Charles Breaux - Jornada Rumo à Consciência.pdf

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Charles Breaux

JORNADA QUMO À CONSCIÊNCIA Os Chakras, o Tantra e a Psicologia Junguiana

Pensamento

JORNADA RUMO À CONãCIÊNCIA Os Chakras, o T antra c a Psicologia Junguiana

Charles Breaux Tanto na psicologia tântricacomo na jun­ guiana, as práticas espirituais e os métodos te­ rapêuticos estão vitalmente associados a uma participação consciente na vida ordinária. Am­ bas as psicologias valorizam as etapas da trans­ formação alquímica da consciência humana. O tantra simboliza a nossa metamorfose num sis­ tema de chakras que se abrem à medida que despertamos progressivamente para as várias dimensões da psique. Da perspectiva junguiana, os temas universais presentes nas inumeráveis histórias de heróis e de heroínas, de deuses e deusas, evidentes no mundo todo, são dramatizações dos estágios de desenvol­ vimento do nosso crescimento na direção da consciência. Neste livro, Charles Breaux, um terapeuta junguiano, ajuda a assentar os alicerces para uma compreensão psicológica prática dos chakras. Para che­ gar a este objetivo, ele desenvolveu o conceito histórico e filosófico do Tan­ tra, o solo natal do sistema dos chakras, e demonstra o quanto o Tantra e a ps cologia junguiana se completam. O tema principal de Jornada Rumo à Consciência 6 a relação do Tai tra com o nosso mundo interior e com a vida em geral. O Tantra compreei de que as forças vitais do cosmos não são diferentes das do corpo e da mei te. Seu interesse maior 6 a total aceitação de ambas e a transformação da nos­ sa consciência daí resultante. E D IT O R A PE N SA M E N T O

CHARLES BREAUX

JORNADA RUMO À CONSCIÊNCIA Os Chakras, o Tantra e a Psicologia Junguiana

Tradução EUCLIDES LUIZ CALLONI CLEUSA M. WOSGRAU

E D IT O R A P E N S A M E N T O S äo P a u lo

Sumário

Introdução 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8.

Raízes Tântricas e Relevância A Caverna dos Antigos Sua M orada Especial O reino do Resplendor O Reino do Som Sagrado A Grande Purificação O Oceano de Néctar A Praia Além Glossário Bibliografia

9 19 54 74 93 114 134 168 202 243 250

IN TRO D U ÇÃ O

Adquiri meu prim eiro livro sobre ioga quando ainda adolescente. Nele havia a figura de um ioguc em m editação com sete lótus ao longo de sua coluna. O autor m encionava uma m isteriosa força (Kundalini) que sobe através dos lótus (chakras), e falava dc animais e divindades estranhas que supostam ente habitam nesses vários chakras. Essas imagens exóticas intrigaram -me, parecendo evocar lembranças antigas que eu não podia recordar. M inha mente racional ficava cism ando sobre o sentido deste estranho “ioga” oriental. Na escola, com ecei a ler literatura teosófica. O livro de Lcadbeater sobre os chakras, embora muito interessante, ainda me deixava confuso sobre a utilidade do conhecimento dos chakras para mim. Muitos anos se passaram , e as informações sobre os chakras são lugar-comum nos círculos da Nova Era, mas não menos confusas. Vários autores e professores, em bora convincentem ente dogm áticos, polemizam sobre o significado c as funções dos chakras. Por exemplo, há muitas discrepâncias entre as com binações de órgãos, glândulas endócrinas, notas musicais, cores e os significados atribuídos aos chakras, para não m encionar as num erosas panacéias para equilibrá-los e purificá-los. Neste livro quero ajudar a assentar os alicerces para uma com ­ preensão psicológica prática dos chakras. Para chegar a este objetivo, desenvolverei o contexto histórico e filosófico do Tantra, o solo natal do sistema dos chakras, e demonstrarei o quanto o Tantra e a psicologia junguiana se com plem entam . Para com eçar, gostaria de expor breve­ mente algum as dc m inhas experiências e conhecimentos.

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Depois de concluir meus estudos na faculdade, onde estudei psi­ cologia, filosofia, e religiões do mundo inteiro, meu idealismo juvenil convenceu-me a ir em busca da iluminação — a única meta digna. Tor­ nei-me um asceta moderno. Um período de três anos de reclusão c m e­ ditação intensa resultou na experiência do despertar da Kundalini. Por vários dias e noites, uma dor ardente queimava no interior de minha pelve c meu baixo-ventre. Em seguida ela subiu através da coluna até o topo de minha cabeça, deixando-me num estado de êxtase por diversas sem a­ nas. Eu esperava ser transformado numa espécie de ser “iluminado” mági­ co; em vez disso, deparei-m e apenas com o início de uma jornada incrível. Este primeiro encontro com a kundalini estimulou a abertura das habilidades de clarividência e cura. Aproximadamente um ano mais tarde, problem as digestivos graves, incuráveis com tratamento médico, forçaram-me a em pregar essas habilidades para curar a mim mesmo. Em seguida, com ecei a trabalhar com outros e posteriormente passei a dar aulas sobre consciência psíquica e cura. Nesse período, efetuei vários experimentos com métodos destinados a um trabalho com os chakras. Meus conhecim entos de psicologia ajudaram-me a organizar e inter­ pretar as impressões psíquicas que via na aura e nos chakras. Descobri que a psicologia junguiana era especialmente pertinente. Num dia abençoado, um amigo apresentou-me ao Tantra tibetano. Foi-me perm itido participar de uma pequena cerim ônia privada dos alunos mais adiantados de Gyalwa Karmapa, a 16* encarnação do chefe da linhagem Kagyu do Budismo tibetano. Nessa cerimônia, Karmapa colocou uma coroa preta sobre a sua cabeça e transmitiu uma poderosa força espiritual. Tive um a experiência muito profunda e fui inspirado a seguir Karm apa ao longo da Costa Oeste recebendo instruções e iniciações. Nos anos que se seguiram, estudei com outros vários lamas e participei de vários retiros de meditação. À medida que me apro­ fundava no estudo do Tantra, percebi que muitos dos métodos que havia desenvolvido intuitivam ente para trabalhar com os chakras eram muito semelhantes ao Tantra. No verão de 1981, fui uma vez mais abraçado pela deusa Kundalini. Por um período de vários meses, tive numerosos encontros

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com ela e experimentei uma série de iniciações tântricas durante a meditação. Também revivi várias vidas com o iogue e com o lama, o que me propiciou maior discernimento do Tantra e do meu fascínio por ele. Essencialm ente, o Tantra diz respeito à nossa relação com a natureza primordial do cosmos. Com o ele é cristalizado, ou por outra, obscurecido, no corpo-m ente-alm a? Como somos transformados quando ele se liberta de sua armadilha pela tendência a formar um sentido individual de identidade? Somos, nós e ele, a mesma coisa? Como encontram os respostas para estas questões? O Buda Gautama atou seis nós num lenço de seda c perguntou a um discípulo como eles poderiam ser desfeitos. Fazendo os seis nós, Buda estava m ostrando como nossas identidades individuais estão entrelaçadas pelos nós do ego em cada um dos seis chakras inferiores. Ele ensinou que devemos desatá-los na ordem inversa daquela em que foram atados. Há um a crença comum que sustenta que o despertar da Kundalini, que ocorre à medida que os nós são liberados, é sinônimo da obtenção da iluminação. Devo dizer que não é assim tão simples. Na verdade, se não som os diligentes em integrar a em ergência crescente dos conteúdos inconscientes e os padrões cármicos, podem os muito bem ser impie­ dosam ente lançados num pesadelo vivo, real. Cari Jung, em Aspects o f the Feminine, aconselha-nos a não despertar os cães porque a perigosa jornada ao inconsciente não é útil nem necessária até que sejamos levados a ela por necessidade. Ele diz que o m edo de nosso lado interior é às vezes saudável porque, uma vez que entrem os em seus mistérios, os padrões científicos e morais do nosso mundo “conhecido” se dissolvem sobre nossos pés. Também mostra o quão profundamente enraizado está esse medo do mundo interior, sugerindo que ele fez com que a mente prim itiva criasse idéias e práticas religiosas e atribuísse poder ao xamã e ao sacerdote para proteger-nos contra ele.1

(1) Carl Jung, Aspects o f the Feminine, Bollingen Series (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1982), p. 92.

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Embora o antigo sistema do Tantra provenha das mesmas profundezas históricas da psique, suas conclusões e práticas são únicas. A relação do Tantra com o nosso m undo interior — e com a vida em g e ra l__é o tema principal deste livro; por ora, mencionarei apenas que o Tantra compreende que as forças vitais do cosmos não são diferentes das do corpo e da mente. Seu interesse m aior é uma total aceitação de ambas e a transformação da nossa consciência daí resultante. Pode-se prontamente com parar esta orientação com a psicologia junguiana. Do ponto de vista desta, estamos envolvidos num processo progressivo de realização denominado individuação. Através desse processo, nós, com o unidades individuais de vida e de consciência, expandimos gradualm ente nosso cam po de referência para abarcar os reinos pessoal e individual do inconsciente. A individuação ocorre através das experiências em nosso mundo dos sonhos e dos eventos da nossa vida diária; na verdade, o mundo exterior é considerado pelos junguianos um a tela em branco sobre a qual são projetadas as imagens do inconsciente. Com o na perspectiva tântrica, nossas vidas são vistas com o sonhos despertos, o representar espontâneo de temas arquetípicos — mitos etemos. A vida vive por nosso intermédio; a aceitação dela, como é, desde sua banalidade até sua sublim idade, é a base para o nosso desenvol­ vimento psicológico e também espiritual. Daí que na psicologia tântrica ou na junguiana as práticas espirituais e os métodos terapêuticos estão vitalmente associados a um a participação consciente na vida ordinária. Ambas as psicologias valorizam as etapas da transformação alquímica da consciência humana. O Tantra simboliza a nossa metamorfose num sistema de chakras que se abrem à medida que despertamos progressivamente para as várias dim ensões da psique. Em cada um desses sete chakras, divindades e outros símbolos retratam os conteúdos e suas funções encontrados em cada nível. Da perspectiva junguiana, os temas universais presentes nas inumeráveis histórias de heróis e heroínas, deuses e deusas, evidentes no mundo todo, são dramatizações dos estágios de desenvolvimento de nosso crescimento na direção da consciência.

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Em The Origins and History o f C onsciousness* o analista junguiano Erich Neumann m ostra como nós, como indivíduos, per­ corremos os mesmos estágios dc desenvolvim ento por que evoluiu a humanidade coletivam ente. Projetadas na m itologia do mundo, essas fases arquetípicas com eçam e terminam com imagens da serpente que devora a própria cauda (Uroboros). Os estágios interm ediários incluem: a Criação do M undo, a Grande Mãe, a Separação dos Pais Terrestres, O Nascim ento e as Provações do Herói, O Exterm ínio do Dragão, O Resgate e Romance com a Donzela Cativa, e a Transform ação e Divinização do Herói. No texto que segue, relacionarei esses estágios arquetípicos com os sete chakras. As práticas tântricas e a psicologia junguiana coincidem e aperfeiçoam -se m utuam ente em muitos aspectos. A psicologia ocidental é devedora de um enorm e apreço, e na verdade dc aprendizado, aos m uitos milhares de anos de pesquisa tântrica nos dom ínios transpessoais da psique. O Tantra, por sua vez, beneficia-se do conhecimento prático dos aspectos mais contem porâneos e pessoais dos processos psicológicos ocidentais. Há muitas diferentes seitas e uma com ucópia de ensinam entos no Tantra hindu e budista. Usufruí principalm ente o Tantra tibetano devido as m inhas experiências iniciais com o mesm o e porque ele ainda está muito vivo em nossa época. Dele extraí o que sinto ser o mais fundamental e apresento esta essência, quando possível, por meio da psicologia junguiana. A linguagem do Tantra é visionária, rica em sím bolos e metáforas produzidas espontaneam ente nas meditações de antigos iogues. Em m uitos casos é m elhor deixar que elas se comuniquem com o seu ser interior em vez de tentar uma tradução para a mente racional; por isso incluí uma prática de meditação no final de cada capítulo, usando

(*) Publicado com o nome de História da origem da consciência pela Ed. Cultrix, São Paulo, 1990.

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divindades e procedimentos lântricos tibetanos. Este é o melhor modo de transmitir o que o Tantra é realmente. Embora extraído diretamente da experiência com a fonte original, quero deixar claro que o que apresento aqui não deve ser considerado Budismo tibetano ortodoxo. Exponho um modo pelo qual o método tântrico pode integrar-se com abordagens ocidentais contemporâneas relacionados com a cura e com o desenvolvim ento do corpo e da mente. Ao expor a perspectiva fundamental do Tantra tibetano, retirei muito dos seus adom os culturais. No The Torch o f Certainty, Jamgon Kongtrul mostra como nossa mente ocidental tem dificuldade para apreender plenamente o fundo cultural da tradição tibetana. Ele conclui que é inadequado e desnecessário impô-lo a nós. Tudo o que se requer é uma apresentação das “obras básicas da m ente” relacionadas com os ensinamentos.2 À prim eira vista, a doutrina tântrica poderia ser considerada uma mitologia ou superstição extravagante por aqueles de nós que estamos saturados de racionalism o ocidental. Sem estudar a psicologia junguiana ou a mitologia, são poucos os que podem apreciar as verdades psicológicas prim orosamente entrançadas no tecido dos ensinamentos tântricos. Para a pessoa média, portanto, os ensinamentos essenciais são mais bem explanados em termos fáceis de apreender e de aceitar. Há necessidade de uma síntese, de um ponto de encontro, entre a abordagem tântrica e nossa perspectiva científica ocidental. Felizmente, este ponto de encontro está bastante bem estabelecido; a evidência científica de eventos parapsicológicos é hoje considerável. A telepatia, a clarividência, a reencarnação, a aura e mesmo a existência e as emanações dos chakras foram todas cientificamente pesquisadas e até certo ponto verificadas.3 As semelhanças entre a perspectiva

(2) Jamgon Kongtrul, The Torch o f Certainty (Boston: Shambhala, 1986), pp. 12-3. (3) Uma referência recomendável é Hands o f Light, de Barbara Ann Brennan (NY. Bantam, 1987). [Mãos de luz — Um guia para a cura através do campo de energia humana, Editora Pensamento, 1990.]

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mundana do místico e as do físico moderno também foram exploradas. É neste terreno intermediário que reúno os dois sistemas do Tantra tibetano e da psicologia junguiana. O ponto seguinte que tive de enfrentar ao apresentar os ensinamentos tântricos foi pessoal: fiz votos de não revelar muitos dos ensinam entos que recebi. Trabalhei esta questão não discutindo aqui quaisquer métodos que não tenham sido publicados em outras obras e com partilhando as verdades intuitivas de minhas experiências pessoais. Não há dúvida de que os métodos tântricos expostos neste livro serão mais eficientes quando reforçados por um lama no seu devido contexto. Todavia, devido ao seu significado arquetípico, sinto que as visualizações apresentadas nos capítulos iniciais podem ser úteis a qualquer praticante sério. Entretanto, as técnicas mais avançadas, bre­ vemente delineadas nos capítulos 6 a 8, não devem ser experimentadas sem a direção de um instrutor competente. Um terapeuta junguiano e um lam a tibetano desempenham uma tarefa semelhante para seus respectivos clientes e alunos. Ambos são veteranos na jom ada interior que nos guia através dos perigos e armadilhas, se cooperam os em nossa busca da cura e da inteireza. Há muitos valiosos livros de auto-ajuda psicológica, mas não podemos comparar a ajuda que esses nos dão à assistência proporcionada por um terapeuta competente. Assim também este livro não substitui um ins­ trutor de Tantra genuíno. Se você se sente atraído pelos ensinamentos e práticas tibetanos, eu o estim ulo insistentem ente a procurar um dos m uitos centros Dharm a do mundo ocidental. As práticas da tradição tibetana foram escritas por homens, com a intenção de serem utilizadas prim eiram ente por homens. Nas meditações que aqui apresento, foi feita a tentativa de equilibrar as perspectivas masculina e feminina. Por conseguinte, algum as das visualizações e dos procedimentos apresentados foram alterados para abranger as mulheres. Apesar disso, em algum as meditações, pedir-se-á a um homem que se identifique com uma divindade feminina; em outros casos, uma mulher deverá visualizar-se com o uma divindade masculina.

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Há numerosas discrepâncias menores nas diferentes seitas e tradições entre divindades c práticas meditativas; não estam os aqui tratando de um a realidade científica rígida e precisa, mas da natureza camaleônica vital da psique. Tentei, portanto, demonstrar os princípios essenciais do método tântrico. Se você decidir experim entar os métodos que descrevo, por favor considere-os símbolos e ferramentas que podem guiá-lo às suas próprias experiências interiores. Deixe que se trans­ formem em realidade viva através das forças arquetípicas e do instrutor que existe dentro de você mesm o (a Mente búdica ou, em termos junguianos, o Self) que eles são capazes de evocar. Para concluir, desejo apresentar um fato no qual tenho um interesse pessoal. Uma jovem m ulher que estivera vivendo no ashram de um muito conhecido “guru das m assas” veio a mim sofrendo de graves dores na região lombar e de inflam ação nos órgãos genitais. Ela permanecera estritamente casta enquanto praticava Ioga Kundalini por diversas horas diárias seguindo as instruções do seu mentor. D iploma­ ticamente, tentei dizer-lhe que talvez seus problemas físicos estivessem relacionados com questões emocionais. Quando sugeri métodos tera­ pêuticos que a ajudassem a integrar algumas dessas questões, ela se tor­ nou muito defensiva e confidenciou que não necessitava de tratar desse assunto porque sua prática espiritual e seu instrutor cuidariam disso. Custou-me muito acreditar no fato de que, enquanto seu instrutor a encorajava a continuar a ativar a Kundalini, ela desesperadamente a impedia de subir através do seu segundo e terceiro chakras, porque “não desejava tratar desse assunto”. Aproximadamente seis meses mais tarde, porém, no próprio ashram, a represa rompeu-se e ela foi entregue aos cuidados de um sanatório psiquiátrico. Ao longo dos anos testemunhei exem plos semelhantes de pessoas que, por pura força de vontade e idealism o religioso, ignoram suas responsabilidades psicológicas, ao mesmo tempo em que seguem em busca de algum a panacéia espiritual. Muitos desses bem-intencionados “esquizofrênicos espirituais” estiveram sendo cortejados pelo hoje carismático e com freqüência autoproclam ado guru comum. ’ A abertura espiritual ocorre som ente por meio do livre fluxo da

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energia prim ordial do cosm os através do corpo e da m ente. Isso pode acontecer de modo gradual ou em irrupções dramáticas, dependendo de variáveis como o grau de abertura ocorrido em vidas anteriores e o nível de resistência psicológica na vida atual. Pessoalmente, acredito que é mais prudente e seguro trabalhar na remoção de bloqueios psicológicos (o que significa que você antes deve dar-se conta de que eles estão aí e desejar trabalhar sobre eles) do que fazer uso de técnicas para forçar o despertar da kundalini. A iluminação é uma fruição da maturidade psicológica, c sua habilidade para crescer e desenvolver-se psicologicam ente não pode ser isolada do atendim ento de suas necessidades físicas. Estes três aspectos de você mesmo não estão separados, mas constituem parte de um continuum. Esta não é necessariam ente uma idéia nova, mas é muito importante. Em outras palavras, o ego-self é o veículo pelo qual você se desenvolve. O Buda G autama usou esta metáfora: o ego-self é como uma jangada que o conduz através do rio da vida. Sem ela não se pode atravessar, mas quando alcançam os a praia oposta, ela não é mais necessária: na verdade, seria muito incômodo tentar arrastá-la à medida que você escala os picos sublimes da consciência. O formato deste livro com eça no chakra-raiz e segue o caminho do seu continuum físico-psicológico-espiritual através dos chakras, considerados nesta perspectiva como estágios progressivos da evolução da psique. Este cam inho nem sempre alcança os cumes; freqüentem ente desce a gargantas profundas, às vezes se move ao longo de correntes de água, através de vales, desertos e altos picos do seu ser interior. Sua direção nem sem pre parecerá clara à medida que você se aventura na região agreste interior. Quando você dá um passo para fora de sua própria som bra, você entra na luz interior. É então que você percebe que de sob todos os medos, desejos, sofrim entos e preconceitos do ego-self irrompe o impulso básico a lem brar sua natureza essencial. Este é o mesmo processo progressivo, sem em bargo de como você possa denominá-lo. Embora aproxim ando-se deste processo misterioso vindos de ex­

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tremidades opostas do espectro histórico e de lados opostos da Terra, tanto o Tantra quanto a psicologia junguiana aspiram a penetrá-lo e a criar condições necessárias no corpo e na m ente para que a trans­ formação espiritual possa ocorrer.

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Capítulo Primeiro RAÍZES TÂNTRICAS E RELEVÂNCIA Ninguém conhece a idade do Tantra. Os mais antigos textos publicados são hindus, com data de 500 d.C. O primeiro texto budista apareceu em tom o de 600 d.C., mas há ensinam entos anteriores não publicados que foram transm itidos diretam ente do instrutor para o aluno por muitas centenas de anos. As raízes do Tantra, entretanto, inseremse na história rem ota da cultura indiana. O Tantra hindu e budista formam os troncos principais de uma árvore que se desenvolveu a partir de cultos e tradições orais longínquos, troncos esses que se ramificaram ao Nepal, ao Tibete, à M ongólia, à China, ao Japão, ao Cam boja, a Java, ao Oriente Próxim o e, mais recentem ente, ao mundo ocidental. A serena civilização da índia antiga perm itiu que o Tantra bro­ tasse das profundezas férteis d a mente psicológica e florescesse em alguns dos mais devotados pensadores espirituais do mundo. Alguns dos seus mitos e rituais são tão antigos como o período Paleolítico (por volta de 20000 a.C ). No complexo da caverna pré-histórica de Pech-Merle, na França, por exemplo, há uma câm ara com emblemas femininos que, como informa Philip Rawson, são muito semelhantes aos que ainda hoje são venerados nos santuários indianos.1

(1) 1973), p. 7.

