ardente

banda do Austro,

Entre a costa Ethiopica,

sam Lourenço, Queimaua entam os Deoses, que Tifêo

Ilha de

Co temor grande em

O

sol

de março,

1 1

belicosa cortava o

sol

em que passava para

mar desde 24 de

çambique, que avistaram

em

i

o

.

no signo dos Peixes.

e

.

Boons Signaees

D 'aquy

Mo-

Esteve durante este trajecto

Transcrevemos a passagem corres-

Gama em i4gj

(pág. 22):

Rrafaell, e isto porque elle o levava, e ao rrio dos

*.

nos partimos

do mês de fevereiro

em

A gente

o de Aries.

aquy posemos huum padram, ao quall poseram nome

padram de Sam

seguinte

42).

fevereiro e ia chegar à Ilha de

de março.

pondente do Roteiro da viagem de Vasco da «

(I,

entrava no signo dos Peixes a 10 de fevereiro e levava a per-

corrê-lo até

sempre o

peixes conuerteo

leste

ciosa de vista.

e

huum sábado que eram

vinte e quatro dias

fomos aquelle dia na volta do mar,

e a

noute

por nos arredarmos da costa a quall era muito gra-

E

ao domingo fomos ao nordeste,

em

oras de vespora vimos estar três ylhas

o

mar

e

quando vêo a eram pequenas,

e

sam de grandes arvoredos e a outra he calva e pequena mais que as outras, e de huuma aa outra averá quatro legoas, e porque era noute vyrámos na volta do mar e de noute pasámos por ellas. e

as duas

E

ao outro dia fomos noso caminho,

porque ás noutes pairávamos.

e

andámos

E huuma

seis dias pello

meiro dia do mês de março, á tarde ouvemos vista das ylhas que se ao diante segue.

mar

e

E

pairámos até pella manham.

E emtam

Gompare-se com V, 78 Muy grandemente aqui nos alegramos Coa gente, & com as nouas muito mais. Pellos sinais que neste rio

achamos

O nome ihe ficou dos bós sinais: Hum padrão nesta terra aleuantamos, Que para

asinalar lugares tais

Trazia alguns, o nome tem do bello

Guiador de Tobias

e terra

porque era tarde virámos na volta do

terra syguinte».

1

maar,

quinta feira, que foy o pri-

a Gabello.

viemos emtrar

em

a



Cap. Vil

— O :{odiaco

Esta terra era a Ilha de Moçambique.

Bons Signais ção

até

Gama

pelo

feita

Moçambique

:

A

g3 viagem desde o

novo descrita

é de

em

rio

dos

V, 84 na narra-

ao rei de Melinde:

Assi que deste porto nos partimos

Com mayor esperança & mór tristeza, E pela costa abaixo o mar abrimos Buscando algum

sinal

de mais firmeza

Na dura Moçambique emfim surgimos, De cuja falsidade & má vileza Ia serás sabedor,

&

dos enganos

Dos pouos de Mombaça pouco humanos.

7.

e a

As

— A divisão

cinco \onas.

da esfera celeste nas cinco zonas

correspondente divisão do globo terrestre acham-se descritas no

Tratado da Sphera de Pedro Nunes na parte do capítulo título Dos quatro círculos menores :

que tem

11



por

«Poys que

ja

falamos dos seys círculos mayores diremos agora,

dos quatro menores.

Auemos

de notar que estando o sol no primeiro

põto de cancro que he ho solsticio do estio: pello mouímento do pri-

hum

meiro mobile: faz

círculo que he

ho derradeiro que ho

sol faz

& chamase circulo do solsticio estiual pella razam chamase também trópico estiual: & veo este nome de tropos que quer dizer volta: porque entam começa ho sol a fazer da parte do norte: sobredita:

&

volta pêra o hemispherio

tando cio

também ho

sol

&

começase apartar de nos.

no primeiro ponto de Capricorno que he o

do inuerno: pello mouímento do primeiro mobile:

que he ho derradeiro que culo do faz

debayxo

ho

solsticio

sol volta

da banda do

sul.

E

solsti-

circulo

chamase

cír-

do ynuerno: ou trópico do ynuerno: porque entam

pêra nos.

també o polo do zodíaco oitaua esphera se

elle faz

hum

faz

Es-

moue

:

E

pois o zodíaco se aparta da equinocial:

E

do polo do mundo.

se apartara

também ho

pois a

zodíaco que he parte da oytaua

esphera se mouera: per derredor do eyxo do mundo:

&

ho polo do Por tãto este per derredor do polo artico: chamase

zodíaco se mouera per derredor do polo do mundo. círculo que o polo do zodíaco faz

círculo artico

:

&o

outro círculo que faz ho outro polo do zodíaco per

derredor do polo antartico:

chamase

círculo

Outro

antartico.

si

quanto he o que mays se aparta o Sol da equinocial: tanto he o que se aparta

ho polo do zodíaco do polo do míído: ho que

se

prouara

desta maneira

E .8.

auemos mays de notar que os quatro

dous trópicos

& ho

paralello artico

& ho

paralellos

menores

antartico nos apartão no

^ astronomia dos Lusíadas

g4

eco ciiiquo -ojias ou regiões.

E

por isso dezia Vergilio nas georgicas.

Cinco zonas ha no Ceo bua das quaes he sempre queimada do torrada do fogo.

estão debaixo das ditas :{onas:

do Metamorphoseos. tura

:

sol

&

Outras tantas partes ha na terra que dereitamente

A

q esta

como Ouuidio no meyo

duas deUas estão cubertas de neue

:

dixe no primeiro liuro

nam

he habitauel per quen-

& as

outras duas que estam

sam temperadas pella mistura do quete com o frio. Assi antre estas:

que a zona que esta antre os dous trópicos he inhabitauel: pella quen-

sempre anda antre

tura do sol que

os trópicos: a terra

&

que

inabitauel: e

debaixo delia he

as

duas Zonas que

antartico:

pêro muito

frio:

circullo artico

sam

do inuerno

estio e

& ho

ho circulo

artico:

circulo antartico:

sol

anda

&ho mesmo

ha de dizer das regiões da terra

que estão debaixo: mas das outras duas zonas:

ho trópico do

inhahitaueis

porque ho

muito apartado delias: se

causa

jaz

estam cercadas pello

& pello

mesma

pella

sam

como

a

assi a

que estaa antre

q esta antre

ho trópico

habitaueis: porque se tempera

da zona torrada q esta antre os trópicos: com a frialdade das zonas frias que estão debaixo dos poios: & ho mesmo se ha de

a quentura

dizer das partes da terra que estam debaixo delias».

A

esta afirmação do texto de Sacrobosco, da inhabitabilidade

zona tórrida

e

da

das zonas glaciais, faz o tradutor Pedro Nunes a se-

guinte anotação na

margem:

«As nauegações dos portugueses nos amostrara: q não ha terra fria em q não aja homes».

tam destêperada per quete ne per

As navegações dos portugueses transformaram

a

sciência

do

tempo.

No

trecho acima transcrito, quando, depois de definidas as cinco

zonas celestes, se diz «outras tantas partes ha na terra que dereita-

mente estão debaixo das ditas zonas», deve-se entender que cada ponto dente.

duma zona terrestre fem o seu zénite na zona celeste As verticais tiradas do centro da Terra para os

círculos polares terrestres

ção

em

determinam

correspontrópicos e

superfícies cónicas de revolu-

torno do eixo do mundo, que vão interceptar a esfera celeste

segundo os trópicos

e círculos

polares celestes correspondentes.

:

Cap. VII

A

como

equinocial, ou,

— O lodíaco

hoje dizemos, o equador, linha

em

tórrida, está definida pelo poeta

zona

Por

Do

este largo

gS média da

V, i3:

mar em fim me alongo

conhecido pollo de Galisto,

Tendo o termino ardente ja passado Onde o meyo do mundo he limitado.

Em

V,

7;

Passamos o lemite aonde chega

O

Sol,

que pêra o Norte os carros guia,

Onde jazem

O e

em X,

filho

quem nega

os pouos, a

de Climêne a cor do dia,

129;

Aqui o soberbo império, que

Com

terras

Da China

&

nam

riqueza

corre,

&

se

afama

cuidada,

occupa o senhorio

Desdo Trópico ardente ao Cinto

Câncer

refere-se o poeta ao trópico de

e

frio,

ao círculo polar ártico.

O

trópico de Capricórnio e o círculo polar antártico são introduzidos

em

V, 27 Achamos

ter de

todo

Do Semicapro pexe Estando entre

elle

Austral, parte do

Mas é a

a

&

passado

ja

grande meta, o circulo gelado

mundo mais

a mais formosa estância

em

secreta.

que entram as zonas terrestres

admirável colocação da Europa na zona temperada,

em

III,

6:

Entre a Zona que o Cancro senhorea, Meta Septentrional do Sol luzente, E aquella, que por fria se arrecea Tanto, como a do

meyo

laz a soberba Europa, a

Pela parte do Arcturo,

Com E 8.

As

marca o

—A

zona.

rodea.

do Occidente:

Mar Mediterrano.

entrada do sol nos quatro signos cardeais

princípio das estações, que

a zona que se considera. rida,

&

suas salsas ondas o Oceano,

pela Austral, o

estações.

por ardente,

quem

Tendo

a

teem sua

feição especial

armada atravessado

segundo

a zona tór-

o poeta descreve naturalmente os factos característicos desta '

:.

:

qA astronomia dos Lusíadas

g6

Na

parte do capítulo

diuersidade dos dias partes da terra

&

— Da

do Tratado da Sphera intitulada

iii

em

noytes que tem os que morao

— começa-se

por descrever o que sucede

diuersas

com

os ha-

bitantes do equador:

«Auemos de saber que ho

os que viuem debayxo da equinocial

principio de Aries:

tempos dous

& quando estaa no principio de Libra: & tem nestes

solsticios altos:

porq lhes passa o

cima de sua cabeça: tem também dous nos principios de Cancro

sol esta

porque entam se aparta ho

sol

&

&

solsticios

Capricorno

bayxos quando ho

&

chamanse bayxos pode do seu zenith:

:

lhes he equinócio:

&

dous bayxos:

teram no anno

teram dous

estios

estando o sol em qualquer dos dous pôtos equinociaes ou junto Tambê teram dous iiiuernos .s. estando o sol nos primeiros

E

de cancro e Capricorno ou júto delles

&

se

põem

as estrellas que

delles.

nesta abitação

estam acerca dos poios

tros.

meio os

»

Por

isso o

poeta diz

hori-

círculos diurnos de todos os as-

Durante todo o ano são os dias iguais às noites; sempre

he equinócio.

.s.

pontos

Para os habitantes do equador os poios do mundo estão no zonte, que corta portanto ao

per

sol dereitamente

ho mais que ser

do qual se segue que poys sempre quatro solsticios dous altos

nace

tem

na cabeça duas vezes no anno: conue a saber quãdo estaa no

sol

em

II,

lhes

63

Vaite ao longo da costa discorrendo,

E

outra terra acharas de mais verdade,

La quasi junto donde o Sol ardendo, Iguala o dia,

&

noite

em

quantidade,

referindo-se a Melinde, que fica junto do equador, a três graus apenas

de latitude

A

sul.

E

linha equinocial é igualmente definida

desda a

fria

Nem mesmo

— Dos

só os que

o Sol

nam muda

o estilo

dias, sobre a gente de Ethiopia,

Tudo tem no

o

VII, 61

plaga de Gelanda,

Ate bem donde

Nos

em

seu Reino

em

grande copia.

vivem no equador teem dois

estios e dois invernos;

sucede aos outros habitantes da zona tórrida.

que viuem antre a equinocial

&

Com

o trópico de Cancro

o título



lê-se

depois no Tratado da Sphera:

«Os que tem ho

zenith antre a equinocial

tem duas vezes no anno ho

&

sol sobre a cabeça:

o trópico de Cancro

porque se imaginar-

.

Cap. Vil

mos hum

— O ^odiaco

em

zodiaco

Cancro

:

&

circulo equidistante a equinocial:

da sua cabeça: craro esta que este

gj que passe pello zenith

tal circulo

se encõtrara

dous lugares que igoalmenle se apartam do principio de

& portanto quãdo quer que ho sol

esteuer nestes dous lugares

passara de necessidade pello zenith de sua cabeça.

que terá dous

estios

&

dous inuernos: quatro

ferenças de sombras: assi cial

Do

solsticios

qual se segue

&

quatro de-

como os que víuem debaixo da

equino-

»

:

E

claro que considerações análogas se

vivem entre a equinocial não

com ho

fala o

e

podem

fazer para os que

o trópico de Capricórnio.

Tratado da Sphera, que só

Mas

destes

se refere ao hemisfério bo-

Quando Sacrobosco, no século xiii, escreveu o seu tratado, não eram seus conhecidos os habitantes do hemisfério austral. Foram os portugueses os primeiros que atravessaram a zona tórrida, real.

onde duas vezes por ano o

sol

invernos fazendo e dois verões,

em V,

passa no zénite de cada lugar, dois

como

o

Gama

diz ao rei de Melinde.

i5:

Assi passando aquellas regiões,

Por onde duas vezes passa Apolo,

Dous inuernos fazendo & dous verões, Emquanto corre dhum ao outro Polo: Por calmas, por tormentas & oppressões Que sempre faz no mar o yrado Eolo, Vimos as Vrsas a pesar de luno Banharemse nas agoas de Neptuno.

A

respeito dos que

vivem no

limite norte

da zona tórrida diz o

Tratado da Sphera no parágrafo

Dos que viuem debaixo do trópico de Cancro: «Os que tem ho

zenith no trópico de

Cancro tem hua soo vez no

.s. quãdo esta no primeiro põto de entam em húa soo ora de hum dia de todo anno te a sombra perpendicular: & neste sitio esta a cidade chamada Syene: & por isso dezia Lucano ^ Syene pêra nenhua parte laça sombra isto

anno o

Cancro:

se

sol

sobre a sua cabeça

&

ha de entender ao meyo dia de

tempo do anno vay

a

«Vmbras nusquam 7

sombra pêra

flectente Syene».

hum a

soo dia:

& em

banda do norte».

todo o outro

gS

Como

Lusíadas

astro)ioniij dos

c4

Lucano, se exprime Camões a respeito de Siene,

O

famoso Pompeyo nam

De

Ter

:

te pene,

ver que a justa Nemesis ordene, teu sogro de

Posto que o

victoria dina.

ti

frio Fasis,

ou Sjene

Que fera nenhum cabo a sombra Bootes gellado,

Temessem

A

71

III,

teus feitos illustres a ruyna,

Nem

O

em

o teu

inclina:

linha ardente,

&: a

nome

geralmente.

cidade de Siene, situada no Egipto ao sul

e

proximamente no

meridiano de Alexandria, era célebre pela famosa medida do raio da Terra,

feita

sabido

qiie

por Eratóstenes

em

cabo ao meio dia no até ao fundo pelo

do verão,

em

zénites

poço era iluminado

Alexandria ao meio

de Siene, media

de Alexandria

e

dia,

no dia

momento

es-

o ângulo compreendido entre

os

do

solstício estival, a distancia zenital

tava no zénite

um

que

e

o que p^rovava a situação da cidade no trópico

Eratóstenes, medindo

de Câncer.

do

solstício

sol,

Era então para nenhinn

século antes de Cristo).

(ò.^

Siene os corpos não lançavam sombra

Siene, isto

o

é,

que nesse

sol,

número de graus do arco Achou que esse

de meridiano compreendido entre as duas cidades. arco era de

7''

12',

isto é, y-

Alexandre Magno

e,

da circunferência.

mandado

depois dele, os Ptolomeus, tinham

medir os caminhos do Egipto, pelos hematistas,

isto é,

ou geógrafos, que mediam as distâncias pelos passos,

agrimensores

tinham

e estes

achado que a distância de Siene a Alexandria era de 5:ooo estádios.

A circunferência isto é,

25o:ooo estádios, donde

do raio da

9.

é fácil concluir

Os climas.

lada — Da é

número de

— A palavra clima não tinha no século xvi

que hoje tem.

O

sentido

definido na parte do capítulo

Nunes,

o

estádios

terra, considerada esférica.

signiíicação é

do meridiano era pois cincoenta vezes esta distância,

repartição

do

iii

dos cHmas



toda tirada de Alfragano.

.

em

a

mesma

que Camões a emprega

Tratado da Sphera,

que,

intitu-

segundo observa Pedro

Sacrobosco considera habitável

apenas a parte do hemisfério boreal compreendida entre o paralelo terrestre de

i2'"'45'

de latitude e o paralelo de 5o°3o' de latitude.

tre estes dois paralelos coloca

os

dois primeiros

em

mais

sete zonas

seis,

En-

que dividem o espaço entre

menores, que são os

sete climas.

Estes paralelos são escolhidos de forma que a diferença entre o maior dia do ano

no paralelo

de meia hora; e

inicial e

em cada

no paralelo

final

clima considera ainda

de cada

um

cHma

seja

paralelo médio^

Cap. VII

dum

onde esse dia difere

No

— O :{odiaco

99

quarto de hora do dos paralelos estremos.

quadro junto resumimos o que Sacrobosco diz

a respeito dos sete

climas.

^

Climas

Latitude

Dia máximo

Largura do clima,

em

I.

ir.

III.

IV.

V.

Princípio

12» 45'

I2h 45«"

Meio

i6

40

l3

Fim

20

3o

i3

Princípio

20

3o

i3

i5

Meio

24

i5

i3

3o

Fim

27

3o

i3

45

Princípio

27 3o

3o

i3

45

Meio

45

14

Fim

33

40

14

33

40

14

i5

36

24

14

3o

Fim

39

14

45

14

45

39 41

20

i5

Fim

43

3o

i5

Princípio VI.

Clima de Méroe

400

Clima de Siene

35o

Clima de Alexandria

3oo

Clima de Rodes

255

Clima de

212

Clima do Borístenes

Roma

i5

43

3o

i5

i5

Meio

45

24

t5

3o

Fim

47

i5

i5

45

.

440

i3

Princípio

Meio

"

i5

Meio

Princípio

Denominação do clima

milhas

,

Princípio

VIL Meio Fim

A

i5

i5

40

16

5o

3o

16

45

dos paralelos

inicial,

máximo»

paralelos, isto

médio

Clima dos Rifeus

í85 i5

coluna intitulada «latitude» dá,

lada «dia

mos

47 48

e final,

em

graus

de cada clima.

indica-se a duração do dia é,

e

o número de horas

e

minutos, a latitude

Na

coluna

intitu-

maior do ano nos mesminutos que o

sol está

sobre o horizonte dos lugares neles situados, no dia do solstício do estio.

Na

clima, isto inicial e

o

coluna seguinte lêem-se é,

as milhas

de largura de cada

do arco de meridiano compreendido entre o paralelo

final.

:

100

Q/í

O

primeiro clima

titude norte,

é

astronomia

cios

Lusíadas

limitado ao sul pelo paralelo de 12^45' de

onde o dia maior do ano dura

i2'^45"\

la-

o qual, segundo

Sacrobosco, separa as partes habitáveis da Terra das que o não são,

por

Este clima estende-se ao norte até ao paralelo de

fiiuito quentes.

de

20''3o'

latitute,

onde o dia máximo

de

é

i3'^i5'^,

meia hora mais

inrcial; tem de largura 440 milhas e chama-se clima

que no paralelo

de Méroe, por nele se achar a cidade de Méroe, situada na Niíbia, na ilha

do

mesmo nome,

em

de que Gamões fala

X, 96:

Ve Meroe, que ilha foy de antiga fama Que ora dos naturais Nobá se chama.

O

dia

em

maior do ano vae aumentando meia hora

que no paralelo três horas e

final

cada clima, até

do sétimo clima tem de duração 16^1 5"^, mais

meia que no começo do primeiro clima.

A

largura dos

climas vae deminuindo, sendo de i85 milhas no último, que tira o seu

nome dos Montes

Rifeus, de que fala o poeta

Da"parte donde o dia

Com

em

III,

7

vem nascendo,

Azia se auizinha: mas o Rio

Que dos montes Rifeios vay correndo, Na alagoa Meotis, curuo & frio As

diuide

:

&

o Mar, que fero

&

horrendo

Vio dos Gregos o yrado senhorio.

A

largura dos climas, definidos pela propriedade de haver

uma

variação de meia hora na duração dos dias máximos nos paralelos

que os limitam, vae deminuindo para o polo.

monstração desta asserção

como noutro

E

foi

A

generalização

e de-

pela primeira vez feita por Pedro Nunes,

logar (pág. 10) já dissemos.

no sentido que

fica

definido que

devemos entender o termo

clima, na pergunta que o rei de Melinde faz ao

Gama em

II,

109:

Mas antes valeroso Capitam, Nos conta, lhe dezia, diligente.

Da

terra tua o clima,

Do mundo onde

&

regiam.

morais distintamente.

Portugal estendia se na Europa sobre o clima de

Roma

ao norte

de Lisboa, e ao sul sobre o clima de Rodes.

Sacrobosco limitava ao 12*^45'

sul

o

mundo

habitável pelo paralelo de

de latitude norte, princípio do clima de Méroe.

As navegações

dos portugueses ao longo da costa africana foram, porem, recuando

Cap. Vil

— O :{odíaco

loi

aquele limite, juntando aos climas conhecidos novos climas,

poeta diz

em

como

o

IV, 76:

Determinam o náutico aparelho, Pêra que com sublime coraçam

Vaa

A

que mandar cortando os mares

a gente

buscar nouos climas^ nouos ares.

Assim no Reportório dos tempos de André do Avelar, Lisboa, i585, se

contam



quatro climas

v.) vinte e

64

(fl.

em

cada hemisfé-

rio:

Dos

«Clyma chamarão

os antiguos, o espaço de terra, q faz diferença,

mea hora

desdo principio, ate o fim,

no maior dia do anno, noctial para

a linha,

Os

&

Titulo 68.

climas.

e

cõforme a

&

o Norte vinte

de maior ou menor quantidade,

podemos

isto,

cotar desda equi-

quatro climas pois ay de diferença entre

o Polo na quãtidade do maior dia do anno doze horas.

antigos não contarão mais de sete,

&

os atribuirão aos sete Pla-

netas pondo o meio do primeiro clima, onde o maior dia do anno era

de treze horas, e

meia,

&

& o meio do segundo,

a experiência, pos

&

em

mas

mesma

&

quantos

boreais, o dia

máximo tem

trópico de Câncer; nos climas austrais,

O

de Capricórnio.

armada

é o clima

&

sam

Por agora baste

os climas».

em

cada hemisfério.

lugar quando o sol atinge o

quando o

sol

chega ao trópico

clima mais ao sul do equador por onde passa a

do Cabo de Boa Esperança, onde Vasco da

exclama quando vae surgir a figura do Adamastor,

O

serue a Geogra-

Outros tantos climas, podemos

pois aqui já vinte e quatro climas

Nos climas

horas

conta fenesceo, porq

linha equinoctial, para o sul.

somête saber q cousa he clima,

Temos

ja esta

mais perfeição, o que toca

Astronomia, nesta parte.

fabricar da

i3.

contauão ate o meio do septimo clima, onde o maior

assi

dia do anno he de dezaseis horas:

phia,

onde o maior dia tinha

em

Gama

V, 38:

potestade, disse, sublimada

Que ameaço Este clima,

diuino,

&

este

ou que segredo,

mar nos

apresenta.

Que mor cousa parece que tormenta ?

As

expedições marítimas portuguesas foram sistematicamente avan-

çando para o

em Verde em jador

sul

1434, 1446.

durante o século xv.

Nuno

Tristão ao

Atinge-se

em

Gil

Eanes chega ao Cabo Bo-

Cabo Branco em 1442

147

1

e

ao

Cabo

o equador e avança-se depois su-

102

ãsirouomia dos Lusíadas

Qyi

cessivamente no hemisfério austral, até que Bartolomeu Dias chega

em dezembro

a Lisboa

com

de 1488

Tormentório, cujo nome então D. João

II

Está aberto o caminho para o Oriente.

Esperança. rige A^asco

Cabo muda para Cabo de Boa

a notícia de ter passado o

Para

lá se

di-

da Gama, por ordem de D. Manuel, a realizar a boa

es-

perança.

Quando começa e

vae

a

«já lá

famosa

concílio

a acção dos Lusíadas, já a

da banda do Austro

ilha

no Olimpo luminoso.

tendo cometido o

agora o caminho poeta diz

e

Noto

em

I,

é

anuncia que a gente de Luso,

Jiipiter

lenho leve por vias nunca usadas,

a força, a

Cabo por Bartolomeu

e

Reunem-se os deuses em

42).

(I,

mar duvidoso num

não temendo de Africo coberto o

do Oriente entre a costa etiópica

e

de São Lourenço»

armada passou o Cabo

mais se atreve agora.

Des-

Dias, não se navega mais para o sul;

enfim para o oriente, para a índia.

E

o que o

27:

Agora vedes bem, que cometendo,

O

duuidoso mar,

Por

vias

num

lenho leue.

nunca vsadas, nam temendo

De Africo & Noto a força amais satreue: Que auendo tanto ja que as partes vendo, Onde o dia he comprido, & onde breue. Inclinam seu propósito,

A

As

&

perfia

ver os berços, onde nasce o dia.

partes onde o dia é comprido e onde breve são os diferentes

climas caracterizados pela duração diferente que neles teem os dias, referidos a

uma mesma

época do ano.

Durante o século xv foram

os portugueses acrescentando para o sul novos climas. 5.° e 6."

Nos versos

da estância indica o poeta as navegações de norte a sul pelo

Nos

oeste de Africa.

gem do Gama:

ir

dois líltimos versos anuncia o propósito da via-

eníim

em

direcção ao oriente, a ver os berços onde

nasce o dia.

A

definição dos ventos Africo e

Noto pode-se ver na

que reproduzimos da Chronographia de Jerónimo Chaves. é designado (fl.

na figura por

LYBS,

e

a

figura junta,

O Africo

seu respeito lê-se no texto

65):

«Aphrico es vn viento q nasce dei Occidéte brumal, como escriue Los Griegos lo llamarõ Lybs: los Leuãtiscos lo llaman Po-

Plinio.

niente lebecho: los dei lo

llaman Garbino.

uamente húmido.

mar Oceano

lo

llamã Huestsuduest, algunos

templadamente, y excessiEs de naturaleza Es viento pluuioso y tempestuoso, y suele muchas frio

vezes causar tempestades, truenos y relâmpagos».

Cap. VII

A

«

lo3

respeito do Noto, que na figura é designado por

Chaves

lo

— O^odíaco

(fl.

AVSTER,

diz

64):

Austro es vn vieto q corre dei angulo dei médio dia Nothis, q quiere dezir humor por

Uamarõ Notho, de

humidades que causa, segun escriue Aulogelio. llaman médio jorno.

Los

dei

mar Oceano

lo

:

los

Griegos

las pluuias

Los Leuantiscos

y lo

llaman Sur, y algunos

llamar Vedaual, es vn viento de naturaleza caliente y húmido, suele ser fulminoso, engedra nublados, causa pluuias, condesa lo suelen

el

ayre, saluo en Africa que causa serênidad.

tilencial,

Na

como

escriue sant Isidro».

volta da costa oriental africana já o Injuriado

Em

Noto da

Noto favorece

a

viagem:

porfia

que eo mar (parece) tanto estaua

Os assopros

esforça iradamente

Com que rios fez uencer a gram

corrente (V, 67).

— Aos

sete planetas dos an-

correspondiam os sete dias da semana.

Entendia-se que os

10.

tigos

Suele ser viento pes-

influição de signos e de estrelas.

qA asirouomia dos Lusíadas

104

planetas tinham «suas horas dominantes sobre os corpos inferiores».

O

tempo desde o nascer até ao pôr do sol, era dividido em 12 horas, assim como a noite. Em cada uma destas sucessivas 24 horas, chamadas horas planetárias ou desiguais, dia artificial

intervalo de

^,

iam exercendo sua à

Lua, como

mesmo

ao

num

influência os planetas pela sua

ordem, de Saturno

turno de sete sentinelas, pertencendo de novo a vez

planeta de 7

em

Assim dominando o

7 horas.

sol

na

pri-

meira hora do dia ao domingo, vinha a pertencer a hora prima do

Lua na

dia à

segunda-feira

e

2,

Marte, Mercúrio, Júpiter, Vénus

a

Saturno respectivamente na terça, quarta, quinta, sexta-feira

como

é,

e italianos

dos dias da semana.

Na

e

sá-

nomes espanhóis, franceses

se sabe, a razão dos

bado. Esta

e

astrologia judiciária era funda-

mental saber-se qual o planeta dominante na hora do nascimento das

bem como

pessoas,

Os

o signo que então subia no horizonte (horóscopo).

planetas influíam

como Marte sobre

os

também sobre classes especiais de indivíduos, homens de guerra e ladrões salteadores de ca-

minho.

Os

sete climas

sete planetas,

eram igualmente

atribuídos pela sua

No

desde Saturno à Lua.

ordem aos

Reportório dos tempos de

— «Dos

Valentim Fernandes, no capítulo intitulado

pranetas

&

que

quer dizer praneta», lê-se:

«... Estes pranetas sete dias

Na

&

da somana:

ou partidas do

lineas

como acima dissemos

descrição de cada céu e planeta

i

Vid. nota de pág. 157.

2

Pertencendo ao Sol, planeta da

2."

3.^

em

a terceira

;

— Saturno,

depois Júpiter, colocado na

situado na

6.^ esfera,

tinha a

6.**

A

23.^

hora pertencia a Vénus, a

24.* a

23.^

hora era de Saturno, a

24.»

de Júpiter,

e

guintes Júpiter, 3

Vénus

e

influía

8.»

hora,

como

e

como

hora;

5.» 5.^

esfera,

depois na

i5.« e

portanto a hora prima as horas 8.% i5.« e 22.».

portanto na primeira hora do dia

Do mesmo modo na

pri-

Mercúrio, e na primeira hora dos dias se-

Saturno, respectivamente.

Gompare-se com o conhecido

título

:

Verdadeira historia do Infante D. Pedro

de Portuga] o qual andou as «sete partidas do mundo», fistevão.

Seguia-se o

que dominava na

Mercúrio

de terça-feira (martes, mardi, martedi) dominava Marte.

meira hora do dia de quarta-feira

citado o

hora para Mercúrio, colocado

hora; Marte, planeta da

de segunda-feira (lunes, lundi, lunedi) à Lua, assim

A

vem

próximo da Terra.

7.^ esfera,

hora; e o Sol voltava a dominar de novo na

7.^

na 22.^

particular

primeira hora do dia, era a se-

4.» esfera, a

esfera

esfera; e a quarta para a Lua, planeta mais

planeta mais afastado

a

proporcionados aos sete climas q som sete

mundo ^ pouoradas».

gunda para Vénus, situada na na

foro correspõdetes aos

feita

por

Gomes

de Santo

Cap. VII

com

respectivo clima

«Do ceo

&

terceyro:

— O lodiaco

«E he senhor do quinto clima onde

Alem dum domínio

No

Assim

as suas cidades principais.

do quinto praneta que he vénus»,

romã: napoles: narbona: toledo:

influência

io5

esta

a respeito

lê-se:

Trapezõda: Cõstãtinopoli:

ík lixbõa».

geral sobre cada clima, tinham os planetas

sobre certos países, províncias

cidades

e

em

particular.

Reportório dos tempos de André do Avelar, edição de i585, en-

contra-se ainda

uma «Taboa

Planetas tem sua significação»

E

cidades, sobre que os

126, v.).

(fl.

com

natural encontrarem-se nos Liisiadas expressões

astrológica.

quando

Descrevendo a nobre Espanha,

diz o

esta

Gama em

origem 111,

19,

se refere a Castela:

Tem

o Galego cauto,

Castelhano, a

quem

&

o grande

&

Restituidor de Espanha,

Depois, na estância 65 do

&

raro

fez o seu Planeta

com

Bethis, Lião, Granada,

ques

&

das prouincias

mesmo

senhor

delia,

Gastella.

canto, diz de D. Afonso

Ren-

:

Com E

estas sujugada foy Palmella,

a piscosa Cizimbra,

&

juntamente

Sendo ajudado mais de sua Desbarata

No

hum

concílio dos deuses

estrella

exercito potente.

do canto

I

Vénus defende contra Baco os

portugueses (estância 33): Sustentaua contra

elle

Vénus

bella,

AfFeiçoada aa gente Lusitana,

Por quantas qualidades via

Da

antiga

Nos

fortes corações, na

Que mostraram na

A benigna

nella,

tam amada sua Romana, grande

estrella,

terra Tingitana.

estrela dos portugueses foi

também conhecida do Duque

de Alencastro (VI, 47): Era

este Ingres potente,

&

militara

Cos Portugueses ja contra Gastella, Onde as forças magnânimas prouara Dos companheiros, & benigna estrella.

No

século XVI o termo «estrela» incluía

também

os planetas.

poeta não se refere porém a planetas determinados.

Usa uma

O ex-

::

lo6

0/4

asíronomia dos Lusíadas

pressão corrente, nascida na astrologia, no se

emprega ainda

A

mesmo

sentido

em

que

Os

pla-

hoje.

também da

astrologia fez parte integrante

medicina.

netas e signos tinham domínio sobre partes diferentes do corpo hu-

mano.

Era preciso observar

da Lua

a posição

dos outros planetas

e

nos signos do zodíaco para determinar os dias críticos das doenças, saber os tempos idónios para purgar, sangrar, íiuências de signos e de estrelas, de que se

etc.

ocupavam

Às variadas

in-

os «Reportórios

dos tempos», allude o sexto verso de V, 23: Se os amigos Philosophos, que andaram

Tantas

terras,

por ver segredos

As marauilhas que eu

A

delias,

passei,

passaram

tam diuersos ventos dando

as vellas

Que grandes escripturas que deixaram Que influiçam de sinos & de estrellas, Que estranhezas, que grandes qualidades, E tudo sem mentir, puras verdades.

Nesta estância compara o poeta a sciência dos antigos

filósofos

com

os novos conhecimentos provenientes das viagens dos portugue-

ses,

«tudo

Também

sem mentir, puras verdades», confirmadas pela observação. com quem o poeta conviveu em Goa, diz

Garcia da Orta,

nos seus Colóquios dos simples

drogas: «que

e

dia aguora pellos Portuguezes do que se sabia

se sabe

em cem

mais

em hú

annos pellos

Romanos» ^

Na

estância 17 anterior já o poeta expõe o conflicto que se acentua

entre a experiência ingénua e a autoridade dos textos consagrados:

Os casos vi que os rudos marinheiros Que tem por mestra a longa experiência, Contão por certos sempre

&

verdadeiros

Julgando as cousas so polia aparência

E

que os que tem juízos mais inteiros

Que

so por puro engenho

Vem

&

por ciência,

do murdo os segredos escondidos

Julgão por falsos, ou mal entendidos.

Garcia da Orta, que estudara

também

em Salamanca

e

Alcalá de Henares,

diz:

medo

«Fez isso porque avia

não vos maravilheis de di\er cousa

1

Conde de

2

Ibidem.

d'isto

de dizer cousa contra os Gregos, e

porque eu estando

algíía contra

Ficalho, Garcia

Galeno

da Orta

e

em

espanha não ousaria

contra os Gregos»

e o seu

^.

tempo, Lisboa, 1886, pág. 3o3.

Cap,

O

VII— O

'107

lodiaco

poeta insiste porem, na estância imediata, no valor do teste-

munho

dos olhos: Vi claramente

Que

a

visto o

lume

viuo.

maritima gente tem por santo,

Em tempo de tormenta & vento esquiuo De tempestade escura & triste pranto; e

no começo da admirável descrição da tromba marinha:

Eu

vista

No ar hum E do vento

E

(& não presumo

o vi certamente

Que a

me enganauaj vaporsinho

&

leuantarse,

sutil

fumo

trazido, rodearse.

quando por fim exclama: Vejão agora os sábios na escriptura

Que segredos sam

estes de Natura,

O poeta convida positivamente os sábios na escritura, isto

consomem

a vida só

no estudo dos

templação directa da natureza.

é,

os que

livros dos velhos filósofos à con-

Nas

estâncias 16 a 23 do canto

V

sente-se perpassar o vento derruidor das venerandas autoridades con-

sagradas.

Nesta última o poeta põe

em

relevo a importante parte

que os portugueses tiveram, pelas suas viagens, no desenvolvimento e

transformação da sciência.

VIII

o A

I.

altura do polo.

1497 já a armada, de que

em

— Ao cair da

Paulo da

S. Rafael, de 100 toneladas, e

desfeita,

numa

Cabo Verde.

acompanhando

caravela,

a

^^

tonéis,

Bartolomeu Dias seguia a

armada

até às Ilhas de

Pungente saudade devia, nesta hora, amargurar o

ração dos navegantes, que iam executar

um

co-

dos mais heróicos feitos

Desaparecera no horizonte

Soava ainda nos seus ouvidos aquele clamor de

em

nau

nome Bérrio do seu primeiro

na Angra de S. Brás.

que a história regista.

mentações

nau capitaina era

também uma nau de mantimentos, de 200

Seguia

para a Mina

A

Gama comandava

Nicolau Coelho a caravela S. Miguel

de 5o toneladas, mais conhecida pelo

que devia ser

era capitão-mór, se estendia

a famosa viagem.

a S. Gabriel, de 120 toneladas.

possuidor.

tarde de sábado 8 de julho de

Gama

Vasco da

Começava

pleno mar.

astrolábio

a terra

da pátria.

gritos, choros e la-

que irrompera a multidão que enchia a praia de Be-

lém, quando os marinheiros, ao desferir das velas, lançaram o grito

de e

Boa Viagem!

Lembravam-lhes os rostos amargurados dos amigos

parentes que ficavam.

Partiam uns

Tejo?

160.

Quando voltariam?

Quantos tornariam ao

Volvidos dois anos, regressaram apenas

552!

Os

navios seguiram a rota das Ilhas de

Cabo Verde, onde

o ca-

pitão-mór mandara que se reunissem, caso se perdessem uns dos ou-

No

tros.

*

sábado imediato avistavam as Canárias,

«... os

navios que se chamavão

quando ElRey

Dom

Roteií^o

culano

e

i858, tom.

i,

na noite de

Gavriel,

João os armou lhe poz estes nomes».

Gaspar Corrêa, Lisboa, 2

sam Miguel, sam

e

sam

Rafael,

Lendas da

se-

que

índia, por

pág. i5.

da viagem de Vasco da

Gama em

i4g']^ 2.^ edição,

Castelo de Paiva, Lisboa, 18G1, págs. 129 e i32.

correcta por Her-

no

astronomia dos Lusíadas

Qyi

gunda-feira, passando através do Rio do Ouro, e

tormenta, que os navios se dispersaram.

domingo,

23,

e

tamanha

a cerração

em

tangendo trombetas

no Só na

a juntar-se

à vista da Ilha do Sal, faltando a S. Gabriel.

nau capitaina, atirando muitas

quarta-feira seguinte reencontraram a

bombardas

foi

Tornaram

sinal de alegria.

Ao

outro dia

chegavam à Ilha de Santiago, onde pousaram na praia de Santa Maria. se demoraram uma semana, concertando as vergas dos danos cau-

Ai

sados na passada tormenta

fazendo aguada:

e

A aquella ilha aportamos, que tomou O nome do guerreiro Sanctiago, Sancto que os Espanhoes tanto ajudou

A

fazerem nos Mouros brauo estrago:

Daqui tanto que Boreas nos ventou

Tornamos

Do

A

a cortar o

salgado Oceano,

terra

imenso lago,

&

Foi na quinta-feira, 3 de agosto e

deixamos

assi

onde o refresco doce achamos (V,

*,

que se fizeram de novo ao mar

vieram rodeando a «larga parte de Africa».

no caminho da derrota para

•largo,

em

a

com

Serra Liôa, engolfou-se

9).

Mina.

Bartolomeu Dias poz-se

Vasco da Gama, na

todas as naus do seu

altura da

comando no mar

direcção ao sul:

Sempre em

No

fim pêra o Austro a aguda proa

grandíssimo golfão nos metemos,

Deixando

Co Gabo

a serra aspérrima a

quem

Lyoa

das Palmas

nome demos.

Navegaram assim durante os meses de agosto, setembro e outubro, com muitas tormentas e cerrações, até que Vasco da Gama julgou ser tempo de ir demandar a terra. Na manhã de sábado 4 de novembro, pelas 9 horas, ouviu-se o gageiro bradar, do cesto da gávia: Terra!

Houve grande alvoroço de alegria. Vestiram-se todos de com muitas bombardas, desfraldando

Terra!

festa e salvaram ao capitão-mór

bandeiras

e estandartes.

Quando puderam a altura

do

sol,

sair

em

terra,

levaram os astrolábios para tomar

operação que se não podia fazer

bem

a bordo, pois

menor que fosse o balanço do navio, se cometiam erros de 4e5gráus^. Iam de^,erminar a latitude ou /ac/e^a do lugar. Camões, que, por

í

Roteiro da viagem de Vasco da

2

J.

Gama em

i4g'j, págs. 2 e 3.

Bensaúde, L'astronomie naiilique au Portugal à répoque des grandes dé-

c divertes^

Berne, 1912, pág.

112.

;

Cap,

VIII— O

astrolábio

iir

Gama

nas estâncias 25 a 27 do canto V, descreve-nos Vasco da

pado com os

da Angra de Santa Helena.

latitude

de Boa Esperança, situado

A

dum

latitude

mostra a figura

ZN^

vertical



bem

grau apenas mais ao

O

ÈZ

arco

com

linha zenite-nadir,

perto do

da

Cabo

sul.

como

se sabe e

do meridiano mede o ângulo da o equador EE'^ isto

é,

a latitude

o ângulo da linha dos poios

o horizonte //'//, isto

é,

a altura

do

Estes dois arcos são iguais, pois que

polo.

qualquer deles, somado

O

faz 90".

EZP

arco

nha dos poios PP' EE'', o arco

ZN'

um

Estavam

lugar é igual à altura do polo,

junta.

PH mede

o arco

PP' com

ocu-

pilotos nas observações necessárias para o cálculo

é

titude

com é

o arco

de 90°, porque a H-

perpendicular ao equador

ZPH é

de 90°, porque a vertical

é pois igual à altura

Uma

polo

PH.

uma

latitude austral pela

As

A la-

H'H.

ou elevação do

latitude boreal é

do lugar, se diz

titude

per-

é

perpendicular ao horizonte

EZ

ZP,

medida pela

do polo antártico.

também

altura do polo ártico;

Por

isso,

em

vez de

la-

altura do lugar.

menor que a altura do polo ficam sempre acima do horizonte no seu movimento diurno. Podem observar-se quer na sua culminação, quer na passagem inferior pelo meridiano, onde atingem a menor altura. Estas estrelas, chamadas cirestrelas cuja distância polar é

ciimpolares, ficam compreendidas

polo

um número

num

círculo cujos pontos distam

de graus igual ao da latitude do lugar.

círculo vai pois deminuindo,

quando

se

O

do

raio deste

avança para o equador.

Os navegadores portugueses começaram por se guiar pela constechamavam a Bu:{ina ^ Por ela sabiam

lação da Uy^sa menor, a que

determinar a altura do polo; por ela contavam as horas da noite.

Aplicavam para

isso

um

conjunto de regras,

chamado Regimento da

Estrela do Norte.

Quando em 1456 Cabo Verde, o polo passagem

1

menor

A e

as descobertas se

estenderam até às Ilhas de

era já tão baixo que a boca da Buzina, na sua

inferior pelo meridiano, vinha passar à flor das águas.

figura da

mais

Bw^ina era formada por oito

uma

estrelas: as sete principais da

estrela de 4.^ grandeza (a 5 de Flamsteed)

gando, do lado da Guarda dianteira, a linha das duas Guardas estrela

(Lisboa, 1590, las.

menor desenhavam

Ursa

se vê prolon-

(T e P)

desta cons-

boca da Bupna.

Por na roda dos rumos da meia noite do Reportório dos tempos de André do Avelar

telação. i;so

A

que

A

fl.

T,

a p e a 5 da Ursa

88, r.) se

a

vê a Ursa menor, ou Biipna^ constituída por oito estre-

qA astronomia dos Lusíadas

JI2

Ursa menor começava a banhar-se no oceano; deixava pois de ser A^iu-se então

circumpolar.

Os

de estudar o céu austral.

a necessidade

como

nossos navegadores distinguiram depois o Cruzeiro

conste-

lação independente, determinando a altura do polo austral pelo Regi-

mento do Cruzeiro do Sul.

A Junta

dos Matemáticos, incumbida por D. João

do estudo dos

II

problemas náuticos, ocupou-se da determinação das latitudes no hemisfério sul, assunto

se ultrapassara

modo

que se tornou urgente resolver desde que

de calcular a latitude

^Gama

em

O

altura meridiana do Sol. stituiu

Os

o equador.

em

1471

nossos cosmógrafos formularam o

qualquer lugar da Terra por meio da

conjunto de regras a que chegaram con-

o Regimento da altura do polo ao meio dia, que Vasco da aplicou na

Angra de Santa Helena.



2. Regimento da Estrela do Norte. A Terra, durante o seu movimento de translação à volta do Sol, executa em torno do eixo

366 rotações

e

porem sempre

um

quarto aproximadamente.

paralelo a

uma mesma

A figura que se

às

movimento de precessão do polo norte, executa num período de 26000 anos, a que se chama ano plaNela estão marcadas as posições do polo desde o ano de Soco, junta representa o

antes, até ao de 16000, depois de Cristo.

os anos anteriores e Cristo.

que

nome de Polar

do circulo descrito pelo polo.

estrelas situadas ao longo

tónico.

virtude deste movimento,

equinócios, o polo vai-se deslocando entre

cabendo, no decorrer dos séculos, o

as estrelas,

mudando em torno duma

cone circular

Em

perpendicular ao plano da eclíptica.

chamado de precessão dos

eixo não se conserva

recta; lentamente vai

um

de direcção no espaço, descrevendo

O

Os

é o polo

nação da

com

o sinal

+

Indicam-se

com

o sinal



os posteriores ao nascimento de

pontos do círculo percorrido pelo polo distam do centro,

da eclíptica

*,

23"

Yá,

número de graus

igual ao da incli-

eclíptica sobre o equador.

Se considerarmos as posições do polo a partir do ano de 3ooo

a.

C.

(— 3ooo), vemos que êle se vai afastando da Ursa maior e aproxichamadas as mando da Ursa menor pelo lado das estrelas p e Guardas desta constelação. As estrelas mais brilhantes da Ursa -f,

1

Como

se sabe,

chamam-se poios de qualquer

midades do diâmetro perpendicular

a este círculo.

círculo

duma

Os poios da

extremos do diâmetro da esfera celeste perpendicular ao plano da nite e o nadir são os poios

do horizonte.

mais designação, entende-se que se trata

ou o polo

sul.

Quando

dum

se diz

esfera as extreeclíptica são os eclíptica,

O zé-

simplesmente polo, sem

dos poios do equador, o polo norte

Cap. VIII

menor são de 4.^

e

a a e a

de

|3,

À

grandeza.

5.*

— O astrolábio

grandeza, e a

2.*

estrela

[3,

ii3 de

7,

as outras são

3.*;

a mais brilhante

das Guardas

da Ursa menor, chamaram os nossos marinheiros Guarda dianteira, porque é a que vai adiante no movimento diurno e primeiro chega ao

No

meridiano.

da

ano de 1000

a.

G. (— 1000) o polo estava mais perto

do que da a da Ursa menor; a Guarda dianteira

p

foi a

estrela

Hercules

VeqcL

No

polar dos Fenícios.

ano do nascimento de Gristo, o polo distava

da a da Ursa menor, aproximando-se depois sempre mais.

11° 7^

No

daXircc

fim do século xv esta distância estava reduzida a 3° Ya e no fim

do século XVI a menos de ao ano de 2096,

em

3^.

Hoje

é

de i°io'

e irá

deminuindo

que atingirá o valor mínimo de 26 minutos.

Então o polo começará a afastar-se da actual Polar.

No

séculos serão depois sucessivamente Estrelas Polares a P,

do Geféo,

em

seguida a a do Gisne,

vez à Vega da Lira.

até

Uma

e

decurso dos

y,

e

depois a

no ano de 14000 caberá a

importante mudança se vai assim operando

no aspecto do Géu.

No

último quartel do século xv,

maram-se vesse

uma

e

durante parte do século xvi,

to-

Se houYs para distância polar da Estrela do Norte. estrela precisamente no polo, bastava medir-se a sua altura

3*^

acima do horizonte com qualquer instrumento, como o astrolábio, o quadrante ou a balestilha, para se ter a latitude do lugar da obser-

qA astronomia dos Lusíadas

114

Descrevendo porém

vaçáo.

pequeno círculo de

3*^

na altura observada

V2 de raio

uma

em

um

torno do polo, era preciso fazer-se

correcção maior ou menor, aditiva ou sub-

Os

dependente da sua posição.

trativa,

no seu movimento diurno,

a Polar,

nossos pilotos consideravam

na Ursa menor o alinhamento das duas estrelas mais brilhantes, a Polar

a

e

Guarda

dianteira, que era

4

como um

ponteiro, cujo movi-

3

V.

mento seguiam, distinguindo

oito direcções correspondentes às situa-

ções, verticais, horizontais e inclinadas a 40°,

junta mostra estas oito posições da Buzina.

em

pé no polo olhando para nós,

com

da linha

Guardas iam na sua culminação,

Braço de

Em

Lintias. à altura

nais

+

oeste.

a altura

As quatro



,

«[5

Quando

as

que estavam na Cabeça;

estavam no Pé.

designavam-se por Braço de

As

leste e

posições intermédias, a 48^, chamava-se

torno da figura lêem-se os números da correcção a fazer

observada da Polar,

ou

dizia-se

inferior pelo meridiano,

posições horizontais da linha

figura

um homem

os braços estendidos horizon-

talmente, o esquerdo para leste e o direito para oeste.

quando na passagem

A

«p.

Imaginava-se

em

cada

um

dos oito casos,

com

conforme se teem de somar ou subtrair, para

do polo

e

portanto a latitute do lugar.

os

si-

se saber

Cap. VIII

O

— O astrolábio

Regimento da Estrela do Norte que

ii5

Tratado da

está junto ao

spera do mudo tirada de latim em lingoage português, existente na Biblioteca Pública de Évora, é assim redigido:

(íRegimêto da estreita do norte cô os sinaes das guardas pêra

quando quer q tomares a altura da estreita do norte pêra saberes quãto estas aredado da linea equinocial pêra aparte do norte.

quando as guardas estam no braço de

Ité

&

dianteyra cõ a estrela do norte leste esta acima do eyxo

E

([

acima do eyxo

Quando

([

a estrella do norte: norte

linea

leste e hoeste.

a estrela do norte

abayxo do braço do

E

loeste.

a estrella do norte esta

meo.

três grãos e

as guardas

E

hoeste.

meo.

quando as guardas estam na

húa guarda per outra

esta

&

huú grão

guarda

loeste esta a

estam no pee esta a guarda dianteyra com

&

E

sul.

a estrella do norte esta acima do

eyxo três grãos.

E

([

quando

as

guardas esta na linea acima do pee esta húa

guarda per outra: norte

meyo

eyxo

E

([

rumos.

quando

E

&

E

sul.

a estrella

do norte estaa acima do

grão.

forem

as guardas

em

cada huu dos sobreditos quatro

daltura que tomares tyraras os grãos que a estrella esta

E

acima do eyxo.

os outros que ficarem estarás aredado da linea

equinocial pêra a parte do norte.

Em

([

estes outros

quatro rumos a diante escriptos anda a estrella

do norte a bayxo do eyxo. teyra

s.

Quando as guardas estam no braço de leste: com a estrella do norte leste & hoeste. E

&

estaa abayxo do eyxo huu grão

E quando

([

esta a

bayxo do eyxo t[

com

E

quando

a estrella

do eyxo ([

E

três

as

grãos

leste

&

a estrella

do norte

meo.

estam na

as guardas

huua guarda per outra

esta a guarda dian-

linea

acima do braço deleste

& hoeste. E

a estrella

do norte esta

meo.

guardas estam na cabeça: esta a guarda dianteyra

do norte: norte

& sul. E

a estrella

do norte esta abayxo

três grãos.

quando

as guardas

guarda per outra norte

estam na

& sul. E

linea

abayxo da cabeça esta huua

a estrella

do norte estaa abayxo do

eyxo meyo grão. ([

E

quando quer que as guardas

fore

acima escriptos

em

cada hú

daqlles quatro rumos cõ a a altura q tomares da estrella. ajutaras os grãos qadita estrella esta abayxo do eyxo. E todo iuto: tãto estarás

aredado da linea eqnocial pêra aparte do norte».

qA astronomia dos Lusíadas

ii6

A se

Ursa menor era também

saberem

as horas

da

como

utilizada

relógio sideral, para

Considerando nos ângulos compre-

noite.

endidos pelas oito direcções, atrás mencionadas, mais três direcções

teremos ao todo 24 posições equidistantes, ocupadas sucessivamente pela constelação nas 24 horas do dia. O ângulo de duas posições sucessivas mede i5^ (24x15^ = 360°) e é percorrido

intermédias,

C&bec&

Hombro ççfluerwo

ora.90 direi h

numa

hora.

beça quando

Se numa noite sucede estar é

meia-noite, o

mesmo não

noite seguinte, por causa do

A

ecliptica.

à

meia

Hnha

a[j

a

Guarda

sucederá,

movimento anual do

dianteira na Ca-

como

sol

se sabe,

na

para oriente na

vai estando cada vez mais inclinada para oeste

noite, nos dias sucessivos.

Como

o dia solar médio

é

maior

que o dia sideral cerca de 4 minutos, no fim de i5 dias haverá um uma hora (i5x4™ = õo™), e portanto a Guarda

desvio correspondente a dianteira

marcará meia noite no primeiro rumo a seguir à Cabeça E assim de i5 em i5 dias, de modo que no decorrer do

para oeste.

ano

irá

Na estrela

marcando figura junta

a

meia noite nos 24 rumos seguidamente.

resumimos o Regimento das horas da

do norte, que tamisem

se encontra junto

noite pela

ao Tratado da spera

:

Cap.

VIII— O

iiy

astrolábio

do mudo da Biblioteca Pública de Évora

e

que

é explicado

do seguinte

modo (.i

&

Regimento pêra

suas guardas,

mea

s.

se

saber as horas da nojte pella estreita do norte

sabedo

em cada mes

sem errardes quasi nada.

E

quinze dias per todo ãno na

manejra

mea

Janeyro meado,

E em E em

os meses

vam per orde

q rumofa:{e

de quinze

E em

noyte no braço ezquerdo

mea

noyte dous horas acima do braço.

fim de feuereyro: na linea do

ombro ezquerdo.

E em

linea.

fim de março: dous horas acima da linea.

Abril meado,

([

em

seguinte

Março meado, mea noyte huua hora em cima da

([

mea

noyte na cabeça

fim de abril: huíãa hora abaixo da cabeça.

Mayo meado, mea noyte dous horas abaixo da cabeça. E em fim de mayo: na linea do ombro direyto. Junho meado, mea noyte huua hora abaixo da linea. E em fim de junho: dous horas abaixo da linea Julho meado, mea noyte no braço direyto: E em fim de julho: húa hora abaixo do braço.

([

([

([

Agosto meado, dous horas abaixo do braço.

([

E em

fim de agosto na linea.

Setêbro meado,

([

E em

mea

noyte húa hora abaixo da linea.

fim de setembro: dous horas abaixo da linea.

Octubro meado, mea noyte no pee.

([

E em

fim de octubro: huua hora acima do pee.

Nouembro meado, mea noyte dous horas acima do

([

E em E em

se

em

«No

que a Guarda dianteira faz meia-noíte,

facil-

deduz a hora que nesse dia corresponde à sua passagem

em

chamou também Estrela

ho-

qualquer outro rumo. rologial

linea.

fim de dezembro: dous horas acima da linea».

Sabido o rumo

mente

pee.

fim de nouembro: na linea.

Dezembro meado, mea noyte huúa hora acima da

([

1

em

fim de janeyro hua hora acima do braço.

Feuereyro meado,

([

ella

as guardas

nojte. logo contares as horas antes da mea noyte: ou despoys

Por

isso se lhe

*.

capitulo passado

chamamos

anda sempre ao redor da

que hora he».

estrella

à

guarda dianteira

estrella Horologial,

porque

do Norte, como seta de relógio, mostrando

André de Avelar, Reportório dos tempos, Lisboa,

1590,

fl.

87, r.

qA astronomia dos Lusíadas

iiS

Quando

o rei D. Duarte, entre os anos de 1428 e 1437, escreveu o

Leal Conselheiro, também se ocupou desta contagem das horas pela

Ursa menor.

Assim no Capitulo LR, Da taboa

declaraçom das

e

cousas que adiante som scriptas, diz:

«Decima, a maneira de conhecer a

me a

suas guardas aa

ha foy devysado,

como de

feito

e

em

noite e

posto

bem

pode

em

em

sabem

duas rodas, húa da

outra terra, posto que delia

mea

mea

venhom

o os

mes eu ordeney da manhãa, com seu regymento

noite sollamente;

noite, e outra

He

como per

proveitosa e

nom pensom

que seja

speriencia muytas vezes o sentem, e pêra

sabem teem ajuda pêra seerem melhor

Vê-se que os relógios de

também auxiliavam

bem

cousa

prazivel aos mais que a sabem, porque antes

sol,

usados

em

regidos».

Portugal no século xv,

a determinação das horas da noite, pois que nas

em

coberturas tinham desenhada a roda dos rumos

marcando

meia

do ano a Buzina

ia

figura anterior.

D. Duarte porem divisou

a

noite, gráfico

uma

que no decurso

semelhante ao da

outra roda, onde mar-

No

cava os rumos da Guarda dianteira ao amanhecer.

Da

ella

tempo

nom penso que

tantos que

pêra se de todo aver boo conhecimento.

os que a

per

que trazem as figuras nas cuberturas, per que se

saber o tempo da

de tanto prazer

e

mym gram

de coor poder saber,

scristo pêra se

estes reynos o

assy geeralmente saibam rellogios dagulha

do norte,

estrella

manhãa, segundo per

roda pêra saberem as oras quantas som da manhaã,

Capítulo C,

noite,

ou des-

como se hão de debuxar estas duas rodas concêntricas. No Capitulo Cl, Pêra saber quantas oras som ante ou despois da mea

pois, explica

noite, e

quanto ante manhaã, diz como, depois de observado o lugar

da estrella major das guardas da noite, se sabe pela roda grande quantas horas hão de decorrer até ao amanhecer, pela roda pequena

quantas passam ou faltam para a meia noite

e,

pela comparação das

duas rodas, o intervalo da meia-noile ao amanhecer.

O

próprio rei dá pois o exemplo de se ocupar

blemas astronómicos, tão importantes

num

prazer de pro-

país que seu irmão, o in-

fante D. Henrique, impelia para as navegações.

uma

com

A

Ursa menor era

constelação preciosa; por ela se sabia a altura do lugar e as horas

da noite.

Compreende-se por

quando, avançando para o

isso o

sul,

a

embaraço dos nossos marinheiros

viram mergulhar no mar.

Cada-

mosto, veneziano ao serviço do infante D. Henrique, descobrindo

1455 as Ilhas de Cabo Verde, onde a Guarda dianteira



em

vinha passar

junto do horizonte, reconheceu a necessidade de procurar novo guia

nas constelações do hemisfério austral.

Cap. VII

1— O

lig

astrolábio

os olhos dos mareantes

Nas viagens de circumnavegação da África

seguiam com interesse o abaixamento sucessivo do polo norte, o mergulhar das Ursas, cada vez mais profundo, nas águas do mar e o seu desaparecimento no hemisfério

final

África e e

em

Gamões, que

sul.

fez a volta

da

tantas noites, passadas através do mar, contemplou atento

enlevado o espectáculo do céu estrelado, não deixa de registar nos

Lusíadas este momento da viagem

em

que as duas Ursas descem abaixo

do horizonte, facto pela primeira vez observado de bordo das naus portuguesas: Assi passando aquellas regiões

Por onde duas vezes passa Apolo, Dous inuernos fazendo & dons verões,

Emquanto

corre

dhum

ao outro Polo:

Por calmas, por tormentas e oppressões Que sempre faz no mar o yrado Eolo, Vimos as Vrsas a pesar de Juno Banharemse nas agoas de Neptuno. (V,

Ovídio conta nas Metamorphoses

(liv.

i5).

que Júpiter, enamorado

ii)

de Cahsto, ninfa do séquito de Diana, tomara, para a seduzir, a forma desta deusa.

Assim

gerado Árcade.

foi

Juno, ciosa da honra conjugal,

para que os encantos de Calisto não continuassem a atrair o esposo,

numa ursa. Árcade, andando um dia à caça no com os olhos fixos nele e, não sabendo que era a sua

transformou a ninfa bosque, vê a ursa

própria mãe, prepára-se para lhe desfechar o dardo mortífero.

intervêm a tempo de evitar o matricídio.

Júpiter

Um vento repentino leva-os

através do espaço, atirando-os para o céu, onde ficaram formando duas

constelações vizinhas.

Calislo é a

ao Polo norte Polo de Calisto,

Ursa maior

como na

por isso Camões chama

e

descrição da América,

em

X,

139:

Vedes

Vay

a

grande

terra,

que contina

de Calisto ao seu contrario polo.

Juno porem indignada por vêr a sua ao

mar para

pedir a Tétis, sua

ama

de

rival brilhar leite, e

no céu, desceu

ao velho Oceano que

não permitissem que nas suas águas se banhassem os astros colocados no firmamento em prémio do adultério com que fora ofendida: At uos

si

laesae tangit contemptus alumnae,

Gurgite caeruleo septem prohíbete triones,

Sideraque Pellite,

in caelo, stupri

mercede, recepta,

ne puro tinguatur in aequore pellex ^ [Met,

1

Se a injúria

feita à

vossa

filha

ofendida vos atinge, afastai do azulado pego

os Sete Triões, e expulsai as estrelas recebidas no céu

que a concubina

se

11, 528).

não banhe nas vossas puras águas.

em

paga do adultério, para

qA astronomia dos Lusíadat

ííiO

Septem^trioucs, donde deriva a palavra Septentriáo, era tino das Ursas,

mais especialmente da Ursa maior.

constelação era circumpolar.

Na

Odissea há

Ursa maior como constelação que nunca

com

e

assim sucedia na Grécia

efeito

Hoje porem

homéricos.



nome

Para Ovídio

também

la-

esta

referências à

banha nas águas do mar,

se

na Ásia Menor, nos tempos

e

assim não sucede,

em

virtude do movi-

mento de precessão; na latitude de 40 já a estrela vem tocar no * Junto damos uma tabela com as distâncias polares das horizonte. sete estrelas principais da Ursa maior e das a e p da Ursa menor, '^

vj

As

desde o ano de 2000 antes de Cristo, até ao de 1900 depois. trelas de

es-

cada constelação estão pela ordem das suas actuais distâncias

ao polo.

Distância polar das estrelas

Ursae majorh

Ano

— 2000 — i5oo — 1000 — 5oo

Ursae minoris j

a

B

17«,52

i5°,oi

2i»,68

130,57

130,54

190,45

180,96

220,44

16,78

15,98

21 ,39

i5 ,42

15,93

20 ,23

21 ,64

19,85

7%97 6,86 6,53

C

£

P

T

a

-n

P

16,78

17,58

21 ,75

17 ,70

18,57

21 ,61

24,41

17,20

17,53

19,68

22 ,74

20 ,25

21 ,3

1

23,48

27 ,22

14,5o

7'07

18,92

22 ,08

24,28

22 ,95

24 ,12

25 ,70

3o,o3

II ,76

8,29

-f

5oo

20,83

24, ,69

26 ,23

25 ,72

26,93

28,16

32 ,8o

-]-

1000

23,09

27 ,40

28,5o

28,53

29,72

3o ,8o

35 ,52

9 500 6 ,22

11,81

-1-

1100

23 ,58

27,96

28,98

29,08

30,27

3i ,34

36,o5

5 ,66

12 ,20

-{-

1200

24,07

28

29,47

29 ,64

3o

,81

31,89

36,58

5,10

12 ,60

-f i3oo -f 1400

24,57

29,07

3i ,36

32 ,44

37,11

4,54

i3 ,00

25 ,08

29,62

29 ,97 3o ,47

3o ,19

30,75

3i ,90

32 ,99

37,63

3,98

i3 ,40

-f-

i5oo

25 ,60

3o ,18

30,98

3i ,3o

32,44

33,54

38,i5

3,42

i3,8o

~|-

1600

26 ,12

30,73

3i ,5o

3i ,85

38,67

2,86

14,21

4-1700

26,64

32,o3

32,40

32,97 33,5o

34,09

3i ,29

34,64

39,18

2,3l

14,62

-f 1800

27 ,17

3i ,85

32,56

32,95

34,02

35,19

39,69

I

,76

i5,o3

33,08

33,5o

34

35,75

40

1,23

i5 ,44

-}-

1900

27,71

Assim

,5

1

32 ,41

,19

vê-se que no ano de 1000 antes de Cristo, a

deixava de ser circumpolar

1

,55

Os números desta

4000 vor Chr.

bis

sftir

numa

latitute

Ursa maior só

boreal de 24^; no começo da

tabela são extraídos de P. Neugebauer^

Gegenwartj ^um Gebrauch

Astronomen, Leipzig, 19 12.,

9,94

Sterntafeln von

fiír Historiker^ Philologen

und

Cap. VIII era crista,

de

que vivia Ovídio,

um

com

vj

f, C, £,

iS*^

A

de latitude;

grau,

também

A

outra Guarda.

Ursa menor e

depois que se fizeram ao

e

se nas agoas de

da

estrela

do

Os navegantes sentiam que ambas

Juno

Neptuno.

atravessar o equador todos os astros tinham ocaso e nascimento.

latitude de 4° ao sul, o polo norte estava outros tantos graus abaixo

do horizonte

e

descrevendo

a Polar,

inteiramente e o

mesmo

em

A

torno dele

um

pequeno

Então nenhuma

Continuando a navegar para o

Em

sucessivamente a

^,

p,

e,

C,

sul,

por

26^ de latitude

descrevia todo o seu círculo diurno abaixo do horizonte. visíveis

menor

estrela desta constelação

sua vez desapareciam as estrelas da Ursa maior.

deixavam de ser

cír-

Estrela do Norte desaparecia

sucedia a toda a constelação da Ursa

17^ de latitude austral.

podia vir acima do horizonte.

oc

observar-se



constelação, assim truncada, e o Regimento

culo de 3° Yf, deixava de ser visível.

a

avançaram mais

Nesta posição não podia

inferior.

as Vrsas a pesar de

em

mar

guia precioso começava a faltar-lhes quando viam

Ao

Cabo Verde,

Ilha de Santiago de

Guarda dianteira desaparecia no horizonte com a Ursa menor perdia então estas duas estrelas quando

Banharem

Na

de latitude a a

25*^

tocava no horizonte, perdendo a



norte deixava de ter completa aplicação.

um

em

a

vinham na passagem

rumo da

que

até

P, ^,

quando os navegantes estavam na

em um

o

vinha tocar no horizonte na altura

toda a constelação desaparecia na sua passagem inferior

ela,

pelo meridiano. Y,

-/j

armada de Vasco da Gama saiu do Tejo e sul, a da Ursa maior mergulhava no mar

pois a

grau para o

sucessivamente depois a

e,

121

deixava de o ser a 3o° de latitude



ano de i5oo a estrela

Quando

SS*^.

navegou e

em

No

norte.

— O astrolábio

que



Depois não su-

biam acima do horizonte, quando desembarcaram na Angra de Santa Helena. Na altura de 34'', no Cabo de Boa Esperança, também a y desaparecia.

de latitude,

Restava apenas a contando

esta a elevar-se 4°

v].

mesmo com

No Cabo

o efeito da refracção, não chegava

acima do horizonte.

Africa não se via pois senão

uma

das Agulhas, a 35° graus

estrela

Na

parte mais austral da

da Ursa maior

e isso só

na

primavera, quando a sua culminação tinha lugar de noite, erguendo-se então àquela pequena altura.

Podia pois muito

bem

o poeta dizer

que a constelação da Ursa maior era desconhecida dos moradores derradeiros austrais da África,

como em

VIII, 72:

Crescendo cos sucessos bons primeyros

No peyto

as ousadias,

Pouco

pouco caminhos estrangeyros^

Que

&.

descobriram

hús, succedendo aos outros, proseguiram;

qA astronomia dos Lusíadas

122 De

Aífrica os

moradores derradeyros

Austrais, que nunca as sete flammas viram,

Foram

vistos de nos, atras deyxando Quantos estam os Trópicos queymando.

A e

expressão sete flamas de Gamões corresponde a septem triones

designa as sete estrelas de

O

no céu como sete clarões.

grandeza da Ursa maior, brilhantes

2/'^

poeta refere-se muito precisamente a

não à Ursa menor, cuja invisibilidade

esta esplêndida constelação e

não era característica do extremo já

do continente africano, pois tinha

sul

lugar 7 graus ao norte do trópico de Capricórnio.

Alguns comentadores entendem que pregada

em

Mas

vez de Sete-estrêlo.

da constelação das Plêiades

e só dela.

Sete-estrêlo é o

O

asterismo, que está situado no pescoço do

As

cal.

Plêiades são visíveis

em

de o ser depois de 67° de latitude

Nem

o poeta contava sete flamas

mal não distingue senão

nome popular

poeta não se refere a este

Touro

e é

portanto zodia-

todo o continente africano

xam

numa

seis estrelas,

em-

a expressão sete flamas é

sul,

na zona

e

só dei-

glacial antártica.

constelação onde

apezar do seu

um

olho nor-

nome de

sete-

estrêlo:

Quae septem

como

diz

sex tamen esse solent,

dici,

As

Ovídio nos Fastos.

Plêiades são claramente indicadas

na linda trova popular Sete-estrêlo, vae

E

em

pino

o cajado vae virando;

As ovelhinhas de Deus,

A

O

cajado

volta que vão levando

formado pelas

é

Orionte,

como Camões

nome Os

três reis jnagos.

lhe

três

1.

estrelas

do boldrié do ensifero

chama em VI, 85, que teem também por Quando as Plêiades vão em pino, isto é,

na sua culminação, o Cajado passa pela posição vertical, vai virando. O autor anónimo de tão formosa quadra, que tantas vezes se enlevou na contemplação da volta que vão levando as ovelhinhas de Deus,

bem que guma senão às sabia

o

nome de

Sete-estrêlo se

não aplica a constelação

al-

Plêiades.

Também Camões chama

às

estrelas

luzente

gado no

final

da

Égloga VII: Então Phebo nas águas

se encerrou

Go'os animaes que o mundo allumiavão; E co'o luzente gado appareceo A cândida pastora por o Geo.

1

João de Deus, Prosas, coordenadas por Teófilo Braga^ Lisboa, 1898^ pág.

32.

Cap. VIIí

— O astrolábio

12S

Nos Lusíadas temos uma imagem semelhante em

Em ^5

quanto apaceutar o largo Polo,

&

Esíi-elLis,

o Sol der lume ao Mundo,

Onde quer que eu

como

aqui,

com fama & em memoria.

gloria

viuer,

Viuirão teus louuores

Camões usa

io5:

II,

uma linguagem

é sabido,

análoga à que

Vergílio põe na hôca de Eneias, agradecendo o acolhimento de Dido: In

dum

fretei

current,

fluuii

Lustrabunt conuexa,

dum montibus umbrae dum sidera pascei:

/?o/í/5

Semper honos, nomenque tuum, laudesque manebunt; Quae me cumque uocant terrae '. [Eneida,

A

607-610).

í,

conceção porem das estrelas movendo-se no azul do céu, qual

rebanho pastando ao longo da campina, rias físicas explicativas

passagem, que nos

sr.

se vê

Flammea

causa canamus.

sit

cibus uocat atque inuitat eunteis,

per caelum pascenteis corpora passim (De rerum natura Y,

astros

nadas no

movem-se

solicitados pelas partículas de fogo dissemi-

As

estrelas

dáo cada dia a volta da campina

como ovelhas que vão em busca do pasto

O

3.

astrolábio náutico.

—O

melhor processo para resolver o latitude era o

Junta dos Matemáticos de D. João

pela altura do

Enquanto os

rios

II,

Assim o

instrumento era o astrolábio.

(i.

sempre (em mim)

nome

^

que

aqui e

a tua honra, o teu

ali

sol, e

Mestre João,

o melhor

físico e ci-

é,

o céu) der pasto aos astros, permanecerá e os teus louvores,

quaisquer que sejam

me chamem.

Cantemos agora, qual

podem então

diz

que emanara da

correrem para o mar, enquanto as sombras seguirem as cur-

vaturas dos montes, enquanto o polo

as terras

celeste,

quotidiano.

problema náutico da determinação da

1

2.

5 1 0-526).

que são o alimento de que precisam para brilharem

éter,

eternamente.

na seguinte

sive ipsei serpere possunt,

Quo quoiusque

Os

das teo-

Dr. José Maria Rodrigues:

Moiibus astrorum nunc quae

;

uma

Lucrécio

do movimento diurno, como

indicada pelo

é

em

é

deslisar

seja a causa dos

movimentos dos

onde o sustento de cada

pelo céu os flâmeos corpos.

um

o

chama

e

astros

convida a

;

ir,

ou

eles

pascendo

i24

Zi astronomia dos Lusíadas

rurgião de D. Manuel, que

em

Cabral

Fecha en uera crus

a...

mejor

como

foi

na expedição de Alvares

piloto

i?oo, na carta que escreveu ao rei, de A^era Cruz:

a

primero de maio de 5oo. pêra

mar

la

non por ninguna estrella

es regvrse por el altura dei sol que

mejor con astrolábio que non con quadrante nin con otro ningud trumento. do criado de vosa alteza

e

voso

e

es-

Johannes.

leal servidor.

artium et medicine bachalarius» ^

No Compendio

dei arte de

nauegar dei licenciado Rodrigo Çamoum exemplar na Biblioteca da Uni-

rano, Seuilha, iSqi, de que existe

versidade de Coimbra,

dum

lê-se, a tis.

i3 e 14, o processo de construção

Traduzimos o mais literalmente

astrolábio.

como eram

ficamos sabendo

fabricados os astrolábios de madeira e

de latão, que iam nas naus de Vasco da

«O

seja de

um

da grossura de

metal ou madeira, dedo. se tomará

Gama.

No meio

astrolábio faz-se desta maneira.

donda que

e

dois de

de

modo que

E

BAC

que corte

posta

uma

ponto

C

uma

tábua re-

A, no qual se porá

um

circulo, o

maior que

um

tamanho de

do segundo o dobro do que o segundo dista

em

duas partes eguaes cada

onde o circulo maior

é

um

E pondo

D um

BC, no

BC, com

arco de círculo,

a outra

ajustada a régua

sar pelo centro A.

eguaes: duas.

em

e

outro

e

o compasso assim aberto no ponto B, tra-

cem-se outros dois arcos de círculo que cortem os primeiros e,

E

dos três círculos.

cortado pela linha

ponta traçar-se-ha acima do ponto

G

grão

ajustada a régua sobre o centro A, trace-se a linha

das pontas do compasso, aberto segundo a linha

abaixo de E.

e

uma

dentro deste círculo se traçarão outros

o segundo diste do primeiro o

trigo, e o terceiro diste

do primeiro.

E

de

por todas as partes egual,

um ponto

ponta do compasso, traçando-se com a outra

poder receber a dita tábua.

Assim

possível.

em FG,

tire-se a linha

DE,

Divida-se agora o quadrante

e cada uma destas em cada uma destas 18 em

a qual

DB

em

em

F,

há de pastrês partes

cada qual destas 9 em cinco: ficará o dito quadrante partido outras três

e

noventa partes eguaes ou gràos, aos quaes se porão seus números

de cinco

desde

B

no ponto

em e

D

cinco entre o segundo círculo e o terceiro,

acabando com 90 no ponto D. Faça-se agora da linha DE, pelo qual se passará um anel ou

resistente, a que se dará

1

começando

uma

laçada por onde caiba

Joaquim Bensaúde, Lastronomie

découvertes, Berne, 1912, pág. 254.

nautiqiie

um

um uma

dedo.

furo fita

Sus-

au Portugal à Vépoqiie des grandes

Cap. VIII

penso o astrolábio, pelo

um

mesmo

— O astrolábio

125

furo se passará

um

fio

delgado

peso que venha pendurar-se abaixo de todo o astrolábio.

estando suspenso a linha

DE,

e

estará

quieto o astrolábio, o

bem

astrolábio, de aquelle lado sobre que cair o

que o

fio

fio

nivelado o instrumento.

caia sobre a dita linha.

Depois

fio,

se dará a

até ao

comprimento

e pelo

Senão, do dorso do se irá

desbastando até

numa régua

da

mesma

recta

Hl no

feita

uma

meio da sua largura,

à qual régua

forma que na figura se vê, gastando-a numa das suas metades

meio da largura, de modo que

também

Se,

cair justamente sobre

matéria, que tenha de largo dedo e meio, se tirará sentido do seu

com

se gastará

fique inteira a linha

Hl,

e

o mesmo

na outra metade até ao meio da sua largura mas

do lado contrário, ficando também inteira nesta parte a linha

HL E

cerca das extremidades se porão duas taboinhas quadradas da largura

da régua pelo meio, levantadas perpendicularmente

e

de meio a meio.

sobre a linha Hl, no centro das quaes se farão dois pequenos orificios,

de

modo que cada um

delles fique

em

egual distancia da sobreface da régua.

no meio feito,

que

do

direitura sobre a linha

Esta régua, por

delia, será fixada sobre o dito astrolábio

um

a

furo feito

noutro furo, nelle

mesmo tamanho do da régua, no centro A, com uma com uma chaveta, como se vê na figura».

se apertará

Hl e

cavilha

qA astronomia dos Lusíadas

120

O

astrolábio usado pelos nossos navegadores era pois

mento simples.

chamavam

duado, a que

um

Constava apenas de duas partes: a roda.

do astrolábio,

e

uma

móvel em torno do centro da roda, que era

nulas,

um

instru-

círculo gra-

alidade de píá medeclina

*.

Suspenso o astrolábio pelo anel ou laçada, o diâmetro correspondente

O número

ao zero da graduação ficava horizontal.

de graus, marcado

pela medeclina, dava a inclinação sobre o horizonte da linha de enfia-

mento dos

dois orifícios das pínulas.

Se o instrumento era de pequenas dimensões, suspendia-se duma

Querendo tomar

das mãos.

com

o instrumento até

declina que se

ambas

íicar

movia

A

as pínulas.

duma

a altura

estrela, erguia-se o

o olho junto do extremo inferior da me-

dos orifícios de

se ver a estrela através

até

braço

medeclina marcava então na graduação a

al-

tura do astro acima do horizonte.

Para tomar

do

a altura

Não

tamente diferente.

sol seguia-se,

se olhava

um método

porém,

para o

Suspenso o instrumento duma das mãos, estendia-se o

medeclina.

braço para a frente, colocando-se o observador de roda no plano vertical do dirigia-se a

sol.

Tendo assim em

medeclina com a outra mão, de

modo

passava através dos

dava a altura do

sol

modo que

à

uma

maneira de cábrea.

figura junta

um

damos



raio de

A leitura do limbo

latão, era

de grandes dimensões,

corda, de três paus juntos pela parte superior

A

observação fazia-se do

a fotografia

dum

mesmo modo.

Na

destes grandes instrumentos.

E

astrolábio náutico de latão, existente no Observatório Astronó-

Tem

mico da Universidade de Coimbra.

um

sombra da

um

nesse momento.

Se o instrumento, de madeira ou suspendia-se, por

a

Então

das pínulas.

orifícios

a orientar a

frente o astrolábio,

pínula mais alta viesse cobrir a pínula de baixo. luz solar

comple-

dos buracos da

sol através

meio metro de diâmetro,

E um

centímetro de espessura e dez quilos de peso.

instrumento

bastante aperfeiçoado, cuja construção deve ser da segunda metade

1

Adoptamos

esta nomenclatura

no Roteiro de Lisboa a Goa, Lisboa, sentar que sobio o sol depois de diito,

com

a

autoridade de D. João de Castro, que

1882, pág. 365, diz: «.

me demorar

á quarta

acharey que não posso ter o Rosto pêra

nem menos

a

Roda do

estarlabeo, pêra que o

a parte

Rayo

.

.

e

quando

se repre-

do sudueste, como



tenho

onde então estiuer o

sol,

entre pellos buracos da mede-

mas forçadamente me ha de ficar o sol no lado direito e nas costas do estarRayo entre pellos buracos da medeclina, o que em todo o outro tempo não acontece, mas de necessidade avemos de ter o Rosto e a circunferência ou Roda do estarlabeo dereitamente ao sol». Pedro Nunes no Tratado da Sphera chama à alidade niediclinio, do latim medicliniwn. Na prática a palavra tomou a

clina,

labeo, pêra que o

forma feminina.

Cap.

do século

As

xvii.

VIII— O

I2y

astrolábio

Era destinado apenas a observações de altura do sol. A pínula, já como as dos primitivos astrolábios. para cima, tem no buraco encastrada uma lente. A

pínulas não são

que devia

ficar

pínula baixa não é furada; há nela dois traços

devia vir formar-se a ele se dirigia a

imagem do

sol,

em

dada pela

cujo cruzamento

lente,

quando para

medeclina.

[ASTROLÁBIO NÁUTICO, existente no Observatório

Astronómico da Universidade de Coimbra,

tendo meio metro de diâmetro,

um

centímetro de espessura

e dez quilos de peso.

A



pesagem do sol. O método, que descrevemos para as observações solares, tem a vantagem de dar a altura do sol ao meio dia verdadeiro, isto é, na sua passagem pelo meridiano, sem emprego 4.

J28

oá astronomia dos Lusíadas

O

de relógio.

observador, tendo o astrolábio suspenso diante de

passagem do

antes da

modo que

no meridiano

sol

sombra da pínula

a

a medeclina

e

si

dirigida de

cubra sempre a pínula baixa, pas-

alta

sando pelos dois orifícios a luz solar, vai vendo a extremidade superior

da medeclina subir constantemente, marcando

um

ângulo sempre

em

maior na graduação; consérva-se depois estacionária, para baixar seguida quando o sol

correspondente à posição

tempo

é a

máxima

em

altura

que a medeclina estaciona durante algum

altura atingida pelo sol e portanto a altura deste

astro na sua culminação, isto

dá pois, por

A

desce do outro lado do meridiano.



é,

O

ao meio dia verdadeiro.

a altura meridiana

si só,

do

sol,

com

astrolábio

a qual se fazia a

conta da latitude.

Este processo, ,tão simples difícil

como engenhoso, parece

compreensão para os nossos

terem a altura do

sido de

ter

que entendiam que, para

ao meio dia, deviam tomar no astrolábio a

sol

quando os seus relógios de

tura do sol

mavam

pilotos,

E

nesta prática.

sol

marcavam meio

al-

dia e tei-

o que diz D. João de Castro, quando conta

no Roteiro de Lisboa a Goa^ (págs. i8i a 184) esta curiosa scena, passada a bordo da nau Grifo, em 2 de junho de i538: «... a oras

de

meo

tomamos

dia

o sol, e estando cada

íicando a sua altura, disse ho Piloto que já decia; logo

com

siderar o crerão todos, e hindosse

em

o sol que a

vere-

sem mães contempo acharão

seus estarlabeos, fiquei eu e o doctor e o Calafate, que sabíamos

o contrairo,

e

oulhando o

sol

que leuauão nos estarlabeos, achei que

o Piloto tomara do sol ao orizonte 48 grãos,

marinheiro 42-,

e

e o

mestre mães

-,

hum

outro 43; eu tinha a este tempo tomado 48-, e o

calafate 42 ^: ora ficando eu ãssi,

bindo o sol até se pôr

em

tal

hum

em

juro que dahi

a híía ora

me

foi so-

altura de 44 grãos, o que sentindo o calafate

seu estarlabeo, começou a dizer que o sol lhe tinha sobido até

mães de 44

grãos, pello que tornando os dous marinheiros a tomar

o sol, acharão daltura 44 grãos; o doctor a este tempo se foi ao mestre e lhe fez tornar a tomar o sol, e achou os mesmos 44 grãos, o que

vendo o

Piloto, o tornou a

tomar outra vez,

grãos folgados: a causa de tamanho erro

do

mar

crereiíi que

lógios lhe fa^em se

erguem

1

e

tomão o

sol

dia, e

com

meo

vem

e

achou os mesmos 44

de os Pilotos

na maior altura, quando os grãos que ao tal

e

homens

os seus

Re-

tempo acham,

vão fazer sua conta, não considerando como os Relógios

Roteiro de Lisboa a

Corvo, Lisboa, 1882.