Philip Rawson, Tantra: The Indian Cult o f Ecstasy (Nova York: Avon

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Nas culturas pré-históricas, o poder criador do cosmos geralmente era adorado como a Deusa Mãe; a cultura hindu prim itiva não constituía exceção. Representada em vários artefatos indianos, ela é freqüente­ mente associada com anim ais, cujos valores sagrados e cultuais eram relacionados com a força e virilidade sexual. A ênfase dada à fertilidade não se restringia a imagens de deusas e de animais. Havia figuras çnasculinas sentadas em posturas de ioga, tendo à cabeça uma peça adornada com chifres e brandindo pênis eretos. Falos eretos entalhados em pedra, alguns de até 61 centímetros de com ­ primento, também demonstravam essa primitiva adoração pelos poderes geradores da natureza. O deus Shiva, que por fim tornou-se uma divindade maior no Tantra hindu, sem dúvida era um desdobramento desses cultos hindus. Shi­ va freqüentemente é representado como um deus com chifres dos em ­ blemas indianos, sentado em postura de ioga com o pênis ereto. Seu símbolo universal é um falo ereto (o linga), e seu veículo é o touro Nandi. Na índia antiga, a única e maior mudança drástica social foi a invasão dos indo-curopeus (arianos) em tomo de 1500 a.C. Os arianos levaram com eles um panteão de deuses celestes, um grupo de sacerdotes que entoavam hinos e cumpriam rituais e uma substância psicoativa cham ada soma, que induzia a estados de êxtase e propiciava poderes mágicos. Os arianos constituíam uma cultura guerreira e patriarcal. Eles acreditavam que podiam controlar os deuses por meio de seus rituais e poderes mágicos. No decorrer do tempo, seus rituais tomaram-se simulações complexas para todo o cosmos, e o sacerdócio tomou-se uma hierarquia poderosa. A adoração de deusas locais, proveniente de cultos hindus mais antigos, continuou a florescer independentemente dessa tradição védica. Muitos cultos populares se formaram em tom o de diferentes deusas e modos de adoração. Como toda a vida animal provém do ventre da fêmea, o universo era visto miticamente como procedendo da deusa. É ela que incorpora a consciência no mundo da m atéria e dos sentidos e, cm contrapartida, a libera. Por conseqüência, um a mulher em quem a

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deusa se realizava era sum am ente reverenciada, e a relação sexual ritual com ela constituía uma iniciação nos mistérios. Essas práticas cultuais eram bem contrárias às tradições védicas ortodoxas. Enquanto no Tantra a energia sexual era adorada e desfrutada com o meio de unir-se aos processos cósmicos, as tradições védicas eram favoráveis a um acúm ulo repressivo do poder sexual sagrado. As disciplinas ascéticas estavam relacionadas com a posição social; para o sacerdote ou para a pessoa investida de autoridade, o armazenamento desse poder sagrado era muito importante pois im aginava-se que enchia seu corpo com energia espiritual, pelo que se supunha que poderes mágicos fossem adquiridos. Por volta do século V a.C., houve muitas mudanças políticas e econôm icas na cultura ariana. Práticas religiosas populares, por longo tempo oprim idas pela tradição védica, em ergiram e com binaram-se com novos sistem as de pensamento. Esses sistemas enfatizavam o esforço pessoal mais do que o dogm a e baseavam -se na experiência de instrutores que dem onstravam pelo exemplo os frutos de suas práticas espirituais. É por isso que grandes mestres com o M ahavira, fundador do movimento Jaina, e Siddhartha Gautama, fundador do Budismo, atraí­ ram m uitos buscadores fervorosos. Nos séculos que se seguiram, a tradição védica imitou muitos dos métodos de m editação, divindades e elem entos filosóficos dessas reli­ giões populares. O que hoje se conhece com o ioga é resultado dessa síntese. O sistema iogue consistia numa disciplina pela qual o corpo, a mente e os sentidos podiam vincular-se à natureza espiritual. Um estado de superconsciência era assim atingido, fazendo com que a distinção entre o self e o Self (vivenciado como consciência universal pura) se dissolvesse. No sistem a iogue, divindades pessoais populares substituíam Brahma, o deus védico supremo e impessoal, que representava o Absoluto além de todo o nome e toda a forma. Shiva e Vishnu, por exem plo, tom aram -se deuses personalizados e centros de sistemas iogues que incorporaram práticas tântricas antigas. Esses iogas tor-

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naram-se o veículo para o que nos referiremos com o Tantra hindu. O Budismo foi outro produto significativo da renascença religiosa nessa época na índia. Siddhartha Gautama, um jovem príncipe que seria mais tarde renomado com o o Buda, abandonou sua família e herança real para sair em busca de uma vida espiritual. Ele viajou pela índia estudando com diferentes mestres e seitas, eventualmente rejeitando seus métodos austeros e sua metafísica cheia de sutilezas para, finalmen­ te, instituir o Caminho do Meio. Seus ensinamentos práticos passaram a constituir o cânon da Escola do Budismo Hinayana (o Pequeno V eí­ culo), pelos discípulos que o sucederam. Aproximadamente 500 anos mais tarde, uma doutrina muito difundida tom ou-se conhecida como Escola do Budismo M ahayana (o Grande Veículo). Nas diversas cente­ nas de anos que se seguiram , m ais e mais elementos tântricos foram integrados ao Budismo. O Tantra budista evoluiu secretamente e/ou lentamente por quase um milênio, florescendo em sua glória plena entre os séculos VIII e XII. Em justaposição às grandes universidades budistas ortodoxas, o Tantra budista propagou-se através de sábios excêntricos. Os mais famosos dentre eles eram itinerantes cabeludos, que ridicularizavam as tradições monásticas rígidas e as convenções estreitas do sistem a de castas hindu e se dedicavam à prática da “Sabedoria Excêntrica”. Esses Mahasiddhas — iogues com grandes (m aha) poderes (siddhas) — desfrutavam suas experiências místicas ao mesmo tempo em que se entretiam com o esporte da realidade mundana. Ensinavam pelo exem plo, mais do que pelo intelecto. A liberdade existencial de suas vidas com freqüência dava lugar a comportamentos e eventos que fragmentavam as estruturas rígidas da mente dos discípulos com metáforas vigorosas e bizarras. Na época dos M ahasiddhas, a índia estava sendo invadida pelos exércitos islâmicos. Pelo século XII, o Budismo havia sido erradicado do solo indiano pelos militantes muçulmanos. A essa altura, o Budismo tântrico já havia sido transplantado para o Tibete com sucesso. Ao ser levado para o Tibete, o Budismo tântrico defrontou-se com a religião nativa Bon, uma antiga tradição xamânica. Há histórias muito expressivas que mostram com o iogues poderosos domesticaram

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com seus poderes m ágicos dem ônios amedrontadores da velha religião Bon. Depois de subjugados, esses demônios tom aram -se guardiões dos ensinamentos budistas e foram incorporados ao panteão budista das divindades de meditação. O Tantra hindu continua vivo através de m iríades de cultos populares e obscuros, mas nunca constituiu uma instituição definida. A tradição tibetana, por seu turno, desenvolveu sua própria forma de teocracia e estabeleceu uma instituição sem elhante à da Igreja Católica. Desde 749 d.C., quando o sábio indiano Padm a Sambhava introduziu os Tantras budistas no Tibete, os ensinam entos foram pre­ servados e aperfeiçoados por uma linhagem de lamas iluminados que retom am de um período de vida após outro. Lamas clarividentes es­ pecialmente treinados localizam esses m estres reencam ados e orientam-nos para mosteiros num a idade ainda precoce. Freqüente­ mente, esses lamas especiais deixam uma carta indicando o tempo e o lugar exatos de sua encarnação seguinte. Este é um exem plo da preci­ são das técnicas tibetanas e evidencia que seu poder foi essencial­ mente mantido. O Tantra budista veio recentem ente para o O cidente e está com rapidez se enraizando na mente de buscadores fervorosos. Isto na verdade foi previsto pelo grande iogue Padma Sam bhava, que afirmou que os ensinam entos do Budism o chegariam à terra do Homem V er­ melho quando o povo tibetano fosse dispersado com o formigas, o pássaro de ferro voasse e os cavalos corressem sobre rodas. Devido à invasão com unista no Tibete, esta profecia de Padm a Sambhava, feita no século VIII, está se tom ando realidade. Os principais centros do Budismo tibetano estão agora em lugares como o N aropa Institute, no Colorado, e o N yingm a Institute, na Califórnia. O Tantra tibetano está se mesclando com nossas visões ocidentais do desenvolvim ento e da cura da psique humana. Am bas as disciplinas estão sendo mudadas e enriquecidas com esse intercâmbio. A palavra tantra deriva da raiz sânscrita tan, que significa “continuar, multiplicar, expandir”. Na índia antiga, era usada com o significado de “entrelaçar”. O s iogues tomaram-na de em préstim o para

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descrever a natureza entrelaçada do mundo e de nossas ações, a continuidade de causa e efeito e a interdependência essencial de tudo o que existe. Os ensinamentos e textos que se tom aram conhecidos como Tantra baseiam-se numa experiência mística que entrelaça a mente do praticante no tecido desconexo da Realidade Absoluta. No cerne do Tantra está a experiência de uma energia divina no interior do ser humano, energia essa que pode ser despertada. O corpo físico 6 considerado o locus dessa energia e, por isso, o foco da prática ritual. Os iogues antigos davam o nome de Kundalini a essa força interior. É possível que seu papel ativo no desenvolvim ento do Tantra remonte a épocas pré-históricas, pois o exem plo de uma prática sem e­ lhante foi encontrado num a tribo primitiva da África. Num docum en­ tário cinematográfico realizado por um grupo de pesquisa de Harvard, a dança cerimonial dos IKung mostra homens da floresta dançando horas a fio para aquecer um a força psíquica cham ada n\um. O n\um sobe da base da espinha até o crânio produzindo um estado de transe. Os IKung acreditam que o n\um é uma energia sobrenatural que os cura. No Tantra, o organism o humano é vivenciado como um mi­ crocosmo do cosmos. Os praticantes tântricos envolvem-se com a transformação da consciência dc modo que possam dar-se conta da natureza ilusória do seu sentido comum de identidade e vivcnciar diretamente sua unidade essencial com o macrocosmo. No interior do corpo e da mente, há centros importantes dc energia psíquica cham ados chakras, em que habitam divindades específicas, com suas forças psicológicas e espirituais únicas. Esses centros, e suas respectivas divindades, formam a base de um complexo sistema de mitos e rituais. Além do papel central do sistema de chakras e da evocação do poder primordial da criação em rituais de m editação, o Tantra também apresenta outras características significativas. A que mais se sobressai é a visualização das várias divindades. O praticante aprende a entoar mantras sagrados, a assum ir posturas corporais e a identificar-se com várias divindades em m editação enquanto experim enta o estado de consciência celestial das mesmas.

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O utra diferença im portante entre o Tantra e a m aioria das tradições espirituais é sua experiência não-teísta da Realidade Absoluta. Embora o Tantra faça uso de deuses e deusas para sim bolizar várias forças espirituais e estados superiores de consciência, o cosm os é visto como um ato de criação progressiva surgindo de um vazio parecido com um ventre prenhe de potencial ilimitado. Esse grande vazio é associado à consciência pura e sua qualidade espacial é o fundamento imutável de onde emergem todos os fenômenos. Embora a m aioria das religiões conceba um ser suprem o, “ D eus”, que cria, governa e, portanto, está separado do universo, a Realidade Absoluta no Tantra é percebida na meditação com o um estado intrínseco do Ser e da Consciência. A maioria dos cam inhos espirituais propõe o afastamento do mundano na tentativa de transcender o mundo. Valores dualistas como luz e escuridão, espiritual e material, bem e mal estão nos seus fundamentos. O Tantra vê as mesmas forças cósm icas que criam o mundo existindo dentro de nós; não há separação, não há bem e mal. As forças que se cristalizam no m undo material são as mesmas forças cósm icas sublimes, que podem retom ar ao seu estado prístino. O Tantra, portanto, abraça tudo o que é humano dentro de nós. A energia do sexo, da em oção, do pensam ento, e toda a ação é transm utada por meios hábeis cm sua essência genérica. O Tantra, por conseqüência, freqüentemente tem sido considerado um caminho de mão esquerda (considerado tabu e perigoso) devido ao seu aspecto não-convencional. M as por milhares de anos ele explorou as muitas dimensões da psique humana. Do seu sólido fundamento de magia compassiva, m itologia e sublimação ritual da sexualidade hu­ mana, o Tantra intuiu uma psicologia holística que abarca campos de interesse com o astronom ia-astrologia, medicina, m atem ática c alquimia-química. Embora expressas num a linguagem m itológica, as intuições do Tantra sobre a natureza do cosm os na verdade têm uma semelhança surpreendente com a física moderna. Ao longo de toda a sua história, o Tantra sofreu m uita oposição c exílio nas m ãos da sociedade ortodoxa. Mas seu espírito sobreviveu vividamente e logo se adaptou a novos ambientes. O Tantra criou essa

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animosidade confrontando as tendências esquizóides básicas das tra­ dições sociais e religiosas na tentativa de livrar seus seguidores da neurose coletiva que as tradições convencionais produzem. Acima de tudo, o Tantra é um caminho de ação. Mais do que um conjunto rígido de racionalizações sobre questões espirituais, ele constitui uma coleção de métodos que podem levar-nos a um estado de realização interior. É um m odo de estar no processo de auto-rcalização. Seu objetivo é sim plesm ente ser. O caminho é sem fim. Em níveis superiores de aperfeiçoam ento, o Tantra é uma m aneira espontânea de ser plenamente consciente ao mesmo tempo em que vive serenamente no ventre da criação. O Tantra não se limita a nenhum “ ism o” ou seita, nem é necessariamente uma religião. Como um conjunto de métodos empíricos e experimentais ele é tão válido e oportuno hoje com o em qualquer período de sua longa história.

Tantra Hindu Apresentando este contexto filosófico e histórico, examinemos mais detalhadamente os princípios e elementos básicos do Tantra. O Tantra hindu com põe-se de metáforas e símbolos herdados diretamente de cultos antigos. Iniciarem os com este aspecto, antes de estudar como essas metáforas e sím bolos foram integrados ao Budismo. Numa das formas do Tantra hindu, a Realidade Absoluta (consciência original) é personificada como Shiva. Os iogues antigos imaginavam o corpo do cosmos como o amante de Shiva. Shiva tem muitos nomes para expressar suas várias formas, m as geralmente é conhecida como Shakti. A o dar forma ao informe e ao limitar o infinito, ela é chamada M aya Shakti. A palavra maya provém da raiz sânscrita ma, que significa m edir, formar, mostrar. Através de sua imaginação divina, Maya Shakti conjura a grande ilusão do universo velando a consciência pura em m uitas camadas de matéria. Essa aparição (maya) não significa que o mundo não existe, mas sua natureza verdadeira fica escondida devido às nossas mentes confusas. (Veja fig. 1, p. 28.)

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Shakii é também venerada com o a reveladora da verdade e a Grande Libertadora. Tudo o que ela traz à existência temporal algum dia retornará à sua essência original. Essa função da deusa é personificada pela temível Kali. Para a pessoa egocentrada apegada ao m undo material, ela é uma colérica e terrível deusa da destruição. Para o iogue que busca a libertação da ilusão e do sofrim ento da identidade do ego, ela é uma salvadora. A simbologia sexual de Shiva e Shakti com o am antes aponta para a sua interdependência. Embora aparentem ente separados, eles constituem de fato dois aspectos com plem entares de uma única unidade; um não pode existir sem o outro. Esta divindade suprem a bissexual é, assim , concom itantem cnte tem poral e infinita. Shiva é o todo ilimitado; Shakti é a convergência progressiva de partes que permanentemente constituem o todo. Shiva é transcendente e imutável; Shakti é fenomenal e mutávei. Em seu Tantra, the Indian Cult o fE cstasy, Philip Rawson descreve a visão tântrica do cosm os com o uma leia entretecida de vibrações, ou ressonâncias sutis. Originando-se na mais rarefeita “substância” da criação, esses padrões vibratórios se envolvem e se fundem até solidificar-se. O som -substância genérico provém do ornamento lilintante do tornozelo de Shakti no seu ato de dançar. À medida que os ritmos de sua dança se ampliam em com plexidade e paixão, o tecido do universo é urdido em sete cam adas principais de densidade.2 Os sete chakras (centros principais de energia ao longo da espinha) do micro­ cosm o humano estão correlacionados com essa divisão sétupla do macrocosmo. O sétimo chakra, no topo da cabeça, representa a união original de Shiva e Shakti. No sexto chakra, no centro da cabeça, Shakti se separou de Shiva e criou o dom ínio da mente (manas). Os cinco chakras restantes, localizados desde o pescoço até a pélvis, representam cristalizações progressivas, sim bolizadas pelos cinco elementos: éter, ar,

(2) Rawson, Tantra, p. 196.

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Fig. 1. Mahamaya: a Shakti Suprema emergindo do linga de Shiva. Do Icons of Buddhist and Brahmanical Sculptures in the Dacca Museum, porNalini Kunta Bhattasali, M.A. Publicado por Rai S. N. Bhadra Bahadus, Dacca Museum Committee, 1929.

fogo, água e terra. Cada estágio é mais denso, à medida que se contrai a partir do elem ento anterior, até que a solidez do elem ento terra se forme. (Veja fig. 2, p. 30.) Depois de Shakti ter criado o mundo, ela é im aginada hibernando nas profundezas do universo material. Segundo Joseph Campbell, a palavra sânscrita kundalin significa “aquilo que é enrolado ou cspiralado por natureza” e refere-se aos padrões espiralados de energia encontrados cm todo o mundo natural, desde a molécula do DNA até a forma das galáxias. Q uando sc acrescenta a terminação longa /. ela se tom a kundalini, nom e fem inino que significa “serpente”.3 Uma serpente costuma ficar enrolada c, com o uma mola, pode liberar sua energia potencial quando ataca. A mente mitológica do Tantra compilou todos esses fatores e os personificou em Kundalini Shakti, o adormecido poder primordial da natureza. No holograma do corpo-m ente, ela repousa no elemento terra, no prim eiro chakra, localizado na base da pelve. O fluxo involutivo da Kundalini subindo até o sétimo chakra divide-se em três canais no sexto chakra. Veja fig. 3. Na pessoa normal, a Kundalini flui pelos canais esquerdo e direito, suprindo todos os órgãos dos sentidos e as faculdades de consciência que mantêm a ilusão do mundo. Enquanto Kundalini permanece nesse estado, nossa vida é dominada pelas forças ccgas dos instintos, dos desejos e dos conceitos do self-ego. Essa energia divina pode ser retirada desses mecanismos do corpo-mente e dirigida ao canal central. Quando isso ocorre, a Deusa Serpente desperta. Subindo através da psique, ela desvela-se em cada chakra para m anifestar níveis de consciência cada vez mais elevados. Por fim nossa consciência é libertada das limitações do invólucro corporal e passa a com partilhar do prazer divino do intercurso sexual de Shiva e Shakti. Esta é a Grande Bem -aventurança c Sabedoria que o Tantra diz ser o fundam ento do ser c a meta m aior a ser atingida.

(3) Joseph Campbell, The Mythic Image (Princeton, NJ: Princeton Univer sity Press, 1974), p. 331.

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7. SAHASRARAPADMA C en tro da co ro a Sílaba- semente: OM No sistema tibetano, concebido como um só centro h d a b slo ri

6. AJNA Entre as sobrancelhas S íla b a -s e m e n tc : A breve

5. VISUDDHA Centro da garganta Elemento: éter, com o substrato dc som (sabda). Sflaba-scmcnte: HAM Cor: branca Forma: círculo

4. ANAHATA Centro do coração Elemento: ar (movi­ mento) Sílaba-sementc: YAM Cor: azul-cinza Fonma: triângulos en­ trelaçados

3. MANIPURA Plexo solar Elemento: fogo Sílaba-sementc: RAM Cor: vermelha Forma: triângulo in­ vertido 2. SVADHISTHANA Centro do abdômen (quatro dedos abaixo do umbigo) Elemento: água Sflaba-scmcnic: VAM Cor: branca Forma: lua cresccntc Combinados no siste­ ma tibetano com o no­ me de Sang-Na (gsangnas)

1. MULADHARA Centro da raiz (no períneo) Sua força primordial latente e representada pela serpente, Kundalini, enrolada cm tom o do linga no centro do Yoni triangular Elemento: terra Sílaba-sementc: LAM Cor: amarela Forma: quadrado

Fig. 2. Chakras no sistema hindu. No Tantra tibetano, o primeiro e segundo chakras são combinados, o mesmo acontecendo com o sexto c o sétimo. Ilustração extraída do Foundations of'1 ibetan Mysticism, por Lama Govinda, publicado por Samuel Weiser, York Bcach, ME c Rider & Co., Londres, reproduzido com pennissão dos editores. [Ver Fundamentos do misticismo tibetano, Editora Pensamento, SP.]

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A linguagem e sim bologia da união sexual são usadas aqui para indicar o êxtase místico que os iogues antigos experim entavam como resultados de suas práticas. Na mente m itológica desses iogues, a energia sexual do microcosmo ligava-os diretam ente aos poderes criadores do macrocosmo. A energia sexual era sagrada e desfrutada num ritual denom inado Chakrapuja. Este ritual se realizava em círculo, com o(a) instrutor(a) e seu ou sua consorte sentados ao centro. Os casais participantes usufruíam de cinco substâncias, representando os cinco elementos. Essas substâncias consistiam de vinho, carne, peixe, um afrodisíaco feito de grãos tostados e o intercurso sexual. Através desse disciplinado ritual, os participantes transmutavam inclinações de paixão e gratificação sensual aprendendo a ver a deusa em todas as coisas. O intercurso sexual era utilizado para despertar a Kundalini enquanto os casais se identificavam com Shakti e Shiva. Havia variações desse ritual em que um único iogue se unia com um

Fig. 3. Ida, Pingala e Sushumna. Ida e Pingala são energias involulivas secundárias cspiraladas em tomo do canal evolutivo primário central, Sushumna. No Tantra budista. Ida c Pingala são visualizadas correndo paralelamente ao canal central. Os três canais convergem no primeiro chakra, cm que a Kundalini pcrmanecc adormecida ate ser despertada.

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número simbólico de consortes para representar vários eventos cósmicos. Esses rituais antigos serviram de inspiração para meditações interiores complexas c para a iconografia sexual simbólica de sistemas tântricos posteriores. Outra prática hindu, o Ioga Kundalini, envolvia uma rica m iscelânea mitológica de sím bolos, animais, e uma m istura de divindades pré-arianas e vcdicas que eram visualizados nos vários chakras durante os rituais de meditação. O movimento da deusa Kundalini supostam ente varia à medida que ascende pelos diferentes chakras. Nos diagramas hindus dos chakras, diversos animais sim ­ bolizam esses movimentos e são considerados o veículo da divindade principal de cada chakra. A energia Kundalini também assume um padrão específico de fre­ qüência em cada chakra. Esses padrões são representados na simbologia indiana pelos m antras-sementes (semente: bijá) no centro do diagrama de cada lótus. O núm ero de pétalas também se refere literalmente à freqüência vibratória de cada chakra. O chakra inferior, por exemplo, tem quatro pétalas, que representam a baixa vibração do mundo material. Na outra extrem idade do espectro, o chakra coronário tem mil pétalas, que simbolizam a alta faixa vibratória dos reinos transcendentes. O Ioga Kundalini tem início no primeiro chakra, estimulando a adorm ecida Kundalini pela visualização do lótus do primeiro chakra na base da pelve. O mantra-semente (LAM) é im aginado no centro desse lótus enquanto é recitado, em silêncio ou em voz alta. A partir da forma radiante do mantra-semente, todos os elementos simbólicos contidos no lótus emergem em ordem seqüencial. Cada divindade e respectivo símbolo são então contemplados e a seguir redirecionados ao mantrasemente. O próprio m antra-sem ente é então imaginado a elevar-se até o lótus do segundo chakra, onde é absorvido pelo mantra-semente deste. O segundo chakra é visualizado abaixo do umbigo. À medida que o mantra-semente desse centro é entoado, todos os elementos do segundo chakra emergem c a meditação é feita sobre eles. Ao terminar, esses conteúdos são rcorientados para o mantra-sem ente, que por sua vez sobe ao terceiro chakra no plexo solar.

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Esse procedim ento é repetido até o sétimo chakra, ocasião em que a consciência do iogue ingressa no vazio celestial da consciência pura. Como uma chama que arde onde não há brisa, o meditante empenha-se em focalizar sua consciência nesse estado. O ritual da meditação term ina pela recriação do corpo-mente. Iniciando pelo sétimo chakra e descendo através do corpo, cada chakra é visualizado descendo do mais alto para o imediatam ente inferior. O conhecim ento c a prática do Ioga Kundalini passou de mestre a discípulo desde a antiguidade. Embora essa transmissão tenha ocorrido, em parte, através de várias formas de sexo ritualizado na corrente principal de antigas práticas tântricas hindus, ela também aconteceu por uma prática cham ada Shaktipat. A pessoa que desper­ tou essa energia cósmica pode transmiti-la a outra de várias maneiras: pelo toque, por transmissão de pensam ento, por cânticos sacros, ou simplesmente olhando nos olhos do discípulo. Sem mencionar suas orientações sensatas e a revelação de métodos e conhecimento, o m es­ tre é importante no cam inho do Tantra porque ele ou ela tem essa habilidade de estimular e, com segurança, conduzir o despertar da for­ ça Kundalini. Quando a Kundalini é ativada, seu fluxo ampliado põe em movimento conteúdos inconscientes, que podem então inundar a consciência. Resistir a qualquer dessas ocorrências pode ser perigoso, visto que essa energia pode ficar presa ou sua circulação ser desordenada nos canais dos corpos sutis. Poderiam então ocorrer graves desequilíbrios físicos ou psicológicos. A fim de preparar o iogue para esses encontros intensos com o inconsciente, havia diferentes níveis, ou tipos, de ioga. O Hatha Ioga reforçava e purificava o corpo físico. O Bakti Ioga harmonizava a natureza emocional com a devoção e as aspirações espirituais. O Raja Ioga treinava a mente e a alim entava com verdades filosóficas. Todos esses níveis levaram ao M ahayoga, às vezes conhecido como Siddhayoga, que se relacionava com o despertar da Kundalini. Muitos anos de treinamento árduo eram passados tradicionalmente com um mestre; este encarnava a energia desperta da Kundalini.

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Tantra Budista Há muita controvérsia entre budistas c hindus acerca da origem do Tantra. Alguns eruditos sustentam que o Tantra budista evoluiu a partir do Tantra hindu, retornando a ele posteriormente. Os budistas acreditam naturalmente que o seu Tantra teve origem com Buda Gautama, o que pode muito bem ser verdade se considerarmos que ele passou tempo considerável perambulando pelas terras santas da índia colhendo experiências de vários mestres c métodos. As primeiras escrituras budistas indicam que G autam a tinha pelo menos certa familiaridade com o conhecimento dos chakras e do fogo interior. É muito possível que ele tenha sido instruído nas artes tântricas antigas e as tenha revisado e reinterpretado posteriormente. É também possível que alguns dos mais elaborados métodos de meditação tântrica não tenham sido introduzidos no cânon budista senão vários séculos depois da sua morte. Com o advento do Mahayana, uma forma de budismo mais liberal e difundida, a palavra Buda passou a indicar mais o potencial da Mente Iluminada inerente a todos nós do que a identificar Gautam a, o Buda. Nesse sentido, vários iogues budistas “despertos” (Buda significa “aquele que despertou”) podem ter integrado elementos tântricos, ou podem ter criado espontaneamente certos procedimentos de meditação que passaram a fazer parte da doutrina tântrica do Budismo. Buda, isto é, a M ente Iluminada, teria sido naturalmente considerado a fonte de sua inspiração. Encontramos no Tantra budista muitos símbolos, divindades, rituais e práticas de m editação que existem no Tantra hindu, mas seus significados são am iúde bem diferentes. O Tantra budista contém ainda três aspectos fundamentais que, segundo os budistas, fazem com que o seu Tantra seja superior ao hindu: a renúncia, a atitude iluminada e a filosofia correta. Renúncia, como aqui é entendida, significa abandonar a crença na identidade individual. Buda percebeu que um indivíduo é constituído de cinco elementos de apego (skandhas): forma, sensações, cognição (ou relação), artifícios mentais com volição, e consciência. O que se deno­

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mina o se lf não são senão esses cinco elem entos que receberam forma devido aos eventos e desejos passados. Diferentem ente do Tantra hindu, que postula um self (Atman) eterno, o Buda G autam a deu-se conta de que não há um self independente ou eterno existindo separadamente desse conjunto de agregados. Nossa crença num self assim é a causa-raiz de todo o nosso sofrimento, conform e diz o budista. A atitude ilum inada refere-se ao ideal do Bodhisattva, que muda a razão para alcançar a iluminação: daquele que lhe proporciona proveito pessoal para o de com paixão por todos os seres. A filosofia correta baseia-se na com preensão do vazio essencial da realidade. Todos os fenômenos são transitórios, vazios de existência absoluta e dependentes de outros fenômenos tem porais. A origem de todos os fenômenos a partir de outros fatores transitórios, e não de uma entidade única independente ou absoluta (como Deus), foi no Budismo cham ada de origem dependente. A Realidade A bsoluta é o Vazio, a nãoexistência imutável e indefinível em que tudo com eça e termina. A existência contínua de qualquer pessoa (isto é, conjunto de agregados) é o resultado da ignorância c do desejo. Ignorar a impermanência de toda a existência conduz ao desejo da continuação da identidade individual. O desejo faz o am álgam a do conjunto de agregados e nos motiva a obter satisfação daquilo que é inerentemente impermanente. Tais tentativas sempre levam ao desapontamento e a várias formas de sofrimento. No Budismo, a libertação acontece quando a ignorância e o apego acabam. Aquilo de que som os libertados é a percepção ilusória do mundo e a convicção de que existimos como um cgo-self independente. Porque a capacidade de uma unidade de consciência presa ao ego é finita, virtualm ente e impossível perceber o Vazio de modo direto. Por isso, o Tantra budista dirige o aluno através de um desdobramento gradual. A prim eira etapa (Kriyatantra) enfatiza as nossas ações, que são formalizadas em rituais simbólicos. Esta prim eira etapa também se concentra na purificação do corpo-mcnte. A segunda etapa (Caryatantra) dedica-se à com preensão das implicações das atividades da Kriyatantra. Ela procura harmonizar as ações rituais exteriores com a consciência

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cultivada na meditação. O Ioga tântrico continua esse desenvolvimento da compreensão, enfatizando as práticas interiores. Isso leva à etapa final do M ahayogatantra. Este Tantra acentua a importância de uma compreensão profunda da natureza vazia da realidade, um modo de ação espontâneo e um estado contínuo de equilíbrio meditativo que une a ambos. O Livro Tibetano dos M o n o s (o Bardo Thõdol) é um dos fundamentos do sistem a tântrico budista. Sob a figura de uma experiência de morte, ele delineia metaforicam ente as dimensões da psique e o caminho da libertação. A cosmologia do Livro Tibetano dos M ortos baseia-se cm cinco Budas primordiais. Esses cinco Budas essenciais correlacionam-se aos cinco elementos cósmicos (ligados aos skandhas ou elem entos de apego já mencionados) e, conseqüentemente, aos cinco chakras do mapa do corpo psíquico do Budismo tibetano. As cinco energias da sabedoria irradiam a partir do Vazio e subdividem-se para possibilitar todas as criações mentais. Quando o processo é revertido na meditação, a sabedoria dessas cinco energias conquista as ilusões de nossa percepção m undana da realidade. Daí também serem conhecidas como “conquistadoras”, porque não só criam a “ aparência” do m undo em nossa mente, mas ainda a dissipam com a sua energia de sabedoria. Para uma adaptação do esquem a dos cinco Budas primordiais, os budistas às vezes combinam as funções do prim eiro e segundo chakras e do sexto e sétimo chakras, e na prática só os quatro chakras superiores são utilizados. Cada um dos cinco Budas representa um tipo de percepção ilusória (relacionada com um chakra particular) e também a energia da sabedoria que lhe serve de antídoto. Cada um dos cinco chakras do sistema budista expressa diferentes aspectos da mente. A energia vital (prana) tem relação tanto com a respiração quanto com a mente. Isto significa que qualquer estado mental terá um tipo correspondente de prana, com freqüência refletido o modo de respirar. M ente e prana são, portanto, inseparáveis na ação. prana de cada chakra é estimulado pela m editação e por técnicas respiratórias. Como resultado, emoções reprim idas e vários estados

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mentais inconscientes são trazidos à consciência. A finalidade de controlar o prana é purgá-lo de suas aberrações mentais e emocionais, dirigindo-o para o canal central, onde esse ar vital alim entará o fogo interior. Rem ovendo a energia vital das ilusões do ego, o elemento mental e emocional de cada chakra é purificado e transformado em sua energia original da sabedoria. Como no sistem a hindu, isso leva ao reverso da gênese, isto é, os cinco estados elem entares da “ mentematéria” são progressivam ente rarefeitos. Dumo (o equivalente budista para kundalini) é um termo que denota uma m ulher feroz que aniquila todos os desejos e paixões. Várias visualizações e exercícios respiratórios (também a energia sexual pode ser usada para ajudar na produção do fogo interior, quer com um consorte hábil ou por visualização) transformam o corpo-m ente num canal desobstruído para o fogo Dumo. O ioguc então está capacitado a dirigir o fluxo dessa energia. Os iniciados demonstram sua habilidade passando por testes específicos. Por exem plo, pode-se pedir-lhes que meditem na neve vestidos com roupas encharcadas. Se forem competentes, podem secar realmente suas vestes e perm anecer aquecidos no frio mais gélido!4 Os cinco Budas prim ordiais, como emanações m edulares do Vazio, são considerados os progenitores das cinco famílias de deuses e deusas que constituem o panteão budista. Assim, um a diversidade de divin­ dades é apresentada em diagram as de m editação (mandalas) usados para indicar certos princípios espirituais e suas interações cm diferentes etapas da integração psíquica. Em algumas m andalas, os Budas prim or­ diais são representados em união com parceiras fem ininas. Isto sim ­ boliza as cinco energias criadoras interagindo com suas cinco energias complementares da sabedoria. Outras divindades circundam os Budas em mandalas destinadas a iniciações específicas. Divindades coléricas ilustram o mundo das cinco sabedorias, ofuscadas pelas paixões e ilusões dos seres sencientes que ainda estão

(4) Não assumo a responsabilidade por qualquer leitor que, sem treinamen adequado, tente fazer essa experiência.

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Mahakala é uma v m to b id itta T adly*ndade colérica que serve como protetora. Shiva. Da coleção thanka de Sergei D .ÏÏoff Re ^ ° Ulakoff- Reproduzida com permissão.

dc

sob o domínio da ignorância. As expressões ferozes e os dentes cerrados dessas divindades dem onstram o poder e a força necessários para lutar contra o ego e suas ilusões (veja fig. 4, p. 38). Suas arm as sâo usadas para elim inar com pletam ente os obstáculos, e os cadáveres sob seus pés são as paixões que elas exterm inaram . Em níveis avançados do Tantra tibetano, o poder dessas divindades coléricas é usado para subjugar as regiões inferiores da psique e propiciar a iniciação a estados mais elevados de energia da sabedoria. No Tantra budista, a fêm ea tem correlação com a sabedoria e é cham ada de Prajna, em vez de Shakti, como no Tantra hindu. O macho está relacionado com os m eios aptos. Por conseguinte, o deus e a deusa em enlace sexual representam a união da sabedoria-intuição com os meios aptos. Os deuses c as deusas do panteão budista podem ser visualizados na meditação com o m entores e guardiões. Por exem plo, para um homem estimulado ou excitado pela beleza de uma m ulher, um a bela deusa insinuante é utilizada para transm utar suas sensações românticas. Uma deusa assim é cham ada de dakini. O termo dakini quer dizer literalmente á que vai pelos céus”, ou a que se move pelo céu. Geralmente aparecendo com o uma deusa, serena ou colérica, é também vivenciada como as várias forças (relacionadas com as cinco famílias de Budas) que estão em jogo em todos os fenômenos. O iogue com eça por visualizála na meditação diária. Em seguida, ele pode unir-se a ela no enlace sexual enquanto recita seu canto sagrado. Essa form a de meditação é, sem dúvida, um meio muito poderoso de entrar cm contato e de integrar o aspecto feminino da psique (a anima). Do m esm o modo, uma praticante faz uso de uma divindade m asculina na m editação para se relacionar com o seu lado masculino (animus). Exceção feita aos cinco Budas prim ordiais, o Tantra budista originalmente não deu forma antropom órfica à não-m anifestada Rea­ lidade Última. No século X, todavia, um a forma de deus monoteísta foi introduzida no m osteiro Nalanda, na índia. Em bora sob a imagem de um deus monoteísta, o Adibuddha (Buda Primeiro ou Buda Supremo) não cria o universo, nem é dele separado. Transcendendo a dualidade de

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forma e não-form a, ele paradoxalmente é a unidade de ambas e o progenitor dos cinco Budas. Como o Buda-Mentc primordial, o Adibuddha é adorado como o “guru-raiz” dos ensinamentos tântricos. Diferentes seitas têm representações variadas do Adibuddha; na seita que me é mais familiar, ele dá origem ao nome Vajradhara (aquele que empunha o cetro de vajra, que sim boliza o poder diamantino in­ destrutível do Vazio). Ele aparece sob várias formas ferozes acompanhado de um a consorte (Ioguine Vajra) como divindade central em várias práticas de meditação tântrica avançada. Às vezes Vajradhara é representado na postura yabyum (enlace sexual tântrico) com Prajnaparamita (veja fig. 5, p. 41). Como re­ presentação antropom órfica do texto M ahayana do mesmo nome, Prajnaparamita representa a “Sabedoria da Praia Longínqua”. Segundo a lenda, Buda escondeu esse livro de sabedoria transcendental num rei­ no celestial, até que a humanidade estivesse preparada para seus pro­ fundos ensinamentos. Diz-se que um sábio indiano de nome Nagarjuna recuperou essa escritura no século II, e a adoração de Prajnaparamita tomou-se então muito popular. As escrituras Prajnaparamita desenvolveram a base filosófica dos ensinamentos sobre a natureza vazia da Realidade Absoluta c constituíam o ponto alto da doutrina Mahayana. Como uma deusa, Prajnaparamita é o vazio que perm eia todas as coisas — o “vazio” que espontaneamente dá nascim ento a toda a criação. Assim, pela Escola Mahayana de Budism o ela era considerada a mãe de todos os Budas, porque é através dela, consciência original vazia com o o espaço, que um Buda é dado à luz. Sua união tântrica com Vajradhara expressa simbolicamente a integração dos “meios aptos” tântricos com a prática Mahayana de m editação profunda sobre o Vazio. No decorrer da prática, o estudante do Budismo tântrico inicia refugiando-se no Buda (a mente iluminada). O Dharma (doutrina budista) e a Sangha (comunidade dos praticantes budistas) são também reverenciados. Um lama (literalmente considerado uma encarnação da Mente búdica) então designa uma divindade protetora do panteão tântrico com base nas necessidades individuais do aluno. Se uma mulher

40

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tem muita raiva reprimida, pode ser-lhe dada uma divindade colérica. Como um rem édio homeopático, a m editação sobre uma divindade colérica purgará a raiva do corpo-mente da mulher. Em outras cir­ cunstâncias, certos atributos podem ser obtidos da divindade protetora. Para um homem luxuriosamenie aferrado à beleza da mulher, pode scr utilizada uma bela deusa para transm utar aquelas sensações em amor mais sublime. Tendo com preendido as qualidades incorporadas na divindade, o lama fortalece o aluno a fim de que realize várias meditações ao longo da iniciação de m odo que os potenciais no interior da sua mente sejam ativados. M uitos anos de práticas preliminares geralmente são exigidos antes que um aluno esteja preparado para ser iniciado na mandala de uma divindade tântrica superior.

Tantra e Psicologia Junguiana Embora a psicologia ocidental tenha ignorado nossas inclinações espirituais ou, pior, as tenha julgado patológicas, há uma tendência crescente para a pesquisa dos domínios parapsicológicos e transpessoais da psique. Cari Jung foi um pioneiro importante nesta investigação de uma compreensão mais profunda da natureza do eu interior. Rompendo com orientações terapêuticas convencionais, ele foi além das preocupações com patologias e sintomas e orientou seus estudos na direção do numinoso. Aventurando-se no território cheio de tabus do misterioso e do “divino”, sua psicoterapia desenvolveu-se num processo e guiar as pessoas além dos limites estreitos da identidade do ego e na busca da totalidade inerente a elas. Suas descobertas constituem uma ponte va íosa entre o Tantra c as formas transpessoais contemporâneas a psicologia ocidental. Antes de atravessar essa ponte, consideremos o abismo que separa o Tantra da psicologia ocidental. A psicologia ocidental tem tradicionalmente um enfoque voltado ao tratamento da doença mental. Um tratamento bem-sucedido é avaado pela habilidade da pessoa de funcionar “norm almente” em nossa strutura social. O Tantra, por sua vez, concentra-se no desenvolvimento

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ualidades que transcendem uma m era adaptação a normas e f ictivos sociais e volta sua atenção para a cura da causa principal do sofrimento hum ano — a ilusão da identidade do ego. Além disso, o conceito de self na psicologia ocidental apóia-se basicamente na identidade do ego. No Tantra, o self tem parâm etros muito mais amplos, incluindo a continuidade de uma vida a outra, isto é, a reencamação. Jung descreve o ego com o um com plexo de fatores psíquicos e uma consciência geral do corpo que atrai conteúdos do inconsciente e do mundo exterior com o qual se identifica.5 Existindo apenas na superfície de nós mesmos, este self vê o m undo em termos de “Eu” e de “não-Eu” e, assim, não pode abarcar a experiência dos estados transpessoais de consciência. Numa perspectiva egocentrada, a possibilidade de existir num estado em que esta separação se desfaça, e em que a fam iliar natureza do “Eu” deixe de ser concreta, é inimaginável, sendo otim ista, e am edrontadora, sendo pessimista. Essa identidade do ego não pode confiar na sua sobrevivência à morte e nem nos dramáticos períodos de transformação. E le está firmemente aferrado ao seu estado presente pelo seu instinto de sobrevivência. Com o M artin W illson refere no seu Rebirth and the Western Buddhist, no Tantra a crença na continuidade do fluxo m ental de uma vida para outra constitui a base para a com preensão da condição humana e é fundam ental para as doutrinas do carm a e da libertação.6 O carma é a m ecânica mesma da continuidade e a libertação significa literalmente a cessação da roda da morte e do renascimento involuntários. Atualmente há provas científicas convincentes a favor da doutrina da reencarnação. A pesquisa do dr. Ian Stevenson da Universidade da Virgínia, publicada em Twenty Cases o f Suggestive

(5) Carl Jung, Analytical Psychology: Its Theory and Practice. (Nova York: Vintage, 1968), p. 10. . _ (6) Martin Willson, Rebirth and the Western Buddhist (Londrcs: Wisd Publications, 1987), pp. 9-10.

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Reincarnation,■> é talvez a que esteja mais bem documentada De qualquer modo, é necessáno boa vontade para considerar -í ™ e as implicações da reencamação a fim d e T ^ ^ aspectos essenciais da orientação tântrica. apreender os O passo seguinte é a concordância w K « „ quando empregamos as palavras “consciência” e “n ^ Ü“6™ 8 dizer significado na psicologia ocidental c por demais « 2 ° ’ *** SCU para nossos propósitos presentes Na n • > nebuloso e inadequado a percepção « t e é chamado de “inconscieme". Alem disso combinação de estruturas conscientes o in ,

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Por exemplo, há inúmeros psicólogos que s u s t e T “ C° nStÍtUÍ 3 PS' quemais é do que um conjunto de atfvirtaH 1 que a psique nada Embora .ivesse Z X * + * consciência em algum as culturas o r i e n I L S , * # rPr° fundidade d* visão da consciência ocidental comum rn 1V3S’ g sintetizou a do mundo exterior e de orientação no ° ^ Pr0dut0 da P ^ cep ção consciência provavelm ente se localizava no c T T 0 ' ^ qUC a a possibilidade de que fosse a evolução de u m 1 CSpeCUlava sobre pele de nossos rem otos ancestrais8 o L ■ g d° S semidos da implica a inexistência da consciência ° 0CIdenla, de c°nsciência E possível que a c o n ic i ê n c t T ° e g O C o cé^ b ro . nosso sistema nervoso c e n S ^ T desenvolvendo como florescer na “L uz”? qualidades em c o o ego e com z

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[sjo Tantra encontramos um a descrição de cinco corpos principais da consciência. O mais sublime, o corpo da bem -aventurança (Anadamayakosa no Tantra, Buda no Budismo), é a parte de nós mesmos enraizada na dimensão infinita e eterna da consciência original. O conceito de espírito é a nossa tradução mais próxim a para esse nível mais sublim e da psique. O corpo sutil seguinte (Vijnanamayakosa, ou Vignanam no Budismo) é sem elhante à nossa noção ocidental de alma. Ele é a sede da consciência individual e contém as faculdades potenciais da intuição c sabedoria espirituais. O terceiro corpo sutil (M anomayakosa no Tantra hindu, Kama Manas e Kama Rupa no Budismo) incorpora nossa natureza emocional e intelectual. Estes dois elem entos da psique funcionam integralmente para criar a personalidade. Quando visto através da clarividência, este corpo sutil é cham ado de aura e, às vezes, é m encionado como corpo astral e mental, respectivamente. O quarto corpo (Pranayamakosa), com um ente cham ado de corpo etérico, é constituído de energia vital. Esse corpo vital leva a força da vida para o interior, e em todas as partes, do quinto veículo da cons­ ciência, o corpo físico (Annamayakosa no Tantra hindu e Sthula Sarira no budista). Apesar de existirem em dimensões diferenies, cada um desses envoltórios da consciência é interpenetrado por aquele que lhe é inte­ rior. Sete vórtices de energia psíquica — os chakras — atra­ vessam esses corpos sutis e desempenham um papel importante em sua integração. A palavra sânscrita chakra significa roda. Um clarividente vê os chakras com o redemoinhos de energia afunilada no interior do corpo etérico. Esses centros etéricos, em contrapartida, relacionam -se com as glândulas endócrinas e com os principais gânglios nervosos do corpo físico. O s chakras traduzem comunicações de todos os níveis da psique em estím ulos eletroquímicos do sistema nervoso e das glândulas en­ dócrinas. Reciprocam ente, traduzem o estím ulo de nosso self corpóreo na linguagem de consciência dos vários corpos sutis. Os chakras, por-

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tanto, contêm o espectro todo da consciência, desde o mais prim itivo (com base no instintivo e sensitivo) ao mais sublime. As práticas tântricas destinam-se a desenvolver todos estes níveis Quando o corpo de consciência mais sublim e se integra plenamente, nós nos tomamos um Buda (aquele que despertou). No Tantra hindu denomina-se essa experiência de Samadhi. Em sânscrito, sam significa união, e adhi, Senhor; assim, Samadhi significa união com o Senhor. O Self é o Senhor do self e sua meta. (Dharmapala) Usarei as palavras psique e corpo-mente indistintamente para conotar a soma desses corpos de consciência, incluindo naturalmente o sistema dos chakras. Comecemos por com parar a visão da psique segundo o Tantra e segundo Jung, objetivando desenvolver o modelo de trabalho que usaremos no decorrer do livro todo. De modo s“ nte àquele das escrituras mdianas, Jung reconhecia uma função trans cendente na ps.que e chamou-a de S e lf Para ele este Self é idêntico às .magens de Deus e à origem delas. Através do que Jung chamou de progrcssiva d° sEm c° mtermos eúd° s inconscientes), o S elf se tom a assim mais iiaça° e mais consciente. religiosos de acordo com Aniela Jaffé em O mito do Significado o processo de individuação foi chamado por Jung de “a realizarão h divino no homem” ’ g realização do

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Z T :fcatz * YmCultrix, Pens”in' ,mx1989.] p-?9de C.G. Jung,S Editora São Paulo,

de Jung é primariamente conhecido de modo indireto através de sonhos / d e outras expressões simbólicas. Outra diferença im portante é que o conceito junguiano do Self ■ niica algo que é eterno e todavia fenom ênico, qualidades con­ tr a d itó r ia s na perspectiva budista. Embora tentando abranger o m isténo * uniâ0 dos opostos, o Self junguiano permanece no remo da “esseidade” , apesar de Jung caracterizá-lo com o uma função trans­ c e n d e n te , um símbolo de união e um princípio totalizador, do mesmo modo que ele luta para conceituar sua intuição do que denominou “nleroma” no seu Seven Serm ons to lhe Dead. Neste estado de pleroma, jung vislumbrou o que os budistas chamam de Vazio, onde n to existência é o mesmo que plenitude” e “am bos, pensar e ser, cessam porque o que é absoluto não tem qualidade.10 M as alguns dos atributos nUe ele confere ao Self traem seu discernim ento intuitivo. Para pesquisar estas expressões do Self, Jung iniciou um estudo da psique em várias culturas e descobriu padrões universais a que deu o nome de arquétipos. Ele concluiu que essas forças psíquicas as­ semelham-se ao código genético do corpo físico; elas predeterminam estruturalmente a anatom ia e a função da psique. A menos que perturbadas por trauma pessoal, elas guiam o curso do desenvolvimento individual. Aparecendo em sonhos, na fantasia, na arte, no mito e na religião, a até mesm o no pensam ento científico, os arquétipos delineiam a totalidade da experiência humana. A decorrência natural foi que Jung compreendeu que os domimos normalmente inconscientes da psique consistem tanto de aspectos universais com o pessoais. Ele percebeu que nossas identidades individuais são formadas a partir desse reservatório transpessoal que designou de inconsciente coletivo. Esta dim ensão interior é de

(10) Carl Jung, “Septem Scrmones ad Mortuos", in Memories, Dreams. Reflections (Nova York: Random House. 1965). p. 397. [Ver O* M m m * aos mortos cm Jung e a gnose, Ed. Cultrix, São Paulo, 1990.]