Goa por

D. João de Castro, anotado por João de Andrade

.

— O astrolábio

Cap. VIII

por onde

regem são

se

em

feitos

diíFerentes Regiões,

serue á leuação do pollo do lugar donde he

nhecidamente

se

mostrou ao meo

i2g

dia;

e

hum muy co-

cada

o que oje

porque, vereficando as oras

por quatro Relógios, achei que dous delles terceiro ii oras -, e o quarto ii oras 0:

feito,

me

alem

fazião

meo

dia,

com

o

como

vezes muito os taes Relógios o variar de suas agulhas, porque,

quer que são ceuadas

e

disto faz mintir muitas

differentes pedras, e os

mesmos

ferrinhos

seião mais aceiros huns que outros, faz que variem ou nordesteem

huns

muy

meo

dia

diflferente

com

dos outros, e daquy

vem mostrarem

o lugar de

tanta falsidade».

Vê-se que, alem de D. João de Castro, discípulo de Pedro Nunes, só o médico e o calafate sabiam que não era necessário relógio para se ter a altura

meridiana do

o piloto, porem, o mestre

sol;

ma-

e os

rinheiros não se convenciam disso, obrigando o honrado D. João de

Castro a jurar que durante

meio grau.

uma

hora lhe fora subindo o

mais

Andrade Corvo, que anotou o Roteiro de Lisboa a Goa,

pensava como

estes, pois

que

numa

nota (pág. 42) diz:

«Para a determinação da altura do

sol

pelo astrolábio e uso das

taboas de declinação, era preciso fazer a observação ao meio dia exacto: e era

podiam

sol

o astrolábio

prever os contratempos que cada dia

fácil

surgir, e tornar difficil

com

senão impossivel a observação; alem

da diíFiculdade de determinar a máxima altura do

sol

sobre o hori-

souXq^ pela dificuldade de ter a hora verdadeira^)

O

contratempo que podia sobrevir era encobrir-se o

A

dia.

sol

ao meio

dificuldade de ter a hora verdadeira não existia, porque esta

não era necessária.

A

este processo de determinar a altura

do

sol

ao meio dia pelo

emprego puro e simples do astrolábio, seguindo, como a fiel de balança, o movimento da medeclina, quando o sol se aproximava do meridiano, até que ela se tornava algum tempo estacionária, indicando

assim a altura máxima, chamaram os nossos marinheiros jpesar o

sol.

— Sabida pelo

as-

5.

Regimento da altura do polo ao meio dia.

trolábio a altura zénite,

tomando

trolábio é 76°

g*)

do

sol

sobre o horizonte, teremos a sua distância ao

a diferença para 90°. ^ distância zenital

do

Assim

se a altura lida

sol será i3°^.

Quando

no

as-

a obser-

vação se faz no dia do equinócio da primavera ou do outono, o

sol

no equador e portanto a distância zenital do sol na sua culminação dá imediatamente a distância do zénite ao equador, isto é, a latitude do lugar. Nos outros dias a passagem meridiana do sol tem lugar está

ao norte ou ao sul do equador, a e é preciso

uma

distância igual à sua declinação,

combinar, por soma ou diferença, a distância zenital do

qA astronomia dos Lusíadas

i3o

dada pelo astrolábio, com a sua declinação nesse

sol,

Neste cálculo é também impor-

nas tábuas, para se obter a latitude.

tante saber se o sol passa ao norte ou ao sul

em

nhece pelo sentido

procurada

dia,

do zénite, o que se co-

que correm as sombras ao meio

O

dia.

pró-

prio astrolábio mostra para que lado vão as sombras, pois que tendo-se

de dirigir a medeclina de

modo que

a pínula baixa, basta reparar para

a

sombra da pínula

que lado

alta

fica esta última.

cubra

Se a

pínula inferior fica para o lado do sul, as sombras correm ao sul, o

passa portanto ao norte do zénite; se

sol

para norte, as som-

fica

bras correm para este lado, e o sol passa no meridiano ao sul do zénite.

Para

conta da altura do polo, acabaram os astrolábios

facilitar a

em

sentido inverso do que atrás

mudou para

a parte superior, na direcção

portugueses por ter a graduação ficou indicado.

do zénite,

O

zero

daí vinha correndo a graduação até

e

A

do diâmetro horizontal.

mente a distância

zenital

do

Por

naiiegar de Rodrigo Çamorano,

Otra manera de ha{er (fl.

num

extremo

do instrumento dava imediata-

leitura sol.

90*^,

isso

já citado,

la ciienta ai sol,

no Compendio dei arte de há

um

como

capítulo intitulado:

la iisan en

Portugal

28).

O

conjunto de regras para o cálculo da latitute constituía o Regi-

mento da altura do polo, que

mente com

se encontrava a

bordo dos navios

junta-

as taboadas da declinação do sol e sua posição nos signos

do zodíaco para cada

dia.

Transcrevemos

este

regimento como se

no Tratado em defensam da carta de marear, que acompanha o Tratado da sphera de Pedro Nunes. Preferimo-lo pela sua forma breve e clara. Juntamos algumas figuras elucidativas dos diferentes



casos. e sul;

H'H é o horizonte; EE' Z o zénite. Á seta indica

presentado pelo símbolo usual

Pn

Ps os poios, norte o sentido das sombras e o sol é reo equador;

ís rel="nofollow">.

e

Pedro Nunes redige da seguinte

forma o

Regimento da altura do polo ao meo dia. «Se o norte:

sol

tem dechnação pêra o norte

&

as

sombras vão pêra o

saberemos pello estrelabio ao meo dia q he na mayor altura:

quantos grãos ha de nos ao sol*: quelle dia:

&

o que

nocial pêra o norte

Isto

é,

&

acrecétaremos a declinação da-

somar será o q estamos apartados da

(EZ = É%\-%Z,

do nosso zénite ao

sol.

fig.

i).

linha equi-

Cap. VIII

Mas

se

ho

sol

— O astrolábio

tem declinação pêra o norte

&

j3i as

sombras vão pêra

& pello

re-

forem iguaes estaremos na equinocial.

E

o sul: saberemos pello estrelabio quanto ha de nos ao sol:

gimento a declinação:

& se

forem desiguaes: tiraremos o menor numero do mayor porq o q ficar isso estaremos apartados da equinocial: & será pêra o norte se se

a declinação era

mayor {E'^J^^Z%,

EZ= h% — Z^,

pêra o sul se a declinação era menor fig.

fig.

2):

&

será

{HB<,Z^, EZ=>^Z — E^J,

3).

A mesma se as

regra nos serue tendo ho sol declinação pêra o sul porq

sombras vão pêra o

declinação: e o q

o sul

Mas se o q cial.

somar

(ÉZ=m-h'^,

se o sol

se

isso

estaremos apartados da equinocial pêra

fig. 4).

tem declinação pêra o

ha de nos ao

E

ajuntaremos o q ha de nos ao sol cõ a

sul

sul: ^^ as

sol for igual a declinação

sombras vão ao norte estaremos na equino-

forem desiguaes tiraremos o menor numero do mayor:

o que ficar: será o que ao

tal

&

tempo estaremos apartados da equino-

& será pêra o sul se a declinação for mayor (£'€?> Z€^, EZ = — E% Z%, fig. 5): & será pêra o norte se a declinação for menor cial:

{m<M, Éz=mz-m, E

fig. 6).

quando não ouuer declinação: ho que ouuer de nos ao

sol isso

:

l32

qA astronomia dos Lusíadas

estaremos apartados da equinocial:

&^

será pêra onde forem as som-

bras.

E em o que

todo tepo que o sol pello estrelabio esteuer

&

equinocial

O

mesmo

teuer de declinação: isso

elle

pêra a

mesma

noueta grãos

parte».

mais antigo que

livro

em

estaremos apartados da

conhece contendo as regras para o

se

cálculo da latitude pela altura meridiana do sol, devidas à Junta dos

Matemáticos de D. João

do Regimento dó estrotabio

&

& do

Consta

quadrante pêra saber ha declinaçam

em cada hnum dia & as/ pêra saber ha estreita do seguido do Tractado da Spera do mundo tjrada de latim em

ho logar do

norte,

soll

que

linguoagejn,

é

a

Sphera de Sacrobosco. sr.

na Biblioteca de Munich.

existe

II,

Joaquim Bensaúde,

primeira tradução portuguesa conhecida da

Este livro

é objecto

do notável trabalho do

naiitiqiie

an Portugal à Vépoque

uma

nova sobre os estudos

U astronomie

des grandes découvertes, que lança

astronómicos feitos

em

luz

Portugal para acompanhar o desenvolvimento

uma

das navegações de descoberta, dando-lhes

No Regimento

direcção scientífica.

de Munich as regras correspondentes aos diferentes

casos de posição do sol e do sentido das sombras, minuciosamente explicadas e aplicadas a exemplos, são seguidas

dum

calendário

com

a posição do sol nos signos e a sua declinação para todos os dias do

Devido à amabilidade do

ano.

sr.

Joaquim Bensaúde, que nos ofere-

ceu umas provas da reprodução/ac-s/;/z//e que a BibHoteca de Munich

documento

está fazendo de tão importante

damos

histórico,

A primeira

reprodução da página relativa ao mês de novembro. luna de números encarnados, contêm os números de

do mês.

A

a encarnado,

reita,

cada

dia.

Na

ordem dos

segunda coluna, impressa a preto, dá o lugar do

signos do zodíaco, apenas

O

em

graus.

dão os graus

e

livro parece ter sido

Biblioteca

PúbHca de Évora

As

junto a

sol

últimas duas colunas à

minutos da declinação do

sol

co-

dias

nos di-

em

impresso pelo ano de 1609. existe

uma

obra semelhante, publi-

Consta também do Tratado da spera

cada posteriormente (iSig?).

do mudo tirada de latim em lingoage português, a que se segue ho

pêra per ella saber ho mareãte em aquém ou datem da linea equinocial, com ho regi-

regimento da declinaçam do qual paj^te

mento da

esta.

s.

estreita

sol

O

do norte.

mente, sem exemplos, por ser de tábuas de declinação para

O



um

regimento

é

exposto mais sucinta-

mais conhecido. ciclo de

E acompanhado

quatro anos.

Regimento de Munich tem, na opinião dos peritos, a aparência duma reimpressão. Se a edição anterior não estava já impressa, com certeza existia o original manuscrito quando partiu a expedição de

KX

lion^bío fcmt díôô. ar.íôa.rnr. ní. ^.vt^.

f lilcíltraobytarionpfi anEdctobifpotconfen:

4

H

5ôcôria0pav55,f.joâl) ilionarDocomfelTo:abâ c K3crtolia«obifpoiiiiar

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f

Iripboniíe^coçmbciríTõ

5

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H

iKjartmbo papai inamT»

b

jôiiciobifpoiconfcflb ^obanbifpoiconfelío:, c

D iRufobpomfóproófpr £ud>cno bUpo albancil-t 6 f íimanobifpo:ifãgozfWJj2_ g 3trcIaoaçãocfancftcuâM8 êSancfaffabdvivma'^ FII 01 £ftcuam íomfcflb z,Ro c iColombano abbaoe Dcj - ã t o gccUiavirgemCTiartYrh ^ iCknicníc papa imanar c

n

f

Bê ^eírjfosotipmanrrí

:noiW-í?" aj TpcDtodwcaoíinoi ,, o Xgrtcola ^ vi^alc marn^TT" c 37acoboo:aoo2matt|pre ríã o Saomninbo r^ ^ g^etnSnoíctapoftollc liõ ,

,

Reprodução, nas dimensões do original, da pagina de novembro

do calendário que acompanha o Regimento do estrolabio existente na Biblioteca de Munich.

& do

quadrante^

VIU— o

Cap.

E Vasco

1497.

com

da Gama,

tSB

astrolábio

os pilotos, devia ter consultado

página semelhante á que reproduzimos, quando

em novembro

Angra de Santa Helena. Almanach perpetuinn de Zacuto

uma

fizeram

a conta da latitude da

E

certo que o

ano anterior

em

Leiria e podia

ir

Mas

a bordo.

fora impresso

este

no

Almanach não

dispensava o Regimento, porque não continha o processo de cálculo

E

da altura do polo.

a tábua que se extraíra da obra de

Zacuto para

juntar ao Regimento, embora pouco precisa, porque se aplicava, sem

correcção,

em qualquer

ano, tinha a

vantagem de pôr de lado

cálculos,

que a imperfeição dos astrolábios, então usados, não exigia.

A

chegada à Angra de Santa Helena

João de Barros (Década

Liv.

i,

iv,

Cap.

é

assim contada na Ásia de

11,

edição princeps, Lisboa,

i552):

«E

q tomou ante de chegar ao cabo de bóa Esperança, foy a baya a que óra chama de Sãcta Helena, auêdo cinquo a primeira terra

meses q era partido de Lixbóa: onde sayo em terra por fazer aguada & assy tomar a altura do sol. Porque como do pso do astrolábio pêra aqiielle mister da nauegaçam, auia poço tepo q os mareãtes deste reyno se aproueitauã,

&

os nauios erã pequenos:

nam

cõfiáuã

muyto de a tomar dentro nelles por causa do seu árfár. Principalmente com hu astrolábio de páo de três palmos de diâmetro, o qual armáuã em três páos a maneira de cábrea por melhor segurar a linha solar, & mais verificada & distinctamete poderem saber a verdadeira altura daquelle lugar: posto q leuássem outros de latam

nos, tã rusticamente

nauegar. PSO delle

E porque

começou

em

este

em a nauegáçã

tractamos desta matéria

em

é

se

achou o primeiro

nossa geographia largamente

os primeiros liuros delia:):

tranho deste lugar, dizermos quando

nam

que tanto fructo tem dado ao

esta arte

rejno de Portugal

(peró que

em

mais peque-

&

per

quem

nam

será es-

foy achado, pois

de menos louuor este seu trabalho que o doutros nóuos jnuen-

tóres que

acharam cousas proueitósas pêra vso dos hómees».

Esta passagem inspirou evidentemente as estâncias 24 a 26 do canto V:

Mas



o Planeta que no ceo primeiro

Habita, cinco vezes apressada,

Agora meyo

rosto, agora inteiro

em

quãto o mar cortaua a armada, Quando da Etérea gauea hum marinheiro Prompto coa vista, terra, terra, brada Saha no bordo aluoroçada a gente Mostrara,

Cos olhos no Orizonte do Oriente.

t34

qA asfronomia dos Lusíadas

A A

maneira de nuues se começam descubrir os montes que enxergamos,

As ancoras pesadas se adereçam, As vellas ja chegados amainamos: E pêra que mais certas se conheçam As partes tão remotas onde estamos, Pello nouo instrumento do Astrolábio Inuençam de

sutil juizo

&

sábio.

Desembarcamos logo na espaçosa Parte, por onde a gente se espalhou,

De ver cousas estranhas desejosa Da terra que outro pouo nam pisou: Porem eu cos pilotos na arenosa

em que parte estou, Me detenho, em tomar do sol a altura E compassar a vniuersal pintura. Praya, por vermos

Como

vimos no capítulo

anterior, o poeta é,

mais rigoroso do que o historiador. 8 de julho

A

armada

na primeira estância, partira de Lisboa

fora na véspera quarto crescente.

e

A

em

lua passava de

Quando chegaram em 4 de novembro

meio rosto para rosto inteiro.

à vista da terra do continente africano, a lua ia pela quinta vez na

transição destas

mesmas

fases,

tendo sido quarto crescente dois dias

Camões exprime-se com admirável

antes.

exactidão, registando

um

facto astronómico verdadeiro.

Segundo

da Gama em

de Vasco

na volta do mar, a sondar

dia na baía a que

saímos

bem

junto

com

terra

na terça-feira 7 de novembro que, vindo as Pêro de Alemquer foi mandado pelo capitão-

no batel à procura de

bom

pouso, ancorando ao outro

puzeram o nome de Santa Helena.

forma depois (pág.

«Ao

i4g'j,

no dia 4 viraram

e foi só

naus na volta da terra,

mór

da viagem

a transcrição que então fizemos áo Roteiro

O

Roteiro

in-

5):

outro dia depois de termos pousado, que foy á quinta-feira,

em

terra

com

o capitam

moor

».

Camões, não podendo, sem prejuízo daquela concisa beleza que se admira no seu imortal poema, descer à monótona pormenorização

dum

roteiro,

novembro, barcou

e

quinta-feira,

com

Tomemos porém nós o dia 9 de como aquele em que o capitão-mór desem-

não distingue

dias.

os pilotos tratou de conhecer ao certo, pello

nouo instrumento do Astrolábio,

aas partes tão remotas» onde estavam.

Cap. VIII—

bem

Para

O

i35

astrolábio

interpretarmos este verso, aproximemo-lo das frases,

que deixamos sublinhadas, de João de Barros. instrumento fora invento recente, é

Este não diz que o

O que

em Portugal.

feito

afirma

êle

que havia pouco tempo que os mareantes deste reino se aproveita-

vam do

uso do astrolábio par^a aquelle mister

achar a altura meridiana do acrescenta que

em

sol

da navegação, que era

para a conta da latitude.

Adiante

de Portugal se achou o primeiro uso

este reino

Assim também se deve entender que, para o emprego que dele faziam os mareantes, para saberem a posição do lugar. O astrolábio náutico português era apenas a simplificação dum instrumento antiquíssimo, como

delle

na navegação.

poeta, o instrumento era novo, no

adiante diremos.

Os

nossos argonautas levaram consigo os astrolábios para terra.

Firmaram na

praia três paus ao alto, que ligaram pela parte supe-

maneira de cábrea, para deles suspenderem o astrolábio grande

rior, à

Próximo do meio-dia,

de madeira, de três palmos de diâmetro.

Gama

Vasco da

com

ocupava do instrumento maior, os pilotos

se

em

o braço estendido para a frente, sustentavam os astrolábios pe-

quenos de

latão, suspensos,

como

Olhando

balança, pelo anel superior.

para a graduação da roda, atentos ao movimento da medeclina, que

com

rigiam

gem do

a

mão

que tinham

modo que um

feixe de luz solar

um

kpesa-

algum tempo por 76 graus, antes de começar a

Acharam uma

sol ao

de

di-

A ponta superior da medeclina foi-lhes subindo na gradua-

sol.

ção, até que estacionou

descer.

livre,

sempre pelos buracos das pínulas, procedia cada

se enfiasse

do

se

volta,

meio

altura

máxima de

complemento da

dia,

As sombras corriam ao Fizeram depois a

76°

altura,

0.

A

distância zenital

era portanto de i3*^^.

para onde ficara voltada a pínula

sul,

inferior.

Abriram o calendário do Regimento

conta.

e

consultaram a página de novembro, análoga à que deixámos reproduzida.

O

lugar do sol era

uma

em

26*^

do signo de Scorpius, a que cor-

responde,

como

nação

pois que aquele signo é austral.

sul,

aí se lê,

o sul e indo para lá

também

declinação de

as sombras,

tância zenital meridiana do sol, para

caso

era austral.

i3°^

com

A

19*^21'

ou seja 19°^,

Sendo

decli-

a declinação para

deviam somá-la com a

obterem a

latitude

dis-

que neste

soma, segundo as regras do Regimento, de

Na

lista

o Regimento de Évora encontra-se,

com

19^1 dava 33 graus.

de latitudes que acompanha efeito, entre

as Alturas

do

sul des a linea equinocial de guinee atee ho cabo de boõa esperança,

a

Angra de Estavam

sancta yllena pois

assim calculado

em

um

33*^

com uma

altura de 33°.

de latitude ao sul do equador.

Tinham

elemento indispensável para marcarem a posição

do lugar na universal pintura,

isto

é,

no mapa-mundi.

Um

grau

i36

qA astronomia dos Lusíadas

mais ao

sul

avançava sobre o mar o Cabo de Boa Esperança, que

haviam de dobrar no dia 22

O

trópico de

este niimero

Câncer

e

onde os esperava o gigante Adamastor.

em

ficava

segundo o Regimento, que dava

23°33^,

para declinação máxima do

sol.

perada austral, entre o trópico de Câncer

como o poeta

e

Estavam na zona tem-

o círculo glacial antártico,

na estância 27:

diz

Achamos ter de todo ja passado Do Semicapro pexe a grande meta, Estando entre

elle

Austral, parte do

O

6.

&

o circulo gelado

mundo mais

astrolábio plano dos gregos.

trolábio náutico,

secreta.

— Camões

sabia

bem

que o

as-

usado a bordo das naus portuguesas, não era mais

dum

que a simplificação

outro instrumento, muito mais antigo, do

qual se conservavam línicamente as peças destinadas à medição de

Bastava-lhe ler o parágrafo do Cap.

alturas dos astros.

de Sacrobosco, obra muito sua conhecida, intitulado absoluta terrae,

em

que se explica o

modo

da Sphaera

i

De

qnantitate

de avaliar as dimensões

da Terra: «Totus aute terre ambitus auctoritate Ambrosii: Macrobij: Theo-

&

dosii

Euristenis philosophorú.

Vnicuique quide

m.

stadia cÕtinere

ccclx. graduíã zodiaci septingenta

Sumpto enim astrolábio

dia.

cclii.

í

deputado terre

noctis claritate

stellate

diffinitur.

sta-

per Ptruque in qua

medidinii forame polo perspecto: notetur graduú multitudo steterit

mediclinium supra orizonte. deinde procedat cosmimetra

recte cõtra septetrione a meridie donec vt prius polo steterit altius

í

di-

alterius noctis claritate viso

vno gradu medicliniú. post hoc mensus

huius itineris spaciiã et íuenietur. ccccccc. stadioríí.

sit

Datis igitur vni-

cuique ccclx. gradú tot stadiis terreni orbis ãbitus. cchi. m. stadioru inuentus erit»

*

^.

No Tratado da Sphera

de Pedro Nunes lê-se a seguinte tradução deste tre-

cho: "Ho cerco de toda a terra segundo dizem os filósofos Ambrósio. Theodosio.

& Eratóstenes he de dozentos & cinquoenta & dous mil estádios dando & sesenta partes do zodíaco setecentos estádios. E ho modo que se tem pêra se isto alcançar he este. Tomaremos ho estrelabio & em noyte crara & estrellada: oulharemos ho polo per ambos os buracos do mediclinio: que he a regra que joga no centro: & notaremos a quantos grãos esta o mediclinio:

Macrobio a cada

:

:

:

hua das trezetas

:

depoys disso yremos dereitos ao norte: ate que outra noite nos amostre ho mediclinio estar

ho polo mais

alto

hum

zentos

&

sesenta grãos

:

Se medirmos este espaço de caminho:

grão.

acharemos que sam setecentos estadioe:

& dando

acharemos quanto

seja

outro tanto a cada

ho cerco de toda a

hum

terra».

dos tre-

Cap.

VIU— O

i3j

astrolábio

Transcrevemos da edição de i5i5, comentada por Pedro Ciruello {Johannis de sacro busto sphere textiim vna ciim additionibiis Petri C/'n/^///, Parisius, i5i5,

um

Trata-se de medir

fl.

no Cap.

32, r.), a que já nos referimos

v.

arco do meridiano, compreendido entre dois

num

lugares, cujas latitudes difiram

Vê-se aqui indicado o

grau.

modo

de determinar a altura do polo, dirigindo para a Polar a medeclina

do astrolábio, até se enfiar esta estrela pelos dois e

das pínulas

orifícios

Temos

fazendo a leitura da graduação nesta posição.

pois as peças

constitutivas do nosso astrolábio náutico claramente indicadas

no

as-

embora impressa escrita na primeira me-

trolábio a que se refere a obra de Sacrobosco, que,

pela primeira vez

tade do século

em

*

Ferrara

em

1472, fora

XIII, compilada de fontes árabes.

Aos árabes

deveu o conhecimento na Europa ocidental deste

se

astrolábio, que era

um

instrumento bastante complexo.

Foi

mesmo

opinião corrente que eles o tinham inventado, a ponto de se lhe cha-

mar

«astrolábio dos árabes».

ceberam dos gregos

Está porem hoje demonstrado que

este instrumento,

do astrolábio esférico

se distinguir

em

siríaco

Do

siba, bispo de Qenserin.

clue

M. Nau {Le

VW

síècle

e

francesa

no século

re-

asU^olábio plano, para,

M.

do armilar.

com tradução

cou, pela primeira vez, astrolábio, escrito

chamado

um

Nau

F.

publi-

tratado sobre o

por Severo Sabokt de Ni-

vii,

estudo deste importante documento con-

traité siir Vastrolabe plan de Sévère Sabokt, écrit

M.

d'après des soiirces grecqiies, par

au

F. Nau, Paris, 1899)

que o astrolábio plano, que se supunha posterior a Ptolomeu (século d.

de C.),

foi

inventado por Eudóxio de Gnido (409-366

por Apolónio de Perga (séculos

foram apenas os transmissores aprendido

Para

com

iii~ii

dum

a obra de

M. Nau.

duas pínulas furadas sobre a graduação.

e

as

reproduzimos as figuras que

fig.

está representado o as-

I

Aí vemos a medeclina com as

Por baixo da medeclina fig. III

e

dentro da cercadura

mostra isolada.

móvel como a medeclina, mas independente

dela,

fig. II

numa

placa circular

representa separadamente.

fixa,

aranha é

torno do eixo

sobre a qual ela se move,

Cada instrumento

Fica assim rectificada a infôrmâçáo que, â respeito da

demos no cap. 11, M. de La Lande. JO

em

A

Através das largas aberturas desta recortada peça vêem-se

os círculos traçados

1

os árabes

extremidades ponteagudas que deslisam

graduada vê-se a aranha, que a

que a

Assim

instrumento, cujo uso tinham

Na

trolábio completo, do lado do rosto.

central.

de C.) ou

os gregos.

se fazer ideia deste instrumento,

acompanham

de C).

a.

11

a.

pág. 10) e que colhêramos,

i.«

tinha,

em

edição da Sphaera^

sem mais exame, na Astronomie de

dá astronomia dos Lusíadas

l3S geral,

ou de

um

jogo de três a sete destas placas,

latitude», sobrepostos

numa chapa tnãe

circular,

metidos todos,

munida dum rebordo,

do astrolábio, caixa

stituía

e

chamadas

cilíndrica de

a

«discos de clima

bem como

a aranha,

que os árabes chamavam

pequena

altura, cujo

fundo con-

o dorso do astrolábio, vindo o rebordo formar do lado do rosto,

a cercadura graduada,

Fig.

I

que se vê na

- ROSTO DO

superior, o anel de suspensão*

íig. I,

a que se prende, na parte

ASTROLÁBIO PLANO.

Dentre os discos de

latitude, coloca-

va-se por cima o que correspondia à latitude do lugar de observação;

sobre êle girava a aranha

Os

discos de latitude,

e

por cima desta a medecHna.

como o desenhado na

fig. II,

conteem

a pro-

jecção estereográíica dos círculos da esfera celeste, sendo ponto de vista o polo austral e plano de projecção o plano paralelo ao equador,

tangente à esfera no polo norte.

Cada ponto

é

pela recta dele tirada para o polo antártico. centro do disco, emjc.

O

círculo

COO

é

projectado neste plano

O

polo norte está no

projecção do trópico de

Cap, Capricórnio;

EE'W

é a

VIU— O

i3g

astrolábio

projecção do equador e

DD D"

a do trópico

de Câncer; o pequeno círculo central é o orifício onde passa o eixo

do instrumento.

O

cercam o ponto

são as almocântai^as^ ou «paralelos de altura», sec-

:{

zénite é projectado

em

^.

As

circunferências que

A

ções feitas na esfera celeste por planos horizontais equidistantes.

maior de todas

HE WH'

Fig.

começam por

rências

é a

projecção do horizonte.

Estas círcunfe-

n - DISCO DE LATITUDE.

cercar completamente o zénite, depois são inter-

rompidas na parte superior, indo terminar no bordo do disco, onde atingem o trópico de Capricórnio.

A parte

do céu

austral,

desde este

trópico para o sul, não é representada no disco.

As

linhas

que se interceptam no zénite, formando

arcos de círculo,

1

como {E, são

Adoptamos, para designar

forma portuguesa, com

um

feixe

os «círculos verticais», que vão

estas circunferências, a palavra almocântara

a autoridade

do professor

sr.

badar.

como

David Lopes, profundo conhe-

cedor da língua árabe, donde a palavra deriva, que a respeito dela nos diz: particípio passado, na

de

marcar

«É o

forma feminina, do verbo cântara: construir em arco, abo-

em arco. A sílaba mo (ou mu) é o preíixo formativo Deve ler-se almocântara e não almocantarat. Há na forma árabe que soa t no estado construto, mas fora disso é apenas sinal do feminino

Daí (al)cântara, ponte

dos particípios.

um

sinal

em

a: aldeia, alcântara,

deiaí, alcantarat».

como

se vê das respectivas formas portuguesas, e

não

al-

QÁ astronomia dos Lusíadas

140

Um

no horizonte os azimutes.

segundo

a recta vertical

deles é o meridiano, que se projecta

Com

.^ji?.

estas linhas e as almocântaras fica

estereografada a rede de círculos correspondente ao sistema de coor-

denadas dos astros, que teem por círculo máximo fundamental o horizonte e por isso

chamadas coordenadas horizontais:

a altura e o azi-

mute.

Fig. III

As

dem

linhas,

numeradas de

de trópico a trópico,

das quais se

— ARANHA

podem

i

DO ASTROLÁBIO.

a 12, que na

como CD, são

metade

inferior se esten-

as linhas horárias, por

meio

saber as horas chamadas planetárias ou desiguais.

As horas do dia são contadas de a 12, desde como as da noite desde o seu ocaso. A hora i

o nascer ao pôr do sexta é

sol,

marcada sobre

o meridiano.

O

disco

tem em cima

um chanfro

que o

fixa

na caixa do astrolábio,

para não ser arrastado pela aranha, quando esta sobre êle desliza torno áo eixo central que (fig. III)

contêm

nos doze signos

um

mantêm

as peças

do instrumento.

círculo excêntrico, projecção

e estes

em

graus.

se suprimiram.

da

estrela.

A

cada

uma

aranha

do zodíaco, dividido

Nela estão também representadas

as principais estrelas fixas, designadas pelos seus

teiro, cujo

A

em

delas corresponde

nomes, que na figura

um

denticulo ou pon-

ponto extremo marca a posição da projecção estereográfica

Para se

ter a posição dos planetas, procura-se nas

a sua situação no zodíaco no dia da observação.

O

Tábuas

ponto, que no zo-

VIII— O

Cap.

141

astrolábio

díaco da aranha marca o signo e grau achado, é a projecção do pla-

A

neta nesse dia. fixas e

uma representação das Fazendo-a mover em torno do centro,

aranha oferece pois

dos planetas.

imagem do movimento

projecção do polo, temos a

diurno.

estrelas

que

é a

Para

co-

porem os astros na posição que, sobre o horizonte dum lugar, ocupam num determinado instante, é preciso fazer uma observação

locar

E

de altura.

O

Para

dia.

para

a sua

que serve a medeclina.

do

isso toma-se a altura

medeclina para o

anel, dirige-se a

com

isto

pode servir para se saber, por exemplo, a hora do

astrolábio

sombra

sol.

sol,

de

Suspenso o astrolábio pelo

modo que

a pínula alta cubra

Suponhamos

a pínula baixa, e lê-se a graduação.

que se acharam 3o° para altura do

sol

sobre o horizonte nesse instante.

Procura-se nas Tábuas o ponto ocupado no zodíaco pelo sol nesse dia.

E

o ponto correspondente do zodíaco da aranha que tem de colocar-se

em

Faz-se rodar a aranha sobre o disco da latitude do

3o^ de altura.

lugar, até que aquele ponto

dum

3o°,

venha colocar-se sobre a almocântara de

ou outro lado do diâmetro vertical do disco, conforme o sol

estiver a oriente

o horizonte.

Também

sagem superior se eleva

e

astro-

sobre

se

vêem

os pontos do zodíaco que vão na pas-

na inferior pelo meridiano, assim como o ponto que

no oriente

a astrologia.

Então temos no

momento ocupam

ou a ocidente do meridiano.

lábio os astros colocados na posição que nesse

e

o que desce no ocaso, o que era importante para

A hora

é

dada pelo número da linha horária que marca,

na metade inferior do disco, o ponto do zodíaco diametralmente oposto ao ocupado pelo

Durante a

um

sol.

noite,

para pôr a aranha na posição correspondente a

certo instante, fazia-se a observação da altura

Para

fixas nela representadas.

duma

das estrelas

isso servia a medeclina,

cujos orifícios se visava a estrela.

Se

a altura lida era,

através de

por exemplo,

de 20°, fazia-se girar a aranha até que o extremo do ponteiro da trela viesse colocar-se sobre a

díaco ocupado nesse dia pelo

almocântara de

sol,

horária

No Tratado

em

O

HE WH'

ponto do zo-

do horizonte

que ele se achava, dava a hora da

e

cinco problemas astro-

nómicos, dos quais acabamos de resumir os dois primeiros, astrolábio é usado noite.

como

Não há

em

que o

relógio para a determinação da hora do dia

cálculos a fazer; tudo se reduz à leitura dos nú-

meros gravados no instrumento.

bem

(fig. I),

noite.

de Sabokt, publicado por M. Nau, a descrição do

instrumento é seguida da resolução de vinte

ou da

es-

dado pelas Tábuas, estava então na

parte inferior do disco, abaixo do círculo e a linha

20°.

distincto: a medeclina,



no astrolábio duas partes de uso

bem como

a graduação, sobre

que correm

as suas pontas, são destinadas à observação das alturas dos astros; a

142

(l/í

aranha

e

astronomia dos Lusíadas

o disco de latitude funcionam

como máquina de

calcular, in-

dicando a aranha, quando levada à posição conveniente, os números a ler sobre as linhas

A

do

disco.

figura junta representa

Diamètre

:

belo exemplar deste instrumento,

Hauteur suspendu.

12 5 "^/m

:

Epal^seuT

um

7™"/m

Poids.errviron

:

ISO^^ti 1

Kilog.

ASTROLÁBIO ÁRABE DE BRONZE, construído por

feito

século x, existente"na Biblioteca Nacional de Paris.

de bronze no século x, que se conserva na Biblioteca Nacional

de Paris.

É um

para Djafor,

em

Ahamed ben Khalaf no

filho

astrolábio árabe construído por

de Moktafi Billah, nascido

377 C907 a 987 da era

cristã).

em

A medeclina

Ahamed ben Khalef

294 da hégira, falecido está colocada do lado

nsTROLHBio PLnno DO

Rei

AFOMSO X (SÉCULO

de CfiSTELA XIII)

telafa^bdâftrola^

FIQURn DO ROSTO

(faz)

DO HSTROLnBIO

n aranha (red), colorida toda de amarelo, contêm o zodíaco e os ponteiros das estrelas fixas. Htravez das suas aberturas vêem-se, em fundo branco, no disco áa latitude de Toledo (ladeza XL): a projecção estereográfica das almocântaras e circulos verticaes, acima do horizonte; e as linhas horárias, que marcam as horas deseguaes, na parte inferior. O rebordo exterior graduado, a que se prendem as argolas de suspensão, coloridas de amarelo como êle, faz parte da mãe do astrolábio que forma o dorso do instrumento. Na figura não se vê a medeclina, porque esta corre sobre a graduação, do lado do dorso.

Vlll— O

astrolábio

14B

sobre

um

disco de latitude, que

está desviado da posição que deve ocupar.

A

rede dos círculos ver-

Cap.

do rosto sobre a aranha,

ticais e

e esta gira

almocântaras está descaída para a esquerda

em

vez de ocupar

a parte superior, o que resultou de se ter fotografado o instrumento

no estado em que actualmente se encontra. É preciso pois imaginar o diâmetro, que passa no zénite, levado à posição vertical. Ao sr. Joaquim Bensaúde agradecemos a cedência que nos fez do cliché deste desenho que se encontra no seu excelente

au Portugal

X de

L' astronomie nautique

(pág. 87).

No Tomo fonso

livro

II

dos Libros dei saber de astronomia dei rey D. Al-

Castilla,

Madrid, i863, encontram-se os quatro Libros de

Os

dois primeiros, intitulados Libros deli astrolábio

los astrolábios.

redondo, tratam da construção

e

O

uso do astrolábio esférico.

lábio plano é estudado nos dois Libros deli astrolábio llano.

em

meiro destes,

astro-

O pri-

que se ensina a construir o astrolábio, fecha com o

debuxo do instrumento,

visto

do lado do rosto, que reproduzimos

Aí se vê a aranha

página separada.

seu zodíaco excêntrico

e

(red),

colorida a amarelo,

em com

Cerca-a o

os ponteiros das estrelas fixas.

rebordo graduado da caixa (madre) do astrolábio, tendo, na parte superior, os anéis

vêem-se,

em

Na

(ladeia xl).

Através das aberturas da aranha

de suspensão.

fundo branco, as linhas do disco da latitude de Toledo figura

não está representada a medeclina, porque ela

corre do outro lado, sobre o dorso graduado do astrolábio.

com

efeito

Não há

necessidade de colocar a medeclina do lado do rosto, pois

que ela funciona independentemente da aranha.

As observações de

altura dos astros são pois, neste exemplar, feitas no dorso do instru-

mento.

O

Libro

II

contêm cincoenta

e oito capítulos.

Os

cinco primeiros

ocupam-se da nomenclatura das diferentes partes do astrolábio; os cincoenta e três restantes resolvem outros tantos problemas astronó-

O

micos.

Cap. xxx trata da determinação da latitude

altura meridiana

no Cap. XXIX,

do

De

sol.

Um

lugar pela

é resolvido

saber la declinacion de qual grado quisieres dei

^odiaco dei cerco dellyguador, dispensa a

dum

problema subsidiário deste

Tábua de

em

que se mostra como o instrumento

declinações dos planetas, exigindo apenas a das

suas posições nos signos do zodíaco, porque por êle se pode deter-

minar mecanicamente a declinação, isto é, a distância ao círculo do equador (cerco deli jguador), de qualquer ponto do zodíaco. Para isso basta

car-se

mover

a aranha até

no meridiano,

isto é,

que esse ponto do zodíaco vá colo-

no diâmetro vertical do

disco,

acima do

horizonte, e ler o niimero da almocântara que passa pelo ponto nessa

posição.

Leva-se

em

seguida ao meridiano, da

mesma

maneira, o

^ astronomia dos Lusíadas

144 ponto de Aries

números

dois

o

e lê-se

em

clinação do sol

diferença dos

declinação procurada do ponto do zodíaco.

é a

O

serve o disco de qualquer latitude.

isto

A

número da almocântara.

Para

astrolábio dá pois a de-

quakjuer momento, desde que se saiba a sua po-

sição no zodíaco.

Vejamos agora como, no século xiii, Afonso X de Castela o problema da latitude pela altura do sol ao meio dia:

resolvia



XXX

Gapitolo

«De saber

la

ladeza de qual uilla quisieres. et es la sua longura de

la linna equinoctial.

sobre

mas

alto

non fuer en

la altura dei sol

mingua

libra,

que fincare será

et lo

toma

que puede seer en aquel

cabeça de aries ó de

Et

dia.

que

la altura

si

en

el

fuer

fallaste

médio

dia.

en

el sol

la

de nouaenta.

Et

ladeza de la uilla que quisiste.

la

una destas dos cabeças de

la

polo septentrional

el

uilla.

«Si esto quisieres saber, et es e

quanto se alza

et es otrossí

en essa

la tierra

si el

sol

aries ó de libra, sepas la

declinacion dei grado dei sol assí cuemo te mostramos.

Et

si

fuer la

declinacion dei grado dei sol á parte de septentrion. minguala de la altura de

médio altura

médio

dia.

mingualo

beça de aries et lo

et

annadiendo sobrella. será

delia, ó

la

fuer la declinacion aparte de

si

sobredicha. et lo que fuer de la

la altura

de libra en essa

que fincare será

Ao

Et

dia que fallaste.

annádela sobre

de

la ca-

ladeza de la uilla que quisiste saber».

enunciado do problema junta-se, no

nição de latitude (ladeia)

do polo septentrional.

la altura

Et desende minguala de .XC*

uilla.

duma

título

vila e diz-se

do capítulo, a

que ela

Exclue-se pois o hemisfério

tantes não havia notícia.

Manda-se tomar a

defi-

é igual à altura

sul,

de cujos habi-

meio

altura do sol ao

máxima do sol nesse dia, inditomar, sem necessidade de relógio.

dia e acrescenta-se que ela é a altura

cando-se assim a maneira de a

Quando

se diz que,

não estando o

a declinação do grau do sol assi

ao Cap. XXIX,

nação do

dum

em

cuemo

te

mostramos, faz-se referência

que se ensinou a determinar, pela aranha, a

ponto do zodíaco.

sol faz-se

nos pontos equinociais, se saiba

sol

no dorso do

Assim

astrolábio,

decli-

a observação da altura meridiana

onde corre a medeclina; a

decli-

nação determina-se no rosto do instrumento com a aranha deslizando sobre

um

disco de latitude qualquer.

diferença, da altura solar

com

A

combinação, por soma ou

a decUnação, que depois se

parte do nosso conhecido Regimento

Se há diferença na forma, o cálculo

lê,

é

da altura do polo ao meio é essencialmente o mesmo.

uma dia.

O

.

Cap. VIII

problema

é

— O astrolábio

aqui restrito ao hemisfério norte

ainda nelle se excluem

Neste Regimento de Afonso X, conto

os pontos ao sul do trópico.

podemos chamar-lhe, não

se tala de

rerem sempre ao



norte.

e

i^5

sombras, que se subentende

:corr

do

se trata de lugares situados ao nort^ *

trópico de Câncer.

,

gavam em pleno hemisfério

completado de

uma

é pois

modo

a

as nossas naus nm^er

determinação da latitude tinha

austral, a

O

de fazer-se fora daquelas restrições.

formulou entre nós,

[:r.

'

Quando, na segunda metade do século xv,

Regimento, que para isso.se

generalização do que acabaraos de

poder aplicar-se

em

ler,

todos os pontos do globo

terrestre.

O

astrolábio plano, que se prestava à resolução de tantos problemas

astronómicos, apenas se empregava a bordo das naus na determinação

Para

de alturas.

E

inúteis.