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proporções oceânicas, e suas correntes e ondas onipotentes cercam as praias do espaço e tempo que definem a ilha do ego-self. Seus ho­ rizontes se contraem até o tempo imemorial e se expandem até cões futuros. De suas profundidades emergem todos os elementos, instintos, desejos, tendências conceituais e aspirações transcendentais ou espiri­ tuais que sempre existiram, ou provavelm ente sempre existirão, lan­ çados às praias da consciência humana. Sob a forma de imagens primitivas (arquétipos), essas estruturas psíquicas, com suas expressões dualísticas inerentes (bom e mau, luz e escuridão etc.), provêem a armação para o “estofo” das camadas pessoais da psique. Radmila M oacanin, em J u n g ’s Psychology and Tibetan Buddhism mostra como o inconsciente coletivo de Jung pode ser comparado com o que os budistas chamam de “consciência depositada” (AlayaVijnana).1 Do mesmo modo que o inconsciente coletivo de Jung inclui todo o potencial e experiência humanos, o Alaya-Vijnana é concebido como uma espécie de “M ente Universal”. Lam a Govinda, em Creative Meditation and M ulti-Dimensional Consciousness, descreve essa consciência depositada como contendo formas primordiais que abrangem o espectro todo das qualidades humanas, das dem oníacas às w 35’, ! ?>Ue aSCCndem a outros "íveis de consciência quando estimuladas por associações.12 Continuando a integrar a visão de Jung e do Tantra sobre a psique veja se voce pode im aginar os sete chakras desdobrando-se a partir das profundezas do inconsciente coletivo e subindo pelos níveis do onsciente pessoal e da consciência do ego. Funções e imagens arquetiptcas cspccfficas sâo e x p r e s s a„av és de cada c h a t o T m

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■ n,o os sele chakras formam a matriz psíquica em que a forma conjuniu, '„ ir a do corpo-m ente é enada. Esta m atriz genérica tom a-se mais caracteristicam ente definida ,flndo várias experiências, e nossas reações a elas, são estabelecidas recessos do inconsciente pessoal. O inconsciente pessoal percebe c 1 sobre a em oção/inform ação de um m odo literal, arm azenando-a e riirigindo o com portam ento mais ou menos com o um com putador pelo sistema nervoso autônom o. A memória de tudo o que nos aconteceu, incluindo vidas passadas, está contida aqui. E, com o um a interface entre a estrutura espaço-tem poral do ego e a dim ensionalidade de níveis mais profundos da psique, o inconsciente pessoal pode também ser um recipiente seletor de conteúdos futuros da consciência do ego. Em geral, o inconsciente pessoal tem a tendência de fixar-sc nos padrões emocionais e estruturas de crenças que nele produzem uma forte impressão. M uitos medos e com portamentos autoconudos brotam desse condicionam ento inconsciente. Estes efeitos no nível pessoal do inconsciente obscurecem as funções positivas dos arquétipos e fazem com que nos fixemos em certas imagens arquetípicas, ou que nos tomemos vulneráveis ao seu aspecto mais negro. Em term os tântricos, o impacto de experiências passadas, desejos e ações (incluindo ações mentais) estão depositados como sementes cármicas no corpo-m ente. Se essas sementes não forem extirpadas, continuarão a produzir seu amargo fruto, a despeito dos esforços conscientes para detê-las. Cada chakra contém um núm ero qualquer de padrões-sementes de experiências passadas — relacionados com motivos arquetípicos - que definem os parâm etros inconscientes do ego-self. Denominados de obscurecim entos no Tantra budista, esses padrões-sementes (Samskaras) eclipsam a energia da sabedoria agindo através de um chakra determinado e constituem obstáculos imensos à realização de nossa natureza búdica. _ _ Em seguida, os chakras em ergem para a esfera da consciência do ego. A mente racional é capaz de funções m ais com plexas do que o inconsciente pessoal; ela pode raciocinar tanto indutiva quanto dedutivamente. Pode também reprim ir desejos e lembranças que não

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quer reconhecer. Assim, ela goza de certa autonomia relativam ente aos domínios inconscientes pessoais e transpessoais. Todavia, para manter a desesperada ilusão de sua sabedoria, ela está sujeita à racionalização. Em cada um dos chakras, podemos então nos deparar com imagens distorcidas da realidade que o self consciente utiliza para pôr em ordem, e talvez manipular, o mundo interior e exterior para conform á-lo a seus desejos c preconceitos. O self racional pode ser bastante obstinado, mas e também de relativamente fácil reeducação. A leitura de um livro como este pode ser suficiente para convencer a mente racional de sua necessidade de alterar atitudes e idéias. Infelizmente, a desprogram ação e reeducação do inconsciente pessoal requer muito mais habilidade e tempo. Mas, a menos que esta tarefa seja cum prida com êxito, desejos conscientes de mudar mostrar-se-ão ineficientes na grande maioria das vezes. Em condições favoráveis, as mentes inconscientes racional e pessoal devem harmonizar seus esforços e sintonizar-se com os níveis mais profundos do inconsciente coletivo. Cada chakra pode ser visualizado com o a lente de um projetor de shdes em que certas funções genéricas da psique são reveladas Por exemplo, o tema do primeiro chakra é a sobrevivência e o bem-estar do corpo físico; ele está associado ao nível mais prim itivo ou instintivo da psique. O carretel de slides do primeiro chakra conteria, portanto imagens arqueup.cas personalizadas desse nível retratando uma orientação bem -ajustada, uma história despojada e traumática, ou uma curiosa mistura de ambos. A soma das “coleções de slides" em todos os chakras cria a ilusão da nossa idenüdade individual. Essas coleções de slides podem ser

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. natureza inierior e exterior. Como o filho pródigo, esquecemos verdadeira herança e o propósito da nossa jornada rumo à nossa C° nSCQuando iniciamos essa jornada, ou conscientemente ou por pressão • tf»rior defrontam o-nos com coisas subjacentes às nossas aparências “civilizadas” que prontam ente gostaríamos de evitar. Daí que o processo He individuação, na terapia junguiana — bem como a prática tântrica de transformação dos aspectos ilusórios do ego-self cm suas energias da sabedoria — com freqüência é muito doloroso. Entrar em contato com o poder primordial dos arquétipos pode também ser terrível ao ego-self, e Jung mantinha um saudável respeito nor seus potenciais “incontroláveis”. As lendas tântricas estão cheias de apelos milagrosos para o despertar da Kundalini, ou o fogo Dumo. Entretanto, o mero despertar deste poder não significa garantia automática de perfeição espiritual. Esse poder prim ordial na verdade pode ser nocivo, ativando conteúdos inconscientes que causariam desequilíbrios psicológicos graves se não forem assim ilados com muito cuidado. Os tibetanos dizem que ativar o fogo é com o colocar uma cobra num bambu oco; ela tem apenas uma entre duas escolhas, sair por cima ou por baixo. O trabalho, então, com eça com uma aproximação afetiva e uma purificação de conteúdos irrelevantes ou auto-inibidores do inconsciente pessoal. Antes de desprogram ar o inconsciente, freqüentemente é necessário nos tom arm os cientes das influências iniciais. Reexperimentar essas influências dissolve suas formações em ocionais/con­ ceituais cristalizadas alojadas em algum chakra em particular. Para com preender o inconsciente e com unicar-se com ele, c

(13) Para informações adicionais sobre reprogramação da mente incons­ ciente, recomendo vivamente Software for the Mind, de Emmett i (Berkeley, CA: Celestial Arts, 1987.)

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importante perceber que ele 6 energizado por dinâmicas emocionais e “pensa” em termos de imagens e símbolos. As qualidades metafóricas dos sonhos e a mitologia ilustram isto muito bem. Outro aspecto importante a considerar é que este nível da psique normalmente não faz distinção entre “realidade” e imaginação O uso da hipnose, imaginação ativa, trabalho com sonhos e simbologia dirigida demonstram como a mente inconsciente pode ser aberta c mudada através de metáforas e visualizações. De fato, empresas de anúncios estão faturando milhões de dólares por ano explorando técnicas de comunicação subliminar. No Tantra- a meditação produz freqüências de onda cerebral alfa e beta que nos permitem o acesso a áreas da psique exteriores às funções racionais normais. E nesses níveis sublim inares que as imagens e atividades ntuais do Tantra operam sua magia. Podem-se considerar as divindades tam neas com o versões culturais ataviadas dos arquétipos ímcmonais. Além do poder das profundezas numinosas da psique que eles contem, podem também ser vivenciados como baterias de energia psíquica carregadas com as poderosas meditações de iogues tântricos praticadas durante bem m ais de um m ilhar de anos. Esse potencial é aberto c usado para transformar o corpo-mente num S c ú . o punficado para forças transpessoais em práticas tântricas. De modo sem elhante, o objetivo da terapia junguiana não é

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V cea verdadeira natureza, bastando apenas que abandonemos nossa à nos** ^ reSÍST m e r r t e nrapÍa junguiana e muitos dos seus métodos e nfeitos constituem rem iniscências de práticas tântricas antigas O fato T l u n g ver na mandala uma expressão do Self, o valor do trabalho com c manifestações sim bólicas da psique através do trabalho com o sonho f a imaginação ativa, o apreço pela reconciliação dos opostos na psique ímacho e fêm ea, consciente c inconsciente, etc.) e a purificação dos conteúdos do inconsciente pessbal para ter acesso ao mana dos arquétipos, todas essas questões podem ser facilmente relacionadas com a prática do Tantra. Embora o Tantra seja um sistema mais radical para a trans­ figuração do corpo-mente, as corajosas investigações e a profunda intuição de Jung proporcionam aos nossos ocidentais alguns conceitos muito úteis para que com ecem os a com preender a sabedoria dos símbolos, os m itos e rituais da meditação tântrica. Do mesm o modo que o processo de individuação, o caminho o Tantra exige coragem , honestidade, desejo de mudar e liberdade disciplinada. A humildade e a concentração nas prioridades necessarias para trilhar este caminho não são facilmente adquiridas, nem m anudas, em nossos tem pos atuais. Os budistas, entretanto, nos advertem de que entrar no cam inho do Tantra sem o necessário com prom etimento é como tentar obter m anteiga a partir da água. Antes de prosseguir na transmissão de alguns topicos expe­ rimentais da psicologia junguiana e do Tantra tibetano, demonstrados nas funções dos chakras, há um pensamento que sera util conservar. Embora apresentadas aqui em ordem seqüencial, as realidades interiores da psique são mais bem com preendidas em termos das qualidades de espaço e tempo dos sonhos. Cada chakra está incrustado nas profundezas transpessoais da psique; os arquétipos e as etapas correspon ente desenvolvimento não necessariam ente emergem dentro dos estr limites do tem po linear; eles podem subir à superfície a qualquer momento, vindos de qualquer profundidade. Bon voyagel 53

Capítulo Segundo A CAVERNA DOS ANTIGOS Na estrutura pélvica, da base da coluna aos genitais, localiza-se uma região cham ada de ovo dc Brahma, no Tantra hindu. Em alguns mitos hindus, Brahma é o deus da criação, e o ovo de Brahma pode ser relacionado com o tema arquetípico do ovo do mundo. Encontrado universalmente na mitologia, o ventre primai, ou o ovo do mundo, é um sím bolo com um para a totalidade original de que toda a vida procede. O primeiro chakra, denom inado Muladhara (suporte da raiz) no Tantra hindu, localiza-se no ceniro desse ovo. Ele é especialm ente importante na meditação porque a força criadora do cosmos jaz adorm ecida aí na forma m ítica da Deusa Serpente K undaüni. A imagem da serpente evoca um rico mosaico de símbolos ligados à terra fértil, à sabedoria eterna e aos poderes regeneradores das camadas mais p r o ­ fundas da psique. No interior do lótus do chakra-raiz, que tem quatro pétalas v e r­ melhas, há um quadrado amarelo que representa o elemento terra. Dentro dele há um elefante branco com sete trornbas. Veja fig. 6, p. 56. Na índia, é pensamento com um que os elefantes brancos atraem seus parentes celestiais, as nuvens. Esses elefantes celestiais trazem a chuva, que faz com que a M ãe Terra seja fértil e abundante. Os elefantes portanto propiciam bênçãos terrenas e boa sorte. No T an tra budista, o sistema de chakras é com parado a um templo sagrado com cinco pavimentos. Cada nível do templo contém 54

um trono e uma m andala dc um dos cinco Budas Primordiais. O primeiro chakra, no andar térreo, é sim bolizado por um quadrado am arelo c relacionado com o elem ento terra. Lam a Govinda, em Foundations o f Tibetan M ysticism , diz que os budistas associam o elemento terra com o dom ínio da lei cárm ica porque ele constitui o plano em que as sem entes de nossas ações am adurecem. Ele é também o domínio da escravidão a se formar, a qual é qualificada pelas forças da rigidez e inércia.1 O Buda Primordial Amoghasiddhi está sentado no trono do primeiro chakra. Veja fig. 7, p. 57. Em bora com um ente seja relacionado com o elem ento ar e a cor verde, é sua Sabedoria que Tudo-Realiza (livre do carma, ou atividade espontânea derivada da compreensão da inseparabilidade entre o Vazio e a aparência da realidade fcnomênica) que pode melhor transform ar as forças do corpo-m ente que operam no primeiro chakra. A paixão ilusória de A m oghasiddhi é o ciúme ou a inveja baseada no medo ou na ansiedade quanto à possibilidade de falharmos cm atingir nossos objetivos, ou que outros possam conseguir mais do que nós. Em geral, a função prim eira do chakra-raiz é traduzir a força vital em necessidades c atividades de sobrevivência do organism o físico. Os sentimentos de segurança e confiança no m undo físico instilam em nós a crença necessária para a expressão positiva do chakra-raiz. Sem esta sensação de sentir-se seguro no corpo c no am biente físico, um medo profundo solapa todos os outros níveis dc consciência. À parte as influências de vidas passadas, os elem entos pessoais no prim eiro chakra são prim ariam ente derivados de experiências pré-natais e de nascimento. Os ambientes de origem e o am biente familiar seguemse naturalm ente com o fatores importantes na determ inação da base de nossa orientação no mundo. Os psicólogos geralm ente concordam que aprendemos mais em nosso primeiro ano de vida do que durante todos os demais. Se nosso am biente pré-natal e inicial satisfez nossas

(1) Lama Govinda, Foundations o f Tibetan Mysticism (York Beach, M Samuel Weiser, 1974; e Londres: Rider & Co., 1974), p. 181. [Fundamentos do misticismo tibetano. Editora Pensamento, São Paulo, 1989.]

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Fig. 6. Muladhara. O primeiro chakra tem quatro pétalas carmins que simbolizam os quatro tipos de bem-aventurança experimentados quando a Kundalini desperta. No interior do lótus encontra-se um quadrado amarelo, mandala que representa o elemento terra. Dentro do quadrado vemos o mantra-semente LAM, que invoca a primitiva divindade Indra. O elefante branco é o veículo de Indra c um sinal de prosperidade. Vemos também um triângulo invertido, o yoni, que representa os genitais femininos e o poder feminino de criação. Dentro dele a Kundalini é mostrada enrolada três vezes c meia em tomo do linga. necessidades de alimento, aquecimento, sentido de pertencer e proteção, então se estabeleceu um a confiança em nosso am biente extemo. Por outro lado, se o ambiente do ventre e do início da infância foram emocionalm ente frios, de desamparo e perturbados, então as impressões no prim eiro chakra interpretam o mundo e os seres humanos como ameaçadores ou estranhos. Geralm ente é difícil trazer à luz as influências do primeiro chakra porque foram programadas durante o desenvolvim ento fetal e prim eira infância, períodos essencialm ente pré-conscientes. A aceitação incons-

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Fig. 7. Amoghasiddhi c o Senhor do chakra-raiz e encama a Sabedoria Todoabrangenie. Sua cor é o verde e ele rege o elemento ar. Sua mão direita está elevada no Mudrá Abhaya, lançando a benção do deslemor. A ilustração é a Estampa 7 do Foundalions o f Tibetan Mysticism, de Lama Govinda (publicado em 1974 por Samuel Weiser, York Beach, Maine.e Rider & Co., Londres) e reproduzida com permissão dos editores.

ciente “daquilo que sempre foi” e o medo de cortar nossas raízes psicológicas trabalham contra a reconstrução da realidade neste nível fundamental. Os aspectos arquctípicos do primeiro chakra estão enraizados nas regiões mais primitivas da psique, ligando-nos com o tempo em que existíamos numa relação instintiva com a Mãe Natureza. Veja fig. 8. Nessa era pré-conscicnte estávam os unidos aos processos inconscientes da natureza. Erich Neumann, em The Origins and H istory o f Consciousness, mostra com o esta fase inicial dc desenvolvimento, revivida na infância (em acréscimo ao ovo do mundo), com freqüência é simbolizada com motivos circulares que remetem para nossa totalidade original — eles são sem começo e sem fim, autocontidos c

Fig. 8. Uroboros. Um dragão mordendo sua própria cauda, um símbolo medieval para as qualidades autocontidas e integralizadoras da psique. De um desenho francês do século XIII.

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eternos. Nesse estado pré-consciente, a identidade do ego ainda não dividia a psique c o m undo em dois.2 Neumann também menciona que desde que lomos expelidos do ventre do inconsciente, ansiamos por retom ar ao Paraíso Perdido, o estado de ausência total da dor e do prazer conscientes e ações responsáveis. O mito do Jardim do Éden dram atiza nosso medo e relutância em em ergir com o seres conscientes, e conseqüentemente separados. O estado inconsciente parecia ser nossa condição natural. Despertar exigiu grande esforço e a consciência dolorosa da dualidade.3 É aqui no chakra-raiz, portanto, que encontram os nosso primeiro obstáculo ao desenvolvimento da consciência, a inércia e o abraço apertado do inconsciente. Freud era fascinado por essa tendência regressiva na psique e cham ou-a de desejo de morrer. P or ironia — porque os opostos vivem lado a lado muito confortavelm ente neste nível da psique — , as forças de autoform ação e sobrevivência são também geradas aqui nos instintos do primeiro chakra. Na sim bologia tântrica, o primeiro chakra encarna as qualidades do elem ento terra, com o a solidez e a inércia. Na vida diária, o primeiro chakra abrange aspectos com o estes: relacionam ento com o nosso corpo físico e os cuidados com ele (nutrição, exercícios c satisfação dos sentidos), modo de ganhar a vida e manter nossa segurança, atitude com relação ao dinheiro e com a qualidade de nosso am biente físico, o relacionam ento com o mundo sensual e as posses materiais e a capa­ cidade de confiar e de nos sentirmos seguros no plano físico. Em acrés­ cimo às m arcas de fam ília e am bientais desta vida, as condições e os traumas vivenciados em vidas passadas podem afetar o fluxo de energia psíquica pelo prim eiro chakra e a conseqüente visão da realidade física. Freqüentem ente, traumas ou danos graves no corpo físico em

(2) Erich Neumann, The Origins and History o f Consciousness, BoUingcn Series, Vol. XLII (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1954), p. 8. [História da Origem da Consciência, Editora Cultrix, São Paulo, 1990.] (3) Neumann, The Origins and History o f Consciousness, pp. 114-16, 280.

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encarnações anteriores poderão manifestar-se com o sintomas correlatos nesta vida, ou provocar medos e comportamentos inconscientes desajustados.

Estar no Corpo “Permaneça no seu corpo” e “fique ligado” são frases populares hoje. O que significam e com o se relacionam com o primeiro chakra? Num sentido literal, o corpo é uma escultura viva de você mesmo. À parte a herança genética e as imagens corporais recebidas na infância, o corpo é moldado pelas mudanças no estado psicológico. Pensamentos e sentim entos com o energia psíquica na aura afetam o corpo físico através dos centros nervosos e das glândulas cndócrinas, alterando sua estrutura e função aparentes. Alguns exemplos disto: as drásticas mudanças físicas na aparência, vistas com toda a clareza em pessoas sujeitas a múltiplas personalidades, c a força sobre-humana experi­ mentada em situações de em ergência ou sob hipnose. No nível celular, os processos que mantêm um corpo inicgral e saudável constantemente são desintegrados por uma luta entre ações, emoções e conceitos. Por exemplo, quando emoções são detonadas (excitação sexual, choro, raiva), a energia com eça a fluir do corpo emocional para o físico, preparando-o para a ação. O ego diz “ Não!” e a ação é reprimida. “Não” significa contração no corpo — os músculos se enrijecem, a respiração tom a-se superficial e o corpo congela-se no conflito. A maioria de nós cresce com esses padrões de tensão crônica. Em resposta à emoção não expressa, o corpo se contrai à m edida que se tom a mais e mais distanciado da mente consciente. Esta repressão da consciência no corpo protege-nos das sensações inaceitáveis, mas também reduz a vitalidade e as sensações agradáveis. Q uanto mais esta situação é considerada normal, tanto mais abandonado fica o corpo. Privamo-nos do que precisam os para nos desenvolver e crescer de forma saudável, e nos indagamos por que não nos sentim os energizados fisicamente.

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A onda contem porânea de técnicas de trabalho corporal demonstra claram ente as qualidades protéicas do corpo. Em oções bloqueadas e tensões interiores podem ser liberadas e o corpo pode tom ar-se livre, solto e saudável, em alguns casos alterando drasticam ente sua aparência e estrutura. Além da liberação da dor bloqueada e de emoções frias, pode ser restabelecida a habilidade de experim entar o prazer no corpo. Nossos corpos são animais. Precisam de exercício, de boa alim entação e de um am biente acolhedor; também necessitam do toque am oroso e da intimidade. O toque é uma necessidade básica. Para o bebê, ele é tão importante quanto o alimento. Os bebês que não são afagados e locados podem tom ar-se indiferentes, perder o apetite, definhar e mesmo morrer. Os adultos podem dar-se conta de que estão procurando satisfazer a necessidade de tocar e ser tocados através da interação sexual. Esquecemos que o toque não precisa necessariam ente ser associado à sexualidade e podemos assim limitar seriamente nossas oportunidades de receber e dar nutrição. Por outro lado, o impulso instintivo para o acasalamento e a reprodução também está associado ao prim eiro chakra. Por isso, ele muitas vezes é chamado de chakra do sexo. O sexo, entretanto, não pertence a um só chakra, visto que a energia sexual (isto é, a libido, Kundalini) flui através de cada chakra. Veremos com o esta energia é transformada, assumindo qualidades diferentes em cada chakra. A natureza da energia sexual no prim eiro chakra é explicada graficam ente por Dane Rudhyar, em Occult Preparations fo r a New Age. Ela está ligada a propósitos bioculturais; é uma compulsão funcional e instintiva enraizada no inconsciente coletivo. Ele nos oferece a imagem de um homem lavrando a terra, encontrando satisfação na liberação m uscular e no trabalho fértil, e compara-o à conservação da natureza-terrosa da mulher para dar origem ao fruto.4

(4) Dane Rudhyar, Occult Preparations for a New Age (Wheaton, I Theosophical Publishing House, 1975), pp. 144-45. [Preparações ocultas para uma nova era, Editora Pensamento, São Paulo, 1991.]

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O impulso à reprodução — que dom ina a energia sexual no pri­ m eiro chakra — pode também ser visto como uma projeção da identi­ dade individual em objetos físicos. Investindo energia psíquica nos filhos, criações artísticas e posses materiais, ritualisticam ente tentamos assegurar a solidez e continuidade de nosso sentido de self. Instintiva­ mente, procuramos um sentido de pertencer e segurança no mundo físi­ co. Com o o cachorro que defende seu território, nos ligamos deses­ peradam ente ao sentido de “m eu” que projetam os nesses objetos. Em The Mythic Im age, Joseph Campbell com para a natureza da Kundalini neste nível da psique a dragões m itológicos inclinados a acum ular e proteger coisas. Eles quase sempre acumulam coisas que nem sequer podem usar — geralmente donzelas formosas e tesouros. E todavia se agarram a elas e as defendem de modo que seus valores básicos nunca são percebidos.5 Na tradição m itológica, o herói (consciência do ego) ao final deve encontrar e vencer esse dragão para resgatar a donzela e apossar-se do tesouro. Na lenda tântrica da deusa Kundalini, temos a valiosa energia vital sendo mantida prisioneira pelos instintos inconscientes no primeiro chakra. Como o herói mitológico, o iogue tântrico deve libertar a Kun­ dalini para que ela possa ascender através dos chakras e revelar todos os seus tesouros de consciência. Ambos, o herói e o iogue, devem descer às entranhas da terra e enfrentar as forças das trevas para realizar aque­ las qualidades que dão origem a um sentido superior e plenitude de vida. O corpo físico é um veículo; ele precisa ser m antido, e suas poten­ cialidades, realizadas. Um corpo saudável é o primeiro passo para as vas­ tas dimensões da consciência além da mente ordinária. No Tantra tibetano, o corpo não é visto com o uma coisa fixa; ele é a expressão de uma encarnação contínua. Quem somos, o que estam os pensando e sentindo e atividades inconscientes são materializadas a cada momento. Alterações na psique mobilizam forças que se manifestam concretamente no corpo.

(5) Joseph Campbell, The Mythic Image, Bollingen Series, Vol. C (P ceton, NJ: Princeton University Press, 1981), p. 341.

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A Instalação de Bases Com um prim eiro chakra fechado ou traumatizado, o self consciente está desligado do corpo e, portanto, inconsciente de suas necessidades. Em geral, usamos a expressão “no espaço” para descrever esse estado de desligam ento do corpo. Nessa condição de falta de base, a vida é vivida com o uma luta e a pessoa se sente incapaz de enfrentar a realidade. Por outro lado, “ um sentido de presença” é uma expressão usada para descrever o fato de se estar dinam icam ente atento ao corpo. O utra maneira de considerar a instalação de bases é comparar o self a um rádio receptor sensível que requer um fio de terra para dim inuir a eletricidade estática. Quando estam os instalados, a energia psíquica flui dos níveis m ais sutis da psique para o corpo físico. Isso ajuda-nos a resistir às influências do ambiente. Se o prim eiro chakra está bloqueado, o circuito é incom pleto e o cam po da aura fica muito enfraquecido. Nesse estado, ficamos ansiosos e mais facilmente influenciados pelos pensam entos e emoções dos outros. As partículas de onda que oscilam no espaço para criar a aparên­ cia da dim ensão física vibram numa certa freqüência eletrom agnética (7,8 Hz). É possível, através do prim eiro chakra, e na verdade vitalm en­ te necessário, criar uma afinidade com a pulsação do campo terrestre. Estar contido nele é outra m aneira de explicar o term o instalar as bases. Os processos biológicos funcionam m elhor dentro das freqüências eletrom agnéticas naturais da terra. Variações dessas freqüências naturais causam tensão nos sistemas biológicos, eventualm ente levando à degeneração de órgãos e tecidos. Além da poluição do ar, da água e dos alimentos, a crescente poluição eletrom agnética da nossa sociedade tecnológica está se tornando um perigo para a saúde. Rádio, TV, microondas, linhas de alta tensão e aparelhos eletrodom ésticos, para m encionar alguns, são fontes de distúrbio no cam po eletrom agnético do corpo. Vibrações caóticas na aura ou uma superabundância de fre­ qüência de ondas cerebrais beta (ligadas à mente racional e a estados de preocupação, de medo, etc.) também perturbam o campo eletro­ m agnético do corpo.

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Na maioria das pessoas, a energia psíquica está freneticamente dispersa pelos corpos mental c emocional. Raram ente ha paz e clareza. A mente está sempre ocupada, pulando de uma seqüência de pensamentos a outra, de uma preocupação, problema ou esquema a outro. O corpo em ocional geralmente é jogado com o um pequeno barco num mar encapelado, e o organism o físico existe dentro dessa aura de vibrações caóticas. Ele é continuamente forçado a responder a estímulos conflitantes que produzem impacto no sistem a nervoso e nos sistemas glandulares a partir desses vários níveis da psique. Quando a aura e o corpo físico relaxam em ressonância com o campo magnético terrestre, as tranqüilas freqüências de onda cerebral alfa e beta são produzidas naturalmente e uma profunda sensação de paz prevalece. O campo m agnético do corpo é novamente alimentado e abraçado pelo cam po geomagnético-mãe. Sentimo-nos seguros e protegidos. Biofeedback, meditação e auto-hipnose são algumas das técnicas que podem ser utilizadas para relaxar o corpo-mcnte em ressonância com o cam po magnético da terra. Consideremos outra perspectiva para am pliar um pouco mais as conotações da experiência de instalação de bases. O Jardim do Éden não era um lugar, mas um estado de consciência: com eçamos nossa jornada sendo expulsos da nossa relação inconsciente e instintiva com a Mãe Natureza. Como é exem plificado pela vida das pessoas espiritualmente realizadas, podemos retom ar ao jardim conscientemente. Uma vez completado o desdobram ento da consciência, voltam os à nossa unidade original. Tom ando-nos o todo que vive através da parte, vivenciamos íntima e conscientem ente nossa “participação” no organismo cósmico. Sua totalidade vive em nós; ele é a nossa vida.

A Matriz Parental Fisicamente, som os concebidos pela união biológica de mãe e pai. Psicologicamente, nascemos da Grande Polaridade. Atrás da máscara da mãe e do pai pessoais estáo os dois arquétipos prim ordiais da Grande Mãe e Grande Pai. C om o bebês, buscamos a nutrição e a orientação

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inerentes a esses progenitores psicológicos através da relação com nossos pais biológicos. Na infância, com param os instintivamente nossos pais objetivos com os arquétipos parentais “ ideais” intem os. A necessidade fun­ damental de nos relacionarm os com a Grande Mãe e Pai c de sermos alim entados, protegidos e guiados por eles m uita vezes foi frustrada dolorosamente pelas inadequações de nossos pais biológicos. Com o resultado, nos sentim os carentes e crescem os desconfiados e mesmo ressentidos com nossos pais biológicos, e com freqüência com o mundo que eles representam. Os com plexos em ocionais que as crianças desenvolvem e os valores psicológicos absorvidos do ambiente parental criam barreiras ao crescimento. A menos que sejam superadas, essas barreiras afetam a base de todo o processo de desenvolvimento. C ada um, no nível m ais profundo, precisa sentir-se amado e amparado por seus pais. Quando sentimos que esse am or nos foi negado, tentamos preencher o vazio de várias maneiras. Ou somos impelidos por essa privação ou controlados por defesas com pensatórias. Uma relação saudável com os arquétipos da M ãe e do Pai está enterrada no nosso íntimo — sob camadas de dor e defesas. É importante revelar essas camadas de trauma. Terapias catárticas, com o R enascim ento e trabalho de corpo profundo, im aginação ativa, trabalho junguiano com sonhos e vários tratam entos psicanalíticos ortodoxos constituem alguns métodos para ter acesso a esses fatores inconscientes e liberá-los. A prática budista da m editação intuitiva, que será discutida em capítulo posterior, é outro m odo efetivo de peneirar nessas profundezas da psique. Através dessas escavações, podemos peneirar nas camadas de energia psíquica que existem sob nossas reações às influências paren­ tais. À m edida que desenterram os esses fatores escondidos e pas­ samos a tom ar posse de nossos sentimentos e projeções, co­ meçamos a sentir com paixão por nós mesmos e pelos nossos pais. Estamos então menos inclinados a censurá-los e m ais dispostos a abrirnos às suas dádivas de am or e lealdade, não im porta quão pequenas e im perfeitas sejam. Só então podemos com eçar a criar raízes

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nos níveis mais profundos da psique para sorver o alimento da Grande Mãe e Pai. Na bolota dorm ita o carvalho todo. De modo semelhante, a pola­ ridade da Grande Mãe e Pai contém todo o potencial para o de­ senvolvimento da consciência. Seu desdobram ento está na dependência de nossa relação diferenciada com esses arquétipos, que são projetados primeiramente nos pais biológicos e depois nos deuses e deusas que se tomam nossos pais espirituais.

Leitura Psíquica do Chakra-Raiz Um exemplo de uma leitura psíquica do prim eiro chakra servirá para resum ir muitos dos tópicos que discutim os até aqui: Clarividcntemente, focalizando a atenção no seu primeiro chakra, sinto tensão. Dessa energia constrita recebo uma impressão de medo, timidez e suspeita. Num nível mais profundo, estou consciente de sentimentos de raiva. Sintonizando mais cuidadosamente esses sentimentos, começam a aparecer imagens. Focalizando uma delas, vejo um feto no ventre durante o trabalho de parto. Ele luta pela vida contra a relutância da mãe cm dar à luz. A mãe não quer a criança; ela é infeliz com o marido; sua vida é uma luta. Todas essas forças projetam-se contra o bebê enquanto ele luta pelo seu direito de nascer e de viver. Por fim a mãe c narcotizada e o nascimento é forçado. Com o coração palpitando e o medo percorrendo suas veias, o bebê é jogado num ambiente claro, frio, e carregado desajeitadamente, levado e deixado sozinho. Outra' imagem surge agora. Frustrada e ressentida, a mãe está se recusando a cuidar das necessidades físicas da criança — alimentá-la, trocar as fraldas, etc. A criança se sente abandonada e indesejada. A repetida experiência de fome, que continua não atendida pela mãe, instila no corpo da criança uma sensação de medo e desconfiança. Agora vejo a mãe tratando a criança com hostilidade, dando vazão à raiva contra a sua própria vida. A criança se contrai de medo desses ataques; incapaz de compreender e de proteger a si mesma, ela se sente

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impoiente. O corpo da criança se retrai e enrijece contra a repetida e arbitrária hostilidade. Em outra imagem, a mãe está imersa em pensamentos. Planeja abandonar o marido. Está torturada com relação à criança; pensa que machucaria o pai se levasse a criança, e isso a agrada. Mas ela não quer a criança realmente e se alegra imaginando o pai tendo de trocar fraldas, etc. Está cheia de maldade e vingança. A criança está mergulhada nesse ambiente de ódio c sente a separação iminente e o abandono. Sem compreender todas as causas e circunstâncias, a criança se identifica inconscientemente com esse caos de sentimentos. Poderíam os continuar observando o relacionamento do pai com a criança e com a mãe, seu senso de responsabilidade ou sua atitude com relação ao seu trabalho. Todos esses fatores teriam algum a influência no relacionam ento da criança com o mundo físico. Todavia, a leitura acim a é suficiente para ilustrar com o as marcas psíquicas influenciam o prim eiro chakra. Você pode imaginar com o elas podem afetar o desenvolvim ento da criança e suas experiências de vida posteriores! Precisamos nos livrar da “personalidade” de nossos pais, em vez de ficar culpando-os por não serem tudo o que queríam os que fossem. As pessoas que ainda estão “ zangadas com a m am ãe” não devem tra­ balhar com a Kundalini, pois poderiam ficar subm ersas pela raiva por­ que o ego ainda está fixado num estágio de desenvolvim ento infantil frus­ trado. Precisam os purificar as auto-im agens que adotamos no espelho das ações e atitudes parentais e tom arm o-nos pessoas por direito próprio.

Dirigindo-se ao Refúgio Depois de m editar sobre a situação humana, Buda G autama concluiu que a vida é condicionada pelo sofrim ento. Toda a vida está em fluxo, e tentar estabelecer algo sólido e perm anente leva ao sofrimento. Estar apegado a como gostaríamos que as coisas fossem e ter aversão a como as coisas são constituem a causa de todo esse sofrimento. N a raiz do apego e da aversão está o fenômeno da identidade do ego. Quando despertou do sonho desta identidade do ego,

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Buda começou a ensinar que podemos superar as causas do sofrimento pela compreensão correta, pensamento correto, palavra correta, ação correta, meio de subsistência correto, esforço correto, atenção correta e concentração correta. O caminho budista com eça com o refugiar-se. No cenário tra­ dicional, um lama inicia um novo aluno num a cerimônia de refúgio. Dirigir-se ao refúgio é um modo simbólico de reconhecer que estamos alienados do verdadeiro self e que nos confiamos à orientação da M ente Desperta dentro de nós. No Budismo tântrico, o refugiar-se tem significados mais espe­ cíficos. Quando os canais psíquicos do corpo estão purificados, eles se tomam um Corpo de Emanação da Mente búdica. O ar vital ou energia psíquica que flui através desses canais, quando depurado, é um Corpo de Alegria. E os fluidos sexuais purificados são um Corpo de Verdade. Quando reconhecemos esses três elementos com o os Três Corpos da Mente Desperta, nos refugiamos no vajra (vajra significa “como o diamante”, ou indestrutível). Depois da cerim ônia de refúgio inicial, o praticante começa cada sessão de meditação com uma visualização do refúgio. Antes de co­ meçar a meditar, o fator mais importante é a nossa atitude. Uma com ­ preensão correta do refúgio baseia-se em fé no desdobramento de nossa verdadeira natureza. Junto com a convicção, precisamos de lucidez; meditamos para atingir o estado de Buda. Fé, clareza e resolução para manter-nos concentrados na meta e os meios de alcançar a m eta __esses aspectos formam a base do refúgio e a atitude apropriada para a meditação. Há no Tibete um ditado que diz: “Dirigir a mente é como arrear um excelente cavalo para poder dom á-lo.”4 O corpo, a palavra e a mente, como um cavalo selvagem, contêm energias poderosas que podem ser arreadas para um trabalho construtivo. Podemos aprender a dirigir essas forças na nossa meditação matinal.

(6) Lama Thubten Yeshe, Wisdom-Energy (Honolulu: Conch Press, 197 p. 74. [/t energia da sabedoria. Editora Pensamento, São Paulo, 1987.]

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Os budistas de todas as seitas diariam ente rendem culto à Tríplice Gema — o Buda (a M ente Desperta), o Dharma (os ensinamentos) e a Sangha (a comunidade dos praticantes budistas). Os seguidores do Vajrayana (Budismo tântrico) também prestam homenagem ao seu guru, que personifica a linhagem de mestres que rem onta ao próprio Buda. O praticante invoca essas quatro m anifestações concretas da Mente Iluminada para obter orientação e amparo em suas meditações diárias. A meditação a seguir é um a versão da visualização do refúgio adaptada ao nosso propósito neste livro. Ela foi com binada com o passo inicial para o domínio da m editação, cham ado samatha. A palavra tibeiana para samatha é zhignas, e significa m orar na paz. Ela se refere ao desenvolvim ento da atenção, que livra a mente das distrações dos pensamentos. Estas duas práticas são o suporte-raiz do Tantra tibetano.

Meditação do Buda Shakyamuni Com ece colocando seu corpo num a postura de m editação. Relaxe c concentre sua consciência na respiração. D eixe que a respiração seja com pleta, contínua e sem esforço. Talvez você queira regular a respiração repetindo silenciosam ente o m antra do Buda Shakyamuni: OM TA YA THA MUNI MUNI M AHAM UNYE SVAHA (ascetismo ou controle, grande ascetism o, assim seja). Utilizando uma contagem de quatro para a inspiração e expiração, recite OM TA YA THA na inspiração, MUNI MUNI na expiração, M AHAM UNYE na inspiração seguinte e S VA-HA na últim a expiração. É também útil estar consciente do seu prim eiro chakra; sinta-o descontraindo, abrindo e instruindo-o à medida que você se concentra na respiração e no mantra. Enquanto você vai relaxando mais e m ais, com ece a visualizar Shakyamuni sentado à sua frente. (Veja a fig. 9, p. 70.) Imagine-o m editando sob a árvore bodhi, onde, depois de peram bular em busca do cam inho da libertação por m uitos anos, ele jurou perm anecer em meditação até que alcançasse a iluminação. Sua com pleição é dourada e usa vestes monásticas da cor do açafrão. Em sua mão esquerda segura uma taça cheia do néctar que destrói os quatro obstáculos que Buda já

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Fig 9. Buda Shakyamuni. Uma divindade cm meditação utilizada na cerimônia de e fu g .o s^ b o l.zan d o o eo m p ro m isso d e ale an çaram e tad ailu m in ação .D aco Ie ção

thanka de Serge, Diakoff. Reproduzida com permissão

superou: o sofrim ento de nossos agregados, o dem ônio da morte, nossa mente inquieta e indom ável e o demônio do desejo. Sua mão direita toca a terra porque, quando o Senhor Buda se sentou sob a árvore bodhi, a tentadora M ara Kam a D eva veio perturbá-lo. Ela tentou dissuadi-lo de sua meta de ilum inação mas, apesar dos m eios que usou, Buda perm aneceu imóvel em sua meditação. Tocando-a, pediu à terra que testemunhasse que ele não estava perturbado pela tentadora. A terra tremeu e sacudiu seis vezes em resposta; daí o significado do Mudrá do Toque-da-Terra. A seguir, olhe fixam ente para a face de Buda, sinta a profundidade da sua tranqüilidade. E então perceba quão imóvel e relaxado está o seu corpo. Como uma pedra, seu corpo repousa solidam ente sobre o solo. Contemple o Guru Buda Shakyamuni com o um ser plenamente iluminado, de infinita com paixão, paciência e conhecim ento para conduzir todos os seres do sofrim ento ao cam inho da libertação. Rogando que lhe conceda sua sabedoria e com paixão, reze com suas próprias palavras para que sejam removidos da sua mente e do seu coração todos os obstáculos. Em seguida, prom eta refrear aquelas ações de corpo, palavra e mente que podem tom ar-se em pecilhos no caminho da iluminação. E, finalm ente, reze para que você desperte para a Natureza Búdica para benefício de todos os seres sensíveis. Visualize um OM branco na sua testa, um AH vermelho na sua garganta e um HUM azul no seu coração. Os raios de luz provenientes dessas três sílabas constituem a essência e o poder da Sabedoria e C om paixão do corpo, palavra e m ente sagrados de Buda, respectivamente. À medida que a luz branca do OM brilha no seu sexto chakra, todas as energias negativas no corpo são purificadas. À medida que a luz vermelha do AH brilha no seu quinto chakra, todas as impurezas da palavra são depuradas. A luz azul do HUM clarifica todas as ilusões de sua M ente-Coração.7 (Veja fig. 10.)

(7) Para informações adicionais sobre a prática do Refúgio, reporte-se Khctsun Sangpo Rinbochay, Tarüric Practice inNying-Mapa (Ithaca, NY: Snow Lion, 1982).

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Fig. 10. OM AH HUNG. Mantras-scmentes visualizados nos chakras frontal, lanngco e cardíaco para purificar o corpo, a fala e a mente.

Depois de receber esse fortalecimento de Shakyamuni, sinta-se mergulhando mais e mais no estado de meditação. Mais e mais, até atingir a profundeza da concentração de Buda. À medida que isso acontece, a imagem de Buda se dissolve em você. Você é transformado em Buda sentado sob a árvora bodhi na postura da M udrá do Toque-daTerra. Seu corpo está estável e fixo como uma rocha e você absorvido em serena meditação. Perm itindo que sua consciência desça como um peso enorm e à base da sua pelve, sinta-se continuando a descer a níveis mais e mais profundos de paz interior enquanto você simplesmente permanece atento à respiração que entra e sai de suas narinas. Se quaisquer pensam entos errantes surgirem , suavemente leve de volta sua consciência a essa imagem de você mesmo e continue a focalizar a sua respiração. À m edida que continua a se concentrar, você pode imaginar que está descendo através das profundezas do seu self interior. Do tumulto da superfície da sua mente, você desce às profundezas calm as do mar da consciência interior. Enquanto continua a respirar e a relaxar, você se aprofunda mais e mais nesse mar de consciência, onde calmamente fixa a sua m orada num maravilhoso e sereno estado de meditação. Permaneça nessa paz pelo tempo que desejar. Antes de sair da m editação, repasse m entalm ente o dia que está à sua frente, vendo-se nesse calm o e claro estado de consciência. Ao ver­ se cm situações específicas, escolha alguns aspectos dessas situações como lembretes. Veja a si mesmo tom ando-se consciente desses lembretes c se lembrando deste estado de tranqüilidade e do seu compromisso com o estado de Buda. Ao repassar esse dia à sua frente, veja-se e sinta-se agindo com o um Buda.

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Capítulo Terceiro SUA MORADA ESPECIAL O diagrama hindu para o segundo chakra tem seis pétalas ver­ melhas. No interior do seu lótus há uma lua crescente — luminosa, branca, fria e receptiva — que simboliza o elem ento água. Dentro da lua crescente encontram os M akara, o monstro dos abismos que vive no fundo do mar. O nome sânscrito para o segundo chakra é Svadhisthana, signifi­ cando “sua morada especial” (ou lugar de prazer). É interessante, c significativo, que os iogues antigos associassem o segundo chakra com o domínio especial da deusa serpente, visto que seu aparecimento aqui revela m uitos elem entos m itológicos da Grande Mãe. Retratada com qualidades proem inentem ente amorosas, geradoras, dominadoras e às vezes cruéis, a Grande Mãe está ligada a cultos de fertilidade e a orgias sexuais, bem com o a imagens que representam as forças inimigas do inconsciente. Todos esses fatores são encontrados na mitologia hindu do segundo chakra. (Veja fig. 11, p. 75.) O segundo chakra está localizado entre o umbigo e o osso pubiano. Psicologicamente, ele se relaciona com os estágios pré-racional e de sonho da consciência, cm que nenhuma identidade estável se estabele­ ceu ainda. Em The Origins and H istory o f Consciousness, Neumann diz que essa etapa do desenvolvim ento está sim bolizada no mundo da m ito­ logia pelos jovens deuses da fertilidade. Não possuindo forças heróicas, eles são impotentes e sofrem um destino coletivo nas mãos da Grande

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Deusa Mãe. Os cultos da fertilidade, em que o m acho ritual às vezes era sacrificado, constituíam dram atizações típicas dessa cam ada da psique.1 No processo de abertura do segundo chakra, portanto, podemos nos defrontar com medos profundamente arraigados e sentimentos sexuais am bivalentes à medida que alguns desses elementos arcaicos do in­ consciente coletivo se tomam mais perceptíveis em nossa vida pessoal. Durante os prim eiros anos da infância, passam os por um estágio muito semelhante ao período histórico relacionado com a m itologia da

Fig. 1 1 .0 segundo chakra, Svadhislhana. No interior do lótus de seis pétalas vermelhas vê-se uma lua crescente branca simbolizando o elemento água. O mantra-semenie VAM invoca a antiga divindade Varuna, o Senhor do Mar. O veículo de Varuna é Makara, um monstro que vive no fundo do mar.

(1) Erich Neumann, The Origins and History o f Consciousness. Bolling Series, Vol. XLII (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1954), pp. 39-102.

Grande Mãe. Vimos no primeiro chakra que, como bebês, aprendemos idealmente a confiar no mundo quando nossas necessidades de sobrevivência são atendidas no período pré-natal e nos primeiros anos de vida. Depois dessa época, começamos a nos diferenciar da mãe e do ambiente. Assim fazendo, sentimos nosso desam paro e impotência. Nossa dependência em relação à mãe liga-se naturalmente com nossa sobrevivência de um modo novo — sobreviver é ser amado, ser amável. Isto nos dá uma certa intuição quanto à ansiedade e à incrível “carga” que carregamos conosco em nossos relacionamentos presentes e a devastadora insegurança que resulta da rejeição e da solidão. No nível de desenvolvimento do segundo chakra, despertamos para a consciência das sensações. Nossa consciência da sensação relacionase primariamente com reações prazerosas e dolorosas ao mundo. Uma pessoa fixada num segundo chakra inconsciente está preocupada, por­ tanto, com reações de prazer e dor. Isto leva a uma entrega a expe­ riências prazerosas e a uma compulsão para evitar as experiências desagradáveis. Esta motivação difere daquela da mera sobrevivência encontrada no primeiro' chakra, mas é uma fonte de ansiedade igual. O sentido do sclf aqui no segundo chakra é, por isso, definido pela totalidade de objetos, pessoas e situações que nos fazem sentir seguros emocionalmente ou que estão associados ao prazer. Ou, num sentido negativo, por aquelas coisas que estão ligadas à dor c à insegurança. Há dois modos básicos de lidar com o segundo chakra em termos de energia sexual associada ao prazer e à dor. Um é continuar a deixar que essa energia flua pelo segundo chakra enquanto liberamos medos e desilusões passados e expectativas românticas. Um tratamento mais extremado, recomendado por muitas tradições espirituais, consiste em evitar experiências sexuais. Embora a abstinência seja benéfica em certas ocasiões, no final todas as velhas cicatrizes e medos terão de ser curados de modo que as “águas da vida” possam fluir pelo segundo chakra e para todos os níveis da psique. Carregando a conotação de sexualidade, a energia psíquica do segundo chakra desempenha um papel importante no magnetismo que atrai macho e fêmea. Este magnetismo está intim amente ligado à pro­

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jeção dos arquétipos de anim us e anima, term os junguianos equivalentes às contrapartes m asculina e feminina da psique. O segundo chakra tem também uma relação especial com o corpo etérico. Com o um cam po de força de energias vitais, o corpo eterico é uma interface entre o corpo físico c os corpos sutis. Coçrentes de força vital passam por ele e para o corpo físico em m iríades de torrentes impetuosas. Essas torrentes tem um efeito nutritivo e purificador, e estão relacionadas com o baço e os sistemas linfático e urinário. Seus cursos são mapeados e m anipulados por métodos com o a Terapia da Polari­ dade, a Acupuntura e as técnicas de meditação taoísta e tântrica. O livre fluxo dessas correntes é essencial para a saúde e para a vitalidade do corpo físico. O corpo etérico é um meio que recebe im pressões que reverberam em resposta a em oções no mundo astral. O segundo chakra desem penha um papel fundamental na tradução desses impulsos para o sistema nervoso. Não só nossos sentimentos são sentidos no segundo chakra, mas também são recebidas as forças em ocionais do ambiente. Essa sensibilidade pode ser muito confusa c perturbada, em especial quando funciona abaixo do nível de consciência, com o acontece normalmente. Porque a mente racional não se sente confortável com os sentimentos dolorosos ou muito fortes, o segundo chakra com freqüência é bloqueado. Desejos sexuais e românticos, solidão, sentim entos de vul­ nerabilidade, desespero, o anseio de sentir-se am ado e emocionalm ente seguro e o ressentim ento e raiva por ser desprovido dessas necessidades, são alguns dos sentim entos comuns encontrados no segundo chakra quando seus conteúdos sobem à superfície da consciência. Q uando o segundo chakra se contrai defensivam ente, não temos contato com os nossos sentimentos. A liberação das energias reprimidas levará a um aumento notável de vitalidade e saúde, devido ao fun­ cionam ento m elhorado do corpo etérico. A capacidade para o sen timento e a intim idade também será aperfeiçoada. No Tantra, o chakra sacro está relacionado com o elem ento água. A água é freqüentem ente sím bolo do inconsciente. Quando as forças impessoais do inconsciente fluem através da psique, a frágil indivi­

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dualidade do ego-self em desenvolvimento se contrai de medo ao defrontar-sè com essas correntes profundas e misteriosas. Forças in­ conscientes comprimem a minúscula ilha de consciência do cgo-self com a onipotência de movimentos ondulantes, e às vezes como ondas agitadas. As unidades tribal e familiar criam santuários a partir desse vasto oceano de forças inconscientes, enquanto o mito e o ritual domesticam o seu poder. Para obter segurança emocional, geralmente tentamos controlar as forças impessoais do inconsciente. A energia sexual, por exemplo, é amiúde associada à possessividade c ao ciúm e à medida que tentamos dominá-la. No aspecto positivo, os poderes do inconsciente profundo podem ser transformadores. A energia sexual também inclui o potencial de transformação experim entado na fusão com outro ser e, cm última instância, nos níveis transpessoais da psique. A saúde e a totalidade do segundo chakra relacionam-se com o estabelecimento de uma identidade emocional positiva. Quando nossas experiências passadas e as impressões no segundo chakra nos dizem que somos amados e amáveis, c quando aceitamos nossos sentimentos e sen­ timos que os outros também os respeitam, somos capazes de dar c rece­ ber apoio emocional livremente. Por outro lado, se nosso sentido de se­ gurança emocional foi traumatizado, podemos ser inconscientemente dominados por uma de suas reações gerais: nossa consciência dos sentimentos e a habilidade de receber alimento emocional de outros es­ tão inibidas por mecanismos de defesa, ou somos impelidos por neces­ sidades emocionais que fazem com que nos com prom etamos em excesso no sentido de alim entar nosso apego à aprovação e ao apoio dos outros.