A

e

a graduação sobre que

e os discos

de latitude tornavam-se

medeclina

isso bastava a

as suas pontas corriam.

aranha

certo que estas peças serviam

a declinação

do

sol.

porém

Preteriu-se

também para determinar nas

dispensá-las,,,,. juntando,

Tábuas do sol, às posições nos signos as 4echnaçõe§iem cada :dia> Desembaraçado o instrumento destas peças, puderam aumentar-áe as suas dimensões, o que facultou uma melhor divisão do limbo circular> Tal

a

é

cação

origem do «astrolábio náutico», que não

dum

é

senão

í^, simplifi-

instrumento que os árabes receberam dos gregos

O

duziram na Europa ocidental.

,e

introt

astrolábio plano ficou reduzido ap^r

nas ao necessário para observar alturas: .um círculo graduado, a roda^

em

cujo centro gira

uma

régua, munida de duas pínulas furadas, a

que os gregos chamaram dioptro se

e os

árabes alidade, e que

em

latim

chamou medidinium, donde o nome medeclina, dos nossos marir

nheiros.

Gaspar Correia descreve-nos, nas Lendas da índia, o Çacuto, Abraão Zacuto, ocupado

com

a.

éstrólico

organização das tábuas do

construção dos astrolábios náutico,s:

sol e a

«Elrey (D. Manuel) era muyto inclinado á Estrolomia, polo que

muytas vezes praticaua com o Judeo Çacuto

O

que todo

bem

/.

.

.

...

.

.

ouvido por ElRey houve muyto contentamento e

prometendo ao Judeu muytas mercês por seu trabalho, lhe muyto encomendou que desse cabo a tão boa cousa como tinha começado. Ao que o Judeu se offereceo, e como já tudo tinha exprimentado, e sabido a certeza do decurso do

mando

hum

o esprimento polas estrellas

regimento desta declinação do

sobre sy,

u

e os

mezes

e dias,

de

e os

sol,

com sol,

hum

mudamentos que

fazia, to-

suas artes da estrolomia, fez

apartando os anos, cada

hum

ano bisexto até o outro, que são

dA astronomia dos Lusíadas

1^6

quatro anos apontadamente, de quanto anda o sol cada dia, contado

de meo dia a meo

pêra a banda do Norte, como pêra a banda

dia, assi

do Sul, todo per grande concerto pasta de cobr^ da grossura de

em

que estaua dependurada

boa ordem; pêra o que

e

meo

dedo, redonda,

direita, e nella linhas e pontos, e

outra chapa, assi de cobre corrediça ao redor,

pontos furados direitos

no ponto do meo

hum

em

certo

que estaUa o

que parte estaua o

chamou

estrolabio, que

tudo per grande assi o lugar

o Judeu ensinou

ElRey mandou, como e de que modo hauião meo dia com o estrolabio, ensinandolhe

a alguns pilotos, que lhe

em

meo

per ambos,

sol

tomando

O que

cada ano, se sabia as legoas que erão andadas. de tomar o sol

no

conta polo regimento na tauoa de

e feita

sol,

sol,

huma argola

postos huns

e nella

do outro, porque entrado o

em

dia, se via

arte e sobtil modo, e lhe

fez

com huma

o ponto do

a conta que hauião de fazer polas tauoadas do regimento, no que

todo os muyto industriou»

No Almanach perpettmm do

(Tabula

sol

de Zacuto, Leiria, 1496, há quatro tábuas

prima, secunda,

solís

1473 a 1476, que, juntamente o cálculo,

em

em

com

et solis

declinação do tais cálculos.

dum

um

do-se

permitem

com

aquela posição, dá a

de Munich preferiu-se pôr de parte

Distribuiram-se os 36o graus do zodíaco pelos 365 dias

uma

mesmo número

E em

nalguns dias.

números inscreveu-se, como vimos,

destes

em

sol,

mesmos que feito

solis,

Depois a Tabida declinationis plane-

No Regimento

sol.

correspondente do são os

Tabula equationis

ab equinotiale, entrando nela

ano, repetindo-se o

de cada

a

iercia, quarta) para os anos de

graus, minutos e segundos, da posição do sol no zodíaco

cada dia de qualquer ano.

tarum

em

*.

se

a declinação

Estes graus e minutos

graus e minutos.

lêem na Tabula declinationis de Zacuto,

ou outra interpolação onde há repetição do

grau do zodíaco.

O

frente

Regimento de Évora,

anual, contêm tábuas de declinação para

em

um

vez

ciclo

duma

ten-

mesmo

única tábua

de quatro anos, o

que mostra que ao tempo da sua publicação se requeria



maior pre-

cisão. .

.

Depois de se referir às tábuas de declinação do

Correia o astrolábio náutico

para se fazer, pelo arte -

E

e sobtil

e o

sol,

descreve Gaspaf

seu uso no tomar do sol ao meio dia

Regimento, a conta de

latitude, tudo

per grande

modo,

dizendo ainda,

em

continuação do que acabamos de transcrever,-

que Zacuto se ocupou também do Regimento da estrela do Norte, para

Lendas da Índia, Lisboa,

i858, tom.

í,

págs. 261 e 263.

VIII— O

Cap.

147

astrolábio

que os pilotos soubessem navegar «assi com o

sol,

como com

a escu-

ridão da noite», acrescenta (pág. 264):

«O que

em

tudo foy

bem, como

tanto crecimento de

parece ao seruiço do Senhor Deos; porque homens

entendimentos forão mais entendendo

em

com que

alcançando,

em

dia

de sobtys ora está

toda perfeição».

Também Gamões diz que saber as partes em que estão

O

que

novo,

é

mento em

Este

uso náutico.

Deixámos

na navegação. e

por

e os pilotos

tratam de

siitil

juizo

&

sábio.

uma

não

e sábio,

é

o instru-

simpHcidade primitiva, mas sim o seu

o sentido do poeta.

é

atrás (pág. i33) transcrito o trecho de João de Barros

que diz que

quando

Gama

invenção de juízo subtil

e

reduzido a

si,

Vasco da

nouo instrumento do Astrolábio

Pello

Inuençam de

em

e

oje

scientes, e

em

Portugal se achou o primeiro uso do astrolábio

Gontinuemos

quem

«No tempo que

foi

a

leitura

achado (Década

o jnfante

desse trecho para sabermos i,

Liv. iv, Gap.

dom Anrique começou

11):

o descobrimento

de Guiné, toda a nauegaçam dos mareantes éra ao longo da costa,

uandoa sempre por rumo: da qual tinham suas

noticias per sináès de

que faziam roteiros como ajnda ao presente vsam

& pêra ^quelle modo

de descobrir

jsto bastáua.

em

algua maneira*,

Peró depois que

quisserã nauegar o descuberto, perdendo a vista da costa

matiua

&

que segundo seu

modo em

elles

& engolfan'-

dose no pego do mar: conheceram quantos enganos recebia na juizo das singraduras

\é-

esti-

vinte quatro

dauam de caminho ao nauio, assy por razam das correntes como doutros segredos q o már tem, da qual verdade de caminho a altura Peró como a necessidade é mestra de todalas é my certa mostrador.

oras

artes, e têpo delrey

dô Joã o segudo foy per

&

negócio a mestre Rodrigo dicos,

&

a

elle

a mestre Josepe judeu

encomedádo

hu Martin de Boémia natural daquellas partes: o qual se

gloriáiia ser discípulo de Joãne de

entre os professores desta sciecia.

de nauegar per altura do

sol,

Monte Régio afamado astrónomo

Os quáes achárã

radamente do q começou,

esta

maneira

de que fizeram suas tauoádas pêra de-

clinaçam delle: como se óra vsa entre os nauegantes,

páo».

este

ambos seus mé-

em



mais apu-

q seruiã estes grades astrolábios de

t^

qA astronomia dos Lusíadas João de Barros alribue pois a invenção do uso náutico do astrolábio

mesmo

a mestre Rodrigo, a mestre José Judeu, que é o

mestre José

Almanach de Zacuto e Martim Behaim, que chegara a Lisboa em discípulo de Regiomontano. Esta passagem Behaim a introdução do astrolábio em Por-

Vizinho, que traduziu do hebreu para latim o se intitula seu discípulo, e a

1484

e se

gloriava de ser

deu lugar

a atribuir-se a

não

tugal,

atendendo a que Barros

se

Afirmou-se também que e

do seu uso náutico apenas.

fala

Ephemerides de Regiomontano

ele trouxera as

que delas se extraíram os elementos para as nossas Tábuas do

Assim o instrumento

e as

tábuas náuticas, usadas pelos navegadores

portugueses, seriam de origem alemã. sidade de

opinião.

tal

Não

é

Está hoje demonstrada a

sol,

Ora não são

de 23°3o'.

calculada para

os

uma

As tábuas

foi

tá-

obliqúidade da eclíptica

uma

a

que se encontram no RegÍ7nento de Munich.

de 23^36' só

O

que se encontra a

*

números desta tábua, mas sim

manach perpetunm de Zacuto, correspondentes 23°33',

fal-

mas sim nas Tahulae

nas Ephemerides,

directioniim profectioniunqiie de Regiomontano

bua das declinações do

sol.

os do Al-

obliqúidade de

A

obliqúidade

adoptada, muito mais tarde (i537), por Pedro Nunes.

náuticas portuguesas

provêem

pois de fonte peninsular.

astrolábio plano, donde derivou o astrolábio náutico, era conhecido

na península séculos antes da vinda de Behaim.

Gaspar Correia cuto,

em

atribue,

por seu lado,

um

papel exagerado a Za-

parecendo apresentá-lo como único introdutor da sciência náutica

Nos primeiros anos do

Portugal.

rique conseguira trazer para cá mestre e construtor de instrumentos.

aqueles que julgou competentes

século xv já o infante D.

Jácome de Maiorca, cartógrafo

D. João

em

Hen-

II

reuniu

em

cosmografia,

torno de

si

todos

como foram o bispo

de Ceuta D. Diogo Ortiz, mestre Rodrigo, mestre José Vizinho, Mar-

Abraão Zacuto, que veio de Salamanca em 1492. Tinha uma junta de astrónomos, cristãos e judeus, como tivera Afonso X

tim Behaim pois

de Castela.

e

Este, justamente cognominado o sábio, dedicava-se à

astronomia por puro amor da sciência, tendo D. João

dum

*

II,

político sagaz,

punha

um

infeliz.

a sciência astronómica ao serviço

vasto plano, comercial e marítimo.

J.

reinado

Bensaúde, L'asÍronomie nautique au Portugal, pág.

2Ô.

IX Novo céu

O

I.

Cruzeiro do Sul.

mentos sob o impulso

forte

— Encetadas

as navegações dos descobri-

do Infante D. Henrique, lançadas as naus

portuguesas através dos terrores do desconhecido para regiões que a sciência então dizia inhabitáveis, os reis portugueses, proseguindo a

obra do Infante, tiveram particular cuidado, como resulta do precedente capítulo,

em

instrumentos

das necessárias regras de astronomia, sendo-lhes guia

e

que os nossos mareantes partissem providos de

todos os recursos que os conhecimentos dos cosmógrafos podiam mi-

Assim no Tratado em defensam da carta de marear, Pedro Nunes: nistrar.

«Ora manifesto he que

estes descubrimentos de costas: ylhas:

diz

&

nam se fezeram indo a acertar: mas partiam os nossos mareantes muy ensinados & prouidos de estormentos & regras de terras firmes:

astrologia

&

ham dãdar

sua Geografia. ja as

sam cousas de que

geometria: que

Leuauã

cartas

muy

particularmente rumadas:

de que os antigos vsauam: que

dose ventos

As

Cosmographos

os

apercebidos: segúdo diz Ptolomeu no primeiro liuro da

&

nam tinham mais

& não

figurados que

nauegauam sem agulha».

regras de astronomia

eram resumidas nos Regimentos. Pelo

Regimento da altura do polo ao meio dia determinavam a latitude, medindo a altura do sol na sua culminação. Com o Regimento da Estrela do Norte obtinham a latitude

observando a Buiina. e

este

Ao

sul

Regimento tornava-se

ram então atentamente

Os

nossos navegadores estuda-

as estrelas austrais,

duma

noite,

do equador porém perdiam a Polar,

inútil.

ção que substituísse a Ursa menor

grupo com a forma

sabiam as horas da

e

e

em

busca

acabaram por

cruz, cuja haste,

duma

distinguir

constela-

um

marcada por duas

novo

estrelas

qA astronomia dos Lusíadas

j5o (a, Y

Crucis)^ tendo

aproximadamente

nha com o polo, tomando

Chamaram

ridiano.

mesma

ascensão recta, se

noite e

determinavam

ali-

na passagem pelo me-

Por

nova constelação Cruzeiro do Sul.

à

marcavam as horas da da agulha de marear,

a

a posição vertical

ela

No Tratado Lisboa em i5i4

a latitude.

redigido pelo piloto João de

*,

ensina-se a medir por ela a declinação da agulha.

Se a origem portuguesa do Cruieiro não

foi

ainda reconhecida

pelos historiadores da astronomia, resulta isso apenas de serem mal

conhecidos no estrangeiro os documentos que a comprovam, dos quais

Foram

nos vamos ocupar.

os portugueses que

marcaram

Centauro, para guia dos navegadores, este brilhante sinal de cruz, que tamanha celebridade adquiriu no século xvi.

briram só novas terras

e

junto do

em forma

Não

desco-

novos mares; deixaram também na esfera

Por isso no Tratado em defensam da carta de marear, que acompanha o Tratado da Sphera, pubhcado em iSSy, diz Pedro Nunes; celeste este

«Nam

novo asterismo.

ha duuida que as nauegações deste reyno de cem anos a

esta parte:

sam

mayores: mais marauilhosas: de mais

as

altas

&

mais discretas conjeyturas: que as de nenhúa outra gente do mundo.

Os elle

portugueses ousaram cometer o grande

sem nenhu

A

estas

Entrara por

Descobriram nouas ylhas: nouas terras: nouos

receo.

mares: nouos pouos:

mar Oceano.

majs

&i o q

descobertas

faz

he: nouo ceo: nouas estrellasy>.

Camões

alusões

frequentes,

como em

V,4: Assi fomos abrindo aquelles mares

Qae geraçam As nouas

Que

em

II,

algíãa

ilhas

nam

vendo

&

abrio,

os nouos ares,

o generoso Enrique descobrio;

8b: Assi dizia,

&

todos juntamente,

Hus com outros em

pratica fallando

Louuauam muito o estamago da gente, Que tantos ceos & mares vai passando; ou

em

IX, 17:

O A

prazer de chegar aa pátria cara, seus penates caros

Pêra contar

Nauegaçam, os vários

i-

J. 1.

&

a peregrina,

parentes,

&

çeos,

rara

&

gentes,

de Brito Rebelo, L/vro de Marinharia, Lisboa, igoS, págs. 22 e 23.

:

Cap.

IX — Novo

iji

céu

Vir a lograr o premio, que ganhara

&

Por tam longos trabalhos,

accidentes,

Cada hum, tem por gosto tam

Que o coração para

O

nopo céu

é descrito

O O

foi

do ramo claro

mar, por yr deitar do ninho caro

morador de Abila derradeiro

Num

&

engenho raro,

madeiro ajuntando outro madeiro,

Descobrir pode

a parte,

De Argos, da Ydra

leste

:

venturoso Rei, que arou primeiro

Este por sua industria,

Um

perfeito,

he vaso estreito.

no último verso de VIII, 71

Conceito digno

Do

-

elle

que

faz clara

a luz, da Lebre, e da Ara.

observador, colocado no polo norte da Terra, tem o polo ce-

no seu zénite

e

com

o equador coincidente

o horizonte, e por isso

vê apenas as estrelas do hemisfério celeste boreal, as quais no seu

movimento diurno, sem nascimento nem ocaso, descrevem circunfer rências horizontais (almocântaras). Semelhantemente o observador situado no polo sul só vê as estrelas do hemisfério celeste austral, sendo

para

êle invisíveis as

A

que estão ao norte do equador celeste.

estas

duas estações corresponde o mínimo campo de visibilidade dos astros.

Os

habitantes do equador

eles os dois poios ficam

podem

modo

círculos diurnos verticais descritos pelas estrelas, de

Os

estão 12 horas acima e 12 abaixo dele.

meço da

noite abaixo

Para

ver toda a esfera celeste.

no horizonte que divide assim ao meio os que. elas

situados ao co-

astros,

do horizonte, vão subindo do lado do oriente

e,

volvidas 12 horas siderais, acham-se todos na parte superior, tendo

passado para a parte inferior todos aqueles que, no princípio da noite,

Numa

brilhavam no hemisfério superior. pois ver-se,

numa

podem boreais como

estação equatorial

só noite, todas as constelações, tanto

austrais.

Um equador

observador situado entre o e

o polo norte pode ver

12

to-

das as estrelas boreais e as austrais

*

/

que não fiquem compreendidas na calote esférica

que determina,

do polo

um

sul,

círculo

em

torno

menor da

lerà celeste, distante dele

um

es-

niímero

de graus igual ao da latitude do lugar.

As estrelas boreais que estão dentro duma calote igual em volta do polo norte nunca descem abaixo do hori-



^-'-^TÍ^^ \' •/T \

t"\, /.

\

"V*-v. *'•.

X.^^xX

\

l-w

\\

'/-'A

^N^vl^

A"/^

\x^ \\'' V

V\

x\

'-X

X. ••

\ \

v\

\

''•./!

A

,''''\

*-Ns^

"VZ-^-VT ^^-^^V \

X^JX

^^^^--^^^l^J—-^"^^^

V /

:

qA astronomia dos Lusíadas

j-52

zonte

descrevem a maior parte do seu

as outras estrelas boreais

;

As

culo diurno acima dele.

estrelas austrais, pelo contrário,

ram mais tempo abaixo do que acima do

O

horizonte.

tem logar para o observador situado ao

inverso

Aí as constelações

como Argos,

austrais,

cír-

demo-

sul

a Hidra, a

do equador.

Lebre

Ara,

e a

conservam-se, no seu percurso diurno, mais tempo acima do que abaixo

do horizonte; as constelações boreais

demoram menos tempo no Camões

indica

visíveis

sobem

a

menor

altura e

hemisfério superior.

no último verso da estância, que acabamos de tran-

screver, o novo céu que se ia oferecendo à contemplação dos nave-

gadores, onde predominavam cada vez mais as constelações austrais,

ao passo que avançavam para o

Não

sul.

Argos, a Hidra, a Lebre

lações novas.

porem a consteAra figuram já no catá-

se refere

e a

logo de Ptolomeu.

Onde

.

o poeta fala de nova constelação é

Ia descuberto ,

A

De

ser

IV, 85:

no Olimpo

A palavra tíeinispério celeste

estrellas

em

como

a de Argos.

indica geralmente nos Lusíadas o hemisfério

que assenta sobre o horizonte.

vide a esfera

Qualquer círculo máximo

di-

dois hemisférios: o equador divide-a nos hemisfé-

boreal e austral; o horizonte separa os hemisférios, superior e

inferior.

É

o hemisfério superior,

geralmente designa. lá

estrella.

palavra estrela é tomada aqui na significação de constelação,

como no último verso de

rios,

/

V, 14:

tínhamos diante

La no nouo Hemisperio, noua

>

em

E

assim





a

abóbada

celeste,

no novo hemisfério

que o poeta

— quer dizer:

no novo céu, no céu que cobre as regiões austrais do globo

ter-

restre.

Assim também em

'

8:

I,

Vos poderoso

O Ve

Sol logo

o

em

Rei, cujo alto Império,

nascendo, ve primeiro

também no meyo do Hemispherio,

E quando

dece o deixa derradeiro;

O sol vê o império português quando nasce no oriente, vê-o

na sua culminação no meridiano (meio do hemisfério) ocaso.

O

e

também

ainda no seu

império a que o poeta aqui alude é o do seu tempo, que

se estendia desde a Ásia, pelas costas de. Africa, até ao Brasil,

como

:

-

Cap.

em

diz depois

VII, 14,

IX— Novo

céu

i53-

quando descreve as possessões da «pequena

casa Lusitana»

De Aífrica tem maritimos assentos, He na Ásia mais que todas soberana, Na quarta parte noua os campos ara, E se mais mundo ouuera la chegara,

No Tratado da Évora,

lê-se,

^

spera do mudo, existente na Biblioteca Pública de

na parte do Cap.

11

que se ocupa do Meridiano

e

Hori-

zonte:

«Em. a spera ay outro circulo mayor: chamase orizonte. hè hu ho mais de cima hemisperio do de mais de baixo

circulo que aparta

& por esso se' chama orizõte. q qr & porq aliem de elle nenhúa cousa circulo do emtsperio»

Ao

podemos

chama

veer.

lhe

tãbem

*.

horizonte chamava-se pois «círculo do hemisfério»

em

poeta

dizer terminador de nossa vista.

;

por isso o

geral designa por hemisfério a meia esfera que se apoia

sobre o horizonte, e assim tem de interpretar-se

A

em

I,

65:

ley tenho daquelle, a cujo império

Obedece o

visibil,

&



inuisibil,

Aquelle que criou todo o Emispherio,

Tudo

Todo

da Terra o

ronha

homem

Elegia



,

&

todo o

insensibil.

o hemisfério é o maravilhoso espectáculo

minador de nossa

Na

o que sente,

III,

que

em

cada lugar

pode contemplar acima do horizonte, que

vista».

que tem a

riíbrica

—^Da

índia a D. António de

descreve Gamões o temporal que, ao dobrar do

Boa Esperança,

assaltou a náu S. Bento,

é «ter-

em

que

foi

em

No-

Gabo de

i553 para a

índia:

Porque chegando ao Cabo da Esperança,

Começo da saudade que renova, Lembrando a longa e áspera mudança;

^

O

trecho original correspondente na Sphaera de Sacrobosco é:

«Horizon

vero est circulus diuidens inferius hemisphaerium à superiori, vnde appellatur horizon, id est, terminator visus.

causa».

Dicitur etiã horizon circulus hemisphaerij,

eadem

;

:

^54

:

;

oá astronomia dos Lusíadas Debaixo estando

da estrella nova



Que no novo Hemispherio resplandece, Dando do segundo axe certa prova Eis a noite com nuvens s'escurece;

Do ar subitamente foge o dia E todo o largo Oceano s'embravece.

A

que resplandece no novo céu,

estrela nova,

Quando

as naus

davam

o Cruzeiro do Sul.

é

a volta da Africa, o polo sul tinha já

O

vação que tornava esta constelação circumpolar.

em

á sua haste alinhada pelo polo, descrevia

ele-

com

torno dele todo o seu

«dando do segundo axe

diurno acima do horizonte,

círculo

uma

Cruzeiro,

certa,

prova».

Voltemos agora à estância V,

de que

14,



começámos

a ocu-

par-nos Ja descuberto tínhamos diante

La no nouo Hemisperio, noua estrella, Não vista de outra gente, que ignorante Algíãs

tempos esteue incerta

Vimos

a parte

menos

d'ella

rutilante

E por falta destrellas menos bella. Do Polo fixo, onde inda se nam sabe Que

A

outra terra comece, ou

mar acabe.

nova constelação, a que Gamões aqui

Elegia

III,

se refere, é a

mesma da

o Cruzeiro do Sul, que êle afirma ter sido assinalada pelos

portugueses, não a tendo visto

nenhuma

outra gente antes deles.

A

verdade desta afirmação do poeta tem sido obscurecida pela opinião, até

há alguns anos geralmente

mento do Cruzeiro no

tral,

que atribue a Dante o conheci-

em

princípio do século xiv,

Quando Dante chega com

vina Comédia. eleva a

aceite,

que compôz a Di-

Vergílio à ilha

montanha do Purgatório, situada em 82 graus de

numa

em

latitude aus-

posição antípoda de Jerusalém, olha para o oriente

tando-se

em

estrelas,

nunca

seguida para a direita na direcção do polo vistas por

Io

mi

volsi a

que se

sul,

e, vol-

vê quatro

ninguém senão pela primeira gente: man

destra e posi

mente

Airaltro polo, e vidi quattro stelle

Non

viste

mai fuor che

alia

prima gente.

(Purgatório,

Que

estas quatro estrelas são as do

corrente, apoiada

em

autoridades

J,

22-24).

Cruzeiro tem sido opinião

como Humboldt,

Rizzacasa d'Orsogna mostrou os erros envolvidos ção, emitindo

um

novo parecer:

as quatro estrelas

até que

em

tal

em

1907

interpreta-

pertencem à cons-

IX— Novo

Cap.

Ara.

telação dá

céu

i5ò

F. Angelitti, professor de astronomia na Universi-

dade de Palermo, publicou, nos anos de 191 2

e

191 3,

um

magistral

estudo de astronomia dantesca na Rivista di Astronomia ^ que se

em Turim,

publica

duma

depois

chegando no ponto especial de que nos ocupamos,

análise minuciosa e completa, a concluir que as quatro

que Dante duas vezes se refere no Purgatório, são as das

estrelas, a

chamas da constelação da Ara, cios,

se

de pura imaginação do poeta.

em

assunto

não são antes quatro astros

fictí-

Depois voltaremos a tratar deste

dêmos como certo que a sciência da Divina Comédia a constelação do

particular; por agora

astronómica acabou por excluir Cruzeiro do Sul.

Os

nossos pilotos consideravam no Cruzeiro cinco estrelas, a que

juntamos, na figura, as letras

duas estrelas a

e y

formam a haste da cruz, sendo desenham a linha dos braços.

beça; as duas, p e

^,

A

da cruz,

£,

que

fica fora

A

de quarta grandeza.

primeira grandeza;

com que actualmente

|5

e y

é

uma pequena

mais brilhante

são de segunda e

observava-se geralmente a

a,

oc,

A

f,

^

che-

a linha ay se tornava vertical e o Cruzeiro

ficava portanto empinado, o que resultava de

mesma

Ca-

latitude

que lhe

a

e y a

mais próxima do polo,

meridiano era marcada pela

quando

Pe

de ter-

§

gada da

servia de Guarda,

a o

As

de

tomando-lhe a altura na sua culminação. a ao

designam.

estrela

a

é

Para a determinação da

ceira grandeza.

se

ascensão recta aproximadamente

terem estas duas estrelas

^.

Desta circunstância

es-

pecial é que resultava a grande importância náutica deste brilhante

grupo de estrelas que os nossos marinheiros souberam destacar da constelação do Centauro,

Três destas

estrelas

encontram-se



no catálogo de Ptolomeu,

que se refere ao ano iSy ou i38 da nossa era. visíveis

tauro,

em

sem

Alexandria. as agrupar

capítulo como,

em

Então eram elas Ptolomeu observou-as, incluindo-as no Cen-

num

Vimos no precedente movimento de precessão dos equinócios,

asterismo especial.

virtude do

o polo boreal se tem deslocado, aproximando-se da Estrela do Norte.

O mesmo

^

movimento tem aproximado o polq

F. Angelitti,

cielo stellato

Sugli accenni danteschi ai segni,

da occidente

nomia, Torino, tom. 2

in oriente, di

un grado

in

(T,

da constelação do

alie costella^ioni

ed ai moto dei

cento anni, in Rivista di Astro-

vi, vii.

Eni i5oo a ascensão recta do Pé do Cruzeiro

da Cabeça

sul

Crucis) era. de 181 ",08.

(a, Criicis)

era de lyg^^^gy e a

i56

(2A

No quadro

Cruzeiro. estrelas

dadas

a, p, y,

cem em cem

astronomia dos Lusíadas

junto*

em

ver-se as distâncias polares das

começo da era

anos, desde o

tâncias polares

podem

graus, décimas e centésimas de. grau, de

teem diminuído; assim

a

crista até 1900.

As

dis-

do Pé do Cruzeiro tem sido

reduzida nestes dezanove séculos de 38° a 27^,5.

Distância polar das estrelas

Crucis

Ano

O

37»,96

4i«,4i

44%09

100

3; ,42

40 ,86

43,54

200

36,88

40

,3i

42 ,99

3 00

36,34

39 ^^^

42 ,44

400

35,79

39,21

41 ,89

5oo

35 ,24

38 ,66

41 ,33

600

34,69

38 ,10

40,77

700

34,14

37 ,54

40

800

33 ,59

36,98

39 ,65

900

33 ,o3

36,42

39 ,09

1000

32 ,48

35 ,86

38,53

IIOO

3i ,93

35 ,3o

37,97

1200

3i,37

37,41

i3oo

3o

,81

34,74 34,18

1400

3o ,25

33 ,63

36,27

i5oo

29,70

33 ,07

35,70

1600

29

íM

32 ,5i

35 ,i3

1700

28,58

3i ,96

34,57

1800

28 ,02

3i ,41

34,01

+ 1900

27 ,46

3o ,86

33 ,45

-|-

Em está

Si*"

Alexandria, situada

abaixo do horizonte.

do polo

37*^,42,

de 6°,42

aciritá

1

bis

Estes

em

latitude boreal de 3í°, o polo sul

No

ano 100 o Pé do Cruzeiro, distante

uma

altura

do horizonte de Alexandria, devendo juntar-se ainda

apenas meio grau.

invisíveis

36 ,84

numa

elevava-se portanto na sua culminação a

o efeito da retracção.

maior elevação.

,21

No As

decorrer do século

11

esta altura diminuiu

outras estrelas do Cruzeiro atingiam

Ptolomeu poude pois observá-las todas.

uma

Hoje são

Alexandria.

números são extraídos de

^ur Gegenwart, Leipzig, 1912.

P.

Neugebauer, Stenitafeln von 4000 vor Chr,

Cap,

IX — Novo

i57

céu

procurar estas estrelas no catálogo de Ptolomeu tem de

Para.

calcular-se as suas coordenadas para a época a que este catálogo se

iSy-iSS

refere,

d.

de C.

Usando

as tábuas e fórmulas do opúsculo

Sterntafeln de Neugebauer, que já citámos, obtem-se a ascensão recta

para aquela época, tendo depois de passar-se para a

e declinação

la-

titude e longitude celestes pelas fórmulas sabidas de transformação,

porque são as coordenadas

eclíticas as

Obtem-se

usadas por Ptolomeu.

assim as seguintes posições para as quatro estrelas principais do Cru-

no ano iSy-iSS da nossa era*:

zeiro,

Estrela

a Crucis.

.

.

r

...

Longitude

Latitude

196° 14^

— 52«4l/

.

»

T

»

190 59

B

»

190

No

-48 -47

58

B

195

— 5o

I

catálogo de Ptolomeu, que se encontra nos Lib. vii e

27 33 i5

do

viii

Almagesto, as estrelas estão dispostas pela ordem das constelações, sendo a 44.^ a do Centauro, cujas estrelas são numeradas desde

Destacamos a posição

37.

como

ali

se

e

grandeza das estrelas

Longitude

G

Quae Quae Quae

32 37

Os

a

n.°^.3i, 82 e 87,

encontram ^r

Centauri constellatio 44

3i

i

Talo eiusdem pedis

.

.

G M Au.

5l

10

.

=^ l5 20

Au,

5i

40

pede

=^14 40

Au.

49 »o

.

est extra sub dextro posteriore

M

=^ IO

est in poplite pedis dextri

est in

Magnitude

Latitude

.

niámeros da coluna das longitudes indicam as posições no signo

de Libra (^), devendo portanto acrescentar-se-lhes os

iSo*'

que vão

desde o ponto de Aries ao princípio de Libra, para se poderem comparar

com

os

números da tabela

anterior.

As

latitudes são austrais

(Au.).

Vê-se assim que a a Crucis se identifica

com

a estrela 32, situada

Torino, 191 2, pág; 842.

1

Rivista di Astronomia, tom.

2

Transcrevemos da tradução do grego para latim de Trapezúncio,

Gàurico, publicada

em Veneza em

Astronómico da Universidade.

vi,

i528^ de

que existe

um

revista

pof

exemplar no Observatório

iSS

Q/i

astronomia dos Lusíadas

junto da pata posterior direita do Centauro, classificada de segunda

grandeza; a

com

Crucis

p

a Sy,

que

considerada de quarta grandeza;

reita,

jarrete direito, de

segunda grandeza

A

dum grau. com nenhuma

diferenças ficar-se

*.

com

e a ^

a 3i,

não

y,

di-

colocada no

com

Esta identificação faz-se

da Cabeça,

estrela

debaixo da perna

fica fora,

é possível identi-

das outras estrelas; para isso seria preciso su-

por erros de alguns graus nas suas coordenadas, tanto na latitude

como na

longitude.

Três das

estrelas principais

do Cruzeiro encontram-se pois

catalo-

gadas por Ptolomeu, incluídas na constelação do Centauro, não cons-

porem um asterismo

tituindo

fizeram

foi

distinto.

O

que os portugueses depois

destacar, na região celeste ocupada pelo Centauro,

uma

um

novo

com a haste dirigida para o polo, útil nas navegações austrais. Formaram uma nova constelação, o sinal tão procurado para lhes servir de guia, como no norte a Biiiina, Os historiadores da astronomia declaram, com Humboldt, que a referência mais antiga a esta constelação, designada já com o nome de Cruzeiro, é a de Corsali, em iSiS^. Da referência que lhe faz também Pigafetta, companheiro de Fernão de Magalhães, quando desgrupo,

cruz de estrelas

creve a célebre viagem de circumnavegação do globo, não nos ocupa-

remos por ser posterior

em viagem em

ido para a índia

primeira

Andrea

(i52o).

Corsali,

florentino,

tendo

serviço do rei português D. Manuel, conta a sua carta escrita de Cochim,

neiro de i5i5, ao duque Julião de Médicis. interessa, e que transcrevemos

com

com

A

data de 6 de

ja-

passagem que nos acompanha, é a

a figura que a

seguinte^:

«In che luogo sia il

giorno

temente

co'l Sole,

lo

il

polo Antartico, per Taltura de gradi, pigliammo

& ricontrammo

con

la notte

manifestano due nugolette

''

1'astrolabio,

&

torno ad essa cõtinuamente hora abbassandosi,

moto

com

1

circulare

esse

si

camminano, con vna

stella

^

&

euiden-

grandezza, ch'in-

di ragionevol

hora alzandosi in

sempre nel mezzo, laqual

volge lontana dal Polo circa vndici gradi: sopra di queste

Deve notar-se que

a figura

do Centauro, que

se vê

desenhada nas modernas

cartas celestes, é diferente da de Ptolomeu. 2

Humboldt, Cosmos,

trad. de Galuski,

tom.

ii,

Paris,

i866, pág, 353; Allen,

Star liames and their meaniugs, New-York, 1899, pág. 188; C. Flammarion, Les étoiles, Paris, 1882, pág. 3

562

Ramuzio, Navigationi

et

viaggi, vol.

i,

Venetig, i558,

exemplar na Biblioteca Nacional de Lisboa. ^

As duas migolette são

s

É

a



Hvdri.

as

Nuvens de Magalhães,

fl.

177

v,

Existe

um

Cap.

IX — Nopo

i5g

céu

apparisce ima croce maranigliosa nel mezzo di cinque

circondano (com'il carro

vanno intorno

ai

tramontana) con

la

&

è di tanta bellezza,

la

che con esse

Polo girandole lontano circa trenta gradi,

curso in 24. hore,

che

stelle,

altre stelle,

&

fa

suo

che non mi pare ad alcuno

segno celeste douerla comparare. come nella forma qui

di sotto ap-

pare».

^

ii

\ A,

POLO ANTARTICO.

Não há dúvida que

B,

CRVSERO.

a c)'oce maranigliosa,

que Corsali acha de

Pé distava do polo, em i5oo, porem ia num navio português e forani nossos marinheiros que lhe mostraram a maravilhosa criii, que

tanta beleza, é o Cruzeiro do Sul, cujo

cerca de 3o graus. os

eles tre

há muito conheciam, pois que

tuguês

por



em

i5oo fala dela o

físico

Mes-

João a D. Manuel, como veremos.

Em vez em

Corsali

uma

duma

simples referência a esta constelação temos

em

por*

exposição completa do uso náutico do Cruzeiro, escrita

i5i4 pelo piloto João de Lisboa, resultado de estudos anteriores, êle

mesma

feitos

com

outro piloto nosso. Pêro Anes,

cidade donde Corsali escreveu.

publicado pelo

sr.

J.

I.

No Livro

em Cochim, na de Marinharia

de Brito Rebelo, Lisboa, 1903, encpntra-se

qA astronomia dos Lusíadas

2Ò0

Tratado da Agulha de 7narear achado por João de llixDepois de explicar no capítulo 4.° como pela

(pág. 20) o

boa, ho ano de i5i4.

Estrela do norte se determina a declinação da agulha de marear, trata o piloto

mesma determinação

João de Lisboa da

pelo Gruzcíiro

(pág. 22):

determinei ífazer decraraçã do cruzeiro por ver mais largo

«...

synall

que do que todos tem conhecimento: o qual por muitas vezes

pere anes que deus

achamos estamdo

te e

eu espremetamos muitas vezes c5 ho norte e

e parte

que be vimos ambos dos ditos synaes esta

ê

húa linha cõ os pollos du mudo:

e

por este cru\eiro ser o mais manifesto synall dos navegiiamtes

por húa agulha estado

isto

nã aver nhú embaraço: determiney de sobre

elle

elle

e

cochim e e

fazer operaça

per a agulha que se faz ao norte».

João de Lisboa

foi

para a índia, pela segunda ou terceira vez,

Entende o

sr.

em

comandada por Tristão da Cunha.

i5o6 na frota de dezasseis navios

Brito Rebelo que foi durante o tempo, que esta ocasião

lhe proporcionou de se achar

em Cochim,

que

tudos a que acima se refere.

Pêro Anes,

piloto

ele

procedeu aos

es-

muito notável, fora

nomeado por D. Manuel, em i5o3, patrão da navegação da índia e mar Oceano. Os dois pilotos, segundo o sr. Brito Rebelo, teriam tomado parte na expedição de Vasco da Gama em 1497. Em Cochim, numa latitude boreal de 10^, podiam observar não só a Estrela do Norte mas também o Cruzeiro do Sul, cujo Pé, na sua culminação,

aí se

uma

elevava então a

altura de 20^ sobre o ho-

rizonte.

Vem em

seguida a descrição da constelação:

«sabereis que neste cruzeiro do suU

quatro delas sã

gramdes da

andam çinquo

— — gramdeza 1.^

e

hua

estrellas as

da— 5.* — grã-

deza: esta he morteíicada ê respeito das outras e esta íFegura do cruseiro conheceras por

húa

estrella

*

plaina que pêra iso

íis

na qual

asynei as ditas estrelas na llatitude que tinha dos pollos e asy as car atuías

As

dos synaes segundo são affigurados».

quatro estrelas principaes que

sificadas

i

Aliás

como de

2.*

— hua espera plaina,

do cruzeiro do

sul,

como

a cruz

eram

se lê correctamente âdeante

onde desenvolve o que

respectivas figuras (Nota do

formam

pois clas-

grandeza; a quinta estrela, «mortificada

sr.

diz aqui

Brito Rebelo).

em

em

no regimento

sustância e onde se

vêem

as

Cap.

IX — Nopo

céu

i6i

respeito das outras», é a que hoje se designa pela letra

s

As

suas

distâncias polares vê-se que são já sabidas.

Em

seguida explica-se (pág. 23) o

modo

de medir o nordestear

ou noroestear da agulha, borneando ao pé do Cruzeiro:

emtã bornearas pelos ferros do semeçircoUo ao pee do cruque seja metido pela abertura emtã veras homde apomta

«...

:{eiro atee

a

froll

de

llis

dagulha pelas quartas que vão ao llomguo da caixa

homde apomtar

aquela

e a

e

deíFeremça de tua agulha e asy veras ho

afastamêto se he pêra ho oriemte ou pêra oçidemte».

Adiante (pág. Sy) grafe

— Regimento do

é este

mesmo

assunto desenvolvido sob a epí-

Cruzeiro do sulL

Gomo



aqui se subentende,

observado quando

expressamente

se declara aí

tiver direito e

«estee a estrela da cabeça cõ ha do pee e híía llinha

prepêdecular».

que o Cruzeiro

Nesta posição,

em

é

es-

que o Pé está no meridiano, pode

não só fazer-se a operação com a agulha, mas também determinar-se a latitude do lugar, tomando a altura desta estrela, cuja distância polar sabida era de 3o^.

Estando-se no equador, o polo

e a altura meridiana

do Pé era de 3o^; ao

fica

no horizonte

sul a altura era de 3o°

mais a elevação do polo antártico; ao norte do equador era menor que

3o°.

Daí a regra simples que transcrevemos

com

a figura res-

pectiva:

tít.

has de saber que quãdo tomares este cruzeiro do siãl halo de

lomaf quãdo esteuer epinado do pee

e olharas bé

qile fiser esta feição e

que este norte

sul

tomaras a

hõa Com a outra

estrella

e lleste oeste



102

astro7i077iia

dos Lusíadas

os braços e olharás be quamtos grãos toomas

grãos estaas na llinha

que menos for de tomares mais

se

e se

tomares menos

e

tomares

se

de — 3o — grãos:

— 3o — aquillo

— 3o — estarás afastado pêra a parte do norte. E de — 3o — tudo o que mais tomares estarás pêra a

parte do sul quer seja pouquos quer muitos» {Livro de Marinharia,

pág. 39).

A noite,

constelação era

também

como

no norte:

«It.

a Bi/:{ina

ffim de ífevereiro

— i5 — dias húa sul

pêra a

meia

ora: asy

bamda do

aproveitada para marcar as horas da

noite na

Cabeça:

como na comta do

sudueste

e

E

daíy de

norte:

— i5 — ê

começamdo no

he espremetada» (Livro de Marinha-

ria, pág. 39).

Podemos assim desenhar uma

figura,,

semelhante à que fizemos

/este

ceôte

Pd para a Ursa menor, que indique as posições ocupadas peío Cruzeiro à

meia

noite, de quinze

em

quinze dias, no decorrer do ano.

A haste

k

Cap.

IX — Novo

t63

céu

da cruz servia assim de ponteiro para marcar as horas da

noite,

como

no norte a linha da estrela polar para a Guarda dianteira.

comprehenderem as designações das posições e movimentos das estrelas por meio dos rumos, deve supor-se no polo celeste uma Rosa, como a da agulha, com o norte para cima e a linha Para

se

A

norte-sul vertical.

linha leste-oeste fica horizontal; a designação

da Rosa indica o lado

leste

vador colocado na Terra

Do que vimos

esquerdo, para o obser-

direito, e oeste o

olhando para o polo

e

*.

dizendo se conclúe que o precioso códice do sé-

culo XVI, pertencente à livraria dos

Duques de Palmela

e

que faz

objecto do Livro de Marinharia, nos permite contrapor à simples

Corsali ao Cruzeiro do Sul, na sua carta de i5i5, o

referência de

Tratado da Agulha do

piloto português

em

anos antes,

que se mostra



data de

em Cochim com Pêro Anes

resultado de estudos feitos

i5i4,

com

João de Lisboa,

oito

o conhecimento completo do valor

náutico da nova constelação.