Lidando com os Sentimentos A percepção dos sentimentos foi o primeiro passo que demos para fora da caverna instintiva do inconsciente. Com o uma evolução da função do sistema nervoso, a percepção do sentim ento aperfeiçoou nossa sensibilidade para as influências positivas e negativas do ambiente.

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C o n scien te ou inconscientem ente, ela ainda atua com o m otivação su b jacen te para o m odo com o reagim os ao nosso m eio am biente.

Embora sentimentos e emoções estejam muito interligados, os sentim entos pertencem mais ao domínio do receptivo e impressionável segundo chakra. As emoções são a expressão da nossa resposta aos sentim entos e se relacionam mais com o terceiro chakra. Usando uma analogia simples, imagine um lago tranqüilo. Quando o vento sopra cm sua superfície, o lago “sente”. As impressões do vento na água criam as ondas. Essas ondas por fim se quebram na praia, expressando a força que as criou. No corpo astral, os estím ulos dão origem a ondulações de im ­ pressões e de sentimentos. Um mecanismo pré-consciente julga esses sentimentos como agradáveis ou dolorosos à medida que filtra essa informação através de uma série de associações. Respostas químicas, neuromusculares e talvez verbais são então lançadas, se não forem reprimidas, nas praias da consciência através dos corpos físico e cterico. Os sentimentos têm significados específicos, mas freqüentemente nós os racionalizamos. Aprendemos a ajustar nossos sentimentos aos cos­ tumes sociais ou às repressões do meio em que vivemos. Em conse­ qüência disso, perdemos contato com os nossos verdadeiros sentimentos. As crianças dão expressão aos sentim entos naturalmente. Quantas vezes não vimos uma criança manifestar algum sentimento de maneira absolutamente franca embaraçando um adulto, que então a repreendeu? Como crianças, éramos indefesos à dor e à repressão infligidas pelos adultos e pela estrutura social. Depois, fomos forçados a nos proteger afastando-nos da nossa percepção. Perdemo-nos em nossas defesas e papéis aprovados socialmente. A barreira entre a realidade defensiva e o mundo de nossos sentimentos reais teve início há muito tempo; ela pode ser enorme. Nossos egos defensivos freqüentemente consideram os sentimentos problemáticos, algo a ser superado ou controlado. Infelizmente, os sentimentos nunca são extintos de uma vez e para sempre. Sentimentos dolorosos podem ocorrer a qualquer momento; eles só são toleráveis quando aprendemos a senti-los e a liberá-los no tempo apropriado.

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A m enos que sejam reconhecidos e aceitos, os sentim entos não podem ser liberados. E les são com o cursos d ’água; se não há resistência, a ág u a flui livrem ente, sem esforço. A resistência cria um a rep resa que transform a num charco a água que corre livre ou, com o au m en to do volum e e da pressão, num a força agressiva c destruidora. É a nossa resistência aos sentim entos

e o

m edo

de serm os rejeitados

por

com partilhá-los que transform am o seu poder num a força am eaçad o ra dentro de nós. A s causas principais para a separação e alienação ex perim entadas no segundo chakra são as defesas e o idealism o em que nos refugiam os para ev itar que nos tornem os vulneráveis aos nossos sentim entos. À m edida que o segundo chakra se abre, a capacidade de sentir tanto a dor com o

o

prazer

é

aperfeiçoada.

E ssa

natureza

am b iv alen te

dos

sentim entos faz com que seja tarefa difícil e corajosa o reto m o além das barreiras de nossas defesas através da história de lem branças traum áticas para recuperar o se lf sentim ental e sua capacidade de se to m a r íntim o. Isso é feito de m odo m ais ad equado num am biente acolhedor, ou profissionalm ente ou com outros que realizam um trabalho sem elhante. L em brar os sonhos e rever os sentim entos neles experim entados é um a introdução excelente ao m undo dos sentim entos internos.

A consonância A consonância psíquica é um fenôm eno relacionado com

o

segundo chakra que freqüentem ente confunde nossas experiências com os sentim entos. A analogia de um tím pano que vibra em consonância com as vibrações de um a m úsica próxim a é um a boa m aneira de d em o n strar com o o corpo astral, que ex iste num a atm osfera com m uitas freqüências de energia em ocional, vibra com

as forças psíquicas

am bientais. À m edida que essas forças interagem com o corpo astral, elas reproduzem — em graus diversos — sem elhantes existentes no interior d esse corpo.

padrões

de

en erg ia

E ste é um m odo de com preender com o nos tom am os program ados pelas influências psíquicas do nosso am biente inicial. Q uando ainda

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bebes, ao despertar para o nosso sentido de self, entram os no domínio puramente consciente do segundo chakra. Receptivos e vulneráveis, entramos em consonância psíquica com o am biente emocional de nossos pais e da cultura vigente. Subseqüentemente, a vulnerabilidade a várias forças emocionais no plano astral se relaciona com padrões que se estabelecem firm emente cm nosso corpo emocional. Ressoamos mais prontamente às forças em ocionais externas que se assem elham a esses padrões estabelecidos. Por exemplo, se no passado passam os pela experiência traumática de sermos julgados, pode ocorrer consonância psíquica ao sermos julgados por outra pessoa. Podemos nos sentir muito estranhos na presença dessa pessoa. Podemos até representar projeções negativas, comportando-nos de um modo não normal para nós, sob a influência desses antigos sentimentos. Outro aspecto da consonância psíquica está associado à psicologia tribal. Esta é um a forma de identificação coletiva proveniente de sociedades prim itivas, mas ainda ativa no segundo chakra no nível da psique, quando inconscientem ente formávamos uma “unidade” com os outros membros da nossa tribo ou clã. Em vez de termos um a identidade individual, a vida era vivida no grupo e em função do mesmo. Quando entram os em consonância psíquica com outra pessoa cm nossa vida atual, ainda podemos estar agindo inconscientemente a partir dessa cam ada primitiva. A consonância psíquica costum a ser confundida com amor ou atenção para com o outro, mas as reações de sim patia geralm ente se baseiam numa identificação inconsciente com a outra pessoa. Mais do que agir com com paixão ou em patia, respondemos com o se o trauma ou problem a da outra pessoa estivesse acontecendo conosco. Nessas respostas consonantes, inadvertidam ente podemos tentar assumir a responsabilidade pelos sentim entos do outro, ou podemos agir como se os sentimentos da outra pessoa fossem verdadeiramente nossos. Ou, de outro modo, podem os estar tão desesperadamente necessitados de intimidade, que assum im os os sentim entos do outro na tentativa de nos sentirmos próximos. É suficiente dizer que podem os nos ver enredados num a variedade 81

dc estados em ocionais confusos baseados na dinâm ica da consonância psíquica. A determ inação de assum ir responsabilidade por inseguranças e sentim entos, com binada com

os instrum entos de autopercepção

apresentados neste livro proporcionarão ao leitor os m eios de m itigar a m aioria dos efeitos da consonância psíquica.

O Companheiro Interior À medida que a energia sexual (libido ou Kundalini) sobe a partir do primeiro chakra, ela assume novas conotações. No segundo chakra, a energia sexual c utilizada na tentativa dc superar o profundo sentido dc solidão, e um tipo com pulsivo de “am or” pode impelir-nos a procurar a união com outra pessoa. Agindo desse nível da psique, não compartilhamos com os outros sem m otivos ulteriores! Embora incons­ cientemente, usamos o nosso “bem -am ado” na tentativa de preencher um anseio profundo de nos unirmos com a nossa “outra m etade”. Esse amante-fantasm a aparece como uma imagem misteriosamente ilusória c incrivelmente sedutora dc um com panheiro ideal projetado das profundezas numinosas da psique. Para uma melhor com preensão da dinâm ica entre o self cons­ ciente e esse companheiro interior, vamos nos referir uma vez mais à psicologia junguiana. Embora haja diferenças básicas entre macho c fêmea, todos temos traços masculinos e femininos. Biologicamente, temos tanto genes masculinos quanto femininos, sendo os dominantes os responsáveis pelas nossas diferenças fisiológicas. Psicologicamente, temos em nós ambos os sexos, de novo com a predominância dc um ou outro. À m ulher interior do homem, Jung deu o nome de anima (eros, alma), o homem interior da mulher é cham ado de animus (mente, espírito). De acordo com Irene Clarem ont dc Castillejo cm Knowing Woman, o self consciente da mulher está harmonizado com instintos, emoções e mtuições. Geralmente, sua consciência c mais abrangente e penetrante do que a do homem. Ela tem a tendência de aceitar ou dc

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rejeitar as co isas in lo iu m } A m ulher, portanto, precisa aprender a co n cen trar sua consciência. O anim tis a ajuda a torn ar claro o propósito c o sig n ificad o da vida. Q uan d o o anim us perm anece inconsciente, o que aco n tece ate um nível relativ am ente elev ad o de m aturidade psicológica, su as q ualidades não podem ser utilizadas de m odo construtivo p ela m ulher. Preso no inconsciente, ele age de m aneira autônom a, dom inando perio d icam en te a m u lh er e levando-a a agir da m aneira m ais irritante. N esses m om entos, ela p ode se to m ar irrazoável c propensa a discussões, colo can d o outras p essoas em situação difícil com suas acusações inadequadas. E screvendo sobre o anim us cm A specis o f lhe Feminine, Jung disse que ele consiste p rin cip alm ente em opin iõ es m ais do que em verdades logicam ente d ed u zid as.3 Em contraste com as qualidades receptivas c doadoras de vida da identidade b ásica da m ulher, o sclf consciente do hom em e ag ressiv o e im pelido

a desenvolver

o dom ínio

sobre

as

forças

vitais.

Suas

p redileções heróicas instigam -no a ir em busca de suas co n q u istas a p en etrar nos m istérios da N atureza. M as porque seu racionalism o está focalizado cm fatos objetivos, ele precisa da m ulher que ex iste no seu íntim o (a anim a) para sondar suas realidades interiores. E la é a m usa que o inspira. Ela revela seus sentim entos, capacidade p ara o relacionam ento e, portanto, para o am or, p ara a im aginação criadora e para o sentido de b eleza. C om o o hom em den tro da m ulher, a anim a é poten cialm en te o guia do hom em para sua n atureza interior e m ais elev ad a e é a com panheira procurada q u e o consola, quando de seu retorno ao lar d epois de suas proezas. O hom em norm alm ente reprim e a sua m ulher interior porque se sente pouco confortável com o dom ínio irracional do instinto e da em oção. N ão obtendo o seu devido respeito, ela o assalta com estados

(2) Irene Claremont dc Caslillejo, Knowing Woman (Nova York: Harper & Row, 1973), p. 77. (3)Carl Jung, Aspects o f the Feminine (Princeton, NJ: Princcton Univer­ sity Press, 1982), p. 172.

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de espírito misteriosos e indulgências vãs. Um homem controlado pela anima pode ser tão sedutor e temperamental como qualquer mulher. Ou um homem assim pode ser irremediavelm ente dominado pela mulher sobre quem projeta sua anima negativa. Embora anima e animus sejam arquétipos, como indivíduos temos uma interpretação pessoal de suas características particulares. O animus fundamenta-se no Pai e inclui a totalidade dos valores patriarcais. A anima baseia-se na Mãe , com memórias inconscientes dos tempos matriarcais. Alem de nossas experiências pessoais cm relação a essas duas fontes primárias, todos os valores sociais e nossas impressões do sexo oposto (incluindo influências de vidas passadas) são responsáveis pelas nossas versões individuais da m ulher interior ou do homem interior. A anim a e o animus agem com o catalisadores para o rela­ cionamento quando mutuamente projetados em pessoas do sexo oposto. Pelo caminho das relações, esses guias interiores potencialmente nos conduzem à totalidade que procuramos em nós mesmos. Os “m ales do amor que marcam o começo de relacionam entos românticos são cau­ sados pela carga numinosa da anim a e do animus. Além de ficarmos inebriados com essa irrupção de sentimentos romântico-scxuais, também ficamos enlevados pelas qualidades idealizadas projetadas sobre nós pelo nosso novo amor. Gostamos de acreditar nessas coisas a respeito de nós mesmos até que se torne claro que a outra pessoa não está apaixonada por nós, mas pela fantasia que ela espera que preenchamos. Quando a tela sobre a qual projetamos nossos companheiros ideais fica desgastada pelo uso e abuso da relação diária, perm ite que vejamos a outra pessoa. Podemos então sentir-nos feridos e enganados; é então que devemos voltar nosso olhar para o outro dentro de nós. Nossos companheiros internos também têm seus traços negativos. Seu mau gênio pode destruir a nossa capacidade de ter relacionamentos significativos. Por exemplo, uma mulher pode ter uma longa série de relacionamentos que confirmam sua convicção de que os homens existem para dominá-la, em vez de com preender que seu verdadeiro conflito está nos aspectos negativos e dominadores de sua própria

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masculinidade. Ela continuará lutando e culpando os homens da sua vida devido ao seu sentido de opressão e inutilidade. Em conseqüência, será impelida a solapar e desvalorizar os homens à medida que luta para dar sustentação à sua auto-estim a e ao seu sentido de poder pessoal. A hostilidade gerada pela posse de um animus negativo 6 bem diferente da força e clareza de uma mulher que integrou o seu lado masculino. Quando um homem é possuído pelo seu lado feminino negativo, ele pode tom ar-se melancólico, insignificante ou excessivamente meticuloso, etc. Ele pode projetar a causa desses sentimentos numa mulher, acusando-a de fazê-lo sentir-se assim. Quando identificado com a mulher negativa dentro dele, pode sentir-se impotente e incapaz de enfrentar as dificuldades da vida. Para realizar suas ambições, talvez ache que deva recorrer a ardis ou trapaças. A raiva e o ressentim ento que o homem sente como resultado do desapontamento causado pela mulher cm quem depositou a projeção idealizada da sua anim a é um golpe cruel. De modo semelhante, se uma mulher não assume a responsabilidade por se aproximar afetivamente do seu lado masculino, ela sem pre será capaz de achar alguma fraqueza, medo ou imperfeição num homem para destruir a fantasia que construiu de um herói que deveria preencher todas as suas exigências e expectativas. A desconfiança e a desesperança geradas por essas experiências constituem uma base fraca para futuros relacionamentos e para a tarefa do desenvolvim ento psicológico. Há quatro seres envolvidos numa relação romântica, duas pessoas e suas contrapartes interiores. É melhor relacionar-se com esses parceiros inconscientes com o respeito que merecem, pois quanto mais inconscientes permanecem, mais autônomos e poderosos se tomam. Não podemos reprimi-los ou controlá-los sem conseqüências desastrosas. Os sonhos oferecem um a revelação excelente sobre a natureza do parceiro interior. Podemos aprender muito prestando particular atenção aos personagens do sexo oposto c ao nosso relacionamento com eles nos sonhos. Manter um diário em que registramos os sonhos de anima e animus é uma boa m aneira de passar a conhecer melhor nossos companheiros interiores. A reflexão sobre os principais temas de

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relações românticas passadas também irá revelar várias facetas da nossa natureza contra-sexual. Há um significado simbólico profundo contido nas imagens projetadas no objeto de nossos desejos sexuais. Integrar os conteúdos inconscientes personificados nessas imagens é um passo importante para o nosso desenvolvimento pessoal.

Sexualidade Tântrica Em que você pensa durante o ato sexual? O que você sente? O que acontece no seu corpo? Por que você pratica o sexo? A diferença entre sexualidade normal e sexo tântrico está nas respostas a essas perguntas. A média das relações sexuais é, em sua maior parte, baseada na paixão física e nas emoções românticas. Nossa entrega à excitação sexual, ao romance e ao sentido de segurança emocional experimentados nessas relações com freqüência nos submete a uma variedade de resultados desagradáveis. Além disso, muito da nossa energia vital pode ser desperdiçado cm favores sem importância, senão reconhecidamente neuróticos, sem uma motivação consciente. Através dos meios hábeis do Tantra, podemos dirigir a força da libido c do am or para dom ínios de expressão mais sutis e recom ­ pensadores. Pela sexualidade tântrica aprendem os a retirar nossos apegos pessoais das forças em jogo entre um homem e uma mulher. Para o homem, sua consorte não é mais a sua com panheira, mas a Deusa — personificação da sabedoria-intuição da M ente Iluminada. Para a mulher, o consorte é a Divindade — personificação dos meios hábeis para se alcançar a iluminação. As várias forças impessoais simbolizadas nas divindades tântricas tom am -nos suscetíveis aos aspectos incons­ cientes do nosso self contra-sexual e aptos para o ato de adoração. Num cenário tradicional, há quatro estágios principais nesse pro­ cesso. O primeiro é para os que (não sendo monjas ou monges) ainda são controlados por desejos românticos. Nessa fase, estamos livres para ter relações sexuais com pessoas não experientes no Tantra, na medida

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cm que nos identificam os, e a nossos parceiros, com divind ad es plenas de com paixão. O estágio seguinte é para os que têm apegos rem anescentes, mas que adquiriram m aior reconhecim ento da tarefa do desdobram ento espiritual. É im portante então que se pratique o ioga sexual apenas com pessoas qu e estejam no m esm o nível de com preensão. Sc estam os estudando com um lam a, ele pode escolher um a consorte m ais hábil ou avançada n a p rática tântrica. N esse contexto, com eçam o s a utilizar várias técnicas de respiração, m usculares e visuais do ioga sexual para abrir certos canais psíquicos e estim ular a energia K undalini. N o terceiro estágio são praticadas m editações com divindades cm enlace sexual. Isto por fim leva ao quarto estágio, em q u e a necessidade de objetos d e adoração é superada. N o ato sexual norm al, a respiração, o pulsar do co ração , a m ente e as glân d u las sexuais são excitadas — tudo isso lendo em vista apenas o orgasm o. No sexo tânirico, aprende-se a articular essas funções; cm vez d e desperdiçá-las, perm ite-se que as energias biopsíq u icas co n s­ truam o co rpo-m ente e ressoem por todo ele. U m a respiração lenta e plena é usada para perm anecer “ ligado” c alerta du ran te a m editação sexual. H arm onizar a respiração com a do parceiro — um inspira enquanto o outro expira — cria um elo de energia psíq uica c estabelece um ritm o tranqüilo. O hom em tam bém usa m étodos que im pedem o orgasm o. À parte a extensão óbvia de d uração do ato sexual através da retenção da ejaculação pelo hom em , há nisso benefícios biológicos c vitais. O sêm en e um nutriente m uito concentrado, que contém horm ônios, m inerais e am inoácidos. D iz-se que um a ejaculação equivale, em v alo r nutricional, a duas refeições. D aí que um hom em doente ou fraco dev e precaver-se contra o orgasm o, enquanto o hom em saudável deve ser cu id ad o so para não esgotar seu d epósito de energia vital. A pesar de as secreções sexuais da m ulher tam bém conterem nutrientes poderosos, sua perda não é tão séria com o a do hom em . D aí que sua n ecessidade de ev itar o orgasm o não tem a m esm a im portância biológica; a bem da verdade, o orgasm o fem inino é estim u lad o nos 87

rituais sexuais tântricos e taoístas. Sua essência feminina é considerada portadora de um efeito vitalizador sobre o ato sexual, nutrindo a circulação de energias psíquicas através dos corpos sutis unidos dos dois praticantes. Em termos teóricos, sua essência é inexaurível e nutre a energia masculina, que se esgota facilmente. A estimulação sexual libera hormônios considerados muito benéficos para todo o organismo. Iogues antigos descobriram que se pode reciclar a energia vital e esses preciosos nutrientes através de todo o corpo-mente com técnicas utilizadas no ioga sexual. Na atividade sexual normal, as emissões da próstata e da vesícula seminal são expelidas durante a ejaculação. No Sexual Energy Ecsiasy, os autores afirmam que, com métodos que impedem a ejaculação, essas secreções são retidas na uretra e lentamente absorvidas pelo sistema linfático para recircular por todo o corpo.4 Acrescentam também uma advertência: as técnicas de bloqueio da emissão natural do sêmen depois da contração das glândulas sexuais, tensionando os músculos do reto ou com prim indo o perínco com os dedos e logo abaixo da raiz do pênis, podem fazer com que os fluidos sexuais retomem para a bexiga e impedir que a próstata se esgote. Como prática freqüente, isso pode causar congestão e, portanto, enfermidade nesses órgãos. Pelas mesmas razões, o homem com energia sexual forte pode achar prejudicial reprim ir regularm ente essas secreções.5 Os antigos chineses, ao mesmo tempo que estimulavam o homem a fazer sexo o quanto possível, advertiam contra a ejaculação nos meses de inverno, mas nada objetavam quanto a isso durante a primavera, quando a onda de energia sexual é mais forte. Em nossos ciclos pessoais de energia, pode não ser prejudicial mas até saudável, liberar fluidos sexuais durante os períodos de excesso de energia.

(4) David Alan Ramsdalc e Ellen Jo Dorfman, Sexual Energy Ecsiasy (Play a Del Ray, CA: Peak Skill, 1985), p. 197. (5) Raxnsdale e Dorfman, Sexual Energy Ecstasy, p. 198.

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Em geral, é aconselhável que o homem perm aneça calmo e evite passar o “ponto sem retom o”, o ponto em que as glândulas sexuais começam a ter espasmos. Isto permite que os fluidos sexuais escorram lenta e gradualm ente e sejam absorvidos. O segredo aqui é concentrarse na identificação com a divindade e com o estado de consciência meditativa (a qual se aperfeiçoa à medida que você desperta a força Kundalini c entra cm níveis mais profundos de reconhecimento dos estados de consciência simbolizados pelas divindades) enquanto deixa que a mulher assum a o papel sexual ativo. A energia vital expandida em atividades sexuais é também de interesse do Tantra. A quantidade de energia que pode ser ativada por meios sexuais pode ser mais bem dem onstrada lembrando o tempo em que você ia para a cam a tão exausto que parecia desmoronar. Então, se ficava sexualm ente estim ulado, a situação de cansaço de repente podia ser alterada. À medida que a energia sexual com eçava a fluir pelo seu corpo, você recebia novo vigor com uma vitalidade que o sustentava durante todo o período do ato sexual. O iogue tântrico considera essa força vital muito preciosa. Há um a ligação muito forte entre a mente c as energias vitais estimuladas pelo sexo. Por exemplo, um dia, enquanto meditava, tive uma experiência muito detalhada da relação objetiva entre ambas. Minha mente com eçou a vaguear até deter-se na contem plação da beleza física de uma mulher que eu havia conhecido recentem ente. Uma coisa levou a outra e, subitam ente, percebi que estava sentado em meditação com uma ereção. M inha mente havia dirigido minhas energias vitais ao órgão sexual. De maneira semelhante, as forças vitais geralmente dispersas em atividades sexuais podem ser dirigidas para circular em funções mais elevadas da psique. Esse uso das forças sexuais tem também um efeito muito saudável sobre o corpo, circulando vitalidade por todo o organismo biopsíquico de modo sem elhante ao da Acupuntura ou da Terapia da Polaridade. Entrando pelo nervo mediano no Centro do Umbigo, a partir da região sexual, a força vital move-se pelo meio de outros centros nervosos.

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Tomando-sc a energia de Fogo da energia da Sabedoria, ela sobe e peneira por iodos os canais nervosos, desfazendo iodos os "nós" psíquicos... (Seis Doutrinas de Naropa)-6 Os ritos sexuais tâniricos usam muitos símbolos e procedimentos para criar um sentido do sagrado. O rito sexual também é realizado num tempo propício. Um desses períodos é a Lua nova. A conjunção do Sol e da Lua nos céus é considerada um tempo apropriado para reverenciar a harmonização das forças solar e lunar no corpo-mente. Para pessoas com bastante experiência em meditação, pode não haver necessidade de um ritual preestabelecido. A sensibilidade mútua c um reconhecimento intuitivo do desdobram ento orgânico das energias sutis podem servir como guias. Para outros, um banho ritual, unção com óleos aromáticos, luz de vela ou fogo, m úsica para meditação e uma serie combinada de visualizações e técnicas respiratórias podem ajudar a criar a atm osfera para a união. Para dar início a essa prática, sugiro uma técnica sexual simples: Comece com a mulher deitada em decúbito dorsal e o homem deitado sobre seu lado esquerdo, à direita da mulher. Depois de harmonizar suas respirações, a mulher levanta as pernas, trazendo os joelhos ao peito. Isto permite que o homem a penetre suavemente. A seguir ela baixa as pernas e as entrelaça no companheiro. Enquanto continuam a respirar juntos, sinta o calor da união sexual subindo pela espinha a cada inspiração. Com cada expiração, sinta o néctar branco como leite no centro da cabeça, dissolvido pelo fogo sexual, percorrendo todos os chakras. Permaneça um tempo sentindo a felicidade criada por este néctar enquanto ele satura e se derrama nas correntes nervosas sutis de cada chakra.

(6) Nik Douglas c Penny Slinger, Sexual Secrets (Rochester, VT: Des Books, 1979), p. 300. Você pode encontrar este material em outros lugares, visto que as Seis doutrinas de Naropa e um texto antigo, mas os leitores podem achar esta referência útil.

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A mulher desejará saber com o contrair e fortalecer os músculos da vagina. Contraindo esses m úsculos em torno do pênis bem dentro dela, um grande prazer é produzido. As contrações rítmicas dela devem ser suficientes para que o homem mantenha a ereção, e assim qualquer outro movimento é mínimo. Ela pode começar por isolar esses músculos enquanto urina; os músculos que lhe permitem interromper o fluxo da urina são os mesmos que ela precisará desenvolver. Introduzindo um dedo, ou outro objeto adequado na vagina e constringindo-o, ela pode aprender a articular e fortalecer esses músculos. O homem também pode contrair os músculos que fazem com que seu pênis intumesça e mover-se ligeiramente dentro da yoni dela. Cada parceiro pode contrair durante suas respectivas inalações, imaginando que estão sorvendo o fogo sexual do lugar de união espinha acima. Depois de aproxim adam ente meia hora desse enlace tântrico, é possível sentir ondas de energia que podem provocar contrações espontâneas e sensações agradáveis por todo o corpo. Relaxe c desfruteas; abra seu corpo à bem-aventurança.

Meditação do Consorte A meditação a seguir não é tradicional, mas considero-a muito útil para estabelecer o contato e a integração entre anima e animus. Ela também é útil para desenvolver a atividade passiva necessária aos níveis de meditação mais avançados. Comece por colocar-se num estado de serenidade interior. A seguir, deixe que a imagem de um a pessoa do sexo oposto apareça na sua visão mental. Não perm ita que a mente racional interfira enquanto você focaliza sua atenção indivisa em cada detalhe, movimento e sentimento associado às várias atividades e transformações desse companheiro interior. As experiências que você tiver durante esta meditação podem incluir o espectro todo das expressões possíveis da parte contra-sexual do seu se!f. Simplesmente estando presente com o testemunha, você será introduzido em muitas facetas do seu companheiro interior. Entregue-se

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completamente ao deus ou deusa sob qualquer forma que essa divindade se lhe manifeste. No fim da meditação, se os episódios não contêm uma experiência sexual, você pode escolher uma das formas cm que o deus ou deusa lhe aparece e imaginar em detalhes uma experiência sexual tântrica. Mais uma vez, deixe-se guiar pelo seu consorte. Os sentimentos de inteireza e amor gerados nessa meditação podem ser continuados na vida diária imaginando que seu consorte o acom panha ao longo do dia e agindo como se isso fosse real. Ao ir para a cama à noite, pode imaginar que ele está ao seu lado. Adormeça sentindo o am or que você compartilha. Pela manhã, comece o dia saudando o seu consorte, etc. Quando aprender algumas outras m editações deste livro, você poderá imaginar que seu consorte se transforma nas várias divindades nelas usadas. Depois dessa meditação inicial, você poderá desejar escolher épocas específicas para realizar a meditação do consorte. O período de Lua nova ou cheia, ou mesmo as quatro fases da Lua são uma boa sugestão. É também uma boa idéia m anter um diário das experiências mais profundas que você tiver na meditação.

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Capítulo Quarto O REINO DO RESPLENDOR No Tantra hindu, o icrcciro chakra sc relaciona com o clemcnlo fogo, c seu nome sânscrilo, M anipura, significa “brilhante como uma jóia” . Ele sc com põe de dez pétalas, da “cor de nuvens carregadas”. No interior do lótus está a m andala Ágni, um triângulo invertido vermelho que simboli/.a o elem ento fogo. Dentro dele há um carneiro, represen­ tando as qualidades desagradáveis da mente racional impelida pelo desejo. (Veja fig. 12, p. 94.) O terceiro chakra é o segundo andar do templo sagrado budista. Porque os budistas combinam o primeiro c o segundo chakras, o terceiro chakra é relacionado ao elem ento água. A água é sim bolizada por um círculo branco. Lama Govinda, cm Fundamentos do m isticismo libeiano, esclarece que as qualidades assimiladoras do elem ento água eslão re­ lacionadas com os aspectos assimiladorcs do terceiro chakra através da idéia de que ele transforma elem entos grosseiros cm fatores psíquicos c absorve conteúdos inconscientes c forças im ateriais.1 O Buda primordial Ratnasambhava, personificação da função psíquica do julgam ento do sentim ento, está sentado no trono no terceiro chakra. (Veja lig. 13, p. 96.) Embora ele normalmente seja associado ao

(1) Lama Govinda, Foundations o f Tibetan Mysticism (York Bcach, ME Samuel Weiser, 1974; c Londrcs: Rider & Co., 1974), p. 179.

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elemento terra e à cor amarela, sua Sabedoria de Igualdade pode ü-ansformar nossos julgamentos de sentim ento centrado no ego numa identidade de sentimento universal baseada na unidade interior de todas as coisas. Daí que, através de uma experiência emocional profunda de altruísmo, podemos desenvolver uma percepção analítica e uma sabedoria discriminadora sem sacrificar nossa ligação com a Grande Unidade. As paixões obscuras de Ratnasam bhava são o orgulho e o egoísmo.

Fig. 12. O terceiro chakra, Manipura. No interior do lótus de dez pétalas encontramos a mandala Agni, um triângulo vermelho invertido. O mantra-sementè RAM invoca o deus do fogo sacrificial. Agni. O veículo de Ágni é um carneiro.

Localizado no plexo solar, o terceiro chakra provê a energia vital ao pancreas e ao fígado, que governam a assim ilação e o metabolismo da energia proveniente do alimento. Além do fogo da digestão, o terceiro chakra é também animado pelo fogo do desejo e pelo poder das emoções. Por isso, durante o processo de limpeza e abertura do terceiro

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chakra, problemas digestivos podem coincidir com períodos dramáticos de instabilidade emocional, à medida que emoções reprimidas são liberadas. Deslizes do poder e do ego são produtos de um terceiro chakra estimulado, mas defensivo e sem desenvolvimento. Um sentido sadio de auto-estima e poder pessoal assinalam um terceiro chakra satisfato­ riamente desperto. O terceiro chakra também está associado ao estágio mitológico do herói e ao desenvolvimento da consciência do ego. Como um centro de consciência, o ego tom a-se uma força integradora suficientem ente forte para reunir os elementos difusos dos mundos interior e exterior e digerilos num sentido de identidade. À medida que o ego se estabiliza, sua capacidade de assimilar os conteúdos da mente inconsciente aumenta, e maior quantidade de energia psíquica tom a-se-lhe disponível. O ego transforma essa energia em poder para controlar seu mundo individual, fazer escolhas conscientes e resistir às dem andas do inconsciente. Assim, o ego obtém uma certa vontade sobre a vida instintiva do corpo e da emoção e uma capacidade para manipular o am biente exterior. Como um centro de poder, o terceiro chakra regula o fluxo de energias vitais através do corpo. Quando este chakra está bloqueado, de forma crônica ou temporária, devido a uma luta pelo poder, sentimo-nos fisicamente letárgicos e possivelm ente também deprim idos e irritadiços. Tomando-nos conscientes das energias psíquicas em luta no terceiro chakra, superando nosso m edo do conflito e assum indo o comando, podemos recobrar nosso poder. Esses sintomas se dissipam e um sentido claro de fortalecimento tem probabilidade de prevalecer à medida que o livre fluxo de energia psíquica pelo terceiro chakra ativa os arquétipos mitológicos do herói. A abertura do terceiro chakra também pode resultar no desenvolvim ento de certas habilidades ligadas à PES* e de clarividência. Podemos abandonar o corpo físico e ter experiência consciente no mundo astral, e os sonhos também são lembrados mais

(*) PES = Percepção extra-sensorial (N.T.).

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Igualdade S T ! ° tCrCC‘r° Chakra C^ o n i f i c a a Sabedoria da Se r , ° amard° * rUgC 0 clcmcnt° ^rra. Sua mio direita estendese àfreme a frcmc, comapalmavoltadapara noM udr, “

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facilmente. Todavia, as informações psíquicas recebidas por esses modos de percepção podem ser confundidas com desejos subjetivos do interior do corpo astral, e assim elas nem sem pre constituem fontes confiáveis de orientação. No terceiro chakra, encontram os o desejo ou impulso de irromper das profundezas das influências inconscientes e coletivas numa tentativa pioneira de descobrir nossa própria identidade. Esse aspecto individualista do terceiro chakra pode m ostrar-se uma fonte de insegurança quando, de fato, nos separa dos dem ais e dos padrões familiares antigos. Outro perigo com este uso da vontade feito ao modo do deus M arte é que ele naturalm ente está m atizado com o desejo centrado em si mesmo e com portando-se com o um “cabeça dura” (como um carneiro). A expressão pessoal pode ser usada positivam ente para canalizar emoções e servir como veículo de autodescoberta, ou pode levar a uma megalomania quando tentamos validar nosso sentido de self. O poder que recebem os de outros na forma de atenção ou de adulação é utilizado para aum entar o amor-próprio. As relações sexuais, quando baseadas nesse aspecto do terceiro chakra, podem ser vistas como uma representação e um a cilada do ego. Características como a arrogância, a pomposidade e as cenas m elodramáticas também estão associadas a ele. Por outro lado, o encanto, o calor, a generosidade e uma boa disposição podem irradiar a partir dos aspectos mais magnânimos do terceiro chakra. Se não trouxermos as m anifestações relacionadas com as funções psicológicas do terceiro chakra à consciência e as resolvermos, nossas relações com os outros serão vivenciadas na base da submissão versus dominação. Vemos os demais não com o com panheiros, mas como inferiores ou superiores. Alfred Adler, que cunhou o term o complexo de inferioridade, fundou um a escola de psicologia baseada nesse aspecto do terceiro chakra. A dler observou muitos dos seus clientes preocupados com m anifestações de auto-estim a, adequação, com petição e dominação; ele também percebeu que o ato sexual pode ser realizado nesses termos.

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Adler acertou no alvo dos sentimentos infantis de inadequação e inferioridade como fonte da nossa necessidade de desenvolver atitudes compensadoras de superioridade. Isto é verdade, sem dúvida, mas na minha experiência, apesar da idade, essas tendências parecem correr à solta nesse reino do resplendor.

Sombra e Persona Sombra é um termo junguiano para os aspectos da psique reprimidos pelo ego. A o crescer, escondemos dos outros muitos aspectos de nós mesmos para sermos amados e aceitos. A sombra oculta permanece imatura, mas tem um desejo inato de reconhecim ento e de aprovação consciente. Outro aspecto da sombra pode estar relacionado com vidas passadas, nas quais representamos algumas das nossas características socialm ente negativas ou inaceitáveis. Infelizmente a sombra, como a pessoa repugnante dos filmes de terror que foi trancafiada num sótão por toda a vida, com freqüência nos amedronta; preferiríamos m antê-la trancada ou esquecê-la. Por ser inconsciente, a som bra é mais comumente tida com o uma projeção sobre outra pessoa, em geral uma pessoa do mesmo sexo. As características contra as quais reagimos numa pessoa que não nos agrada são bons reflexos da parte desprezada de nós mesmos. Uma segunda saída para a sombra está nos sonhos cm que somos perseguidos ou atacados por animais, ou por um integrante hostil ou repulsivo do mesmo sexo. Uma terceira manifestação é reagir em ocionalmente num grau inapropriado a uma dada situação. É inútil em preender tentativas de encobrir a som bra com comportamentos do ego socialmente aceitáveis. Para fazer as pazes com a sombra, é necessário parar de julgá-la e de reprimi-la. O ego final­ mente terá necessidade de aceitar todos os ressentimentos, carências agressões, inseguranças, vontade de poder e desejos infantis contidos na sombra. Se não o fizer, grande quantidade de energia psíquica per­ manecerá presa em subpersonalidades conflitantes que dão corpo a esses

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conteúdos reprimidos. Quanto mais eles forem abafados, tanto mais as suboersonalidades terão liberdade para devastar a vida do self consciente. Em casos extrem os, a negação persistente do lado negauvo da som bra resulta no que clinicam ente se denom ina complexo PMC°S o m en te quando recebemos o choque da visão de nós mesmos como realm ente somos, e não de como desejam os ou pretendemos ser, é que a jornada para a nossa individualidade essencial pode começar. Encarar a som bra requer humildade. A confiança é também um fator importante. Se acreditam os que a sombra não destruirá nossa vida caso a libertem os, mais facilmente podemos integrá-la em vez de continuar a projetá-la nos outros. A som bra também pode conter qualidades positivas que ficaram sem desenvolvim ento porque a auto-imagem é m odesta ou tímida em demasia. Pode não ter havido suporte ou estrutura de referência no nosso ambiente inicial para o desenvolvim ento de algumas dessas qualidades potenciais. . Uma sim ples observação da m itologia revelará algum as variações da função potencial da sombra. No mito, a sombra m uitas vezes é representada como um animal ou com panheiro muito peculiar que salva o herói de um fim prem aturo visando seus instintos. Em outros casos, vemos o herói combatendo um inimigo brutal cuja m aldade proposital enigmaticamente provê justo o que o herói precisa. Esses temas míticos ilustram com o a sombra realmente contém elem entos ausentes que são valiosos ao ego. Enquanto a sombra constitui o aspecto de nós mesmos condenado ao inconsciente, a persona é a máscara que o ego usa para se apresentar ao mundo exterior. Nos sonhos, por exem plo, a persona pode ser representada por um disfarce ou traje. Com o crianças, criamos ou adotamos imagens que nos proporcionaram aceitação cultural e parental. A persona reflete, portanto, a identificação do ego com padrões parentais e sociais. Pode-se também considerar a persona com o as ciladas usadas pelo ego para justificar a nossa existência. Ao crescer, m uitos de nós

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experimentamos algum tipo de privação emocional e por isso não desenvolvemos um sentido forte de auto-estima. Como adultos, man­ temos escondida essa insegurança básica. Os mecanismos de defesa usados para lidar tanto com a dor emocional como com uma existência injustificada são algumas das mãos desesperadas que modelam as máscaras que usamos. Infelizmente, essa postura defensiva do ego nos enrijece, e passamos a agir de acordo com certos padrões que nem sempre conduzem à satisfação de nossas necessidades. Como crianças, muitos de nós logo aprendem os que era inútil pe­ dir diretamente o que queríamos; por isso, tomamos a decisão de parar de expressar nossos senü mentos e necessidades, recorremos à manifestação da nossa raiva ou nos tom am os manipuladores. Como adultos, em conseqüência, temos uma história de necessidades e de desejos emocionais não atendidos que nos acompanha no rela­ cionamento com os outros. Sem nos comunicarmos com clareza, com freqüência projetamos um grande número de expectativas e exigên­ cias em nossas relações, apenas para sentir sempre outra vez a dor e confusão do passado. Consumidos pela raiva e pela dor quando nossas expectativas não são atendidas, contamos com mecanismos de defesa psicológicos para nos conter. Freqüentemente, fazemos exi­ gências como se esperássemos não ser atendidos, o que nos inibe ainda mais ou faz com que sejamos por demais exigentes. Estes, naturalmente, não são os modos mais positivos ou eficientes de conseguir o resultado desejado. À medida que distanciamos nosso senso de identidade do poder de obter dos outros o que queremos, podemos aprender que temos para conosco mesmos a responsabilidade de pelo menos reconhecer, se não expressar, os sentimentos e desejos. É mais importante nos expressarmos honesta e diretamente do que influenciar e manipular os outros. Pela expressão, dissipamos a carga emocional e podemos aprender a dirigila da maneira mais positiva. Compartilhando o que é sentido, em vez de fazer exigências, descobrimos que é muito mais fácil dar vazão às próprias reações e defesas e não sermos dominados por elas. Agindo como pais benevolentes e sensatos de nossos desejos e emoções,

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podemos amorosamente dar-lhes ouvidos e orientá-los com firmeza, em vez de enfrentá-los e reprimi-los. Outra ramificação da dinâm ica entre sombra e persona são os juízos que fazemos dos outros. Num esforço de defender nosso sentido de auto-estim a — nossas brilhantes e resplandecentes máscaras — encontramos freqüentemente defeitos nos outros antes que eles possam ver nossa sombra. Todos temos necessidade de nos sentirmos bem conosco mesmos. Se não nos sentimos aceitos e reconhecidos, nos tomamos amargos e cínicos. Sentimos ciúme dos outros e podemos passar a vida toda preocupados em apontar todas as maneiras pelas quais os outros não merecem receber o que sentim os que nos falta. Do mesmo modo que as convenções sociais podem prender-nos numa ordem rígida, parte da nossa auto-imagem estrita (persona) po­ de dominar nossa criatividade e individualidade. Em Análise Tran­ sacional, este aspecto é chamado de “pai punidor”, porque é a parte de nós que se tornou exatamente como a nossa mãe e o nosso pai. Essa parte está sem pre dizendo o que devemos e o que não devemos fazer, e punindo-nos quando não obedecemos. Por meio de uma revolução psicológica, a criança interior pode ser libertada para explorar e se desenvolver. A sombra tem uma relação contrária à energia investida na persona. Uma persona muito desenvolvida arrasta a sombra para regiões mais profundas do inconsciente, onde ela se tom a mais perigosa. Crimes horríveis com etidos cm nome do Estado ou da Igreja são exemplos de uma persona muito desenvolvida. No outro lado do espectro, uma persona pouco desenvolvida faz com que seja difícil viver no mundo social. Automaticamente, nos alienamos se formos incapazes de aceitar qualquer dos papéis ou regras da sociedade. Em qualquer dos extremos, somos inibidos na realização e manifestação da nossa individualidade. Quando expressadas conscientemente, sombra e persona são instrumentos essenciais para a autodescoberta e funcionamento no mundo. Uma tarefa importante do ego-self nessa etapa de desen­ volvimento consiste em integrar as qualidades da sombra e da persona, sem se identificar com elas.

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Sexo, Amor e Poder Visto que a auto-estima e o sentido de poder pessoal estão diretamente ligados ao sentir-se amado e aceito, a maioria das pessoas depende de outros para se sentir valorizada. Quando a necessidade é grande, comprometemo-nos com nós mesmos a obter am or e aceitação Embora isso pareça funcionar por algum tempo, é quase certo que a longo prazo trará ressentimentos. Quanto m aior a necessidade e quanto maior o poder que damos à pessoa que supre a necessidade, mais subservientes e impotentes nos sentimos. A necessidade de auto-estima e de um sentido de adequação precisa ser atendida. Ao contrário de jogos de poder, isto pode significar cavar fundo na doutrinação parental e cultural. Por exemplo, poderíamos começar voltando nossos olhos para a programação inicial referente à identidade sexual. Superar o profundo sentimento de culpa e de vergonha talvez experimentado no conflito entre o nosso desejo sexual emergente e nossos tabus sexuais e sociais particulares é obviamente importante. Foi o sexo algo obsceno? Muitos de nós crescemos com a atitude de que, por alguma razão misteriosa, nossa identidade sexual era algo de que nos envergonhávamos e que Unhamos de esconder. De modo ainda mais restrito, pode haver laços de caráter sexual ou emocional insidiosos, geralmente com o genitor do sexo oposto. Pode ocorrer que os pais nunca nos tenham permitido expressar nossa identidade sexual. Um a mãe pode inconscientemente não desejar afastar-se de seu filho e de modo disfarçado impedir que outra mulher o tire dela. Um pai pode cobiçar sua filha, reprimindo seus fortes sentimentos de amor sexual pelo apego cium ento a ela e inibindo o seu amadurecimento. Libertando-nos dessas limitações, podem os ficar livres para ex­ pressar toda a energia da sexualidade de um modo positivo. É gostoso celebrar a vitalidade da vida através de relações sexuais. A m ar com dignidade propicia uma certa auto-estima que nos possibilita sentir e expressar o amor ainda mais plenamente. Outro fator importante a considerar é a educação do ego rela-

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tivamcnie à sua relação com a força impessoal do am or. O poder do ego c uma espada de dois gumes; precisamos manejá-la com habilidade. Por um lado, estam os em débito com a vida por esculpir uma identidade individual e consciente a partir da m atéria-prim a do inconsciente coletivo. Ironicam ente, de posse de um sentido de self bem definido, somos obrigados a sacrificá-lo e também a sacrificar suas exigências de poder para entrar numa ordem superior de existência consciente. Não vivemos apenas pela espada; se não a puserm os de lado no tempo oportuno, ela se voltará contra nós. Amor e poder são antagônicos; a abundância de um diminui o outro. O poder do ego, seu desejo de controlar e de possuir, impede a abertura e a entrega que o am or exige. O am or é universal divino e, no entanto, o ego quer possuí-lo, quer tê-lo quando, como e com quem assim o desejar. Mas quando o ego brande sua espada para conquistar o amor, ele sempre se frustra. A menos que sacrifique sua vontade de poder, o ego não pode penetrar no m istério que é o amor e continuar sua jornada aos reinos mais sublim es da consciência.

As Emoções e o Mundo Astral As respostas do sentim ento que estudam os no segundo chakra são expressas com o emoções. As cargas em ocionais se manifestam a partir do corpo astral, através dos chakras, dos principais gânglios nervosos e das glândulas endócrinas, afetando as secreções horm onais, a circulação, a pressão sangüínea, a respiração, o açúcar no sangue e a excitação neuromuscular. Numa pessoa prim itiva, as em oções se expressam instantaneamente. Com a evolução do sistem a nervoso, o reflexo emocional insüntivo é retardado e pode ser m udado m ediante uma intervenção consciente. Isso significa que impomos nossa vontade sobre os impulsos inconscientes do corpo e im pom os algum afastamento e controle sobre os efeitos irracionais das emoções. Os ensinam entos metafísicos freqüentemente fazem referência ao mundo das em oções com o plano astral. A visão tântrica do universo também nos m ostra um núm ero de dim ensões existentes em diferentes

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freqüências. C om o as várias freqüências no especiro eletrom agnético podem existir sim ultaneam ente no m esm o lugar sem interferir um a na outra, assim pode acontecer com os m undos físico e astral. É raro estarm os diretam ente conscientes da região astral, em b o ra seja esse o lugar para onde vam os em nossos sonhos e sua energia se m anifeste em nossa vida com o em oções. Em seu livro Journeys Out o f thc Body, baseado em

12 anos de projeção astral, R obert M onroe descreve

lucidam ente o plano astral com o um a realidade form ada pelos desejos e m edos que norm alm ente são reprim idos na nossa vida física. Por exem plo, ele relata com o seus m edos eram m ais fortes qu e seus desejos sexuais, que em si m esm os eram “obstáculos trem en d o s”. E xplica tam bém com o, até que fosse capaz de disciplinar essas em oções grosseiras, estava fadado a vagar pelas áreas m ais desag rad áv eis do m undo astral, habitado por “personalidades fragm entadas” e por outros “seres anim ados” .2 E xperiências fora do corpo, quer no estado de sonho ou cm outros estados alterados de co nsciência, m ostram -nos q u e as em oções e desejos têm vida própria no corpo astral, acim a e além da conexão com o organism o físico. E m bora todos tenham os um corpo astral, o nível do seu d esen ­ volvim ento e a nossa habilidade em utilizá-lo difere m uito. Há re la ­ tivam ente poucas pessoas que podem usar de m odo consciente o corpo astral com o um veículo independente, separado do físico. A pesar d e às vezes estarm os conscientes no plano astral du ran te o sonho, a m aioria das pessoas não m antém essa consciência ao despertar. O grau de co n sciência astral é desconhecido para a m ente racional o rientada pelo físico. P orque as crianças ainda não aprenderam a fazer um a separação clara entre o m undo interior e o exterior, elas têm m aio r probabilidade de lem brar suas experiências astrais. Há, todavia, ocasiões em que podem os acordar com a sensação peculiar de ter tido um son h o

(2) Robert A. Monroe, Journeys Out o f the Body (Nova York: Doublc 1971), pp. 77-8.