Mas ha

Na

mais.

carta escrita de

i5oo a D. Manoel, que

Mestre João^, depois de contar como terra

com mais

numa

latitude sul

trelas austrais: las estrellas dei,

saber, antes

ninguna

me

estrella

Vera Cruz em

i

de maio de

noutro lugar citámos (pág. 124), o piloto



dois pilotos

e

em

27 de abril descera

em

achara pelo astrolábio que estavam

de 17 graus, fala dos seus trabalhos sobre as esmando a vosa alteza como estan situadas

«solamente

pêro en que grado esta cada una non paresçe ser inposible en

la

lo

he podido

mar tomarse

altura de

porque yo trabaje mucho en eso

e

por poço que

el

nauio enbalançe se yerran quatro, o cinco grados, de guisa que se

non puede fazer synon en

Na

*

figura, relativa

terra».

No

corpo da carta reserva

àUrsa menor, do nosso anterior capítulo

signações direito e esquerdo referem-se a

um homem

um

(pág. 116) as de-

colocado no polo celeste

e olhando para a Terra.

«Para não abrir

^

um

novo additamento, não parecerá inteiramente fora de um outro astrólogo do tempo de D. Manuel,

propósito o intercalar aqui a noticia de

que, como é notório, também cultivava com amor esta sciencia, Chamava-se elle Joam Farás, physico de el-rei, e d^elle existe na Real Bibiiotheca d'Ajuda uma traducção em hespanhol da Geographia de Pomponio Mela. .. O titulo, no alto do primeiro fólio, em letras encarnadas, é do teor seguinte: Llã geografia j cosmografia de Pomponio Mela cosmógrafo, pasada de latiti en romance per maestre Joan Farás bachiller ê artes e em medeçina Jisico j sororgiano dei miiv alto rey de Portugal Dom ManocL Não encontramos registado o nome de João Farás. Será acaso o mesmo mestre João, que acompanhou Pedro Alvares Cabral?» (Sousa Viterbo, Trabalhos .

.

.

náuticos dos portugueses^ Parte

lí,

págs. 285, 280).

;

qA astronomia dos Lusíadas

104 espaço para fazer junto ofac-símile

um

esboço das constelações austrais^ de que damos

*,

'

\^^ -f

9

€ escreve ao lado"

«tornando senor

propósito estas guardas nunca se escondeis



anteâ syenpre andan en derredor sobre el orizonte, e aun esto du-

doso

qtre

non

tyco,

e

estas

se qual

de aquellas dos

mas baxas

principalmente las de

estrellas

sea



poio antar-

la crus son grandes-

como ías det carro, e la estrella deí polo antartyco, o sul es pequena como ia dei norte e muy ciara,, e k estrella que esta en rib^ de toda la crus es mucho pequena»^ casy

com o nome der grandes «casy como las dei

Aqui temos pois o Cruzeiro do Sul designado Crii\.

As estrelas da com efeito no

carro» e

sificadas

de

2.^

constelação são



do Cruzeiro clasgrandeza, como as da Ursa maior. No esquema

estelar o Cruzeiro

século xvi foram as estrelas

está

rubrica «las guardas».

evidentemente na parte superior, junto

As guardas

são as duas estrelas

(a,

da.

j Crucis)

que apontam na direcção do polo sul, como na do polo norte apontam as Guardas da Ursa Maior. Diz mestre João que estas guardas nunca se escondem, antes sempre andam em derredor sobre o iiorizonte naquella latitude e época do ano o Cruzeiro andava na verdade todat

1

Este fac-simile

é

reproduzido da ofera Centenário do descobrimento da Amé-

Memorias da Comissão portuguesa^ Lisboa, 1892, pag. 61. pode vêr-se no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Corpo rica^

maço

2,

doe. n.®

2.

A

carta original

chron.,- parte

3.^,,

IX — Novo

Cap.

A

a noite acima do horizonte.

mava

i65

céu

palavra bosja mostra que êle for-

do polo antártico uma Bu:{ma, como no norte.

junto

As

três

pequeninas estrelas muito juntas, que se vêem sobre a última letra desta palavra, são do Pássaro da índia

que

se

(a, p, f

(p, y, ^

O

Apodis).

losango

eleva sobre o artigo la é formado peias três do Triângulo

com

Trianguli)

Vê-se pois que

em

a « Centauri.

i5oo havia

um



grupo de estrelas a que os

chamavam a Cí^ui. Mestre João fala dele a Do esquema das uma constelação já conhecida. de como D. Manuel

nossos marinheiros

estrelas

do texto da carta resulta evidentemente que

e

do

se trata

Cruzeiro do Sul.

A

carta de Gorsali de í5i5,

com

o seu ião confuso esboço, deixa

em

pois de ser o documento mais antigo ciona,

A

que a Cruz do Sul se men-

prioridade pertence à carta de mestre João, de

de j5oo.

Anterior à referência de Gorsali é

Agulha do

Não

João de Lisboa,

piloto

serviço de D. Manuel,

quem mostrou

foi

também

i

de maio

o Tratado da

pois Corsali, que ia

em

aos nossos marinheiros aquela,

constelação; foram os nossos que lhe indicaram a cru^ que tanto o

maravilhou,

Resta>nos examinar cartas de

uma passagem, muito

Américo Vespúcio, na qual

forma de uma mandorla, que

A

mandorla

*

seria

se

citada,

uma

€le fala de

de

uma

das

constelação

tem suposto ser o Cruzeiro do

em Sul.

imaginada por Vespúcio ligando as quatro estrelas

por duas linhas divergindo do pé do Cruzeiro para os extremos dos braços e convergindo depois no topo da cruz. O exame das cartas leva

porém

a concluir que se

não

trata desta constelação,

mas de um

outro grupo de quatro estrelas.

Na

obra de Bandini, Vita e lettere di Amerigo Vespucci, Firenze,

1745, encontra-se, depois

das quatro cartas

em

que Vespúcio narra

as suas duas primeiras viagens, feitas ao serviço do

as duas seguintes, outra carta

^

feitas

dirigida a

segunda viagem.

ao serviço do

Lorenzo

rei

rei

de Castela, e

português D, Manuel,

de' M^edici,

€m

uma

que lhe conta a sua

Nesta carta, escrita de Sevilha com data de 18 de

julho <3e i5oo, lê-se o seguinte (págs, 69 e 70):

«... e

^

Esta palavra,

'«designar o 2

come desideroso,

O

ciiija

tradução

d'esser€ autore, che segnassi la stella dei

literal é

amêndoa, é usada na arte

il-aliana

para

resplendor oblongo que cerca o corpo dos santos subindo ao céu,

título

da carta é: Lettera di Américo Vespuc-ci

indiri^:^ata a

Lorem^o

di

Pierfrancesco de' Mediei, che contiene un^esatta descrizione dei suo secondo Viaggio •fatto

per

i

-Re di Spagna, ora per la

'existe íia Biblioteca

prima volta data

da Universidade de Coimbra.

alia luce.

A

obra de Bandini

:

j66

Q/i

Firmamento

astronomia dos Lusíadas

deiraltro polo, perdei molte volte

il

sommo-

di notte in

movimento delle stelle delPaltro polo, per segnar quanto» minor movimento, e che fussi piú presso ai Firmanon potetti con quante male notti ebbi,. e con quanti stru-

contemplare

il

di esse tenessi

mento,

e

menti usai, che fu

men

tenessi

quadrante,

restai satisfatto in

polo dei meridiono

il

Firmamento:

intorno ai

e

me

Capitolo dei Purgatório,

medesirao

a causa dei

*

mentre che

un detto dei nostro Poeta Dante,

di

Non

e Tastrolabio.

segnai

che

stella,

che dieci gradi di movimento alFintorno. dei movimento,,

dimodochè non essendo

il

quando

gran

di

nominar nessuna,

circolo, che facevano»

questo andavo, mi ricordai

in

dei quale fa

menzione nel prima

finge di salire di questo emisperio, e

trovarsi nell altro, che volendo descriver

il

polo Antartico dice

mi volsi a man destra, e posi mente Air altro polo, e vidi quattro stelle Non riste mai,fiior che alia prima gente: Goder pareva il Ciei di lor Jiamelle,

Io

O

settentrional pedovo sito,

Poichè privato

«Che secondo crivere per

le

me mi

pare, che

quattro stelle

fíno

nottai

quattro stelle figurati

movimento,

e se

Vespúcio

vita,

sul,

o polo

*

Polo dei meridiono

Humboldt na sua Histoire de

é

e

non mi

non salga verilà; perche ia

salute,

e

diz que,, desejoso de ser êle

2

spero presto tornare in il

polo»

^,

o autor que primeiro

perdera muitas vezes o sono da

dit

sul.

la

Géographie du nouvemí

continent,

Vespuce, à chercher vamemení une étoile polaire du sud,

des paroles (de un deito) de notre poete le

Purgatoire, en feignant de sortir

assi-

noite,,

tomo

dá conta de parte deste trecho nos seguintes termos: «Tandis que

3 19,

occupé,

dice

des-

in questi versi vogíia

non tomar sanza notare

nalasse a estrela polar do

pág.

Poeta

íl

qiielle.

come una mandorla, che tenevano poça

Dio mi dá

quello emisperio, e

di mirar

polo delPaltro Firmamento,



a qui, che quello, che

diffidi

sei

Dante, qui dans

le

je

me

rv^

j'étai&

rappelas

premier chapitre

dit

d'un hemisphère pour entrer dans Tautre, veut

mi

volsi a

man

destra e posi mente.

D

décrire ce pôle antarctique et chante

:

me

poete a euFintention de décrire parles quatre

parait à

moi que dans

étoiles le pôle

ses vers le

Io

de Tautre firmament et jusqu'iei

je n'ai

.

aucun doute que cela ne

.

soit

ainsi, parce qu'enefFet je vis quatre étoiles qui figuraient (ensemble) ima mandorla,.

et avaient

é

peu

(!)

de mouvement».

O

ponto de admiração depois da palâwa peu

posto por Humboldt, que, inclinando-se a crer que se trata aqui das estrelas

Cruzeiro, encontra este advérbio

a contrariar a sua opinião.

do-

IX — Novo

'Cap.

i6y

cê11

«observando as estrelas mais próximas do polo, as quais, descrevendo círculos diurnos de

pequeno

movem

raio, se

mais lentamente,

Su~

blinhamos as palavras minor movimento, por ser esta a circunstância

por

notada

êle

com

cuidado,

especial

como

resulta

da leitura do

Apesar de tantas noites passadas a enfiar os astros pelas pínulas do astrolábio e do quadrante, não lhe foi possível assinalar Não pôde pois estrela com menos de lo graus de distância polar. trecho.

nomear estrela alguma <|ue marcasse o polo sul. Emquanto nisto andava, recordou-se da passagem do Purgatório,

em

que Dante, olhando para o polo

a verdade com que o poeta fazendo a figura de

vê quatro estrelas,

sul,

se exprime,

uma mandoHa,

e verificou

porque notou quatro estrelas

as quais tinham pouco movi-

mento. ^

Que

estrelas

diz que elas

que

formavam

esta

mandorla?

pôde observar mais próximas do polo.

êle

Vespúcio apenas nos

tinham pouco movimento, o que quer dizer que eram das

Não

se lhes

Não

atribuir distância polar muito superior a lo graus.

estrelas do Cruzeiro, que de- distância

em

pode pois

se trata das

iSoo se estendiam entre 3o e 36 graus

do polo, descrevendo os seus círculos diurnos com

uma

velocidade superior a metade da das estrelas equatoriais, que são as

de velocidade máxima

Vespúcio não podia pouco movimento estrelas já tão distantes do admitir menos cuidado numa circunstância que *.

classificar

polo, e

como de

não se pode

merecia especial

lhe

atenção.

Em

nova

carta, dirigida ao

mesmo Lorenzo

de'

Mediei no fim de

para lhe narrar a sua terceira viagem, descreve Vespúcio as

ii5o2,

constelações austrais.

De novo

fala

de

um

grupo de quatro

estrelas

|unto do polo:

polo Antartico non ha FO-rse maggiore, nè minore, siccome si

«II

può vedere risplendano,

forma

di

sinistra

nel nostro polo Artico, nè lo toccano

ma

quelle che

quadrangolo.

E

lo

alcune

stelle,

che

circondano sono quatíro, che hanno

mentre queste nascono,

un Ganopo risplendente

si

vede dalla parte

notabile grandezza» (Bandini,

di

pág. 114).

O

*

astrónomo

A

Ideler, que

reiaçãe da velocidade do

estrelas equatoriais é



-

Humboldt consultou a

respeito das obser-

movimento diurno de uma

dada pelo seno da sua distância polar.

para a a do Gruseiro, por ser sen.

3o°= —

;

estrêla para a das

Essa relação é de

para as outras é maior.

:

qA astronomia dos Lusíadas

i68

com

vaçôes estelares contidas nesta carta, vê-se embaraçado

este

quadrángulo, pois diz

«L'obser\^ation que

marquante,

tantes che circondano

pôle austral n'est environné d'aucune étoile

le

mais quelles sont ces quatre

est exacte,

polo antartico

il

e

étoiles

peu

écla-

hanno forma di quadran-

golo ? Serait-ce

le petit

carre d'étoiles de cinquième et sixième gran-

Bode

a placé

dans ses cartes, d'après

deur, que

La

pôle

même

cono

si

?

les

observations de

dans lequel, de notre temps, se trouve eífectivement

Caille, et

J'en doute, à cause de ce qui suit:

E

le

mentre queste nas-

vede dalla par^te sinistra un Canopo risplendente.

Ces rap-

ports de lever et de coucher ne cadrent pas avec la supposition que je

viens d'énoncer))

*.

Depois descreve Vespúcio identifica

com

a,

(3,

y

Hjdri,

«Dopo questo seguono avanzano

tutte Taltre, che

um

grupo de

em

e

seguida

três estrelas,

um

que Ideler

de seis:

splendore

sei altre lucenti stelle, le quali di

sono nelPottava sfera; delle quali quella,

che è nel mezzo nella superfície delia detta sfera, ha misura di

conferenza gradi trentadue.

Canopo,

ma

fosco, le quali tutte

Este grupo de seis estrelas

cir-

Dopo queste figure seguita un gran

é

si

veggono nella via

lattea».

assim explicado por Ideler:

«Je crois reconnaítre dans ces six plus brillantes étoiles, a et p

des pieds du Centaure et les quatre étoiles de la Croix du Sud, parce

que

i.*'

elles

se trouvent toutes

r étoile du milieu 3i°--

que

du pôle

(p

de

la

Croix) est

fait

Croix du

Deve pois

il

Si

mes

explications et

mes

con-

en resulte que Vespuce, dans sa

déjá mention des deux

Nuages de Magellan

II

nom

et

particulier

ne connait pas même

le

Sudy).

com Ideler que Vespúcio no fím do ano nome do Cruzeiro do Sul nem isolava as

concluir-se

não conhecia ainda o

^

parce que

est le

aux constellations de Tautre hémisphère. la

i.^

acçompagnées d'un Canopus obscur qui

des deux Coalbags; mais qu'il ne donne encore aucun

nom de

;

misura di circonferenia)\

second Coalbag ou sac de charbon.

Médicis,

Voie lactée

parce

jectures ne sont pas hasardées, lettre á

la

vraiment aujourd^hui éloignée de 3.°

austral (c'est une

les six étoiles sont

dans

Humboldt, Histoire de

la

Géographie du nouveau continent, tom.

i5o2 suas

v, pág. 227.

Cap.

numa

estrelas

i6g

ceu

constelação separada, visto que as juntava

num grupo

do Centauro

principais

IX — Novo

de seis

com

as duas

o que confirma a nossa

;

opinião de que na carta anterior, de i8 de julho de i5oo, ele se não

quando

refere ao Cruzeiro,

da sua mandorla K

fala

Pelo contrário, não pode haver dúvida que a

mente o

Mestre João na sua carta de

piloto

signando-o

com



nome de Cruz.

o

ele se refere nitida-

de maio de i5oo, de-

i

Esta carta

Tratado da

o

e

Agulha de João de Lisboa, de i5i4, no qual se mostra o conhecimento completo do seu uso náutico, são os documentos mais antigos em que se menciona o Cruzeiro.

O

astrónomo

distinto

em

vatório Astronómico de Lisboa, que

Sub-director do Obser-

Lourenço Marques

foi a

1907

Campos Rodrigues,

o Observatório

instalar

Oom,

Frederico

sr.

teve ocasião de

e ahi

observar, durante 16 meses, as constelações austrais, diz-nos que as

um

pessoas, que não teem

com

o confundem facilmente

chamam grupo cido



«Cruzeiro falso» £,

com

do ano

'.

Carinae,

â,

conhecimento seguro do Cruzeiro do Sul, o grupo de estrelas que os portugueses

e os ingleses

x Velae

As

Cr^oss.

estrelas deste

— reproduzem um aspecto muito pare-

o do verdadeiro Cruzeiro e é

e

False

fácil a

confusão

em certas

sobretudo quando o verdadeiro se não vê.

épocas

Com menos

também podem

atenção, ou maior inexperiência,

fazer confusão, por serem aspectos caracteristicamente cruciformes, duas outras combi-

nações:

a,

Trianguli, a Centaiiri, ou

p, Y

observações mostram

bem

p, 0, u,

w Carinae.

numa simples referência a um grupo uma indicação segura do Cruzeiro.

quer vêr, austrais,

Estas

o erro que pode cometer-se quando se

Quando Vespúcio perdia o uma estrela polar do sul, havia

de quatro estrelas

sono da noite, procurando descobrir

meio século que de bordo das naus



portuguesas se começara o estudo das constelações austrais.

1

Tem-se também querido

que fala Plínio triones

non

(n.

23

— m. 81

identificar

d.

com

o Cruzeiro o Thronon Caesaris de

de G.) na sua Hist. Nat., L.

cernit Troglodytice, et confinis Aegyptus: nec

vocant Berenices crinem

thfonon: insignes démontrer, que

la

;

item,

ibi stellas».

flatterie

quem

A

II,

este respeito diz

Humboldt: «On

courtisanesque des savants

Thronon, constamment invisible en

formar constelação i38 da nossa era. i3

As

estrelas

distinta,

Itália, et

quem

sub divo Augusto cognominavere Caesaris

à Auguste, les etoiles dont se

Paris, 1886, pág. 352).

Cap. lxxi: «Septen-

Canopum

compose

Italie»

la

a

dit,

sans

le

alexandrins qui avaient

changé Tétoile de Canopus en un Ptolemaeon, avait aussi

honneur

Na

rattaclié,

pour

faire

Croix du sud à un Caesaris

{Cosmos, tomo

II,

trad.

de Galuski,

do Cruzeiro estão incluídas no Centauro, sem

no catálogo de Ptolomeu, que

se refere ao

ano iSy ou

dos Li/shidas

Q/í as/rouofjiia

l'^0

obra de Ramusio, Naingationi

por Luiz de Cadamosto, das duas navegações por

escrita

em

A

serviço do Infante D. Henrique.

ele feitas

descripção das duas navega-

traduzida do italiano para português,

ções,

pela

encontra-se a narrativa,

píaggi,

et

foi

publicada

em

1812

Academia das Sciências de Lisboa. Para a primeira navegação Cadamosto em março de 1465, numa caravela nova de 46 to-

partiu

neladas que o Infante lhe

mandou armar, da

qual era patrão Vi-

cente Dias, natural de Lagos, costeando a Africa até ao rio Gambia.

De observações Cadamosto no «Nos

dias,

astronómicas, feitas na embocadura deste

trata

rio,

capítulo final da narrativa desta primeira viagem:

que estivemos sobre a embocadura deste

mais que huma vez a

estrella

não vimos

rio,

do Norte: aparecia muito baixa sobre

o mar, e era necessário para a ver estar o tempo muito claro, pare-

cendo levantada delle somente cousa de huma lança de

bém vimos

sobre o

mar

Tam-

altura.

seis estrellas claras, luzentes, e

grandes, e

tirando-lhe o lugar pela Bússola, vimo-las direitas ao Sul, figuradas

por este

modo

# * ##, e assim julgamos ser o

não

estrella principal

se via,

e

o dia de doze

meia, estando

e

me

dous do dito mez se não

A

em

disposição

engano»

em

Sul,

e os

O

E

uma

sétima,

à da

ia inclinado a

Em

austral.

E

e

tomo

é

Carro do

seis estrelas

Estavam em

noite, o Cruzeiro

vê-lo então sobre o

possível que naquele grupo de

O

que

é certo é

que



i3°

mar,

-seis estrelas

neste ano de 1455

noticias

paM

geografia das nações ultramarinas, publicada pela Academia das SciênII,

n.°

I,

Lisboa, 1812, pág. Sy.

que no capítulo anterior feitas

As

Transcrevemos da tradução portuguesa, contida na Colecção de

a história cias,

no começo da

Podiam

46° para o poente.

entrassem as do Cruzeiro.

*

um

mais próxima do polo, que eles supunham

dois de julho,

próximo ao seu ocaso.

arranjo

Ursa Maior, devendo comple-

poder vêr-se, depois de perder de todo a do Norte. de latitude norte.

se vê na

um

que se depreende do texto

como depois Mestre João uma Buzina por

como

naturalmente

companheiros procuravam formar

teem pois uma disposição análoga tar-se

o principio de Julho, a

cruz deste esboço de estrelas,

que melhor conveio ao tipógrafo.

e

*.

obra de Ramúzio, não merece confiança.

que Cadamosto

a

era possível vêlla senão perdendo

Neste lugar achamos a noute de onze horas

de todo a do Norte. meia,

nem

Carro do Sul: mas

(pág. 118) nos

na segunda navegação.

É

a estas observações

queremos

referir.

de Cadamosto

Demo-las porém como

Fica assim rectificado esse engano.

Cap.

uma

a tripulação de

IX — Novo

tjl

céu

caravela portuguesa estuda

com

vivo interesse

as estrelas do sul.

Podemos agora as descobertas

reconstituir a história

lações que indicassem o polo, latitude de

nam um Carro

como no

em

do Sul de que não vêem

Em

existência.

1455,

das estrelas, não duvi-

numa

latitude sul de

uma

o físico Mestre João forma junto do polo antártico

em

Em

companheiros imagi-

e os

uma

i5oo,

boca vem abrir-se no actual Triângulo;

busca de conste-

norte as Ursas.

ao norte, Gadamosto

i3*^

dando contudo da sua

17%

Buzina, cuja

D. Manuel da

e fala ao rei

que duas estrelas apontam na direcção do polo,

Cruz do

sul,

como de

constelação conhecida.

expedição de Vasco da

Gama

com Pêro Anes,

E

assim natural que os pilotos da

tivessem

um

Lisboa, que parece ter sido

por i5o6,

passo que

estendiam para o equador, os navegadores portu-

se

gueses trataram de estudar as estrelas austrais

numa

Ao

do Cruzeiro.



conhecimento dela.

em Cochim,

desses pilotos, estuda

a constelação

do Cruzeiro

João de

e

no seu Tra-

tado da Agulha, de i5i4, ensina a determinar por ele o desvio da agulha, a latitude do lugar e as horas da noite, ficando assim comple-

tamente resolvido o problema que vinha sendo posto ha tantos anos.

As

referências de Corsali e Pigafetta são posteriores.

A estância, esta verdade

:

Que

que Vasco da

como

Gama

não vista de outra gente», exprime

estrela,

a nova constelação foi primeiro assinalada na

celeste pelos portugueses austrais.

em

que estamos comentando,

pois,

chama ao Cruzeiro «nova

esfera

mais adequada para as navegações

a

o Cruzeiro do sul era

uma

constelação

bem

portuguesa

devia ser tradição ainda viva no tempo de Camões.

2.

— Os

antárticos frios

e

os

ardores equatoriais.

Em

conti-

nuação da passagem, atrás citada (pág. \5o), em que Pedro Nunes diz que os portugueses, entrando sem receio pelo Oceano, descobri-

ram novas

terras,

novos mares

e,

o que mais

é,

novo céu

e

novas

estrelas, acrescenta:

«E perderanlhe torrada ^ona:

com que

tanto o

medo: que nem ha grande quentura da

o desconpassado frio da extrema parte do sul:

os antigos scriptores nos

que perdendo a

&

nem

estrella

do norte

:

ameaçauam

& tornandoa

passando ho temeroso cabo de Boa esperança

lhes

:

Ganges tam nomeado

a

grade Trapobana:

&

:

descobrindo

ho mar de Ethiopia

de Arábia: de Pérsia: poderam chegar a Jndia.

tais»»

pode estoruar:

a cobrar

Passaram o

as ilhas

:

rio

mais orien-

:

qA astronomia dos Lusíadas

f'f2

Esta firmeza de ânimo perante os ardores equatoriais antárticos

também

em

o poeta enaltece

Porque

os frios

e

VIII, 67

se eu de rapinas só viuesse

Vndiuago, ou da pátria desterrado,

Como

crés que

tam longe me

Buscar assento incógnito

&

viesse,

apartado

Porque esperanças, ou porque

?

interesse,

mar yrado, Os Antárticos frios, & os ardores Que sofrem do Carneyro os moradores

Viria exprimentando o

O

?

com que

receio da grande quentura da zona tórrida,

escritores

ameaçavam quem ousasse aproximar-se

os antigos

dela, era

uma

das

causas principais das murmurações que contra o descobrimento da

Guiné faziam, segundo João de Barros, não somente os mareantes,

mas ainda

de mais

pessoas

outras

(Década

qualidade

I,

liv.

I,

cap. iv):

«Cá segundo os

afirma q esta per que o sol anda a que elles

nam

é

Ora onde

habitada.

dentro do feruor do

mundo, todos

antigos escreuerã das partes do

sol,

chamam

manda

o jnfante

tórrida zona,

descobrir,

é já tanto

que de brancos que os homees sam, se

for alguu de nos, ficará (se escapar)

tam negro como sam



os Guinéus

vesinhos a esta quentura».

Já vimos no capítulo

vii (pág.

se afirma a inhabitabilidade

como no

94)

da zona tórrida

e

texto de Sacrobosco

das zonas glaciais, co-

mentando o tradutor Pedro Nunes, em anotação, que «as navegações dos portugueses nos amostraram que não ha terra tão destemperada por quente

E

nem

por

fria

em que

não haja homens».

este feito de ousadia perante os terrores

com que

a sciência

do

os portugueses

acabaram por

mostrar, que o poeta celebra na estância transcrita.

Propriamente

tempo os ameaçava, quando Vasco da

cuja falsidade

e

Gama

rar a figura do

Gama como

navegadores, que

viagem ]á aqueles terrores Samorim, devemos conside-

partiu para a sua

estavam dissipados, mas, na sua

fala ao

a personificação de toda essa sucessão de

êle continua, os quais

Crescendo cos successos borls primeyros

No peyto Pouco

Que

&

as ousadias, descobriram

pouco caminhos estrangeyros,

hus, succedendo aos outroá, proseguirdffl. (Vlll,

p).

IX — Nopo

Cap.

Os

do

frios

sul

como alcançam

céu

jj3

esquece o poeta que

uma

Sul,

&

fama amigos, não

das duras provas se experimenta

Vencendo os torpes

Do

Descrevendo

faziam particularmente sentir-se.

as honras imortais os que são de

no regaço

frios

regiões de abrigo nuas. (VI, 97).

A

Camões dá do maior

explicação que

austral,

por

rigor do frio no hemisfério

de abrigo da parte do polo, é a que se encontra na

falta

Ásia de João de Barros, na descrição da viagem de Fernão de Magalhães ao longo da costa sul-americana,

mar de Ponente (Década

III, livro

em

busca de passagem para o

V, cap.

ix):

«Seguindo seu descobrimento, chegarão a dous de abril do anno de quinhentos

em

está

&

vinte, a

cincoenta grãos

hum

:

&

que chamarão de são JuUão, que

rio a

com

isto já

tantas tormetas

&

frios,

que

podiam marear as velas. Porque naquellas partes de cUma* he mais frio, que da parte do Norte por razão do auge do sol, como querem os astrónomos, como

os mareantes não

o inverno, assi

em proporção

:

por ser desabrigado de terra firme da parte do polo».

Hoje

é

conhecido o regimen de correntes atmosféricas e marítimas

do Atlântico, que, na sua parte

sul,

comunica com o Oceano glacial

antártico por todo o largo espaço que vai desde o

das Agulhas.

A

consigo as aguas frias da corrente do costa africana.

Gabo Horn ao Gabo

corrente do Brasil, inflectindo-se para leste, arrasta

Ao

Gabo Horn que

longo da costa da Patagónia

dirige sobre a

vem do

sul a cor-

rente fria de F^alkland.

A

viagem de Magalhães

é o

último feito cantado nos Lusíadas:

Ao longo desta costa que tereis Yrá buscando a parte mais remota

O

Magalhães, no

feito

com verdade

Português, porem não na lealdade.

Desque passar

a via

mais que mea,

Que ao Antártico polo vay da

linha,

Dhíãa estatura quasi Gigantea

Homes

E

vera^,

Co nome

^

foi

Em proporção

da terra

mais auante o

ali

estreito,

vizinha:

que

delle agora, o qual

de clima

— quer dizer:

transcrito da edição de Lisboa, 1628.

se arrea

caminha

em proporção

da

latitude.

Este trecho

i']^

C/^

astronomia dos Lusíadas

& terra

Pêra outro mar

Com

que

fica

onde

suas frias asas o Austro a esconde. (X, 140 e 141).

Foi da terra vizinha àquele rio de S. Julião, situado por 5o° de a

austral,

latitude

mais de meia distância portanto do equador ao

polo antártico, que vieram os homens de estatura gigantesca, a que

Magalhães deu o nome de Patagões. Fernão de Magalhães deixou o seu nome ligado ao Estreito por descoberto. estelares

Gama

Na

esfera celeste o seu

nome

se juntou ainda às

que brilham no hemisfério austral.

Também

ele

Nuvens

o feito do

merecia ser comemorado entre as estrelas como diz Camões,

quando descreve

a partida de

Belém:

Pellas prayas vestidos os soldados,

De

E

varias cores

vem,

&

varias artes,

não menos de esforço aparelhados

Pêra buscar do mundo nouas partes:

Nas

fortes

nãos os ventos sossegados,

Ondeão os aerios estandartes» Elias prometem vendo os mares largos De ser no Olimpo estrellas como a de Argos. (IV, 85).

Os astrónomos não tão

se

lembraram de

merecida consagração.

A

Armada do Gama

heróica empresa terá

imorredoira nos versos do poeta, a e

fazer à

quem

foi

dada «uma

sonorosa», para cantar as glórias da sua pátria.

porem fama fúria

grande

X Â astronomia em Dante

A

I.

— No

máquina do mundo.

e

Camões

estudo que fizemos no anterior

capítulo a propósito da estância V, 14,

mostrámos que Camões celebra

nela este facto, que revela o saber náutico dos pilotos portugueses na

época dos descobrimentos: foram eles que, procurando na esfera celeste,

desde o meiado do século xv,

guia,

como no

um

Centauro, lando-o

numa

do Sul.

O

um

norte a Buzina, acabaram por descobrir, na região do

grupo de estrelas apropriado àquele uso náutico,

(n.

iso-

deram o nome de Cruzeiro

constelação distinta, a que

reconhecimento da origem portuguesa desta constelação

tem sido retardado pela opinião, aceite,

asterismo que lhes servisse de

que identificava

com

há poucos anos geralmente

até

o Cruzeiro as quatro estrelas que Dante

1205, m. i32i) põe junto do polo antártico, nos cantos

Os

Purgatório.

I e

VIII do

trabalhos, porem, de astronomia dantesca que ulti-

mamente publicaram, em

Itáha, Rizzacasa de

vieram provar cabalmente a falsidade de

tal

Orsogna

opinião.

e

F. Angelitti,

Vamos

indicar

o caminho por eles seguido, o que nos leva à análise das ideias astro-

nómicas de Dante, complemento indispensável a este nosso estudo de astronomia camoneana

Camões

*.

aliava ao seu engenho poético

Dante juntava ao seu génio poético

nham sóHdos conhecimentos

*

Neste capítulo tentamos fazer

teschi. sr.

.

.,

a

que

F. Angelitti.



um

uma

vasta erudição,

profundo saber.

como

Ambos

ti-

de astronomia, que Camões revela nos

um resumo

do genial estudo, Sugli acceni dan-

nos referimos, do ilustre director do Observatório de Palermo,

Pondo de parte

as fórmulas e cálculos minuciosos

que o acompa-

nham, limitamo-nos apenas a considerações geométricas elementares. Os admiradores de Dante e de Gamões, a quem os cálculos astronómicos não sejam familiares,

poderão assim fazer

na Rivista

di astronomia,

uma

ideia

aproximada de tão formoso estudo, publicado

Torino, anos dei9i2ei9i3.

qA astronomia dos Lusíadas

J'j6

Lusíadas

e

Dante manifesta nas suas poesias

prosa, particularmente

A concepção

em

//

do sistema do mundo de Camões difere nalguns pontos

da de Dante, que escreveu no alvorecer do século (Trat.

Cap.

II,

em

nas suas obras

e

Convito.

Em //

xiv.

Convito

explica Dante que Aristóteles suposera haver ape-

iii)

— os sete céus dos sete planetas, envolvidos pela esfera estrelas fixas — seguindo nisto os antigos astrónomos dum tempo

nas oito céus, das

,

em

de observações mais grosseiras,

que nas estrelas se notava ape-

nas a revolução diurna; mas Ptolomeu, sabendo

que a oitava esfera

àlêm do movimento diurno de oriente para ocidente

tinha,

da linha dos poios do equador,

em

trário

céu,

um movimento

lento

em

em

torno

sentido con-

torno da linha dos poios da eclíptica, descoberto por Hi-

parco, acrescentara

nono



chamado

um

novo céu por fora do céu estrelado.

cristalino

Este

ou primeiro móbil, era a esfera propul-

sora do movimento diurno que arrastava consigo todos os céus inte-

numa volta completa em quási 24 horas, isto é, em 28 horas e ^ duma hora, como Dante diz *; o movimento lento, que hoje chamamos de precessão dos equinócios, ficou sendo considerado como próA situação dos diferentes céus é em seguida prio da oitava esfera. riores

(Trat.

II,

«Ed

Cap.

iv)

assim descrita:

è 1'ordine dei sito questo,

che

primo che numerano

'1

dov' è la luna: lo

secondo è quello dov' è Mercúrio:

dov' è ¥enere

quarto è quello dov' è

è

Marte:

:

lo

lo sesto è quello dov' è

il

Giove:

Sole

:

è quello

lo terzo è quello

lo quinto è quello dov'

settimo è quello dov' è Sa-

lo

turno: Tottavo è quello delle Stelle: lo nono è quello che non è sensibile

se

non per questo movimento che

è

detto di sopra

chiamano molti cristaUino, cioè diáfano, ovvero Veramente, fuori

di tutti questi,

li

pongono

cattolici

^,

lo

Cielo Empireo,

che tanto vuol dire, quanto cielo di íiamma ovvero luminoso;

gono, esso essere immobile lo

luogo di quella

Tal

é a

Somma

E

quale

lo

tutto transparente.

questo quieto

e

pon-

e pacifico cielo è

Deita che sè sola compiutamente vede».

máquina do mundo de Dante, formada pelos nove céus de

Ptolomeu, movendo-se dentro do Empíreo

católico.

Tendo-se, porem, julgado necessário, para explicar desigualdades

que parecia haver no movimento da oitava esfera, atribuir-lhe

1 -^ de hora equivale a 4 minutos. O dia médio 4 minutos aproximadamente. 2 O movimento diurno, de que falou no Cap I

sideral é

iii.

menor que o

um

ter-

dia solar

X — QÂ astronomia em Dante

Cap.

Camões

e

ijj

ceiro

movimento, chamado de trepidação, teve de acrescentar-se mais

uma

esfera.

O

céu estrelado passou a

ter,

como próprio

vimento trepidatório; para a nona esfera, ou céu

movimento fera; o

cristalino,

mo-

passou o

lento de ocidente para oriente, antes atribuído à oitava es-

décimo céu, novamente acrescentado,

E

móbil, propulsor da rotação diurna.

Camões no canto X, dentro do Empíreo imóvel.

ficou

sendo o primeiro

assim a máquina do mundo,

constituída por dez esferas, girando

descrita por

O

dele, o

com

sistema de Dante concorda

o texto da Sphaera de Sacro-

bosco.

Pedro Nunes, na sua tradução desta obra, corrige o texto

original

em

cípio

anotações marginais, que deixámos transcritas no prin-

do Cap.

III

feita a descrição

com

(págs. 19 e 20); de acordo

estas anotações é

de Camões.

Sacrobosco atribue à oitava esfera o andamento de anos.

Pedro Nunes anota que

tal

grau

i

era a opinião de Ptolomeu,

em

100

mas que

acharam depois que este movimento de ocidente para nona esfera, e não era de i grau em 100 anos, mas de I grau e 28 minutos em 200 anos. Assim também diz Camões, em X, 86, que o nono céu anda os astrónomos

oriente pertencia à

Tam

lento

&

sojugado a duro freyo,

Que em quanto Phebo, de Dozentos cursos

faz,

da

luz

elle

nunca escasso

hum

passo.

Dante segue, como Sacrobosco, a opinião de Ptolomeu, atribuindo à esfera estrelada o

expressamente

em

andamento dum grau por

//

Convito (Trat.

11,

Cap.

movimentos do planeta Vénus, enumera no seu

epiciclo: segundo, o

completa

num

lo

la stella si

epiciclo

quello dei sole; //

primeiro, o do planeta

três:

do centro do epiciclo no deferente, que se

Dante descreve assim os

«Uno, secondochè

guendo

Assim o afirma

quando, contando os

ano; terceiro, o comunicado a todo o céu de Vénus pela

oitava esfera.

secondochè

século. vi),

il

si

terzo,

movimento delia

cento anni uno grado.

movimentos:

três

muove verso

muove con

tutto

il

lo

suo epiciclo; Taltro,

cielo

ugualmente con

secondochè tutto quel cielo stellata spera,

si

da occidente

muove,

se-

in oriente, in

Sicchè a questi tre movimenti sono tre mo-

vitori».

Dante não adopta pois, para a oitava

esfera,

o andamento pro-

posto pelos astrónomos afonsinos, extremamente lento, de 28 minutos

em

200 anos, ou

duma

volta completa

em

i

grau

e

47.000 anos,

JjS

cA astronomia dos Lusíadas

em Camões; nem

que encontramos de

grau

I

em

o andamento muito mais rápido,

duma

cada 66 anos, ou

volta completa

em

23.760 anos,

que Albaténio deduzira, comparando as suas observações das estrelas Antares, Coração do Lião,

e

com

Sírio

guindo, porem, Ptolomeu, adopta o movimento de

em

ou duma volta completa

Menelao;

as feitas por

36. 000 anos, valor

i

em

grau

que

é

se-

100 anos,

quasi a média

números 47.000 e 23.760. poeta vinha enumerando os diferentes movimentos

aritmética daqueles

O

na esfera de Vénus, que tores, já //

por

é a terceira,

ele definidos

a considerar

para contar os seus agentes mo-

no precedente capítulo (Trat.

11,

Cap.

de

v)

Convite:

«E adunque da sapere primamente, che cielo)

li

movitori di quello (terzo

sono sustanze separate da matéria, cioè intelligenze,

le

quali la

volgare gente chiama angeli».

Os movimentos do

terceiro,

bem como

de todos os outros céus,

são dirigidos por creaturas espirituais, puras inteligências, a que a gente vulgar

chama

categorias

três

anjos.

Estas creaturas angélicas repartem-se por

cada categoria compreende três ordens, havendo

e

assim nove ordens, correspondentes aos nove céus. goria

é

formada pelos Anjos, Arcanjos

e

A primeira

cate-

Tronos, que respectivamente

fazem mover os céus da Lua, de Mercúrio

e

de Vénus; as Domina-

ções, Virtudes e Principados constituem a segunda categoria e

respectivamente os céus do Sol, de Marte

e

movem

de Júpiter; finalmente as

Potestades, Querubins e Serafins, compreendidos na terceira catego-

dirigem os movimentos da esfera de Saturno, do Firmamento

ria,

do primeiro móbil

*.

Estas creaturas espirituais não actuam por contacto material;

zem mover

os céus, apenas entendendo.

lecto, é definida

tando no Trat.

de

//

fa-

inte-

vem comen-

Convito:

Voi che, intendendo,

1

Tal acção, por mero

no primeiro verso da canção que Dante 11

e

il

terzo ciei movete,

Esta enumeração das ordens e categorias é feita segundo a sucessão das es-

feras desde a primeira,

ordem de hierarquia o último os Anjos.

que

á a

No

A

da Lua, até à nona, que é a do primeiro móbil.

angélica é a inversa,

ocupando o primeiro lugar os Serafins

e

Paraíso, XXVIII, Dante segue a classificação de S. Dionísio

Areopagita, que inclue na primeira jerarquia os Serafins, Querubins e Tronos

;

na

segunda, as Dominações, Virtudes e Potestades; e na terceira, os Principados, Arcanjos e Anjos.

Cap.

X — qA astronomia

em Dante

CamÔes

e

lyg

onde invoca os Tronos que, entendendo, causam os movimentos do céu de Vénus.

Tendo contado três agentes

três

movimentos neste

céu, a que

correspondem

motores, Dante não mencionou ainda o movimento diurno,

por isso continua:

«Ancora

si

muove

questo cielo,

tutto

oriente in occidente, ogni di naturale

una

e rivolgesi coll' epiciclo, íiata;

lo

se esso é da intelleto alcuno, o se esso é dalla rapina dei bile,

me

Iddio lo sa, chè a

É

primo mo-

pare presuntuoso a giudicare».

ponto de dúvida para o poeta se o movimento de toda a esfera

uma

de Vénus de oriente para ocidente

como

da

quale movimento,

vez

em

os outros três, por algum intelecto, ou se

cada dia

é

produzido,

provêm da rapina do

primeiro móbil; parece-lhe presunçoso decidir; Deus é que sabe.

Não

tem, porem, esta dúvida no Paraiso, XXVIII, 70-78: Dunque

costui,

che tutto quanto rape

L'altro universo, corrisponde

Al cerchio che piú ama e che piú sape.

O

demonstrativo

o primeiro móbil, o qual arrasta

costiii indica

consigo (rape) todos os outros céus e corresponde, segundo Dante, ao círculo dos Serafins, a

ordem

angélica que mais participa do

amor

e

da sapiência divina.

Também

Camões, depois de

ter dito

corre, tão leve e tão ligeiro que

continua

em

que debaixo do Empíreo imóvel

se enxerga, o

Móbile primeiro,

X, 86:

Com Vão

este rapto

O

&

grande mouimento,

todos os que dentro tem no seyo

Por obra

Assim

não

dia

&

deste, o Sol

noite faz^

se explicava o

andando a tento

com

curso alheyo.

movimento diurno de todas

as esferas, le-

vadas na rapina do primeiro móbil, como diz Dante, ou no movi-

mento rapto, como

diz

Camóes.

Já no Cap. vi (pág. 58) vimos

Sacrobosco se exprimia a este respeito:

«Sed primus omnes

sphaeras secum impetu suo rapit intra diem,

&

noctem

circa

como alias

terram

semel».

Além

desta rotação comunicada pelo primeiro móbil a todas as

esferas, tinha o céu estrelado a sua revolução lenta trário, à

razão de

i

em

sentido con'

grau por século, segundo Dante, que tão presente

;

i8o

cA astronomia dos Lusíadas sempre

tinha

movimento que

tal

quando pela primeira vez a

«Nove

delia luce quasi ad

quando

zione,

appresso

fiate già

mia mente,

la

alli

êle conta a idade.de Beatriz,

se lê

na Vita Nuova,

miei occhi apparve prima

alia

EUa

chiamare.

lo cielo stellato era

quali

donna

mosso verso

la

parte d'oriente delle dodici

che quasi dal principio dei suo anno nono,

si

io la vidi quasi alia fine dei

mio nono anno».

Já o céu do Sol, no seu giro próprio anual,

ia

completar nove vol-

contadas desde o nascimento do poeta, que portanto

tas^

fim do seu nono ano, quando a gloriosa

primeira vez apareceu aos seus olhos.

dama do

das doze partes de

fixas

I

grau

em

loo anos, o avanço

em

100 meses,

triz

no seu primeiro encontro com Dante, i

Dante,

em

5. 200,

em em

i

de maio de 1274.

100 anos gastaria o

volta inteira.

duração de 7.000 anos apenas,

Colocando no ano

grau

de grau fazia-se

Mas

fir-

esta volta não

Alguns Padres da Igreja atribuiam ao mundo

chegaria a completar-se.

uma

uma

36.000 anos a dar

oriente estrelas

Tal era a idade de Bea-

8 anos e 4 meses.

Neste movimento lentíssimo de

mamento

mover para

dum duodécimo

em

isto é,

ela já estado nesta

Movendo-se a esfera das

grau.

i

quási no

ia

seu pensamento pela

Então tinha

vida o tempo bastante para o céu estrelado se

uma

delia

non sapeano

era già in questa vita stata tanto, che nel suo

Tuna d'un grado:

apparve a me, ed

i

lo cielo

sua própria gira-

la gloriosa

quale fu chiamata da molti Beatrice,

tempo

| II:

mio nascimento, era tornato

un medesimo punto, quanto

clie si

parti

ai

por

até

como

viu,

óu

e

Dante assim pensava também.

da criação o começo da era vulgar,

5 199,

cuja vida se tinham completado treze séculos depois de

Cristo, contava

como decorridos

culos de duração do

mundo.



no seu tempo sessenta

Faltavam apenas cinco

estrelado tinha volvido 65 graus, isto

é,

pouco mais

e cinco sé-

séculos.

dum

O

céu

sexto dos

O movimento celeste aproxiAssim o afirma em // Convito, Trat. 11, Cap. XV, quando compara o firmamento com a Física, pelo seu movimento diurno, e com a Metafísica, pelo seu movimento quási insen36o graus

duma

revolução completa.

mava-se da sua consumação.

de ocidente para oriente:

sível

«Ancora, per per di

lo

due movimenti, significa queste due scienze; chè

movimento, nel quale ogni

punto a punto, significa

mente compiono e di

fa

li

la fisica; e

in oriente

si

rivolve, e fa

nuova circulazione

cose naturali corrutibile, che cotidiana-

lor via, e la loro

questo tratta

da occidente

le

di

muta di forma in forma movimento quasi insensibile, che

matéria

per lo

si

per un grado in cento anni, significa

le

cose

X — qA aslronomta

Cap.

e

non avrebbe

chè

punto,

fine

;

Camões

la metafísica.

di queste trata

i8j creazione, e

di

E

peró dico che

significa quelle, che essa circulazione cominciò, che fine delia circulazione è redire a

uno medesimo

quale non tornerà questo cielo, secondo questo movimento,

ai

che dal cominciamento dei e

e

ebbero da Dio cominciamento

incorruttibili, le quali

non aranno fine, questo movimento

em Dante

mondo poço piíi

che la sesta parte è volto;

noi siamo già nelViiltima etade dei secolo, e attendemo veracemente

la

consumazione dei

celestiale

Tendo o firmamento

movimento».

volvido pouco mais

dum

revolução, Dante julgava-se no último milénio do

sexto da sua lenta

movimento

celes-

tial.

O

2.

duplo movimento da oitava esfera.

com Pedro Nunes, um tório,

triplo

— Gamões

movimento na oitava

considerava,

esfera: o trepida-

próprio dela; o movimento lento de ocidente para oriente, co-

municado pela nona esfera; e o diurno, causado pelo décimo céu, como mostrámos no Cap. iii. Dante, com Ptolomeu, considerava nela apenas um duplo movimento: o de i grau por século de ocidente para oriente

em

o diurno,

em

torno dos poios da eclíptica, que lhe era próprio, e

que era arrebatada pelo nono céu, como acabamos de

ver.

Atendendo sempre

a estes dois

movimentos, resolvia Dante o pro-

blema astronómico da determinação das

estrelas visíveis

dum

deter-

minado lugar da Terra em qualquer época e o problema recíproco deste, da limitação da zona terrestre donde uma determinada estrela se

pode

Ele ponderou até as circunstâncias da visibilidade do

ver.

céu estrelado

e

dos planetas, na hipótese teórica da não-existência do

movimento diurno.

Parecendo-lhe o primeiro móbil, pela sua acção

sobre as outras esferas,

comparável à Filosofia moral, na sua

cia sobre as outras sciências,

Convito, Trat.

ii,

parte dei

possibile fosse questo

nono

ancora non veduta

cielo sarebbe

delia terra; e Saturno sarebbe quattordici anni e

luogo delia terra celato, quasi, e

'1

e

sole, si

dici di e

//

Giovi

sei anni si

cielo

non muovere,

in ciascimo

mezzo

luogo

a ciascuno

celerebbe; e Marte un anno

sole cento ottantadue di e quattordici ore (dico di, cioé tanto

tempo quanto misurano il

em

Cap. xv:

«Onde ponemo che la ter^a

influên-

explica assim essa semelhança

celerebbero

e

cotanti di); e

Venere

mostrerebbero;

mezzo starebbe ascosa

e la

Mercúrio, quasi

Como

luna per tempo di quattor-

a ogni gente.

quaggiú generazione, nè vita d'animale

e

Di vero non sarebbe

e di piante: notte

non sarebbe,

qA astronomia dos Lusíadas

a



ma

nò seltimana, nè rncsc, nè anno;

dl,

disordinato, e

'1

cessando

meiíti,

movimento morale

la

tatto Tuniverso

sarebbe

non

altri-

Tallre seienze sarebbono celate

filosofia,

alcun tempo, e non sarebbe generazione, nè vita di

sarebbono

E

degli astri sarebbe indarno.

felicita, e

indarno

per antico trovate».

scritte e

Se o nono céu se não movesse, como Dante não seria levado na rotação de cada

os

dia,

firmamento

figura, o

homens contemplariam

uma abóbada celeste que a principio julgariam imóvel sobre o horizonte. No decorrer dos séculos verificariam que as estrelas iam desaparecendo lentamente do lado do oriente, surgindo novos astros do lado do ocidente e descobririam assim o movimento do céu estrelado

em

da

volta dos poios

eclíptica de

i

grau por século.

Os

habitantes

dos lugares por onde passa o plano da eclíptica estariam, relativa-

mente

a este

estão os habitantes

Em

em

movimento,

condições análogas àquelas

em

que

do equador a respeito do movimento diurno.

qualquer lugar do equador o hemisfério celeste que se vê no co-

meço da

noite, girando

em

torno dos poios, situados no horizonte,

acaba por desaparecer no fim de 12 horas, sendo substituído pelo hemisfério inferior; todas as estrelas

duma

semi-revolução diurna.

por Dante,

em

podem assim

ser vistas

no tempo

Analogamente, na hipótese figurada

cada lugar da Terra, situado debaixo da

eclíptica, se-

riam observadas todas as estrelas nó fim de 18.000 anos, tempo da semi-revolução do firmamento. parte do tempo criação, só

cada

um

um

duma

céu estrelado.

metade

Um

e

mais

um

sexto, e portanto dois terços

do

terço restaria ainda por observar.

com qualquer dos

poios da eclíp-

mó dum

moinho.

apenas, mas sim metade do

Nestes dois pontos não

sempre

céu,

ficaria

invisível.

Considerando o que sucede para os lugares intermédios, cujo nite fica entre a eclíptica e

em

em

sempre o mesmo hemisfério girando lentamente em torno

da vertical como a terço

volvidos 6.000 anos desde a

sexto da esfera celeste se teria tornado aparente

lugares cujo zénite coincidisse

tica ver-se-ia

um

é,

destes lugares, àlêm do hemisfério primitivamente visível;

ter-se-ia pois visto

Nos

Decorrida, porém, apenas a sexta

revolução, isto

qualquer dos seus poios, conclue-se

*

zé-

que

qualquer desses lugares estaria ainda por ver, decorridos sessenta

séculos,

menos que metade, mas mais duma

terça parte,

do firma-

mento.

Em t

suma, a afirmação dantesca que

um

Este problema é tratado completamente pelo

tmtomia, Torino,

vol. VI, págs, 5o6"5ii.

terço do céu estrelado

sr. Arigelitti

na RiPista di As-

X — qA astronomia

Cap.

não

em Dante

Camões

e

i83

no seu tempo, se a nona esfera

teria ainda sido vista

se

não mo-

em cada lugar da supermas em nenhum mais de dois

vesse, deve entender-se neste sentido: que fície

da Terra do cêu,

parte.

E

e

portanto estaria ainda por ver, pelo menos, a terça

certo que Dante contava

O

anos desde a criação. -?

de volta,



,

metade,

teria sido vista

terços,

como decorridos na sua

céu tinha avançado mais

vida

rigorosamente devia dizer que estariam por ver

e

do céu estrelado.

O

6. Soo

graus àlêm de

5

^

poeta preferiu porem a fracção simples

*,

ou

r,

ex-

*^

7-^

.

.

dum modo

primindo-se

costuma

ele

O

aproximado, grossamente assegnando, como

dizer.

caso teórico imaginado por Dante, que acabamos de resumir,

mostra como

mia

.

ele se

Vamos agora

esférica.

efectivo

Para

comprazia na resolução de problemas de astrover como êle considerava o movimento

do firmamento. da visibilidade das

distinguir as diferentes circunstâncias

trelas, resultantes

é conveniente

do movimento diurno,

num

lembrar como a esfera celeste

é dividida

em

com um

três regiões

em

por dois círculos menores paralelos ao equador, traçados cada polo como centro,

es-

lugar qualquer da Terra,

dum número

raio esférico

volta de

de graus

do lugar, as quais são: uma calote esférica

igual à latitude geográfica

contendo as estrelas circumpolares aparentes; a calote simétrica, das

zona intermédia,

estrelas circumpolares ocultas; e a

nascimento

Os

e ocaso.

terrestre e a celeste.

P' do equador é

e

O

dois círculos da

fig.

i

PZPZ'P, passando pelos dum ponto L da superfície

círculo

pelo zénite

o meridiano do lugar L.

Z

HH'

QQ

Q

P

poios

P

e

da Terra,

P

é

o polo boreal

o austral.

Consideremos primeiro

medida na esfera

real,

polo norte à latitude.

com um

um

lugar

L

celeste pelo arco

da calote esférica limitada

pelo. círculo

raio esférico

PH,

de latitude geográfica

HPAH é

ZQ.

menor, traçado

cp,

bo-

a projecção

em

volta

do

igual à altura do polo, e portanto

Esta calote contêm as estrelas circumpolares boreais, que

durante todo o movimento diurno

do horizonte HH'; trica

com

são as projecções do hori-

zonte racional e do equador sobre esse meridiano. Q

/das estrelas

representam a esfera

AIPHA,

em torno

de

PP^

se

é a calote circiimpolar aparente.

que cerca o polo

sul,

contêm as

conservam acima

A

calote simé-

estrelas circumpolares

austrais, que durante o movimento diurno se conservam abaixo do

1

os i8o

Em

6.5do anos o firmamento tinha volvido 65 gráus; faltavam

duma

semi-revolução, que se efectuaria

em

18.000 anos.

1

15

gráus pafa

i84

dA astronomia dos Lusíadas

horizonte

HH

é

;

HAQH'A'QH, as estrelas que

em

A

a calote circuinpolar oculta.

compreendida entre os paralelos

zona intermédia

HA

e

A'H', contêm

cada dia surgem no oriente, acima do horizonte de

L, para desaparecerem no poente.

em

Se,

vez de L, se tratasse

austral, seria

Cp,

polo sul;

A

e a

AH

circumpolar aparente a calote A'P'H'A', que cerca o

medida pelo arco

é

lugar L' de latitude geográfica

calote circumpolar oculta seria

distância do paralelo celeste

clinação é

de

dum

de igual valor,

AH

HPAH.

ao equador,

sua de-

isto é, a

^Q = 90° — i^^ = 90° — ^. A declinação

mas

Concluímos pois que,

austral.

num

lugar de latitude geográfica dada, os paralelos celestes, boreal e aus-

de declinação igual ao complemento dessa latitude, destacam

tral,

uma

volta dos poios celestes as duas calotes circumpolares, e

em

aparente

outra oculta.

Consideremos agora o problema recíproco, ísto é, como são vistas estrela as diferentes partes da superfície da Terra, durante

duma dada

a rotação diurna da esfera celeste.

ximo que passa pela Seja

S

linha dos poios

O

plano da figura

PP^

e

o valor da declinação do astro, isto

é,

em

ph mede

o

mesmo

5

má-

(fig. 2).

5Q

ao

é a projec-

dirigido para

no orbe terrestre o hemisfério,

cada instante visível ao astro S, do hemisfério

terrestre

HH

máximo perpendicular ao diâmetro SS'

a estrela; o plano deste círculo separa

o círculo

da sua distância

equador QQ', a qual começamos por supor boreal. ção do círculo

é

pela estrela dada

invisível.

ângulo que o arco celeste

PH^

O

arco

igual ao

Cap.

X — qA astronomia em Dante mesmo número

arco SQ, e portanto tem o

da

O

estrela.

e

com

'85

de graus da declinação

paralelo terrestre que se projecta

volta do polo terrestre boreal jp

Camões

em

^

em

ah, descrito

o raio esférico ji?/í, limita a calote

boreal terrestre que durante toda a rotação diurna se vê constante-

mente do astro S;

A

circumpolar aparente.

é a calote

calote simé-

trica a'p'h'a' conserva-se durante a rotação diurna invisível ao astro é a calote

os lugares da

ocultam à

zona intermédia haqh'a'q'h contêm

Terra que durante a revolução diurna aparecem

e se

estrela.

em

Se,

A

circumpolar oculta.

S;

vez de S, considerássemos

austral Q'S'

= B,

seria

uma

estreia S' de declinação

circumpolar aparente a calote

a'p'h'a' e

circum-

polar oculta a calote hpah.

O

paralelo terrestre ah dista do equador qq'

igual a go°

— hp,

ou a

90° —

5,

complemento da declinação do tude geográfica do

do astro S

é

mesmo

PS = go'' —

Conclue-se pois que para sul

q

sl

uma

arco aq, ou

hq',

isto é,

a sua latitude geográfica é o

astro.

O

valor,

'à,

um

mas

paralelo

austral.

a'/z'

Ora

tem uma

lati-

a distância polar

distância polar de S' é P'5'

= 9o^ —

estrela dada, situada ao norte

§.

ou ao

do equador, os dois paralelos terrestres de latitudes geográficas,

em valor absoluto, à distância polar da es, em volta dos poios do globo terráqueo as duas calotes uma aparente e outra oculta ao astro constantementet

boreal e austral, iguais, srêla,

destacam

circumpolares,

durante a revolução diurna.

Em

particular, se a estrela é equatorial e portanto

^^o,

as dua-

iS6

qA astronomia dos Lusíadas

calotes anulam-se,

em

todas as partes da superfície terrestre são,

e

cada dia sideral, aparentes ao astro durante 12 horas

e

ocultas du-

rante as outras 12.

Apliquemos o que

acaba de dizer às estrelas da Ursa maior

se

no ano de i3oo, para nos reportarmos à época da mística viagem des-

Na

por Dante na Divina Comédia.

crita

podem

tabela do Cap. viii (pág. 120)

ler-se as distâncias polares das sete estrelas principais

constelação nesse ano; a maior distância polar é a da 37*^ 6'

36",

em

que arredondaremos

a latitude geográfica boreal de

37°

37*^ 7'

O

7'.

tj,

de

daquela

ou

37*^,11,

com

paralelo terrestre

destacava pois, naquela época, a

calote circumpolar terrestre aparente àquela estrela, o que quer dizer

que todos os lugares da Terra, de latitude norte superior a 37°

conservavam

visíveis à

se

7',

Ursae inajoris durante a rotação diurna;

tj

e

portanto de todos esses lugares se podia ver aquela estrela constan-

E

temente acima do horizonte. restantes estrelas da

juntamente se podiam

também

que as suas distâncias polares são todas menores que a da

Como

a refracção atmosférica eleva 34' as estrelas,

junto do horizonte, a

de 37°

7',

Pode

Ursae majoris era 36^^

33'

vista

visto

tj.

quando passam

não só do paralelo

de latitude norte.

A ponta mais

aus-

latitude geográfica de 36^40'

N.

pois dizer-se que, no ano de i3oo, para toda a Itália, incluindo

a Sicília,

E

vj

mas ainda do de

da SicíKa tem proximamente a

tral

ver as

Ursa maior movendo-se em torno do polo,

era a Ursa maior

uma

constelação circumpolar aparente.

assim o afirma Dante no Paraiso, canto XIII, 7-9: Immagini quel Carro, a

cui

il

seno

Basta dei nostro cielo e notte e giorno. Si ch'al volger dei

temo non vien meno.

A

Ursa maior chamava-se também o Carro *; as três estrelas da cauda da Ursa formavam a lança do carro, sendo a vj a ponta da lança.

Diz o poeta que por toda a

para na abóbada celeste se ver dia

Itália e noite

o polo tinha altura bastante o Carro, que,

com

o volver

da lança (temo), não era deminuído pela descida de qualquer das suas^ do horizonte. Incluímos na Itália toda a Sicília, aten*

estrelas abaixo

dendo ao

efeito

da refracção.

Dante não conhecia

podia fazé-lo intervir nos seus cálculos,

não

este

mas podia

fenómeno saber,

e

como

notícia de facto, que a ponta da lança vinha passar rente ao horizonte

na extremidade mais austral da

1

Carreta lhe chama CamoeS

em

Sicília,

3C,

no seu tempo.

8§í.

Olha a carreta^ atenta a Cinosuraé

Cap.

As

X — qA astronomia

em Dante

Camões

e

i8'J

Can^o eram, porem, muito quando o poeta, saindo do Inferno com Vergilio «a riveder

circunstâncias de visibilidade do

diferentes, le stelle»,

se encontra

na

do Purgatório, numa situação antípoda

ilha

Observando no

de Jerusalém, por 32^ de latitude austral.

belo planeta que convida a amar, voltou-se à

do polo

sul

quatro estrelas,

mão

oriente o

direita e viu junto

que contemplou enlevado; volvendo de-

mal teve tempo de notar o desaparecimento do

pois ao nosso polo,

Carro, quando viu o velho Catão junto de Com'io

si:

dal loro sguardo fui partito,

Un poço me volgendo Là onde

airaltro polo,

Garro già era sparito;

il

Vidi presso di

me un

veglio solo,

Degno di tanta reverenza in vista, Che piú non dee a padre alcun figliuolo.

Em

32° de latitude sul cinco das estrelas do

lares ocultas,

Carro eram circumpo-

porque as suas distâncias ao polo norte

diam

entre 24^,57 e 3i°,36 no ano de i3oo.

com

37°, II

de distância polar,

e

uma

A

O

ocaso.

êle,

compreen-

ponta da lança, a

das rodas,, a

essas elevavam-se acima do horizonte do Purgatório, e

se

yj,

com 32°,44, com nascimento y,

poeta voltou-se para o polo norte, não para olhar para

porque este polo estava 32° abaixo do horizonte, mas para olhar

para o ponto do horizonte onde desaparecera a láltima estrela do Carro, o que tivera lugar

num

azimute de 20°, contado do norte para

oeste.

Tendo estado primeiro

tado ao

sul,

teve de efectuar

sobre a direita, ou

um

um

descrito pelo poeta,

contemplar as quatro estrelas volgiro de 160°, se continuou a volver

Em

giro de 200°, se volveu pela esquerda.

qualquer dos casos a expressão

pouco ao nosso polo,

a

líii

poço não pode

mas sim ao tempo. significa

referir-se ao arco

Dizendo que se volveu

que se voltou para olhar por

um

um

pouco

para o norte.

Camões não

se esquece de

mencionar a circunstância de ser a Ursa

maior desconhecida aos moradores do extremo cano,

em

sul

do continente

afri-

VIII, 72:

De

Affrica os

moradores derradeyros

Austrais, que nunca as sete flammas viram^

Foram

vistos

de nos, atras deyxando

Quantos estam os Trópicos queymando.

Gama, no Cabo das

Já Verificámos (págs. 121 e 122) que, na época da viagem do seis estrelas

Agulhas,

em

da Ursa maior eram circumpolares ocultas 35° de latitude austral.

Só a

yj

surgia no horizonte, ele-

iSS

qA astronomia dos Lusíadas

vando-se a menos de 4° na sua culminação, que só na primavera tinha lugar de noite. Podia pois Camões fazer dizer ao Gama que os moradores derradeiros austrais da Africa nunca viram a Ursa maior.

nunca podia estender-se milhares de anos

este

atrás,

como

E

resulta da

tabela de distâncias polares que nos serviu para essa demonstração (pág. 120).

Assim os maior

em

dois poetas se

latitudes

mento apenas

ocupam ambos da observação da Ursa

austrais.

teórico; o nosso

O

florentino tinha disso

um

conheci-

poude seguir com curiosidade o des-

aparecimento sucessivo daquela constelação, quando circumnavegou a costa africana.

O

lugar mais favorável à observação das estrelas é o equador,

onde numa noite podem todas ser a Ulisses,

quando na bolgia dos conselheiros fraudulentos conta

merária travessia este,

Dante faz notar este facto

vistas.

já fora

das colunas de Hércules

A

na ância de ver o mondo sen^a gente.

com rumo de

a te-

sudo-

chegada à linha equi-

nocial é admiravelmente descrita neste terceto: Tutte

le stelle già deiraltro

Vedea

la notte, e

Chenon

il

polo

nostro tanto basso

surgeva fuor dei marin suolo. {Inferno,

Chegando ao equador,

XXVI,

127-129).

Ulisses via já todas as estrelas austrais du-

rante a noite, e via o polo norte tão baixo, que não surgia fora do nível

do mar.

Enquanto remavam no hemisfério boreal, podiam contemplar

Avançando para o

todas as estrelas boreais e parte das austrais.

sul,

baixava o polo norte, diminuindo a calote celeste circumpolar aparente; a calote circumpolar oculta ia-se

também

reduzindo.

No

equa-

dor o nosso polo atingia o espelho das águas, e não só os astros boreais e

mas também

os austrais se ofereciam, todos, à vista de Uhsses

dos seus velhos companheiros.

Temos

até aqui atendido especialmente ao

movimento diurno, cau-

sado pela nona esfera, de que resultou termos de considerar no globo terrestre duas calotes circumpolares,

cada estrela, tendo por bases cada e austral,

um

de latitude geográfica igual,

polar da estrela; ou, o que é o

uma

aparente

e

outra oculta a

dos paralelos terrestres, boreal

em

valor absoluto, à distância

mesmo, duas

calotes tendo por vér-

tices os poios terrestres, e por bases os paralelos descritos

deles

mento

em

com um

raio esférico igual

lentíssimo,

à declinação

do

astro.

em

O

volta

movi-

porém, que a oitava esfera executa, dentro da nona,

sentido contrário da rotação diurna, faz variar a declinação das

X—

Cap. estrelas;

astronomia em Dante

Qyí

e

Camões

'8g

no decurso dos séculos aumentam portanto aquelas duas

deminuem quando ela decresce, anulando-se até, se a estrela durante aquele movimento lento vem passar no equador. É fácil ver, dum modo elementar, como esta calotes,

declinação cresce,

se a

e

variação se dá.

O

círculo

PCPCPy

ou primeiro móbil, poios P,

P

que na figura junta representa a nona esfera,

máximo

o círculo

é

do equador

e pelos poios

«coluro dos solstícios».

R, R' da eclíptica e se chama

a

é

ÇlQ

desta esfera que passa pelos

projecção, sobre o plano deste coluro,

do equador, cujo polo boreal

supomos

ser

CC

P;

é a

projecção

da eclíptica, da qual o polo boreal é

O

R.

coluro dos solstícios incide

perpendicularmente sobre os dois círculos eclíptica,

da nona esfera, equador

e

marcando no último o

ponto C, que

o primeiro ponto

é

do signo de Câncer,

ponto O,

e o

O

princípio de Capricórnio.

CQ, ou o seu

igual

arco

C'Q, cuja grandeza designamos por

As

clinação da eclíptica sobre o equador.

s,

oitava esfera; para termos a posição de qualquer delas,

marcamos nesta o ponto em que

aos círculos da nona,

raio tirado do centro da estrela fixa.

A

Terra para a

mede

a in-

estrelas estão situadas

estrela.

em

na

relação

a encontra o

S uma

Seja assim

sua latitude, cuja grandeza designamos por

P, é

me-

dida pelo arco SC, pois que as latitudes celestes são dadas pelo arco

do círculo máximo, que passa pelos poios da entre o astro e a eclíptica.

em

torno de

RR'

O

eclíptica,

compreendido

movimento lentíssimo do céu estrelado um círculo menor paralelo

faz descrever à estrela

à eclíptica, projectado

no segmento

rectilíneo SS'.

A estrela vai

des-

lisando relativamente aos círculos fixos da nona esfera, projectando-se

na figura segundo os pontos sucessivos da recta SS'.

mesmo

serva sempre o

valor

SC=^ = S'C'. A

A

latitude con-

declinação, porem,

contada desde o equador QQ^, vai variando: tem o valor máximo na s; tem posição S, em que é medida pelo arco SC-\- CQ = p

SCQ=

S',

— Q'C' = P — 3; endido entre ^ — e

Entre estes

S'C

e

+

medida pelo arco S'Q' = nas posições intermédias tem um valor compre-

em

o valor mínimo na posição

p

+

£.

que

é

mesmos

limites vai pois va-

riando o raio esférico das calotes circumpolares terrestres, aparente

uma,

e oculta a outra, à estrela

Se a estrela

é

considerada.

de latitude boreal,

como primeiro supomos,

a calote

qA astronomia dos Lusíadas

jgo

com

circumpolar aparente ao astro,

o seu vértice no polo norte da

Terra, tem o raio máximo, quando a estrela atinge,

em

o semi-

S,

coluro dos solsticios que passa por C, principio de Câncer; vai-se depois reduzindo e o raio da calote adquire o valor mínimo, quando

em

a estrela atinge,

S',

o semi-coluro dos solsticios que passa por O,

Então esta

principio de Capricórnio.

calote, de raio P



£,

é a

porção

da superfície da Terra que, no decorrer dos séculos, se conserva

sempre aparente ao astro: lote igual,

perpétua ocultação

de perpétua aparição.

é a calote

simetricamente traçada

em

Uma

ca-

torno do polo sul, é a calote de

que compreende a porção da superfície terrestre

*,

eternamente oculta ao astro.

O

inverso

tem lugar para uma

em

sua declinação é mínima cípio de Câncer,

e

S\_,

máxima em

estrela Si, de latitude austral; a

no semi-coluro que passa pelo prinS\, no semi-coluro que passa pelo

princípio de Capricórnio.

Nas considerações que acabamos de fazer, suposemos ser p maior que £, como a figura representa. Se fôr.p menor que s, o ponto S'

vem

Q

colocar-se entre Q' e C, no primeiro caso, e o ponto Si entre

e C,

no segundo; então, com o movimento lentíssimo do céu

lado, a estrela, quer seja boreal quer austral,

de perpétua aparição

e as calotes

QCl,

vem

estre-

passar no equador

de perpétua ocultação anu-

e

lam-se.

Apliquemos o que

se

acaba de dizer às sete estrelas principais

da Ursa menor, como Dante o para a inclinação da riável, era

nação

O

faria.

provavelmente de 23 graus

clássica, a

valor adoptado pelo poeta

considerada por ele

eclíptica,

mais recente por

e

meio.

um

elemento inva-

Esta era a determi-

ele conhecida, feita

em Marâghah

pelo astrónomo Nazir ad-din at-Tíàsi^, no ano de 1270.£ -= 23'^3o',-

pois

advertindo que

uma

diferença dalguns minutos não

produz alteração sensível nos resultados a que de cada estrela

bem

conhecia,

ia

Tomaremos

se chega.

A

latitude

o poeta buscá-la ao catálogo de Ptolomeu, que ele

como veremos.

talogadas por Ptolomeu, a de terceira grandeza, que

vem

Das

menor logo

sete estrelas

da Ursa menor, ca-

latitude é a Polar, classificada de

em

primeiro lugar designada pela

sua situação no extremo da cauda, «quae est in extremitate caudae».

A sua latitude celeste é de 66 graus, atingida por esta estrela durante p — £,

1

em

boreal.

o

A

declinação mínima

movimento lentíssimo do céu

Estas designações de perpétua aparição e de perpétua ocultação encontram-se,

alguns tratados de astronomia, impropriamente aplicadas às calotes a que atrás

chamamos circumpolar aparente 2

e

Rivista di Astronomia, tom.

circumpolar oculta. vi,

pág. 848, nota.

X — QÁ astronomia

Cap.



estrelado devia pois ser de 66^

2?)^

em Dante

e

em

igi

A calote de perpétua

3o' == 42° 3o'.

aparição para a Polar seria descrita

Camões

volta do polo boreal da

Terra

com um

raio esférico de 42° 3o'; limitá-la-ia pois pelo sul o paralelo

terrestre

com

Em

latitude geográfica de 90°

— 42° 3o',

isto é,

de 47°

3o'.

todos os pontos da Terra, de latitude geográfica boreal superior

a 47 graus e meio, era portanto a Polar uma estrela de perpétua aparição, e igualmente o eram também as outras seis estrelas da Ursa

menor, por terem a constelação da

latitude celeste

maior que a da Polar.

Para Dante

Ursa menor era de perpétua aparição em todos os

lugares situados ao norte do paralelo terrestre de latitude geográfica

47°3o'N.

Na

canção «Io son venuto

punto delia rota» começa assim Dante

ai

a terceira estância:

Fuggito é ogni augel che

caldo segue

'1

Dal paese d'Europa che non perde

Le

As

sette stelle gelide

unquemai.

aves que vão atrás do calor fugiram já da região da

que não perde nunca as sete estrelas gélidas. ladas são as da Ursa menor, situadas ao

na zona glacial ártica

hoje,

celeste.

A

deixa de ver esta constelação é a que

47 graus

e

que,

nia,

meio de

com

tempo de Dante, como ainda região da Europa que nunca ao norte do paralelo de

fica

latitude, e nela ficam as cidades

os centros mais afamados de cultura scientífica.

emigraram para o

na alegoria do poeta, aqueles das escolas de Paris

árabe Averroes

A

e

sul

filósofos

em

de Paris e Coló-

foram no século

as suas célebres Universidades,

região da Europa

Europa

Estas sete estrelas ge-

As

xiii

aves que desta

busca de calor significam,

que abandonaram as tradições

de Colónia para seguirem as doutrinas do

*.

expressão «stelle gelide» parece ser

uma

reminiscência da pas-

sagem da Eneida, VI, 14-17: Daedalus, ut fama

est,

fugiens Minoia regna,

Praepetibus pennis ausus se credere caelo,

Insuetum per

iter

gélidas enavit ad Arctos,

Ghalcidicaque levis tandem super

ares e,

1

Rivista di Astronomia^ tom.

2

Segundo

com

vii,

adstitit arce

págs. 5o9-5i8,

ousou cometer-se aos voou peio desusado caminho para as gélidas Ursas

a fama, Dédalo, fugindo dos reinos de Minos,

as suas asas velozes,

2.

deslizando levemente, parou afinal sobre a cidadela de Ghalcis.

:

:

qA astronomia dos Lusíadas

jg2

Mas

Vergílio não se refere propriamente às constelações das Ur-

sas; as gélidas Ursas (gélidas Arctos) indicam apenas o polo boreal

do mundo.

Dédalo, voando da ilha de Creta para a rocha Calcídica,

tomou a direcção do norte. na mente aqueles mesmos versos

situada na ilha de Eubea,

Camões devia

ter

quando designou o polo boreal I,

vergilianos,

em

Arcturo congelado,

celeste pelo

21

acharam juntos num momento, Os que habitam o Arcturo congelado,

Ali se

Arcturo

E

os que o Austro tem,

A

Aurora nasce,

é estrela

O

também

Arcturo congelado Posto que o

é o

frio Fasis,

Que pêra nenhum cabo

O

Bootes gelado,

Temessem

Numa

e

&

as partes

onde

o claro Sol se esconde.

de primeira grandeza, a principal da constelação

do Boieiro, ou Bootes; mas telação.

&

o teu

&l

dava

se

este

nome

Bootes gelado de

a toda a cons-

III,

71:

ou Syene a

sombra

inclina

a linha ardente.

nome

geralmente.

noutra estância o poeta indica,

com

a constelação, o polo

norte.

Voltando a Dante, consideremos o problema de duplo movimento do céu estrelado que

nos põe, quando, na praia do Purgatório,

ele

olha para o polo sul e vê quatro estrelas nunca pistas senão pela pri-

meira gente: Io

mi

volsi a

man

destra e posi mente

AlPaltro polo, e vidi quattro stelle

Non

Quem

mai fuor che

viste

era a primeira gente?

prima gente.

alia

Se era a primeira na ordem do

tempo, como quer a maior parte dos comentadores, deve entender-se

que a prima gente eram os primeiros habitantes de certas latitudes boreais, para

quem

do movimento boldt e os que

Eva com

tinham sido

as quatro estrelas

meiros tempos da criação

e

lento, próprio

seguem

do céu estrelado.

a sua opinião, a

nos pri-

Assim, segundo

Hum-

prima gente seriam Adão

os seus descendentes, que tinham vindo habitar na Ásia,

regiões situadas por 3o graus de latitude norte.

gente ser primeira na antigos dividiam o

ordem de

mundo

podem entender

e

em

Pode, porem, aprima

Vimos Como os como Assim também como primeira

situação no globo.

conhecido

primeiro o mais próximo do equador. gente se

visíveis

depois se tinham tornado ocultas, por efeito

os habitantes

em

sete climas, contando

duma zona compreendida

entre

:

X — qA astronomia em

Cap, o equador

e

!

um

Dante

Camões

e

igS

certo paralelo de latitude boreal, os quais, pela sua

posição mais favorável, eram os únicos que podiam observar as quatro estrelas.

O

poeta acrescenta, a seguir: Goder pareva

O

il

ciei di lor fiamelle.

vedovo

settentrional

Poichè privato

sito,

mirar quelle

sei di

Havia pois uma região septentrional privada da estrelas.

vista das quatro

Neste caso era ela constituída pela

Privada eternamente?

calote terrestre de perpétua ocultação para aquelas estrelas.

Senão,

pode supôr-se que era formada pelos lugares da Terra donde elas

puderam

ser observadas nos primeiros

pois deixado de o ser

em

virtude do

Aqui temos pois de resolver

um

tempos da criação, tendo de-

movimento

lento

que Dante ponderou, atendendo à rotação diurna

chamamos de precessão dos

hoje

e

rio. — Dante,

esférica,

ao movimento que

equinócios.

As observações astronómicas matutinas na

3.

do firmamento.

problema de astronomia

ilha

do Purgató-

seguindo a opinião corrente no seu tempo, entendia que

a terra emersa, la

gran

secca, se continha toda

num

trapézio esférico

rectângulo, fechado ao sul pelo equador, pelo círculo polar ártico ao norte, e por dois arcos de meridiano, afastados

em

longitude,

emersa,

em

a leste

e

a oeste.

No

um

do outro i8o graus

meridiano central da terra

32 graus de latitude boreal aproximadamente, estava

tuada Jerusalém

O resto

*.

do globo era coberto pelas águas

mondo sen^a gente. Neste mundo sem gente imaginou

si-

e cons-

tituía il

tório

o poeta a montanha do Purga-

emergindo das águas, numa situação antípoda de Jerusalém.

esta situação faz várias referências.

Assim, quando, depois duma

A ás-

pera subida por aquela montanha, os dois poetas se sentam voltados ao levante, para contemplarem o caminho andado, Dante, vendo-se

iluminado do lado esquerdo pela luz solar, ficar

que o

sol lhe fica

Come

ao norte;

ciò sia, se

il

e

fica estupefacto

ao veri-

Vergílio explica:

vuoi poter pensare,

'

Dentro raccolto, immagina Siòn

Gon questo monte Si^

in su la terra stare

che ambedue hanno un solo orizzòn

E

diversi emispere {Purgatório^ IV, 67-71).

*

Assim

se interpretava a

DominusDeus: terras».

passagem da Bíblia

Ista est Jerusalém, in

(E^eqiiiel^ V, 5):

médio gentium posui eam,

«Haec

dicit

et in circuitu ejus

;

ig4 ffse

dA astronomia dos Lusíadas queres compreender

como

gina o monte de Jerusalém a

recolhido dentro

isto seja,

em

ti,

ima-

monte do Purgatório situados sobre Terra, de forma que ambos tenham um horizonte comum, ficando

em

e este

hemisférios diametralmente opostos».

Está aqui claramente

cada a posição do Purgatório, antípoda de Jerusalém,

e

indi-

numa

portanto

latitude austral de 32 graus.

A

primeira indicação a respeito da posição do

época da mística viagem,

no zodíaco, na

dada por Dante no Inferno,

é

quando uma onça de pele mosqueada

Tempo E il

sol

se lhe atravessa

87-43,

I,

no caminho:

era dal principio dei mattino

montava su con quelle stelle Gh'eran con lui, quando Tamor divino Mosse da prima quelle cose belle; Si che a bene sperar m'era cagione sol

Di quella fera

alia gaieta pelle,

L'ora dei tempo, e

Rompia

la

dolce stagione.

manhã, e o sol ia surgindo com aquelas estrelas que dele, quando o amor divino primeiro fez mover aquelas

a

estavam junto

formosas cousas; eram de

bom

agouro a variegada pele da onça, a

Era pois uma manhã de primavera. e a doce estação. Era tradição antiga no tempo de Dante que o mundo fora criado na

hora do dia

primavera, na época do equinócio; o

sol tinha sido criado

no signo de

Sacrobosco, no seu opiísculo Computns Ecclesiasticus, quando

Aries.

faz a descrição dos signos,

«Primum

igitur

signum

começa assim est Aries,

a de Aries:

quoniam secundum quòd

credit

Ecclesia, in eo factus est sol».

No

Reportório dos tempos do nosso André do Avelar ainda se

descrição do signo de Aries: a

na

Tal era também a opinião de Dante.

maior opinião de todos».

tercetos finais do Inferno, Vergílio guia Dante pela vereda

Nos

escura por onde sobem, que, por

uma

céu contém,

ram no



«Neste signo criou Deos o Sol, segundo

e

sem descanço, de

volta ao chiaro mondo, até

abertura redonda, avistam enfim as belas cousas que o

por ela saem a ver de novo as estrelas.

Purgatório.

Assim

se acha-

Dante nota então com prazer o aspecto do céu,

que descreve nos nove tercetos que vamos transcrever (Purgatório,

I,

13-39): Dolce color de oriental

Che

Dal mezzo

1 Dal me^^o DeWaer.

zaffiro,

s'accoglieva nel sereno aspetto ^

puro infino

ai

primo

giro,

é a lição exacta, restituída pela crítica diplomática,

cm

vez de

!

X — qA astronomia

Cap.

em Dante

Camões

e

igS

Agli occhi miei ricominciò diletto,

Tosto

eh'

i'

uscii fuor delPaura

Ghe m'avea contristati

morta,

occhi

gli

e

il

petto.

Saindo da atmosfera morta que lhe tinha contristado a vista e o coração, deleita-se contemplando de novo o azul de safira, que desde o zénite (me^io, me^^o dei capo) se estendia até ao horizonte (primo giro).

Lo

amar conforta

bel pianeta che ad

Faceva tutto rider Toriente,

Velando

O

i

Pesei che erano in sua seorta.

amar

belo planeta que convida a

em

velando os Peixes, que vinham

fazia sorrir todo o oriente,

O

sua escolta.

O

sobe no oriente antes do signo de Aries. aqui ao signo ou à constelação dos Peixes.

signo dos Peixes

poeta pode referir-se

No

seu tempo o desvio

entre os princípios das constelações zodiacais e os dos signos, resultante do

movimento de precessão, era

de 20 graus, estendendo-se



por isso estas constelações desde o vigésimo grau do signo do

nome Aries,

até

ao vigésimo grau do signo seguinte.

Estando o

mesmo sol em

o surgir dos Peixes, signo ou constelação, no horizonte do

um

oriente, indica que se está

Io

mi

volsi a

man

pouco antes do romper de

alva.

destra e posi mente

Airaltro polo, e vidi quatro stelle

Non

viste

mai fuor che

Goder pareva

O

il

settentrional

Poiehè privato

O poeta, se fica

vedovo sei di

prima gente.

sito,

mirar quelle

olhando para o oriente, tinha o polo norte à sua esquerda.

Volvendo à mão

Nada

alia

fiammelle.

ciei di lor

direita

contempla o polo

sul e

vê quatro estrelas.

sabendo a respeito da posição delas relativamente ao ho-

rizonte e ao meridiano; apenas se fica julgando que estariam junto do

polo austral. diz

Quanto

à posição que

estrelado, só nos

que nunca foram vistas senão pela primeira gente,

sitio

e

que há

um

septentrional privado de as ver, que o poeta por isso lastima, cha-

mando-lhe viúvo (vedovo

mia

ocupam no céu

sito).

Já indicámos o problema de astrono-

esférica, envolvido nestas indicações.

Com'io dal loro sguardo

Un poço me Là onde

il

Vidi presso di

fui partito,

volgendo alFaltro polo,

Garro

me un

già era sparito,

veglio solo,

Degno di tanta riverenza in vista, Ghe piú non dee a padre alcun íigliuolo.

;

'

igô

qA astronomia dos Lusíadas

Deixando aquelas

Na

boreal.

estrelas, voltou-se

em

latitude austral

vinham acima do horizonte, como (yj

por algum tempo para o polo

que se achava, duas estrelas do Carro

notámos.



A

Ursae majoris) desaparecera, quando viu junto de

ponta da lança o velho Catão,

si

inspirando tanta reverência, que mais não deve filho algum a seu pai.

Lunga

barba e

la

Portava,

a'

bianco mista

di pel

suoi capegli simigliante,

De' quai cadeva

ai

petto doppia

lista.

Li raggi delle quattro luci sante

Fregiavan Gh'io

Os

il

si la

sua faceia di lume,

vedea come

Sol fosse davante.

il

lançavam tanta

raios das quatro luies santas

de Catão, que ela parecia iluminada pelo

luz sobre a face

Catão de

sol.

do Purgatório, interroga os poetas sobre a sua vinda, pois do diálogo

com

E

Vergílio.

só então é que é o

titica,

guarda

desaparece de-

e

romper de

alva:

L'alba vinceva Fora mattutina,

Ghe

fuggia innanzi,

Gonobbi

il

che

si

di

lontano

tremolar delia marina. [Purgatório,

I,

As observações astronómicas em que Dante

um

pouco antes do romper de

iiS-iiy).

se estava

comprazendo

alva, interrompidas pelo

aparecimento

de Catão, são continuadas depois na tarde desse

4.

As observações astronómicas

vespertinas.

mesmo

dia.

— Ao cair

da tarde

do dia da chegada ao Purgatório, os poetas, guiados por Sordelo,

caminham na montanha por uma vereda direcção ao vale

em

tortuosa a

que deviam passar a noite.

do ocaso, quando chegam à

meia encosta,

O

sol

em

aproxima-se

do vale onde contemplam as almas

vista

que, sentadas sobre a erva e as flores, cantam a Salve Regina.

Chega

delo mostra a Vergílio várias personagens.

a

Sor-

hora da Ave-

Maria: Era

già Tora che volge

Ai naveganti

Lo

E

che

di lo

il

ch'han detto

a'

il

cuore

dolci amici addio

nuovo peregrin d'amore

Pange, se ode squilla

Ghe

disio

e entenerisce

paia

'1

di lontano,

giorno pianger che

si

muore.

{PurgatóriOy VIII,

Era

já a

1-6),

hora que faz volver à pátria o desejo dos navegantes

lhes enternece o coração, no dia

em

e

que disseram adeus aos amigos

I

:

Cap.

X — c4 astronomia

em Dante

e

Camões

igj

queridos; a hora que punge de saudade o peregrino, há pouco sepa-

rado dos seus, quando ouve ao longe o toque da Ave-Maria, que parece chorar o dia que morre.

Então a multidão das almas entoa o hino Te

E

lucis ante.

aquele exército gentil, terminado o cântico sagrado,

quando

pálido e hu-

fica,

milde, olhando para o céu, descem do alto dois anjos de azas verdes,

empunhando espadas de

Sordelo diz que eles

fogo.

vêem para guardar

o vale contra a serpente que se aproxima, e convida os poetas a des-

cerem ao lugar onde vão passar a noite. Dante anda apenas três passos quando reconhece o seu amigo Nino Visconti, a quem, depois de afecNino queixa-se da sua viúva, tuosas saudações, explica a sua vinda. que passara a segundas núpcias.

uma pausa

Segue-se

aproveita para retomar a observação do céu, que de

que Dante

manhã

viera in-

Curioso sempre de ver a desconhecida

terromper o velho Catão.

re-

gião polar austral, os seus olhos dirigem-se ávidos para o céu estrelado,

apenas

pontos



(pur

là)

onde as estrelas são mais vagarosas, como os

duma roda mais próximos do Gli occhi miei ghiotti

Pur



Dante contemplava

andavan puré

le stelle

come ruota

Si

gunta-lhe:

dove

eixo {Purgatório, VIII, 85-98):

ai cielo,

son piú tarde,

piú presso alio stelo.

do polo

as vizinhanças

«Filho, para onde olhas, lá

Vergílio per-

austral.

em cima?»

E

Dante responde;

«Para aquelas três estrelas que incendeiam o polo do lado de cá»

E

11

duca mio: «Figliuol, che lassú guarde?»

Ed

io a lui

Di che

:

«A

quelle tre facelle,

polo, di qua, tutto arde».

il

Vergílio faz-lhe então notar que as quatro estrelas claras que

nham

visto de

manhã

estão agora

em

baixo, do lado de

lá, e

ti-

que estas

três tinham subido para o lugar que aquelas ocupavam de manhã:

Ed

egli a me: «Le quattro Che vedevi staman, son

E

Mas

chiare stelle di là, basse,

queste son salite ov'eran quelle».

Vergílio é interrompido por Sordelo, que mostra a serpente

que, no fundo do vale, avançava por entre a erva e as flores.

observações celestes

A

E

as

terminam assim.

altura do polo sobre o horizonte era de 32 graus, pois tal era a

latitude

do Purgatório.

Podemos

esquerdo levantado para o

alto,

representar-nos Dante,

numa

com

o braço

inclinação duns 40 graus, apon-

qA ãslronomia dos Lusíadas

igS

com o braço direito estendido a uma altura duns 20 graus, apontando com As três o indicador para as quatro chiare sielle, já vistas de manhã.

com

tando

o dedo indicador para as três facelle, e Vergílio,

vão

estrelas

altas {lassú),

próximas da sua passagem superior pelo me-

ridiano, ficando do lado de cá do polo, isto

é,

entre este e o zénite; as

quatro estão baixas, próximas da passagem inferior pelo meridiano,

do lado de

O



do polo,

drugada desse

damente

a

Os

dia.

mesma

dois grupos de estrelas

declinação, distando, porem,

forma que, quando se

entre este e o ponto sul do horizonte.

isto é,

primeiro grupo subiu à posição que o segundo occupara na ma-

um

devem

em

ter

aproxima-

ascensão recta por

passagem superior meridiana, o outro ambos são circumpolares aparentes no

vai na

aproxime da inferior;

e

Naquela manhã de primavera, quando os Peixes surgiam no oriente, o grupo das quatro estrelas subia à sua culminação e o grupo das três descia à passagem inferior no meridiano; o in-

Purgatório.

Os

verso tinha lugar de tarde.

dois grupos

dos perto do coluro dos solsticios, a

um

e

devem

pois estar situa-

outro lado do polo austral

do equador.

^Quantas horas decorreram entre tarde

as

observações da

manhã

e as

Bastante grosseiramente tem sido avaliado este intervalo

?

da

em

As observações matutinas foram feitas um pouco antes do De tarde, na hora da Avc-Maria, ou seja, meia hora depois do pôr do sol, as almas cantam todo o hino Te liicis ante. Descem os dois anjos, segue-se o colóquio com o juiz Nino Visconti, 12 horas.

romper de

e

alva.

terminado

Supondo assim

que Dante contempla as estrelas.

êle é

decorrida outra meia hora, colocaremos as observações da tarde

que a viagem

nascimento do dia durado 1

hora

e vinte

quinze dias depois do equinócio da primavera, o

foi

no Purgatório seria às 6 horas

sol

tempo verdadeiro 1 1

e

e

o ocaso às 5 horas

horas

e

meia.

cinco minutos.

A

sol,

e

ainda

i

e três

e

um

quarto de

quartos, tendo portanto

duração do crepiásculo fora de

Entre as duas observações teriam

pois decorrido: o crepiásculo matutino,

nascer ao pôr do

as 11 horas e

hora, o que perfaz

meia desde o

um

intervalo de

14 horas entre as observações celestes matinais, supostas feitas

pouco antes do romper de feitas e

I

alva, e as observações

hora depois do ocaso do

sol.

depois do equinócio



Rivista di Astronomia, iom.

vii,

um

da tarde, supostas

Este intervalo seria de i3 horas

meia, na hipótese extrema da viagem ter sido

1

uma

Admitindo, como parece mais provável,

hora depois do sol posto.

pág. í3h

feita vinte e cinco diaâ

Cap.

X — qA astronomia

em

t)ante e

Camões

Resta-nos agora saber se aqueles dois asterismos, e o outro

um

triangular

quadrangular, são formados por estrelas reais, ou se são

Precisamos pois averiguar

de pura ficção do poeta.

se nos globos

ou nos catálogos de estrelas, conhecidos de Dante,

celestes,

separar

íg^

um

grupo de

três e

um

grupo de quatro

é possível

que da

estrelas,

ilha

do Purgatório pudessem ser observados nas condições de posição definidas pelo poeta.

O

5.

catálogo de Ptolomeu,

Ptolomeu era no tempo de Dante,

—O e

catálogo de 1.022 estrelas de

continuou sendo até ao século xvi,

Dante não

o código fundamental da astronomia sideral de posição. só o conhecia,

mas

atribula até grande importância ao

número

1.022

de estrelas nele descritas. Já nos referimos (pág. 167) a este catálogo, que se encontra nos Libs. VII

e

VIII

do Almagesto, verificando que nele

se registam, in-

cluídas na constelação do Centauro, três estrelas do Cruzeiro do Sul,, faltando,

porém, aquela que forma a cabeça da cruz

(j

Cr^ucis).

As estrelas são descritas pela ordem de 48 constelações, e as que não fazem parte de nenhuma delas encontram-se a seguir a uma constelação vizinha.

O

e latitude celestes,

catálogo dá as coordenadas eclípticas, longitude

das estrelas,

buídas por seis ordens.

e as

suas grandezas aparentes, distri-

Estão registadas 1.022 estrelas, entre as

quais i5 de primeira grandeza ^

A

época a que se refere o catálogo de Ptolomeu

é

o primeiro ano

do império de Antonino Pio, correspondente, segundo uns, ao ano de iSy da era vulgar,

«([

e,

segundo outros, ao ano de i38.

Sunt autem omnes

stellae

tum boreales tum

Magnitudinis ([

Primae

SecGdae

australes. 1022.

diferença

Quarum

* i5

45

Tertiae

208

Quartae

474

Quinta e

217

Sextae

A

49

Obscurae

9

Nebulosae

5

Et cincinnus». Encotitra-se este resumo final do catálogo de Ptolomeu citada, fl.

48V.

do Almagesto,

feita

ria

tradução, já atráa

por Trapezúncio e revista por Gaurico, Veneza, i528,

qA astronomia dos Lusíadas

200

dum

ano não tem porem importância nenhuma, atentas as condições

As observações que

de precisão das coordenadas registadas.

ram de base

ao catálogo foram feitas

em

Alexandria,

numa

servi-

latitude

boreal de 3i graus.

Da e

teoria do

movimento da

adoptada por Dante, resulta

uma

para

trelas

lado

uma

regra simples

obteem, es-

Efectuando-se o movimento própHo do céu estre-

sempre à

eclíptica, ficando

distância dela; as latitudes celestes não são pois alteradas por

aquele movimento.

As

épocas.

As

latitudes

do catálogo servem para todas as

longitudes celestes, que, a partir do primeiro ponto do

signo de Aries, se contam na eclíptica segundo a até ao

se

torno da linha dos poios da eclíptica, as estrelas descrevem

lentamente círculos paralelos ao plano da

mesma

com que

época dada, as coordenadas eclípticas de qualquer das

do catálogo.

em

Ptolomeu

oitava esfera, exposta por

ponto

estrela, essas

em

que ela

ordem dos

é cortada pelo círculo de latitude

vão aumentando à razão de

i

grau por século.

signos

de cada

Sabido

o intervalo de tempo que separa a época dada da época do catálogo,

tomar-se hão tantos graus quantos os séculos completos contidos nesse intervalo, juntando-lhe tantas vezes 3 minutos quantos os lustros

com-

pletos a mais, e ainda tantas vezes 36 segundos quantos os anos restantes; os graus, minutos e segundos, assim obtidos, somar-se-hão, ou

subtrair-se-hão, da longitude registada da estrela, conforme a época

para que se quer a posição do astro

é posterior,

ou anterior, à época

do catálogo.

Para tesca,

se

terem

na época da viagem dan-

as posições das estrelas

que pode ser o ano de i3oo ou i3oi da era vulgar, contaremos

como decorridos

i.i63 anos desde a época do catálogo.

anos conteem-se

u

longitudes das estrelas

gundos, de

modo

Em

j.i63

séculos, 12 lustros e 3 anos, durante os quais as

aumentaram

11 graus,

36 minutos

e

108 se-

que, para ter as longitudes das estrelas na época

da mística viagem, Dante juntaria às longitudes, dadas por Ptolomeu, II

graus

e

38 minutos, número redondo.

Para determinar

as posições das estrelas

na época da criação, con-

taremos 5.336 anos decorridos desde a criação até à época do catálogo.

O

primeiro ano da era vulgar correspondia, segundo as indi-

cações dantescas, ao ano de 6199 ou 6200 da criação.

anos se conteem 53 séculos, 7 lustros trelas

de

e

i

variaram neste intervalo 53 graus, 21 minutos

modo

Como em

5.336

ano, as longitudes das ese

36 segundos,

que, para ter as longitudes das estrelas naquela época, Dante

subtrairia das longitudes, dadas por Ptolomeu, 53 graus e 22 minutos,

número redondo.

No

Paraíso, XlII, 4-6, refere-se Dante às quinze estrelas

classi-

X — qA astronomia

Cap.

cm Dante

Camões

e

20I

Ptolomeu na primeira grandeza, quando convida quem

ficadas por

bem

queira entender

o que ele viu, a imaginar

Quindici

Lo

stelle,

che in div.erse plage

cielo avvivan di tanto sereno,

Che soperchia

As quinze

em

que

estrelas,

deli'

aere ogni compage.

com

diversas plagas avivam o céu

tanta luz que atravessa toda a espessura do ar, são as quinze estrelas

de primeira grandeza do catálogo ptolomaico.

Em

Convito, Trat.

//

Caps. xiv

11,

xv, Dante mostra a seme-

e

mundo com

lhança das esferas componentes da máquina do junto das sciéncias do seu tempo.

por

As

comparadas sucessivamente às

ele

sete sciéncias

do

trivio e

astronomia.

fera

com

Em

seguida explana a semelhança da oitava es-

a física por três motivos,

— pelas

1.022 estrelas nela obser-

vadas, pelo seu polo aparente e pelo seu movimento diurno

com

sua semelhança

do

geome-

quadrivio: gramática, dialética, retórica, aritmética, música, tria e

o con-

sete esferas dos planetas são

a metafísica por outros três,



;

e a

— pela via láctea^

pelo polo oculto e pelo seu movimento lentíssimo de ocidente para oriente



Depois compara a nona esfera à sciência moral,

.

mente o céu imóvel, o Empíreo, à

E mero

quando

se

e final-

teologia.

ocupa da oitava esfera que Dante se refere ao nú-

1.022 das estrelas catalogadas no Almagesto:

«Per che per ordine

è

da vedere prima

poi quella delia metafísica.

física, e

niolte stelle

;

chè, secondochè

li

Dico

savii

comparazione delia

la

ch'il cielo stellato ci

d'Egitto

mostra

hanno veduto,

infino

alFultima stella che appare loro in miridie, mille ventidue corpora di stelle

pongono,

di cui io parlo» (// Convito, Trat.

11,

Cap.

xv).

Aqui consigna pois Dante que, segundo o que os sábios do Egipto poderam observar até à última estrela que ao sul lhes aparecia, contaram 1.022 corpos de os números dois, vinte lhança do céu estrelado

«E si

in questo

com

lo

seguida considera subtilmente

para explicar

uma

ha esso grandíssima similitudine

due s'intende

il

tre

movimento

altri

nove,

e

béne

e venti, e mille:

locale, lo quale è

terazione: chè, conciossiacosachè dal dieci in

esso dieci alterando cogU

colla física, se

numeri, cioè, due,

da un punto

movimento su non si vada

a un altro di necessita: e per lo venti signifíca

í5

das razões de seme-

a física:

guardano sottilmente questi

che per

Em

estrelas. e mil,

il

con sè stessoj

e la

delFal* se

non

piú bella

^02

qA astronomia dos Lusíadas

alterazione, che esso riceva,

che riceva

si

movimento

significa.

si

si

può

mostra

soli

se

sua di sè medesimo;

E

per

lo mille significa 7nille,

è

il

movimento

maggior numero,

E

non questo multiplicando.

la fisica;

il

prima

e la

ragionevolmente per questo numero

è venti;

cere; chè in nome, cioè questo

cere non

è la

e

detto

il

dei cres-

piú cres-

movimenti

questi tre

siccome nel quinto dei primo suo libro

è pro-

vato».

Este trecho mostra

bem como Dante

se

em

comprazia

meditar a

composição deste número 1.022 das estrelas catalogadas, que servara inalterado desde Ptolomeu até ao seu tempo, bula

uma

As

em

em

se con-

ao qual

atri-

importância cósmica.

posições das estrelas

podiam também

ser estudadas por Dante

globos celestes, que não faltavam no seu tempo.

hoje

e

Itália dois

Existem ainda

exemplares de globos celestes árabes, construídos

antes de êle escrever a Divina Comédia, baseados sobre o catálogo

de Ptolomeu.

Um, do

ano de 1080, conserva-se no Museu de

mentos antigos de astronomia

física e

do ano de 1226, que no século

tro,

deal Borgia,

em

Velletri, e

xviii fazia parte

por isso

horgiano, está actualmente no

é

instru-

matemática de Florença; o oudo Museu do Car-

conhecido pelo

nome de globo

Museu Nacional de Nápoles.

Qual-

quer deles podia ter sido estudado pelo poeta.

Vimos como Dante podia facilmente deduzir do maico

O

as

catálogo ptolo-

coordenadas eclípticas das estrelas para qualquer época.

conhecimento das coordenadas equatoriais, ascensão recta

e decli-

nação, era-lhe, porem, indispensável para a resolução dos problemas

O

que as suas referências astronómicas implicam. que passa pelos poios do equador rário, ou círculo de declinação,

compreendido entre o astro tingue

em

e

e

por

uma

círculo

máximo

estrela é o círculo ho-

dessa estrela; o arco deste círculo

o equador é a declinação, que se dis-

boreal e austral; a ascensão recta é o arco do equador con-

tado para leste, no sentido directo, desde o equinócio vernal até ao

ponto

em

Dadas

que o círculo de declinação da estrela corta o equador. as

coordenadas eclípticas

duma

estrela,

podem

obter-se as

suas coordenadas equatoriais por qualquer dos três métodos: pelo mé-

todo analítico, efectuando os cálculos indicados nas fórmulas; pelo mé-

um desenho de projecção; ou pelo método um globo celeste. Todos estes métodos se

todo gráfico, executando

mecânico, empregando

usavam no tempo de Dante. tratados de astronomia,

diam tais

ser feitos por

em

quem

As fórmulas eram

então expressas, nos

regras tão minuciosas que os cálculos po*

soubesse executar as operações fundamen-

sobre os números, sendo ainda facilitados por tábuas adequadas*

X — qA

Cap.

O

astronomia em Dante

e

Camões

uso das fórmulas era porém muito laborioso.

breve era o emprego do método gráfico.

O

sr.

'2o3

Muito mais

fácil e

Angelitti indica

um

processo simples de efectuar a resolução geométrica do problema

O

emprego do globo

duma

celeste era,

Deve

exactidão suficiente.

porém, o processo mais expedito

como

ter-se

*.

e

certo c[ue era a este que

Dante de preferência recorria.

Com os

modernos globos

celestes, feitos de pasta de papel compri-

mida, articulados pelos poios do equador passar-se

dum modo

armila meridiana, pode

grosseiro, das coordenadas eclip-

Distendendo, por exemplo,

para as equatoriais.

ticas

embora

fácil,

numa

um

fio

entre o

polo da eclíptica e o ponto desta correspondente à longitude celeste

dada da

tome-se sobre este

estrela,

do círculo de a eclíptica.

latitude,

um

tenso, que

fio

marca o quadrante

arco igual à latitude dada, contado desde

Ter-se-há assim o lugar da estrela no globo celeste.

Faça-se agora girar o globo até que este ponto venha colocar-se debaixo da armila meridiana: o arco desta, compreendido entre o ponto, e

o equador, é a declinação; e o grau do equador que cair debaixo da

armila dará a ascensão recta da estrela.

Os

globos celestes usados na antiguidade

de madeira ou metal, eram muito

com grande

na idade média, e

bem

feitas

gravavam

neles se

Serviam como

ins-

permitiam resolver todos os problemas dô

e

com

astronomia esférica,

precisão igual à que se obtinha nas observa-

Tais globos celestes, ou astrolábios esféricos, pres-

ções dos astros.

riais,

e

torneados

exactidão os círculos e constelações.

trumentos de observação

tavam-se

bem

à transformação das coordenadas eclípticas nas equato-

porque se podiam indiferentemente articular na armila meridiana,

tanto pelos poios do equador,

como

pelos da eclíptica.

Articulado

primeiro o globo pelos poios da eclíptica, levava-se o ponto desta cor-

respondente à longitude celeste dada da estrela, até armila, sobre a qual se

Assim

à latitude dada.

da

estrela.

e

podia

com

rigor

debaixo da

um

arco igual

marcar na esfera

a posição

Articulando agora o globo pelos poios do equador, aca-

bavam de determinar-se marcado

se

ficar

então, a partir da eclíptica,

lia

as

até ficar debaixo

coordenadas equatoriais, levando o ponto

da armila meridiana

e

lendo a declinação

ascensão recta, como acima se disse.

Dante podia

pois,

com um

dos globos celestes

em

uso no seu tempo,

fazer esta transformação de coordenadas muito rapidamente e

uma

exactidão maior do que permitem os modernos globos

1

Rivista di Astronomia, tôm.

2

Ibidem^ tom.

vii,

pág, 87,

Vií,

págs, 85-86.

^,

com

2Ò4

qA astronomia dos Lusíadas

A

6.

do Cri{\eiro do Sid.

hipótese

—A

celebridade adquirida no

século XVI pelo Cruzeiro do Sul estabeleceu a tendência a relacionar

com

esta constelação qualquer referência a

embora

trelas,

com

tal

um

grupo de quatro

es-

acompanhada de indicações incompatíveis Assim sucedeu com as quattro chiare stelle

ela viesse

aproximação.

de Dante.

Vespúcio na sua carta a Lourenço de Médicis, de julho de i5oo,

com que Dante quer descrever o polo uma mandorla e tinham pouco movipouco movimento está êle de acordo com o

diz que viu as quatro estrelas

que elas figuravam

austral, e

mento.

Atribuindo-lhes

poeta, cujas observações se fazem na região do céu onde as estrelas

são mais vagarosas,

Pur Si

como pontos duma roda mais



dove

come

le stelle

perto do eixo:

son piú tarde,

ruota piu presso alio stelo.

De pouco movimento eram pois, para o poeta, tanto as quatro como as três que de tarde tinham subido a ocupar o

claras estrelas

lugar daquelas.

Da

análise que fizemos (págs. i65 a i68) das cartas de Vespúcio,

de i5oo e i5o2, resulta que êle não pode referir-se ao Cruzeiro, que

nem

de

nome

E

conhecia.

pouco movimento

se Vespiicio

não podia qualificar como de

as estrelas desta constelação,

entre 3o e 36 graus de distancia do polo sul,

diam

não podia

classificar entre as estrelas

em

que

i5oo se esten-

também Dante

mais vagarosas, pois que,

as

em

i3oo, estavam situadas entre 3i e 37 graus de distância polar.

Andrea

Corsali,

navegador florentino ao serviço do nosso

rei

D. Manuel, que pelos marinheiros portugueses tivera conhecimento

da nova constelação,

é

quem

pela primeira vez,

em

i5i5, diz que as

quatro estrelas de Dante são as do Cruzeiro, atribuindo por isso ao

poeta

um

espírito profético.

Humboldt, que

se inclinava a ver nas quatro estrelas dantescas as

do Cruzeiro do Sul, explica assim como o poeta poderia ter tido co-

nhecimento desta constelação:

«On

ne peut douter que

le

Dante, dont Pérudition égalait

le

génle

poétique, a pu avoir notion des quatre étoiles de la Croix du Sud) soit

par

PArabie

les

voyageurs pisans ou vénitiens qui visitaient TEgypte,

et la

Perse, soit par des globes de construction árabe sembla-

bles à ceux de

Dresde

et

de

Si donc les quattro stelle

la collection

du Dante sont

du Cardinal Borgia

à Veletd.

celles de la Croix, ce

que

la

plupart des commentateurs admettent, on n'a pas besoin d'attribuer

;

X — qA astronomia em

Cap.

comme

au poete un esprit prophétique seizième siècle

No

Dante

Camões

e

le faisait

au commencement du

voyageur fíorentin Andrea Corsali»

le

2o5

*.

Cosmos, ocupando-se ainda das sete estrelas descritas no Pur-

Humboldt:

gatório, diz

L'astronome milanais de Cesaris voyait dans

«...

«di che

'1

qui se couchent

quand

Croix, Canopus, Achernar et

Foma-

polo di quà tutto quanto arde,»

se lèvent les quatre étoiles

de

la

J'ai tente, dis-je, d'éclaircir le

Ihaut.

le trois facelle,

et

problème par

les

considérations

suivantes: «Le mysticisme philosophique et religieux qui penetre et

rimmense composition du Dante, assigne

vivifie

à tous les objets, à

Cest Le groupe des

côté de leur existence réelle ou matérielle, une existence idéale.

comme deux mondes

dont Tun est

le reflet

de Pautre.

quatre étoiles represente, dans Tordre moral, les vertiis cardinales, la

Prudence,

pour cela

la Justice,

nom

le

«qui éclairent

pérance

mêmes

de saintes

ciei

semo

sept

nymphes

ciei-

la

Terre de

se trouvent réunies

Cest

la

uns des autres d'après les

do carro

tudes teologais.

esmeralda,

noi sem qui ninfe, e nel

la vérité, le paradis terrestre,

«In cerchio

le

facevan di sè claustro

de

lois éternelles

Le monde

et théologales.

du íirmament, éloignés la

ideal est

Mécanique une

celeste,

libre création

produit de Tinspiration poétique»^.

le

Dante descreve direita

étoiles,

nous révèlent eux-

nous sommes des nym-

les objects réels

sont à peine reconnaissables.

de Tâme,

:

êtres

«lei

réunion des vertus cardinales

Sous ces formes mystiques, les

chantent:

ils

nous sommes des

Dans

stelley).

Ninfe.»

et la

Les premiers de ces

leur double nature; le

Tempérance; elles méritent lumières, liici sante. Les trois étoiles

Force

pôle» representem les vertiis théologales, la Foi, TEs-

et la Charité.

phes, dans

le sette

le

la

é a

que vêem dançando ao lado da roda

três ninfas

representam as três Vir-

triunfal de Beatriz, as quais

Uma,

-cor

de fogo, é a Caridade; outra, verde de

Esperança; a terceira, da candura, da neve, Tre donne

in giro dalla destra

Venian danzando

:

L'altr'era,

come

Fossero state

La

ruota

Tuna tanto

Ch'appena fôra dentro

ai

é a

rossa,

fuoco nota

se le carni e Fossa di

terza parea

smeraldo

fatte;

neve teste mossa. [Purgatório,

XXIX,

121-126).

^

Histoire de la Géographie du nouveau continent, tom.

^

Cosmos,

trad. de Galuski, Paris, 1866, tom.

11,

iv,

pág. 324.

págs. 578 e 5jg.

Fé:

2c6

qA astronomia dos Lusíadas

A

esquerda do carro dançam quatro ninfas vestidas de púrpura,

que são as Virtudes cardeais, a Justiça, a Temperança, a Fortaleza

com

a Prudência, que,

e

os seus três olhos pode ver o passado, o pre-

sente e o futuro: Dalla sinistra quattro facean festa, In porpora vestite, dietro ai

D'una

modo

di lor, ch'avea tre occhi in testa. (Purgatório, XXIX, i3o-i33).

Mas quando

Matilde, depois de ter banhado o poeta nas águas do

Letes, o introduz na dança destas quatro, elas, abraçando-o, dizem-lhe:

«Nós aqui somos ninfas Indi

mi

no céu somos estrelas».

tolse, e

Dentro

E

e

alia

bagnato m'offerse

danza delle quattro belle;

ciascuna col braccio mi coperse.

«Noi sem qui Ninfe, e nel

ciei

semo

(Pwrga/dr/o,

stelle».

XXXI,

io3-io6).

Deste último verso conclue Humboldt que as quatro estrelas que

Dante vê na manhã da chegada ao Purgatório simbolizam as quatro Virtudes cardiais, sendo por isso que lhes chama «luzes santas», quando descreve o brilho

com que

os seus raios

iluminam

a face de Gatão,

Li raggi delle quattro luci sante.

As três facelle, que à tarde tinham subido ao lugar que estas ocupavam de manhã, simbolizam as três Virtudes teologais. Podem estas sete estrelas ser de pura invenção do poeta, que as imaginaria situadas junto do polo sul naquela região do firmamento,

não vista de Alexandria, onde os globos celestes, construídos segundo o catálogo de Ptolomeu, deixavam

um

Humboldt, porém,

não são

as sete estrelas

espaço vazio de estrelas. fictícias;

a que o poeta liga aquela significação ideal.

Cruzeiro; o grupo das três e

é

formado pelas

Fomalhaut, propostas, como

êle diz,

O

Para

são estrelas reais,

grupo das quatro

estrelas

é

o

Canopo, Achernar

pelo astrónomo milanês

De Ce-

saris.

Os comentadores que admitem

o Cruzeiro

como

explicação do pri-

meiro grupo procuram as estrelas do segundo na região celeste que

mesma declinação do Cruzeiro, mas dele difere cerca de 12 horas em ascensão recta. Não concordam todos na escolha das três estrelas; no que, porém, todos se acham de acordo é em ser uma delas No catálogo de Ptolomeu está registada, entre a estrela Achernar. as estrelas da constelação de Eridano, uma de primeira grandeza,

tem

a

Cap.

X — QÁ astronomia

designada como «ultima

&

fluuii

hoje está ela identificada

que assim deve

(a Eridani),

com

a

Camões

20J

Julgou-se

durante

de primeira grandeza,

Eridani, de terceira grandeza,

^

Acabou por

deminuido de brilho.

ter

e

est splendida».

muito tempo ser esta a Achernar

mas

em Dante

se

reconhecer

nem podia estar, uma distância

que a Achernar não está no catálogo de Ptolomeu,

porque no tempo deste grande astrónomo ela tinha

polar de 23 graus e não podia por isso ser observada na latitude de

Alexandria, que é de 3i graus boreais.

Vimos no precedente do

como

capítulo

do Cruzeiro

três das estrelas

encontram no catálogo de Ptolomeu, faltando, porem, nele

Sul se

a estrela que

forma a cabeça da cruz

(y

Crucis).

Se as sete estrelas são pois aquelas que a que nos

vimos referindo, Dante

propõem

os comentadores

uma

teria ido buscar

das quatro es-

bem como uma do grupo das três, a outras fontes que não ao nem aos globos celestes segundo este construídos.

trelas,

catálogo ptoiomaico

Humboldt las

diz

que Dante podia

ter tido

conhecimento das quatro estre-

do Cruzeiro, quer pelos viajantes pisanos ou venezianos que iam ao

Egipto, Arábia e Pérsia, quer pelos globos de construção árabe, semelhantes ao globo horgiano.

que

um

porém, de documento algum

E

O número

no céu

é,

segundo Dante, 1.022, número este que

reportando-se à autoridade dos sábios do Egipto,

uma

nem

se co-

ao poeta não pode atribuir-se o conhecimento de estre-

que não sejam as catalogadas por Ptolomeu.

las vistas

*,

único exemplar desses supostos globos árabes contendo este

asterismo. las

consta,

então estivesse formada a constelação do Cruzeiro



nhece

Não

importância cósmica.

Vimos como

êle,

e

de estre-

êle adopta,

ao qual atribue

na comparação que faz

da física com a oitava esfera, considera tão significativos os algarismos do número 1.022. Bastava que êle conhecesse uma estrela a mais, para se alterar o algarismo 2 das unidades, a que ligava especial significação.

1

Assim o próprio poeta contradiz

Schiapareli,

Manuali Hoepli)^

a explicação de

na sua obra L' astronomia nelV antico testamento {nP 332 dos trata da constelação designada

no Livro de Job

chadrê theman, que a Vulgata traduz por interiora Austri

e êle

(IX, 9) pelo

Esta constelação dos Penetraes do Sul era formada, segundo o

trónomo

italiano,

deli'

ilustre as-

por cinco estrelas de primeira grandeza, entre as quais a Ganopo,

cinco de segunda, que, pelo ano jSo

a.

C, culminavam todas na

altura sobre o horizonte^ inferior a 20 graus, do lado do sul,

dida grinalda na região mais austral do firmamento.

mente

nome

por penetrali

Aiistro.

e

Hum-

distribuídas pelas constelações de Argo,

pertencendo cinco à primeira, duas à segunda

Palestina a

uma

formando uma esplên-

Estas dez estrelas estão actual-

do Centauro

e

do Cruzeiro do Sul,

e três à terceira.

Assim os hebreus

teriam incluído três das estrelas do Cruzeiro na brilhante constelação dos Penetraes

do Sul,

como Ptolomeu

incluiu depois três delas

Ptolomeu, isolaram as estrelas do Cruzeiro

num

no Centauro; mas nem asterismo distinto.

eles,

nem

qA astronomia dos Lusíadas

20S

Demais, a verdade

boldt.

que o catálogo de Ptolomeu esteve

é

uso entre os astrónomos até ao século

número das

xvi,

Nem

estrelas registadas.

sem que

em

aumentasse o

se

sequer as quinze estrelas de

Não

primeira grandeza chegaram a ser reobservadas todas.

se pro-

pondo fazer novos catálogos, os astrónomos contentavam-se em

trans-

Mesmo

portar para outras épocas as posições dadas por Ptolomeu.

astrónomos notáveis, como Albaténio, se limitaram a reobservar muito poucas estrelas, com o fim

línico

de determinarem

são o movimento próprio da oitava esfera,

com

com maior

preci-

o qual depois fizeram

o transporte das longitudes de Ptolomeu.

Se as sete estrelas de Dante são astros reais, elas teem de ser procuradas entre as do catálogo ptolomaico, o qual serviu de base aos construtores dos globos celestes que o poeta podia ter estudado e foi

o código fundamental da astronomia de posição até ao século xvi.

E

brilhavam na região celeste, onde mais

se as quattro chiare stelle

tarde os portugueses isolaram a nova constelação do Cruzeiro, Dante

deve

tê-las escolhido entre

do Centauro. grandeza

as

mais resplandecentes junto das pernas

Nesta região regista Ptolomeu

e cinco

uma

estrela de primeira

de segunda; todas as outras estrelas do Centauro

são de grandeza inferior.

Entre aquelas

seis se

devem

pois encontrar

as quatro estrelas de Dante, e assim ficam excluídas duas

a

Y,

porque não existe no catálogo,

como já vimos (págs. 167 e como «Quae est extra sub quarta grandeza,

e

i58),

e a p,

porque com

a estrela do Centauro, designada

dextro posteriore pede», classificada na

por isso de menor importância.

entende que, entre as

do Cruzeiro:

ela se identifica,

O

sr.

Angelitti

Dante escolheria, por formarem

seis,

um

*

grupo

mais compacto, as quatro de segunda grandeza, que, no catálogo de Ptolomeu, teem as coordenadas eçlípticas da tabela junta, onde as trelas estão

numeradas de

Número

i

a 4, pela

ordem

Longitude

Latitude

da estrela

1

0'=

I

Libra

io«

2

Libra

ii

10

3

Libra

i5

20

4

Libra 16 20

Rivista di Astronomia, tom.

vi,

0'

190"

= 191 = 195 = 196

10

20 20

pág. 843.

es-

crescente das longitudes:

— 5i°

— 55 — 5i — 43

10'

20

40

,

Cap.

A com

X — qA astronomia

em Dante

e

Camões

2og

com aã, e a terceira As coordenadas das quatro estrelas são rela-

primeira destas estrelas está identificada a a

tivas ao

do Cruzeiro.

Para

ano iSy, ou i38, da era vulgar.

época da criação, Dante, conservando as

coordenadas na

ter as

mesmas

53^22' das longitudes, pela regra atrás exposta;

latitudes, subtrairia e

para ter as coor-

Devemos

denadas na época da viagem, juntaria às longitudes ii^38'. supor que,

mesmo

para a época da viagem, Dante calculasse assim as

coordenadas, deduzindo-as das posições ptolomaicas, e não de obser-

vações recentes, porque então os astrónomos, como se

notámos, não'



ocupavam em reobservar estrelas, e muito menos estrelas tão auscomo estas. Dante não devia ter usado o catálogo de Albaténio,

trais

nem

o dos astrónomos afonsinos, porque esses foram deduzidos do de

Ptolomeu, adoptando para o firmamento indicado pelo poeta, de

um

um

movimento

diferente do

Assim Dante

grau por século.

teria atri-

buído às quatro estrelas, escolhidas entre as mais brilhantes do Centauro, as seguintes coordenadas, para as épocas da criação e da via-

gem:

Longitude

Número da estrela

Na época

da criação

Na época

da viagem

j

1

2

i37 48

202 48

— 5i«io' — 55 20

3

141

58

206 58

— 5i

4

142

58

207 58

— 43

36o 38'

201° 38'

Estudando a hipótese da escolha das o

sr.

tral

40

estrelas nesta região celeste,

um

Angelitti restringe os seus cálculos e discussões a

ponto cen-

do grupo das quatro estrelas das pernas do Centauro: ao ponto

cuja latitude e longitude são respectivamente a tudes, e a das quatro longitudes, do grupo.

média das quatro

lati-

Esse ponto central tem

pois as seguintes coordenadas:

longitude na época da criação

==

:i3g° 5o',

= 204 épocas = — 5o

longitude na época da viagem latitude constante nas

Dante devia

duas

ter-se assegurado,

quando

5o 18.

fez a escolha

de estrelas, da posição delas a respeito do meridiano

e

do seu grupo do horizonte.

Qá astronomia dos Lusíadas

2Í0 na manhã

e

na tarde do dia

E

atenção, no Purgatório.

em

que imagina fixar sobre elas a sua

por prima gente quer indicar os

se

meiros habitantes dos lugares da Terra, situados boreal, devia ter

também

numa

verificado que as suas estrelas

pri-

certa latitude

eram

visíveis

dessa latitude na época da criação, tendo deixado de o ser, passado certo tempo,

em

virtude do

movimento lentíssimo do céu estrelado de

ocidente para oriente.

Para a primeira indagação precisava Dante determinar

as coorde-

nadas equatoriais das suas estrelas para a época da viagem, o que podia fazer, partindo das coordenadas eclípticas, pelos três métodos,

O

já indicados.

sr.

Angelitti aplica os três processos à determinação

das coordenadas equatoriais do ponto central das quatro estrelas do

Centauro, partindo dos valores da latitude

e

longitude celestes, acima

Começando

registadas para a época da viagem.

pelo método analí-

tico, aplica

primeiro as modernas fórmulas de transformação de coor-

denadas

em

e,

seguida, refaz o cálculo,

como

êle se

podia efectuar no

empregando a regra de Albaténio e as tábuas então em Acaba por fixar-se nos valores seguintes das coordenadas equa-

século XIV, uso. toriais

do ponto central, para a época da viagem*:

ascensão recta

=

declinação

=—

174°

Aplicando depois o método gráfico, mais

uma

goroso, obtêm

declinação de

i^,

64^ 21

—64°

e

.

fácil

uma

embora menos

ri-

ascensão recta de

175^ Já vimos

por meio

como

dum

o

mesmo problema

globo celeste.

Os

gado por Dante. podia efectuar

com

um

pode resolver mecanicamente,

Este deve ter sido o processo empre-

globos celestes,

no seu tempo, permitiam

se

rigor

em

uso

assim

êle

ou astrolábios esféricos,

maior que os actuais;

e

grande facilidade t rapidez, e suficiente aproxi-

mação, aquela mudança de coordenadas. Conhecidas as coordenadas equatoriais do ponto central das quatro estrelas, resta saber a sua posição a respeito

diano, nos instantes

vações, isto

O

é,

com

que o poeta imagina ter

do meri-

suas obser-

duma

estrela, ângulo

formado pelo seu círculo ho-

o meridiano, obtêm-se subtraindo a ascensão recta do astro

da ascensão recta do meridiano.

l

feito as

e

resta determinar a sua altura e o seu ângulo horário.

angulo horário

rário

em

do horizonte

Rivista di Astronomia, tom.

vii,

pág. 82.

X — qA astronomia em Dante

Cap.

Os

em

instantes,

Camões

211

que Dante imagina as suas observações astronó-

micas, não são definidos

com

mas

precisão,

indicados

Assim, quando, ao romper de

terminação poética.

Lo

e

bel pianeta che

com uma

inde-

alva, diz:

ad amar conforta

Faceva tutto rider Poriente

Velando

i

Pesei che erano in sua scorta,

sabendo que, quando

íica-se

ele saiu

a riveder

le stelle,

despontavam

no oriente, ou tinham acabado de subir acima do horizonte, os Peixes;

mas não

fica

lação do

esclarecido se se trata do signo dos Peixes ou da conste-

mesmo nome.

O

sr.

Angelitti

examina por

isso as três hi-

póteses, a seguir formuladas: a primeira, que estivesse no horizonte

médio do signo dos Peixes,

oriental o ponto

01 5.°

grau deste

que no horizonte do oriente se achasse o ponto

signo; a segunda,

médio da constelação dos Peixes, que ao

isto é,

deve supor correspondente

se

grau do signo de Aries, pois que, no tempo de Dante, as cons-

5.°

telações zodiacais se estendiam desde o 20.° grau do signo do

nome

até ao 20.°

mesmo

grau do signo imediato; a terceira, que no horizonte

oriental estava o primeiro ponto de Aries.

Na

primeira hipótese, tem que se determinar a ascensão recta do

meridiano,

isto é,

o grau do equador que estava no meridiano, quando

no horizonte oriental do Purgatório passava o

iS.^

grau do signo dos

Peixes.

Nos tempos do poeta chamava-se ascendente ao grau da

eclíptica

que subia no horizonte oriental;

nele subia no dente.

mesmo

instante,

e

ao grau do equador, que

chamava-se ascensão oblíqua do ascen-

Subtraindo 90 graus desta ascensão oblíqua, tinha-se o grau

do equador que então estava no meridiano, recta do meridiano.

e

portanto a ascensão

Esta ascensão recta pode-se determinar,

apli-

cando as fórmulas, ou as tábuas das ascensões oblíquas dos signos, ou empregando

O

um

emprego dos

globo celeste. três processos levou o sr. Angelitti a

ascensão recta do meridiano

para o instante dos Peixes

em

*.

em

= 262°

adoptar a

29',

que no Purgatório ascende o ponto médio do signo

Primeiro faz o cálculo por meio das fórmulas

seguida, usando as tábuas que

davam

e refá-lo,

as ascensões oblíquas de

vários pontos da eclíptica para os diversos climas, tábuas contidas nas

obras astronómicas do tempo do poeta.

Rivista di Astronomia, tom,

vii,

pág. 148.

O

processo mais simples

é,

212

qA astronomia dos Lusíadas

porem, o do globo.

Goloque-se

um

globo celeste na posição corres-

pondente à latitude do Purgatório, com o polo austral numa altura de 3-2 graus sobre o horizonte. Faça-se girar o globo até que o i5.° grau

do signo dos Peixes

se

venha colocar no horizonte oriental.

então o grau do equador que

vem

cair

ter-se-há assim a ascensão recta do meridiano.

muito rapidamente,

uma

leitura

e os

Leia-se

debaixo da armila mediana,

Esta operação faz-se

globos celestes do tempo de Dante permitiam

mais rigorosa do que os modernos.

Subtraindo da ascensão recta do meridiano, que era de 282°

29',

do ponto central das quatro estrelas do Centauro,

a ascensão recta

que era de 174°

obtemos o ângulo horário deste ponto, de 78^

r',

O

contado desde o meridiano para oeste. central fazia pois, de

mediaram 14

círculo horário

manhã, do lado do ocidente,

meridiano do Purgatório. tarde

e

do ponto

este ângulo

Entre as observações matutinas

horas, ou i3 horas e meia,

como



28',

e

com as

o

da

verificámos.

Nesta primeira hipótese contamos como decorridas 14 horas, o que corresponde a um aumento de 210 graus (14 x i5° = 2io°) no ângulo

Assim o

horário.

vendo para

oeste,

com

um

do meridiano o que é o

mesmo,

ângulo horário de 288^ distava do meridiano

28',

um

estrelas,

distava

contado para oeste, ou,

ângulo de 71°

82',

contado

Conclue-se pois que o círculo máximo, passando pelos

leste.

poios do equador e pelo ponto central das quatro estrelas, fazia de

nhã,

com

o meridiano do Purgatório,

do ocidente;

O

mo-

a rotação diurna do firmamento, até que, de

quando o poeta imagina observar de novo as

tarde,

para

círculo horário daquele ponto central foi-se

e

um

de tarde,

um

ângulo de 71°

ponto central estava pois de tarde

ma-

ângulo de 78° 28' do lado

um

32^,

do lado do oriente.

pouco mais próximo do

meridiano, e portanto a maior altura sobre o horizonte, do que de

manhã.

A igual hipótese,

em

tório o 5.°

de 275°

e

Na segunda

que se supõe ascender no horizonte oriental do Purga-

grau de Aries,

5o',

seria, pela

Na

conclusão se chega nas outras duas hipóteses.

ter-se-ia

uma

ascensão recta do meridiano

o ângulo horário do ponto central das quatro estrelas

manhã, de 101°

terceira hipótese,

em

meiro ponto de Aries,

contado desde o meridiano para oeste.

49',

que se supõe ascender no Purgatório o

ter-se-ia

uma

pri-

ascensão recta do meridiano de

270*^, e

o ângulo horário daquele ponto central seria de

oeste.

Nestas duas hipóteses deve-se considerar

96'' 69',

menor o

para

intervalo

entre as observações matutinas e as vespertinas; contando decorridas só i3 horas e meia, juntaremos ao ângulo horário da

(i3,5x tese,

i5*^

= 202°,5),

para ter o da tarde.

o ângulo horário seria,

à,

manhã

202° 3o'

Assim, na segunda hipó-

tarde, de 3o4*^ 19' para oeste, ou de

Cap.

X—qA

55° 41', para leste.

O

aslronômta em Dajite

círculo horário do ponto central formaria de

manhã, com o meridiano, dente; e de tarde,

um

um

ângulo de 101° 49' para o lado do oci-

ângulo de 55° 41^, para o lado do oriente, es-

Na

tando portanto muito mais alto que de manha. o ângulo horário seria, à tarde, de 298°

O

leste.

com

o meridiano,

um

29^,

terceira hipótese,

para oeste, ou de 61°

3i',

círculo horário do ponto central formaria, de manhã,

para

tarde,

2/3

Camões

e

um

ângulo de 95°

59',

para o lado ocidental;

e

de

ângulo de 6í°3i^ para o lado oriental, estando portanto

então mais elevado sobre o horizonte.

Do

diálogo, travado entre Dante e Vergílio no

momento das

obser-

vações astronómicas vespertinas, resulta que as quatro estrelas vão perto da sua passagem inferior pelo meridiano e portanto próximas

da sua altura mínima sobre o horizonte, tendo estado, no instante das observações matutinas, perto da passagem superior,

mas da sua

altura

máxima sobre

o horizonte.

e

portanto próxi-

Não podemos

pois supor

que estas estrelas estivessem situadas junto das pernas do Centauro, porque, se assim fosse, resultaria, como acaba de mostrar a discussão feita

nas três hipóteses consideradas, que as quatro estrelas estariam

no momento das observações da tarde mais o que está

em

altas

do que de manhã,

completo desacordo

com

as condições definidas pelo

uma

fácil

confirmação do resultado a

poeta.

Qualquer pessoa pode

ter

que acabamos de chegar, com o simples emprego

Colocando truídos,

austral

um

mesmo um

globo qualquer,

dum

globo celeste.

dos modernamente cons-

na posição correspondente ao Purgatório,

isto é,

com

o polo

elevado 32 graus sobre p horizonte, e trazendo o primeiro

ponto de Aries ao horizonte do lado do oriente, verifica-se imediata-

mente .que o Cruzeiro do Sul de 85 graus. trelas

No

fica a oeste,

em

ano de i3oo,

eram menores, do que

as indicações

es-

o Cruzeiro do Sul

No momento das observações mabem longe do meridiano, pois ia

afastado dele 93 graus para ocidente.

trelas

ângulo horário de cerca

hoje são, cerca de 8 graus, o ângulo

horário devia ser duns 93 graus. tutinas estava

num

que as ascensões rectas destas

E

tamanha

a discordância

com'

do poeta que se pode logo concluir que as quatro

não podem ser as do Cruzeiro,

grupo, vizinho desta constelação,

nem

as

es-

de qualquer outro

como aquele que temos vindo

con-

siderando.

Os propugnadores do Cruzeiro do Sul procuram as trêè /aceíle mesma declinação deste asterismo,

na região celeste que, tendo a dele dista cerca de 12 horas

em

ascensão recta.

Rejeitado, porêm^

o Cruzeiro, tem de renunciar-se a esta escolha do grupo das três trelas,

es-

porque elas não satisfariam também à condição de irem pró-

dA astronomia dos Lusíadas

lVv

ximas do meridiano nos instantes das observações. Achernar, que todos eles incluem entre as

E

demais,

a

não era conhecida

três,

de Dante.

De tudo

o que temos dito resulta já que não

foi

entre as estrelas

mais brilhantes do Centauro que Dante tomou as quatro chiare

stelle.

Tal hipótese involve erros incompatíveis com o grande saber

astro-

nómico do poeta suas afirmações.

e

com a precisão e cuidado, que ele sempre põe nas Não queremos porem terminar esta análise, sem

examinar a interpretação do Cruzeiro do Sul, ou antes, do grupo

mais racionalmente, o deve

telar que,

vista

da condição expressa no verso

substituir, debaixo

— «non

viste

es-

do ponto de

mai fuor che

alia

prima gente».

Dum modo

análogo ao

já descrito

para a época da viagem, dedu-

zem-se das coordenadas eclípticas, relativas à época da criação, do

ponto central do grupo de quatro estrelas, o mais brilhante

compacto

ascensão recta declinação

= =—

1

25° 29',

32 46

.

Este ponto central, tendo na época da criação tral

mais

e

do Centauro, as seguintes coordenadas equatoriais:

de 32°

46', distava

do polo

uma

declinação aus-

sul 67° 14^, e era então visível

os lugares boreais de latitude geográfica inferior a 67° 14^

de todos

O

grupo

inteiro das quatro estrelas podia ser visto nas latitudes boreais infe-

riores a 5o°.

Os propugnadores do teeín entendido por

situados

numa

Cruzeiro, ou

prima gente

dum

grupo estelar vizinho,

os primeiros habitantes dos lugares

latitude boreal de 3o°.

Verificámos que, na época da

viagem, o ponto central do grupo, que vimos considerando, tinha

uma

portanto 35° 39' do polo

sul.

declinação austral de 64° 21'

e distava

Assim, não só o ponto central, mas todo o grupo, se podia observar

na

boreal de 3o°.

latitude

tiesta latitude geográfica

de serem



A

tem

situação proposta da primeira gente

pois de ser rejeitada, porque,

as estrelas visíveis apenas nos primeiros

da criação, como se pretende, elas continuaram visíveis, e

Na se era

a ser

em

vez

tempos depois constantemente

ainda o eram na época da viagem.

hipótese do Cruzeiro, ou

dum

grupo vizinho, a prima gente,

aquela gente que nos primeiros tempos contemplou estas es-

trelas e depois deixou

de as ver, teria de ser pois colocada

tude bastante superior a 3o°, na de 45°, por exemplo.

numa

lati-

Nesta latitude

O ponto central das quatro estrelas do Centauro deixaria de sê ver,

X—qA

Cap.

quando

astronomia em

Dame

Camões

e

Como, segundo

a declinação austral de 46°.

ele atingisse

21S a

teoria da oitava esfera de Ptolomeu, as latitudes das estrelas se con-

servam constantes, aumentando

um

as longitudes

grau por século,

é

preciso determinar o valor que tomaria a longitude do ponto central,

quando a sua declinação

se tornasse igual a

sua latitude celeste era sempre de

um

problema de astronomia esférica

cuja latitude celeste e declinação são

método

Os

— 5o°

—45°, sabendo-se que



18'.

a

assim a resolver

— achar a longitude dum astro, — o que podemos fazer pelo

dadas

método gráfico ou por meio dum globo celeste. esféricos do tempo de Dante permitiam resolver o pro-

analítico, pelo

astrolábios

blema com rapidez

e

exactidão

^.

A

longitude do ponto central, cor-

respondente àqueles valores de latitude e declinação, seria de 180° 20'; e

como

um

a longitude na época da criação era de 189° bo', teria havido

aumento de 40°

3o'

na longitude, o qual

período de quarenta séculos

e

meio.

Este

decorrido entre a época' da criação e aquela

se é

em

num

teria efectuado

o intervalo de |que o

tempo

ponto central

das estrelas se havia de tornar invisível na latitude boreal de 45^.

Os

habitantes

desta

latitude

teriam pois visto este ponto durante

4.060 anos, tendo-se-lhes tornado circumpolar oculto pelo ano de ii5o

a.

C.

A hipótese da Ara,

7.

sogna

quem

segundo Rinacasa.

— Foi Rizzacasa de Or-

primeiro censurou os astrónomos que teem defendido a

hipótese do Cruzeiro do Sul, por não terem sequer consultado

um

globo celeste, para verificarem se as estrelas desta constelação ocupa-

vam

também quem primeiro procurou no catálogo de Ptolomeu as estrelas dantescas. Tendo colocado um globo com o polo austral numa altura de 32 gcáus sobre o horizonte, e com o 255." grau do equador debaixo da armila meridiana, poude assim considerar o aspecto do céu como êle se ofereceria à as posições indicadas pelo poeta; ele foi

observação dos poetas, na hora matutina da chegada ao Purgatório*

A O

constelação da

Cruzeiro

ia

Ara

próxima da sua passagem pelo meridiano. longe dele do lado do ocidente, quási a meio do seu ia

curso descendente; de tarde, passadas 14 horas, devia. pois

ir

no he-

misfério oriental a mais de meio do seu curso ascendente, de

que estava mais celeste,

alto

que de manhã.

modo

Esta simples inspecção do globo

que basta para se rejeitar a hipótese do Cruzeiro, ou

dum

grupo vizinho, chamou a atenção de Rizzacasa para a constelação da Afa.

Rivista di Asti-onomla, tom.

vii,

págs. 466 a 470.

2l6

qA astronomia dos Lusíadas

A

Ara,

também chamada Lar

e

Turíbido,

do catálogo ptolomaico, formada por sete e

grandezas, segundo Ptolomeu, se

ordem

é a

constelação n.° 46

estrelas, cujas

coordenadas

resumem no quadro

junto, pela

crescente das longitudes*:

Constelação da Ara

Número Longitude

da estrela

I

Escorpião

2

Escorpião 20 5o

3

Escorpião iS

4

Escorpião 25 10

5

Escorpião 26 20

6

Escorpião 27 40

7

Sagitário

20*»

40'

3

Grandeza

Latitude

— 3o° — 34

= 230" 40' = 23o 5o = 235 = 235 10 = 236 20 = 237 40 = 243

-33

20'

4

20

4

— 34 — 26 — 22

— 25

5

i5

10

4

3o

4

40

5

45

4

Estas sete estrelas são todas pouco brilhantes, pois estão

cadas na quarta à

e quinta

grandezas.

origem mitológica da constelação da Ara

estrelas,

e

da sua

e à teoria

segundo Arato, entende que as quatro chiare meiras da tabela,

classifi-

Rizzacasa, porém, reportando-se

stelle

influição

^

são as quatro pri-

que as três facelle são as três últimas, tendo estas

apesar da sua pequena grandeza, sido escolhidas por Dante

por causa da sua importância mitológica.

A

como

inspecção da coluna das latitudes mostra logo

se fez na-

turalmente a separação dos dois grupos de estrelas, de que resultou a figura da constelação: as últimas três, mais próximas do equador,

formam

do polo, as chamas do fogo que arde

Quando

a

Ara vem chamas

em cima

do

lar

ou

altar.

na sua passagem inferior pelo meridiano, as qua-

tro estrelas das

casa,

formam, do lado

a base da constelação; as quatro primeiras

estão mais altas que as três da base; Rizza-

porém, supõe que Dante imaginara a constelação colocada numa

posição invertida, tendo este equívoco levado o poeta a considerar,

nas observações da

tcirde, as

Rivista di Astronomia, tom.

1

2

Que

quatro estrelas mais baixas que o grupo

vi,

pág. 844,

influiçam de sinos

&

de estrellas

(Os Lusíadas, V,

I

23).

Cap, das

três.

equador

X — qA astronomia

em Dante

Camões

e

2JJ

Imaginando assim a Ara, com as chamas voltadas para o base do lado do polo antártico, quando ela de manhã ia

e a

próxima da passagem superior meridiana, as quatro estrelas das chaficar por cima das três da base; de tarde, depois da pas-

mas deviam

FIGURA DA CONSTELAÇÃO DA ARA, reproduzida dos Libros dei saber de astronomia

sagem

inferior, a constelação tinha já

estavam por baixo, tendo as

três

'.

executado meia volta, as quatro

passado para cima delas.

E

esta

inversão na posição relativa dos dois grupos, operada pelo movimento diurno, que, segundo Rizzacasa, o poeta exprime quando faz dizer a Vergílio: «Le quattro chiare

Ghe vedevi staman, son

E

E uma

queste son

interpretação

bem

salite

stelle

di là, basse,

ov'eran quelle».

diferente da que se dá a estes versos na

hipótese do Cruzeiro.

*

mas; n.""*

As

estrelas

n.***

i

que

a 4, da tabela, são as quatro

as outras três estão na base da constelação, a

6 e 7 nos extremos do

friso,

em

Rey D.

se 5

vêem no meio das cha-

no meio

e

em

cima, e as

Esta figura está no centro da «Rueda

baixo.

de las estrellas dei Fogar», que se encontra Libros dei saber de astronomia dei

n.*»

em

frente da pág.

Alfonso

X de

1

Castilla.

14

do tom.

i

dos

Os astrónomos

Afonsinos conservaram as latitudes de Ptolomeu e transportaram as longitudes para o ano de 125 16

1

da era vulgar, juntando-lhes 17°

8'.

,

2JS

qA.

O

sr.

astronomia dos Lusíadas

Angelitti submete as estrelas da

Ara

a

uma

análise seme-

lhante à que fez a respeito das quatro estrelas do Centauro.

miremos apenas os

Resu-

resultados.

O

quadro seguinte dá as posições das estrelas da Ara, para as épocas da criação e da viagem, deduzidas do catálogo de Ptolomeu, subtraindo das longitudes, que se lêem na última tabela, 53^

mando

22' e so-

11^38', segundo a regra atrás exposta.

Consteíação da Ara

Longitude

Número da estrela

Na época

Na época

da criação

da viagem

— 3o« 20'

I

1770 18'

242«

2

177 28

242 28

-34

i5

3

181

38

246 38

-33

20

4

181

48

246 48 247 58

18'

5

182 58

6

184

18

249 18

— 34 — 26 — 22

7

189 48

254 48

— 25

Tomando

a

média destes números, o

sr.

10

3o

40 45

Angelitti restringe as suas

considerações ao ponto central das estrelas da Ara, cujas coordenadas

são as seguintes:

= 182^ 11^, = 247 longitude na época da viagem latitude constante nas duas épocas = — 29 34. longitude na época da criação

1

A

estas coordenadas eclípticas

1

correspondem, na época da viagem,

as coordenadas equatoriais

ascensão recta

=

declinação

=—

237°

56',

5o 33.

Supondo que, no momento das observações matinais, ascendia no horizonte oriental o i5.° grau do signo dos Peixes, a ascensão recta

do meridiano seria de 252^29', ângulo horário

e o

= 252*^

ponto central da Ara teria o 29'

— 237° 56'= 14° 33'.

X—

Cap,

Como um

(lá

astronomia em Dante

ângulo de i5" corresponde a

e

uma

Camões

2ig

hora, conclue-se que,

neste instante, o ponto central tinha atravessado superiormente o

me-

pouco menos duma hora. Se supozermos que ascendia o 5.° grau do signo de Aries, a ascensão recta do meridiano seria de 276® 5o', e o ponto central teria o ridiano, havia

ângulo horário

= 275°

5o'

— 237^

havendo portanto cerca de duas horas

e

56'

= 37°

54',

meia que passara no meri-

diano.

Na

hipótese, finalmente, de ascender no horizonte o primeiro ponto

de Aries, a ascensão recta do meridiano seria de 270°,

e

o ponto cen-

tral teria o

ângulo horário

= 270° — 237"

56'

= 32° 4',

tendo passado pela sua culminação, havia pouco mais d& duas horas.

Para termos os ângulos horários no momento das observações manhã, 210° na primeira hi-

vespertinas, juntaremos aos ângulos da

pótese, e apenas 202" 3o' na segunda e terceira,

como

anteriormente.

Acha-se assim, na primeira hipótese, o ângulo horário

== 224*^ 33',

ângulo horário

= 240°

24',

ângulo horário

= 234**

34'.

na segunda, o

na terceira, o

Como

a

passagem

inferior pelo

meridiano corresponde a

um

ân-

gulo horário de 180°, vê-se que o ponto central da Ara tinha, de tarde,

passado inferiormente pelo meridiano havia cerca de três horas no primeiro caso, cerca de quatro no segundo,

meia no

cerca de três horas e

terceiro.

Tendo o ponto 39*^ 27'

e

do polo

central

sul,

uma

e portanto,

declinação austral de 5o°

33',

distava

na sua passagem inferior pelo meri-

diano, descia 7° 27' abaixo do horizonte do Purgatório, situado latitude austral de

32**.

É

numa

pois essencial saber se êle tinha já surgido

acima do horizonte no momento das observações da tarde, para verificar se então a

Ara

se podia observar.

9 problema de astronomia

esférica,

horizontais, azimute e altura,

dum

Assim tem de

se

se resolver

da determinação das coordenadas

ponto da esfera celeste, de que se

conhecem o ângulo horário e a declinação. Este problema resolve-se, como o da passagem das coordenadas eclípticas para as equatoriais,

...

qA astronomia dos Lusíadas

220

pelo método analítico, pelo método gráfico, ou, muito facilmente, pelo

emprego dum globo

Na

celeste.

primeira hipótese, o ponto central tinha de tarde, no Purgatóseguintes coordenadas horizontais:

rio, as

=333*^31',

azimute

distância zenital=

=

altura

O O

azimute

é

88 33, i

27

contado desde o ponto sul do horizonte para oeste.

ponto central tinha surgido havia pouco, achando-se apenas na

tura de cerca de

i

grau

e

Na

A

meio.

aproximadamente metade acima,

e

constelação da

Ara

al-

estava pois

metade abaixo, do horizonte.

segunda hipótese, as coordenadas horizontais são:

=326°

azimute

4',

distância zenital= 81 47,

=

altura

O

8

i3

ponto central estava a pequena altura, de cerca de 8 graus, sobre

o horizonte.

A

constelação tinha acabado de surgir, toda, acima do

horizonte.

Na

terceira hipótese, as coordenadas horizontais são:

=328*^39',

azimute distância zenital altura

O

ponto central estava cerca de

= =

5

84 27 5

graus

,

33 e

meio sobre o horizonte,

constelação vinha, quási toda, acima do horizonte.

e a

A

interpretação de Rizzacasa, que reúne

as quatro estrelas

da manhã

e as

num mesmo

trèsfacelle da tarde, não é contra-

riada pelos resultados que acabamos de resumir.

Ara

satisfaz a condição,

da tarde ela

No momento

já se elevava,

uma

constelação da

das observações

metade pelo menos, acima do horizonte,

as três estrelas que,

segundo as suposições

então deviam estar acima do grupo das quatro. senta

A

geralmente exigida, de se achar, de manhã,

perto da sua culminação no meridiano.

podendo pois ver-se

asterismo

Mas

feitas,

aqui se apre-

dificuldade na interpretação de Rizzacasa, pois, estando tão

baixas as estrelas da Ara, mal pode dizer-lhes respeito a pregunta de Vergílio a Dante:

«Figliuol, che lassú guarde?».

supor que as xrès facelle iam

Vejamos finalmente

bem

altas

as condições

Ara, desde a época da criação.

Tal pregunta faz

no firmamento.

de visibilidade das estrelas da

Das coordenadas

eclípticas

do ponto

X — qA astronomia em

Cap.

Dante

Camões

e

22/

central da Ara, atrás registadas^ deduzem-se, as seguintes coordena-

para a época da criação:

d-as equatoriais,

O

ascensão recta

=

declinação

=—

ponto central distava pois 62°

169°

10',

27 45,

do polo

i5^

sul,

e era por isso

visível de todos os lugares do hemisfério boreal de latitude geográfica

E

inferior a 62** i5'.

lugares da Terra de

toda a constelação da Ara se podia observar dos latitude boreal inferior a

5ó graus, na época da

criação.

em

Consideremos,

Para

45''.

atingisse

estes, o

uma

duma

especial, os habitantes

ponto central da Ara tornar-se-ia invisível quando

Gomo

declinação austral de 45°.

deste ponto era constantemente igual a

— 29° 84',

tude correspondente a

a

Acha-se assim

uma

latitude boreal de

tal

latitude

e

uma

longitude celeste de 227°

do que a longitude de 182°

que o

1 1',

declinação de —45°.

14',

mesmo

a latitude celeste

procure-se a longi-

a qual é 46^

3'

maior

ponto tinha na época da

Seria pois necessário que decorressem quarenta e cinco sé-

criação.

culos, desde esta época, para

que o ponto central se tornasse circum-

polar oculto para aqueles habitantes, o que sucederia pelo ano de 700

Assim, na interpretação de Rizzacasa,

antes de Cristo.

podia ser a gente que habitou, nos primeiros quarenta os lugares da Terra situados por

A hipótese da Ara,

8.

45*^

Ql

prima gente

e cinco séculos,

de latitude boreal.

segundo Angelitti,

—O

sr.

Angelitti aceita,

da explicação de Rizzacasa, apenas a identificação das quatro estrelas da manhã com as que formam as chamas da Ara, excluindo deste terismo as três estrelas da tarde.

as-

Desagradando-lhe também supor,

com

Rizzacasa, que Dante, por equívoco, tivesse invertido a posição

real

da Ara,

restitue esta à sua verdadeira situação

lado do equador, de

modo

que, quando a

Ara

com

a base

do

surgia no horizonte, as

quatro estrelas das chamas, mais próximas do polo austral, nasciam primeiro, e já visíveis

E

em

qualquer das três hipóteses, atrás consideradas, eram

no momento das observações da tarde.

assim como os propugnadores do Cruzeiro do Sul procuraram

o grupo das três estrelas ção do Cruzeiro, sr.

mas

numa

região celeste

com

distante dele doze horas

em

a

mesma

Angelitti foi procurá-las na região celeste que, tendo a

clinação das

chamas da Ara, precede

declina-

ascensão recta, o

mesma

esta constelação 10 horas

de-

em

ascensão recta; de maneira que, quando, decorrido o intervalo de quatorze horas entre as observações

dá manhã

e as

da tarde, as quatro

qA astronomia dos Lusíadas

222

chamas

estrelas das

vão

três estrelas

vêem

se

a

pequena altura acima do horizonte, as

pouco depois da sua passagem superior pelo

altas,

meridiano, aproximadamente na

ocupava de manhã.

tro

em

registadas

trelas,

mesma

posição que o grupo das qua-

Satisfazem a condição requerida as três es-

último lugar,

com

números

os

A

constelação de Argo, no catálogo de Ptolomeu.

As

nopo, a Argiis, de primeira grandeza.

na

48, 44 e 46,

estrela

44

é a

Ca-

estrelas 48 e 4b identifí-

cam-se respectivamente com as que actualmente se designam por V

Puppis

e -

A

Puppis.

grandeza destas duas



classificada por Pto-

lomeu como teixeira magna^ devendo portanto colocar-se entre gunda e a terceira grandeza.

A

interpretação de Rizzacasa,. assim modificada pelo

satisfaz

bem

em

as condições

Nem

as estrelas da Ara,

nem

na Argo, estão suficientemente vizinhas do polo aus-

para junto do qual Dante dirige os olhos cheios de curiosidade:

tral,

Gli occhi miei ghiotti

Pur Si

9.

A



dove

come

andavan pure

le stelle

ai cielo

son piú tarde,

ruota piú presso alio stello.

hipótese de serem Jicticias as estrelas.

dores entendem que, ITQS facelle

nem

— Muitos

as quatro chiare stelle da

estrelas conhecidas savii d'Egitto

meridie»,

manhã, nem as fictícios.

appare loro

as do catálogo de Ptolomeu, observadas

Das quatro

latitude boreal de 3i°.

nada dizendo, a

tal

elas

não forem

respeito, do

estrelas são fictícias, êle deve tê-las

já cata-

As

de 1.022, «secondochè

infino alP ultima stella che

Dante expressamente que

gente,

em número

do poeta,

hanno veduto,

eram

numa

dria,

comenta-

da tarde, devem ser procuradas entre as estrelas

logadas no tempo de Dante, por serem todas elas astros

diz

Angelitti^

que o poeta define a posição dos dois

grupos de estrelas, exceptuando uma. as três escolhidas

sr.

a se-

estrelas

em

três.

in

Alexan-

da manhã,

vistas senão pclâ

grupo das

li

prima

Se as sete

imaginado naquela região celeste

que, desde a criação até ao seu tempo, tendo-se

em

consideração o

duplo movimento do céu estrelado, nunca poude ser vista senão pelos habitantes da zona terrestre compreendida entre o equador e o paralelo

de 3i" de latitude boreal.

Estes habitantes constituiriam a pri-

meira gente, não por ordem do tempo, mas pela ordem de situação

no globo, contada desde o equador. gente haveria

um

setientrional vedovo

Em sito,

contraposição à primeira região privada da vista

daquelas estrelas pela sua posição ao norte da latitude boreal para a qual tais estrelas seriam de perpétua ocultação.

É

natural,

porém, supôr-se que,

em

vez de limitar a zona da «pri-

meira gente» pelo paralelo de Alexandria, o poeta pensasse antes no

Cap.

X—

(yl

astronomia

em Dante

Camões

e

223

paralelo de Jerusalém, que mais lhe importava considerar, situado

32 graus de latitude boreal,

também

i

grau apenas mais ao norte,

O

as £.022 estrelas eram, de facto, todas visíveis.

numa

tório ficava

e

em

donde Purga-

posição antípoda de Jerusalém, de forma que a

na latitude de Jerusalém, era pre-

calote celeste, circumpolar oculta

cisamente a calote circumpolar aparente no Purgatório,

Na

latitude

boreal de 32 graus, é circumpolar oculta a calote celeste, tendo por

base o círculo descrito

em

torno do polo sul,

Dentro desta calote devem

32 graus.

com um

ter ficado

raio esférico de

constantemente com-

preendidas as quatro estrelas, durante todo o tempo decorrido desde

a criação até à época da viagem, para delas se poder dizer que nunca

tinham sido vistas senão pela primeira gente, se esta gente tuída

pelos

32 graus;

habitantes

lugares boreaes

dos

satisfeita essa condição, elas

é consti-

de latitude inferior a

não podiam

ter sido vistas

dos

lugares ao norte do paralelo boreal de 32 graus.

Na

hipótese de serem fictícias as estrelas, podem, dentro de certos

Vamos resumir

limites, escolher-se arbitrariamente as suas posições.

uma das soluções propostas pelo sr. Angelitti. Os dois grupos estelares teem a mesma declinação austral, mas o das três precede dez horas, em ascensão recta, ao grupo das quaEstas formam uma cruz com a haste dirigida para o polo austro. tral da eclíptica, tendo portanto a mesma longitude, tanto a estrela do pé como a da cabeça da Cruz

com uma

triângulo equilátero,

da

O

fictícia.

grupo das

três

forma

um

das bissectrizes na direcção do polo sul

eclíptica.

Como

Dante diz que, de tarde, as

três facelle

tinham subido ao

ocupavam de manhã, deve supôr-se que este lugar era antes da passagem superior pelo meridiano pois que, se esta passagem se tivesse já efectuado, o movimento das estrelas seria então de descida. E como também diz que as quatro chiar e stelle iam, à lugar que as quatro

tarde, baixas,

pode supôr-se que

elas

do polo do equador, na sua passagem

estavam no meridiano, debaixo

De manhã,

inferior.

quatorze

horas antes, elas estavam pois do lado oriental, duas horas antes da

sua passagem superior pelo meridiano e portanto

num

ângulo horário

de 33o graus.

Atribua-se ao pé da Cruz fictícia este ângulo horário de 33o graus, contados no sentido do movimento diurno, no momento

das observações matutinas.

Dê-se-lhe

uma

declinação

austral

80 graus, sendo portanto a sua distância polar de 10 graus. a estrela do pé ficará suficientemente vizinha do polo sul.

.

Si

.

.



dove

le stelle

son piú tarde,

come ruota piú presso

alio stelo.

de

Assim

^ astronomia

224

A

dos Li/síadas

ascensão recta do meridiano, limitando-nos à primeira hipótese^

de ascender, de manhã, no horizonte do Purgatório o i5." grau do signo

dos Peixes, era,

como sabemos, de

achava então 3o^ para

cia se

A

era de 282° 29'.

—56°

29'. Como o pé da Cruz fictído meridiano, a sua ascensão recta

esta ascensão recta e a

correspondem uma longitude de

leste

262°

uma

declinação de

uma

celeste de 278° 55' e

podem

para a época da viagem, valores estes que se

40',

como na

obter pelo método analítico, gráfico ou mecânico,

—80%

latitude celeste

resolução

do problema inverso.

Para termos conservar a

na época da criação, devemos

a longitude e a latitude

mesma

latitude

de 56°

segundo as ideias de Dante,

40',

e subtrair 65° da longitude, visto terem decorrido sessenta e cinco

A

208° 55',

uma

tância polar de 29°

17'.

A

declinação de

da criação, de 29°

17' e,

como vamos

—60°

na da viagem, de e

48', e

do pé da Cruz

distância polar da estrela

minuindo durante os sessenta

longitude celeste de

correspondem uma ascensão

estas coordenadas eclípticas

recta de 169° 27', e

uma

o que dá

séculos entre as duas épocas,

um

portanto

fictícia era,

uma

dis-

na época

Ela yeiu sempre de-

10°.

primeiros séculos desde a criação,

ver, até atingir o valor

mínimo de

9° 5o', e

aumentou

em

seguida, nos quatro séculos anteriores à viagem, até tomar o valor de

A

10°.

sempre

estrela conservou-se pois

invisível nos lugares situa-

dos ao norte do paralelo boreal de 32 graus.

A com

cabeça da Cruz

a

mesma

fictícia

considera-se formada por

longitude da do pé, e

cerca de 3° 44', de

modo que

com uma

a haste da

estrela

se

estrela,

latitude celeste

menor

Cruz tem uma extensão, de

Verifica-se que

cerca de sete vezes o diâmetro da Lua.

uma

também

esta

conservaria invisível nas latitudes boreaes superiores a

32 graus.

Como

vimos no

n.^ 2 deste

Capítulo (pág, 189), obtêm-se o valor

máximo, ou o mínimo, de declinação duma estrela, atingidos com o movimento lento do fi^rmamento, somando à sua latitude celeste, ou subtraindo dela, os graus de inclinação da eclíptica sobre o equador.

Assim

a estrela

austral, de 56°

do pé da Cruz

40'+

23° 3o'

= 80°

fictícia teria 10'.

Como

a declinação máxima,

a estrela é austral, este

valor seria atingido quando ela estivesse no semi-coluro dos solstícios

que passa pelo princípio de Capricórnio, tude fosse de 270°. 23° 3o' cios

= 33°

10',

quando

declinação teria o valor a estrela estivesse

que passa pelo princípio de Câncer,

tude fosse de 90°.

uma

A

isto é,

Assim

longitude celeste de 208° 55' e

uma

longi-

mínimo de 56°4o' —

no semi-coluro dos

isto é,

esta estrela, que,

quando a sua

quando

solstí-

a sua longi-

na época da criação, tinha

declinação austral de 60° 48',

X—

Cap.

(1/1

astronomia em Dante

a que corresponde a distância polar de

madamente

sessenta e

um

máxima mínima de 9° 5o'.

29*^ 17',

uma

Camões

teria,

longitude de

austral de 80°

então a declinação tância polar

séculos,

e

10',

225

volvidos aproxi270*^,

adquirindo

que corresponde a

a

dis-

Depois, durante os quatro séculos de-

corridos até à época da viagem, a longitude aumentaria até 278^ 5 S', e a. declinação

deminuiria até 80^, sendo portanto de 10^ a distância

polar.

Como

mínima declinação, atingida pela estrela do pé da Cruz, durante o movimento lento do firmamento, é de 33^ 10', a calote do a

globo terrestre, limitada pelo paralelo traçado

em

com um

de perpétua ocultação

raio esférico de 33®

O

para esta estrela. fica boreal,

uma

10',

é

a calote

torno do polo norte

paralelo terrestre, de 56° 5o' de latitude geográ-

destaca pois para' o norte, sobre a superfície da Terra,

calote para a qual a estrela é de perpétua ocultação.

res, nela situados, constituiriam o settentrional

ção ao pé da Cruz

vedovo

sito,

Os em

lugarela-

fictícia.

Não entraremos em mais

particularidades.

Admitindo que Dante

imaginou os seus dois grupos de estrelas na região circumpolar austral,

inobservada pelos astrónomos do Egito, outras soluções se

podem

formular, alem da que acabamos de resumir, satisfazendo a todas as

condições de posição indicadas pelo poeta.

Dante

ter visto,

num

simples volver de olhos, sobre

Ele teria assim deixado as suas quatro chiare

numa

um

globo celeste.

stelle e as três facelle

indeterminação poética.

9.

Conclusão.

— Das

três interpretações,

de fazer, aquela que considera se inclina o sr. Angelitti, é a

A

Essas soluções podia

sr.

com

Angelitti,

a própria modificação in-

não chega a satisfazer completamente.

A hipótese, patente.

acabamos

dantescas, e à qual

que satisfaz a todas as indicações do poeta.

interpretação da Ara, de Rizzacasa,

troduzida pelo

cuja análise

fictícias as estrelas

porem, do Cruzeiro do Sul é inaceitável, como ficou Esta última conclusão é a que sobretudo nos importa.

bem

Alguns comentadores dos Lusíadas aproximam da primeira parte da estância V, 14: Ia descuberto

tínhamos diante

La no nouo Hemisperio, noua estrella Não vista de outra gente, que ignorante Algus tempos esteue incerta

a

d'ella,

passagem do Purgatório: .

Non

viste

.

.

e vidi quattro stelle

mai fuor che

alia

prima gente,

220

qA asironomia dos Lusíadas

dando como certo que à nova que

fala

Camões,

provado o erro de



nova constelação, de

estrela, isto é, à

Dante aludia com as suas

tal

opinião, que

tem

qiiattro stelle.

Fica

tido o inconveniente principal

de contrariar o reconhecimento da origem portuguesa do Cruzeiro,

jus-

tamente registada por Camões naqueles versos.

Provam

esta origem: o

João de Lisboa, redigido

Tratado da Agulha de marear do

em

piloto

i5i4, onde se ensina o uso náutico do

Cruzeiro do Sul; e a carta que a D. Manuel escreveu, de Vera Cruz, o físico M.^ João, piloto de Cabral, já

desta constelação.

estrelas da

de

1

em

i

de maio de i5oo, falando-lhe

Vimos, no anterior Capítulo, como as quatro

mandorla descrita na carta de Vespúcio, de i8 de

julho

podem ser as do Cruzeiro. Finalmente, acabou de mosque também a este asterismo não pertencem as quatro estrelas

5oo, não

trar-se

de Dante.

Não pode

pois restar dúvida que foram os marinheiros portugueses

que souberam destacar no firmamento este grupo estelar, tão próprio para lhes servir de guia nas navegações austrais.

no seu imortal poema, este honroso

facto,

que

Camões

bem prova

enaltece,

o saber as-

tronómico dos navegadores portugueses, os quais descobriram, não só

novas terras trelas».

e

novos mares, mas, «o que mais

é,

novo céu, novas

es-

.

índice remissivo das estâncias comentadas

Pág.

Pág.

Canto

Canto

estância

I,

— — — — — — — —

estância

II,

— — — — — — — — Canto

III,

.

estância

— — — —

— — — —

8

.

21

,

27

.

33

.

.

62,

42 56

.

92



71

.

71 .

i53

»-

3o, 86

33 .

63

68

.

i5,

3o

33,

86

.

96

.

73

7^

92 io5

91 .

72

.

123

6

95



»9

20 22

59 65

85

69

83,84

.

74» 75

.

80

.

90

37,71 .

.

.

101

i52,

174

2

82,91

7

95

.

.

i3

.

.

.

14

.if 2,1 54, 225

i5

.

1

-95

97,119,121

17

.

.

.

106

18

.

.

.

107

.

107

.

107

19

.

.

22

.

.

.

24

.

.

25

.

.

26

.

.

— —

27

.

.

37

.

.

.

38

.

.

.

61

.

.

.

73

67

.

.

.

io3

78

.

.

.

92

84

.

.

93

10

.

II

.

.

.106 3o,

76

i34, 147

i34

.

95, i36

72 lOI

.

68

.

68

12

.

.

68

38

.

.

87

39

.

47 84 85

.

.

87

.

.

io5



97

'



.

60

.



61

.

VIII, estância 32

.

27



.

.

Canto VII, estância 14

Canto

10

,*

.

— — — — — — — —

98, 192

110

12

.

Canto VI, estância

io5

.

.

ii5

76

io5

.

.

71

67

.

.

23



100

7

9

.



— — — —

— — — —

100

109

--



35

I





.

— — ^ — — —

59

60



192

io5

38

65

Canto V, estância

102

Canto IV, estância 27

Canto V, estância

71, i52

29, 81

.

.

.

.

.

.

173

.

i53

35, 69,

85

.

96

.

68

qA astronomia dos Lusíadas

228

Pág.

Canto

VIII, estância 67



'~~'





.

72

.

.



^72

.

i5i

ág.

Canto X, estância 86

.

í6, 58, 59,

:

83,177,179 87

121, 122,

13,27,33,

.

172, 187

Canto X,

estância

— — —

75

.

.

76

.

.

77



39, 40, 55, 56

— — — —

.

41, 56

80

.

43, 57

81

.

79

85



53 39, 53

.

78

52

— — —

87

.

62

.

89

.

i3,

62

90

.

i5,

66

91

93

129



. '

,39

.



140

.

26, 55, 57

--

141

.

68 100



.

57

.

5o, 61,

88

.

.

95

.

119

-

173

173, 174

Colocação das estampas

Em frente da pág.

Frontispício do Tratado da Sphera

Primeira página da Theorica do Sol e da

Fragmento da Página

A

A

final

7

Lua

12

terceira página da Theorica do Sol

14

da Sphaera Mundi

22

máquina do Mundo, extraída da Margarita Philosophica sétima esfera, extraída da Margarita Philosophica

Página de novembro do calendário do Regimento de Munich Astrolábio do Rei Afonso

X

de Castela.

55

....

64 182 142

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Coimecticut

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