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extraordinariam ente vívido. A esses dam os o nome de sonhos lúcidos, e são assinalados pela estranha sensação de que estamos “acordados”. Daremos maior aprofundamento ao sonho lúcido no capítulo 6. Astral significa “com o estrela”. As qualidades luminosas do corpo emocional é que inspiraram o termo astral. Os m atizes iridescentes percebidos pela clarividência na aura de uma pessoa, através da qual o amor e a sabedoria espirituais irradiam, são verdadeiram ente uma beleza para contemplar. A superfície do corpo astral assem elha-se aos vapores do gelo seco; a névoa lum inosa parece espiralar, subir e novamente retom ar. Emoções específicas parecem mover-se em porções do corpo astral que se relacionam com áreas apropriadas do corpo e com os chakras. Emoções primitivas relativas à sobrevivência do corpo tendem a gravitar junto à base da aura, abaixo do primeiro chakra. Sensações sexuais, inveja e insegurança emocional consolidam -se próximo do segundo chakra. A raiva e a arrogância se juntam perto do terceiro chakra; amor ou pesar, em torno do quarto chakra, e assim por diante. Emoções repentinas ou fortes podem sobrepor-se temporariamente ao corpo astral. Depois de passarem , a freqüência vibratória normal e os matizes de cor retomam. Gravitando cm tom o de seus padrões característicos particulares, o corpo astral altera-se e transform a-se na variedade de estados em ocionais que experimentamos. Ele é também grandemente afetado por hábitos físicos e por atitudes mentais. Viver em condições de sujeira, subm eter o corpo físico ao álcool, às drogas, a certos tipos de música, ao fumo, à poluição e a grande quantidade de alim entação animal irão afetar o corpo astral adversam ente devido às contrapartes astrais desses elementos. O corpo astral é particularm ente suscetível a impressões oriundas da mente. Formas na m atéria astral podem ser clarividentemente vistas a em ergir e dissolver-se em resposta a correntes de pensamentos. Pensamentos fortes podem criar formas astrais que parecem adquirir vida própria. Essas formas podem projetar-se no m undo astral, povoando o am biente adjacente e afetando outras pessoas. Pensamentos negativos podem criar monstros astrais com capacidade de devorar a alegria e o

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am or em nossa vida. Confrontá-los e familiarizar-se com eles pode ser uma tarefa hercúlea. Além da integração da sombra, aprendendo a expressar os sentimentos e com unicando claramente nossos desejos, várias coisas podem ser feitas para m udar c aumentar o nível de vibração no corpo astral. O corpo físico pode ser purificado e exorcizado. Alimentar-se com produtos saudáveis e não-tóxicos desenvolve as partes cor­ respondentes do corpo astral. Exercícios e esportes são expressões eficazes para a energia emocional represada. O entusiasm o e a alegria exercem um efeito purificador e animador sobre o corpo astral. Surfar, esquiar, velejar, andar a cavalo e uma animada partida de tênis ou futebol produzem uma sensação de vitalidade e excitação que representa uma alternativa aos padrões emocionais negativos e oportunidade para desenvolver um suprimento de experiências emocionais positivas. Tocar um instrumento musical ou cantar proporciona tanto uma vazão catártica como modos de expressão criativa para as emoções. Esforços criativos, como dançar, costurar, ou fazer um trabalho artístico, motivam a expressão emocional e produzem sentimentos de satisfação e de realização. Ouvir m úsica inspiradora e Passear em meio à grandiosidade da natureza também purificam o corpo astral e dão-lhe novo ânimo. Uma consciência aguda dos processos de pensamento habituais oferece igualmente uma oportunidade para melhorar as forças mentais que influenciam o corpo astral. De uma perspectiva tântrica, limitar-se a representar emoções é, com freqüência, do mesmo modo que reprimi-las, uma maneira de tentar livrar-se delas. A transmutação das em oções em sua energia de sabedoria correspondente acontece, primeiro, pela aceitação das emoções com o elas são, não querendo mudá-las ou tentando livrar-se delas. Para fazer isso, precisam os aprender a deixar de julgar as emoções como boas ou más e vivenciá-las tais como são. Desassociando-as do ponto de referência do ego, podemos tomar consciência da sua energia grosseira. Em Cutting Through Spiritual Materialism, Chogyam Trungpa com para a mudança das em oções à vitória sobre os demônios alcançada pelo grande iogue M ilarepa. Quando estava meditando cm sua caverna,

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M ilarepa tcvc de enfrentar uma m ultidão de dem ônios. Por mais que fizesse para livrar-se deles, eles continuaram a persegui-lo ate que ele parou de tratá-los como seres maus. Ao aceitar sua presença, eles se transformaram cm dakinis, espíritos femininos que representam as energias geradoras de vida.3

As Leis do Carma Todos os pensamentos, emoções e ações geram padrões de energia no corpo-mcnte. Esses padrões são com o sementes. Eles produzirão bons ou maus frutos, dependendo da natureza do ímpeto original. Os ensinam entos orientais sobre o carm a (palavra sânscrita que significa “ação”) sugerem que todas as condições da vida presente foram determ inadas por ações passadas. De modo sem elhante, as circuns­ tâncias futuras são criadas pelas ações presentes. Num retiro de m editação, o professor Gocnka, de Vipassana, narrou esta antiga história budista para demonstrar com o o carma funciona: Certo dia, um rico comerciante aproximou-se de Buda c ofereceu-lhe uma grande soma em dinheiro para celebrar um ritual pelo seu falecido pai. Os sacerdotes brahmin celebravam costumeiramentc esse ritual por uma pessoa morta para livrar sua alma de lodo o seu carma negativo. Sabendo que isso era um empreendimento fútil, Buda estava relutante em atender a esse pedido. Percebeu todavia que o homem era sincero c respondeu que, se o comerciante estivesse disposto a ajudar, ele realizaria a cerimônia. Buda pediu ao homem que colocasse algumas pedras brancas e um pouco de ghee (manteiga clarificada) num vaso de ccramica e o depositasse no rio. A seguir, Buda instruiu-o para quebrar o vaso com uma vara. O comerciante seguiu essas instruções e retomou no dia

(3) Chogyam Trungpa, Cutting Through Spiritual Materialism (Bost Shambhala, 1973), p. 241. [Além do materialismo espiritual. Editora Cultrix, São Paulo, 1986.]

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seguinte. Buda perguntou-lhe o que aconteceu quando quebrou o vaso. O comerciante relatou que as pedras foram ao fundo e a manteiga ficou flutuando na superfície. Buda então salientou que as leis do carma são exatamente como as leis naturais que fizeram com que as pedras afundassem e a manteiga flutuasse. Esclareceu ao comerciante que o peso do carma de seu pai fará com que certas situações se apresentem na sua vida seguinte a despeito de qualquer cerimônia que ele, Buda, pudesse realizar.

O conceito de carm a é inseparável do sentido de identidade individual. A criação do carma depende de um self que pratica ações. Como a com binação de todas as experiências, emoções e pensamentos passados que estruturaram de maneira única nossa psique, o carm a é a mesma m atéria e a cola de nossa identidade individual. Nós não temos carma; nós somos o carma! O carm a é a força que impele a alma para encarnar vida após vida. E o fio de continuidade que entrelaça a complexa textura de padrões gerada e regerada pelas nossas ações e reações, de uma existência após outra. Através da história, com freqüência amam os e odiamos as mesmas pessoas. Estam os literalmente revivendo antigos romances e inimizades. Se não com as mesmas pessoas, pelo menos com pessoas parecidas que atraímos devido às nossas predisposições cármicas. Carma não é destino. Em cada vida temos oportunidades de desligar-nos de nossos apegos e aversões, de curar as feridas e animosidades e de mudar os padrões causais da psique. Embora colhamos o que está semeado, temos a liberdade de semear novas e melhores sementes, que produzirão frutos diferentes. Diversamente da tradição cristã, que nos ensina a orar a um Ser Supremo para salvar-nos de nossos pecados, no Tantra a redenção está em nossas próprias mãos. Na verdade, não há conceito de pecado no Budismo; há somente insensatez baseada na ignorância. A sabedoria traz intuição com relação aos efeitos de nossas ações; daí que somos menos propensos a praticar maus atos. Se os cometemos, estam os condenando a nós próprios. Não é o Ser Supremo que nos está punindo, ou uma força

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maligna exterior que nos está desviando do caminho; somos nós mesmos. Esta é uma perspectiva mais saudável, que nos dá forças. Os budistas sustentam que há dez maneiras de criar carma negativo: três associadas ao corpo, quatro à palavra c três à mente. As ações corporais incluem: m atar ou infligir dano físico, roubar ou apossar-se daquilo que não foi dado livremente e má conduta sexual (comportam ento sexual im próprio para qualquer das partes). As da palavra são: mentir, caluniar, fazer uso de linguagem obscena e fazer intrigas. As ações negativas da mente são: ter má vontade com relação aos outros e a nós mesmos, ter inveja das posses ou características dos outros e manter uma visão incorreta com respeito a si mesmo e à natureza da realidade. Em síntese, o que quer que prejudique outra pessoa ou nós próprios produz carm a negativo. Por outro lado, o carm a bom é criado por ações que de fato trazem benefício a nós e aos outros. Os frutos dessas ações são chamados “m éritos”. Como o carm a negativo, os efeitos do m érito são duradouros. Por isso, os budistas incentivam a obtenção de m éritos para compensar os resultados do carm a negativo. Os ensinamentos hindus, por sua vez, enfatizam o não-apego aos frutos de nossas ações. Praticar ações m eritórias apenas para evitar a am eaça do mau carm a pode reforçar os aspectos manipuladores e autocentrados do ego. A m édia das pessoas está presa numa grossa teia de carm a de vidas passadas. Trabalhar esses padrões cármicos necessita de muitas existências. Uma atitude de aceitação ajuda enorm em ente. Com a crença de que tudo o que nos acontece é manifestação direta de ações passadas, a energia não é desperdiçada na luta ou no ressentimento contra outros (ou contra a vida em si) por aquilo que criamos. Esta aceitação ajudanos a concentrar-nos na realização de coisas m ais favoráveis para a nossa saúde e bem-estar. As funções de causa e efeito do carm a não se conformam necessariam ente a idéias de tempo linear ou cronológico. Os frutos do carm a só amadurecem em condições apropriadas. À medida que progredimos no trabalho espiritual (orgulhosos talvez de nosso mérito acumulado), podemos dar de frente com situações cárm icas de muitos

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períodos diferentes da vida de nossa alma. A duração da fruição desses carmas baseia-se em muitas variáveis: grupos de certas almas encarnando juntas, certas condições sociais e carm as coletivos, o nível de nossa compreensão espiritual, e assim por diante. Portanto, não importa quão distantes estejamos no caminho espiritual; precisamos estar sempre prontos a aceitar e a neutralizar carmas antigos. Os budistas falam de três venenos da mente: a ignorância (a perspectiva egocentrada), a raiva (incluindo todas as formas de aversão) e a luxúria (todas as formas de desejo). Esses três venenos são considerados a causa-raiz de todo o carm a negativo. Não ceder aos desejos e às ações prejudiciais que criam carm a negativo é a melhor maneira de preveni-lo, mas isso nem sempre é possível ou seguro. Reprimir esses venenos sem extirpar suas fontes localizadas nas profundezas da psique pode causar distúrbios graves no corpo-mente. Por exemplo, John Blofeld, em Tantric M ysticism o fT ib e t, relata como alguns monges, que prefeririam morrer a quebrar seus votos de castidade, desenvolveram desordens nervosas significativas/ Nossa própria Igreja Cristã também tem sua cota de clero neurótico que passou a beber ou a praticar atos de perversão. É mais prudente ceder aos desejos perm anecendo atento ao ato, à motivação subjacente que o provoca e às suas conseqüências. Usando de intuição, o propósito subjacente ao com portam ento freqüentemente pode ser integrado, dissipando a compulsão. Quando deixamos de acreditar em nós mesmos como unidades de consciência separadas, descobrim os que realmente não há um alguém que faz, não há uma vontade individual e, assim, não há criação de carma. É para essa finalidade que os ensinamentos sobre o carma são dirigidos, em última análise, na tradição tântrica.

(4) John Blofeld, Tantric Mysticism o f Tibet (Nova York: E.P. Dutton, 1970), p. 80.

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Meditação Intuitiva A concentração pode ser considerada um sim ples ato de descansar a atenção num objeto ao mesmo tempo em que se põe de lado tudo o mais. Na m editação profunda, este pôr de lado eventualm ente se estende à respiração e ao corpo, causando uma dim inuição geral do seu metabolismo. Na verdade, a diminuição espontânea do ritmo respiratório é uma boa medida da profundidade da meditação. Essa tranqüilidade da mente e das funções psicológicas promove estados de transe de­ nominados jhanas. Esses estados constituem um passo importante, mas não a meta da m editação. De fato, eles às vezes constituem obstáculo a um progresso m aior porque, embora possamos bloquear a atividade mental, nossa atenção pode tomar-se embotada. Em uma palestra em Nova York, Kalu Rinpoche admitiu que, “na pior das hipóteses, a m e­ ditação tranquilizadora é com o um animal em hibernação”. Idealmente, a meditação tranqüilizadora é como uma “rodovia pavim entada em que trafegamos para chegar a níveis mais avançados de meditação tântrica . O passo seguinte na meditação budista é um aumento da clareza c sensibilidade da consciência. A prática m editativa que nos ajuda a fazer isto 6 cham ada de Vipassana. A palavra tibetana para Vipassana, !hag lhong, significa “visão penetrante”. Quando a atenção penetra na mente inconsciente para observar a série de eventos menlais que criam os fenômenos que inquestionavelmente assum im os como sendo o “eu”, demos um grande passo para nos libertarmos dos seus liames. No início precisamos praticar a Vipassana aplicando uma con­ centração total no cortejo de eventos que ocorrem no teatro do corpomente. Com distanciam ento e atenção focalizada, podemos afinal apren­ der a captar os pensam entos exatamente quando começam a emergir, observar suas transformações e associações e acom panhá-los quando passam para a esteira do pensamento seguinte. Com essa acuidade, a insidiosa corrente de eventos mentais que leva ao processo de identificação pode ser seguida e interrompida. Comece refugiando-se e entrando num profundo estado de medi­ tação tranqüila. A seguir, transfira sua atenção da respiração para as sen-

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saçõcs do corpo c para os pensam entos que flutuam pela mente. Se per­ ceber que sua atenção se desviou para alguma dessas sensações ou pen­ samentos, traga-a delicadam ente de volta para uma observação relaxada. Quando o foco da m editação intuitiva é o corpo, é útil dirigir sua atenção através dele numa seqüência ordenada. Você pode começar, por exem plo, colocando a atenção nas áreas superficiais de sua cabeça e a seguir dirigi-la ao pescoço, ombros, braços, parte superior das costas, parte inferior das costas, nádegas, parte posterior externa das coxas, barriga das pernas e pés. Fazendo o retom o, com ece pelas canelas, parte anterior interna das coxas, órgãos sexuais, baixo-ventre, abdômen, peito, pescoço, etc. Depois de alguns dias ou pouco mais, você pode começar a dirigir a sua atenção através do corpo em planos diversos — da parte anterior para a posterior, de cima para baixo — estando atento a todas as áreas e órgãos internos. Simplesm ente preste atenção às várias sensações com o calor e frio, tensão, dor, comichão, etc. Concentrar assim a atenção no corpo pode provocar várias sensações e lembranças associadas na consciência a partes específicas do corpo. M antenha-se calmo, continue a respirar e observe esses fenômenos à medida que a sua energia bloqueada é liberada. Sim plesm ente, deixe acontecer. Num ambiente tradicional, esse tipo de m editação é praticado intercaladam ente com curtas caminhadas e descansos desde o am anhecer até tarde da noite, por períodos de dez dias, noventa dias, ou mesmo por mais tempo. Reservar todo um final de semana para um retiro pode ser uma m aneira fácil de dar início a esta prática, se períodos mais longos não forem possíveis. Você também pode usar a aura e os chakras como objetos de meditação intuitiva. Com ece imaginando o contorno geral da aura ao seu redor. Ela se acum ula principalm ente na frente, mais para um lado, contraída atrás de você? Qual o seu sentimento quando você a observa pela primeira vez? A seguir, dirija sua atenção m etodicamente através da aura desde o topo até a base. Preste atenção às cores, às imagens, às sensações. Você sente a energia de mais alguém na sua aura? O que essa pessoa estará fazendo aí?

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Agora, colocando sua atenção cm cada um dos sctc chakras, observe se ele está tenso ou relaxado. Que outras sensações ou impressões você experimenta? Um outro enfoque e observar os pensam entos que surgem na sua mente. Enquanto observa este cortejo interior de criação mental, preste atenção se os pensam entos são principalmente visuais ou auditivos. Você apenas vê figuras em sua mente ou fala consigo mesmo? Você tem ambas, imagens e vozes? Se assim for, você tem imagens antes e a seguir fala consigo sobre elas, ou fala antes e depois tem imagens? Uma vez que isto esteja claro, você pode im aginar que sua atenção e o espaço cm que as imagens ou sons estão acontecendo. Por fim, você desejará chegar à intuição a respeito da natureza ilusória da identidade do self: quem está meditando?5 Como a sensação do “eu” surge? Como o eu se distingue dos estímulos internos e externos? A sensação do eu deve ser idêntica aos mecanismos sensoriais ou distinta deles. Ao observar suas várias funções sensoriais, procure ver se uma delas (ou todas elas com binadas) e o eu. Sc você conclui que essa função c distinta dos mecanismos, então, onde ela está?

(5) Para maiores informações sobre a meditação intuitiva, ver Amadco So Leris, Tranquilily and Insight (Boston: Shambhala, 1986). 113

Capítulo Quinto O REINO DO SOM SAGRADO Anahata, o nome sânscrito dado ao quarto ehakra, significa li­ teralmente “não batido”. O term o refere-se à vibração sutil que é a energia criadora do Vazio. Ele é entoado como a sílaba sagrada OM , e diz-se que é ouvido interiorm ente em meditação quando a Kundalini subiu ao ehakra cardíaco. Em geral, o quarto ehakra é também m en­ cionado como ehakra cardíaco, definindo sua posição no corpo e su­ gerindo sua associação com a fonte de inspiração espiritual e o amor altruísta. O quarto ehakra tem 12 pétalas vermelhas brilhantes. Dentro delas encontramos dois triângulos de cor cinza interligados. Juntos, eles compõem a m andala Vayu, que representa a relação harmoniosa entre as forças masculina e fem inina do cosmos. No interior da mandala Vayu, que também sim boliza o elem ento ar, há um antílope. Conhecido pela sua velocidade, o antílope é um bom veículo para o antigo deus do vento, Vayu. (Veja fig. 14, p. 115.) No Tantra budista, o elem ento fogo é associado com o centro do coração. Seu símbolo é um triângulo vermelho apontando para cima. Lama G ovinda sustenta que este fogo não é físico, mas psíquico. Ele é o fogo da devoção religiosa e da inspiração. Ele afirm a ainda que o centro do coração é a sede da m ente intuitiva e dos sentimentos transmutados (am or e com paixão divinos), e que é um foco primário na

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meditação porque está onde o universal é realizado na experiência hum ana.1 O Buda primordial Aksobhya c o senhor do chakra cardíaco. Ele encarna a sabedoria radiante. (Veja fig. 15, p. 117.) Sua Sabedoria Radiante dissipa a ilusão da separatividade das coisas e reflete sua Vacuidade inata. Suas paixões sombrias são o ódio e a aversão. O fogo alquím ico da devoção c compaixão religiosas transformará afinal nosso sentido de identidade pessoal. Como a fênix, o ego será

Fig. 14. O quarto chakra, Anahaia. O chakra cardíaco tem 12 pétalas vermelhas brilhantes. Dentro da mandala do ar, dois triângulos interligados, encontramos o mantra-semente YAM, que invoca o deus do vento, Vayu. O veículo de Vayu c um antílope.

(1) Lama Govinda, Foundations o f Tibetan Mysticism (York Beach, M Samuel Weiser, 1974; e Londres: Rider & Co., 1974), p. 179.

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consum ido e transform ado. Isto pode ser traum ático, resultando m uitas vezes num a grave crise de identidade. T odavia, a abertura do chakra cardíaco eventualm ente g era um a form a de identidade m ais abrangente, cm que a individualidade e a universalidade com eçam a se fundir. Q uando o chakra cardíaco desperta, o aum ento do seu nível vibracional altera o corpo astral, infundindo-lhe a m ais sublim e energia dos céus interiores. A brir o coração tam bém dá início a um a relação íntim a com o m istério da vida. C ada passo leva-nos a um a união m ais profunda com o desconhecido, o potencial infinito esco n d id o em cada m om ento, e a beleza, perfeição e m em ória distante de reinos sublim es. Em Journeys Out o f The B ody, R obert M onroe descreve ex p e­ riências de êxtase no plano astral que dem onstram alguns desses fe­ nôm enos relacionados com o chakra cardíaco. D epois de se deslocar por reinos de em oção grosseira do plano astral, ele visitou regiões mais belas. R o bert M onroe relata ter sido inundado por um “ A m biente P er­ feito ” em que experim entou um estado de pura paz c em oção intensa. Ao reto m ar ao seu se lf racional norm al, sentiu um a profunda nostalgia daquele lugar a que ele sabia pertencer e onde d everia ter ficado para sem pre.2 T alvez vocc reconheça este sublim e estado em ocional. V ocê pode tê-lo ex p erim entado ao ficar sozinho num a m ontanha, cercado pela m ajestade do céu e pela paisagem distante. Ou pode ter sido num a floresta p rofunda, silenciosa — você se viu no interior de um a catedral de árvores altivas, enquanto raios de luz iridescentes se projetavam com o deuses através da riqueza das som bras. O u talvez isso tenha ocorrido enquanto

fazia am or —

tudo

parecia

tão perfeito,

tão

m aravilhoso, tão extraordinário. Q uando o centro do coração se abre com pletam ente, sente-se um desejo ardente de que todos os seres desfrutem do am or e da bem -

(2) Robert A. Monroe, Journeys Out of the Body (Nova York: Doubleday, 1971), pp. 77-8.

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Fig. 15. Aksobhya é o senhor do chakra cardíaco e personifica a Sabedoria Radiante. Sua cor é o branco c ele rege o elemento água. Como o Buda Shakyamuni, Aksobhya expõe o Mudrá do Toque-da-Terra, o mudrá-testemunha. Es­ tampa 4 do Foundations o f Tibelan Mysticism, de Lama Govinda (publicado cm 1974 por Samuel Wciscr, York Beach, ME, c Ridcr & Co., Londres), reproduzido com permissão dos editores.

avcnturança disponíveis neste nível de consciência. Na tradição budista, este impulso é expresso como o voto de a ;,idar todos os seres sencicntes a atingir a iluminação. A pessoa que cumpre este voto tom a-se um Bodhisattva. Todas as formas de amor rom ântico são motivadas por essa busca de união com a fonte de amor. É uma grande desventura que essa busca seja direcionada para fora e que a fonte seja confundida como sendo uma pessoa que está fora de nós. O resultado traumático dessas projeções frustradas é uma aguda sensibilidade à ansiedade abrasadora que experim entam os por estarm os divorciados do verdadeiro Sclf e do seu reino de am or universal. À medida que o chakra cardíaco com eça a desabrochar, com freqüência ele traz um m estre que serve com o encarnação deste nível de consciência. Ele também pode abrir-nos à com unicação consciente com a hierarquia espiritual de seres que guiam as alm as neste planeta. Podemos, em contrapartida, atuar no coração de um grupo que trabalha para guiar a evolução terrestre. Atualmente, as energias do chakra cardíaco estão se tom ando mais ativas à medida que evoluím os coletivam ente para além dos estágios de consciência relacionados com os três chakras inferiores. Um problema nesta transição, tão predom inante no movimento Nova Era, é a tentativa de viver no coração sem lidar com as repressões e os impulsos do ego nos chakras inferiores. Se, por exem plo, estamos zangados, arrogantes, desesperados, ou em ocionalm ente inseguros, o am or não flui livremente. Uma decisão forçada para ser amável não é a m esma coisa que o jorrar espontâneo do am or sentido em profundidade. A confusão surge também entre o amor rom ântico e o amor altruísta. O am or rom ântico é associado à projeção da anima e do animus e ao desejo de uma relação perfeita. O rom ance é um ideal. Porque ele quer que a outra pessoa satisfaça uma com pulsão inoportuna para sentir-se completo ou seguro, o amor rom ântico não é estranho a ousadias manipuladoras. O am or altruísta, por outro lado, é uma em patia e compaixão que nos capacita a agir de um a maneira profundam ente zelosa. Ele é uma

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aceitação incondicional da vida e dos outros. Há uma profundidade de com preensão e de sabedoria nesse amor, que só advém de um profundo sofrimento e de uma intensa experiência de vida. Não se trata de projeção ou de uma form a de controle, m as de uma abertura e entrega muito sincera ao que existe. Podem os experim entar desapontamentos, mas nunca seremos abatidos se permanecermos abertos ao nosso potencial por existir neste estado de amor. Quando a energia psíquica flui através do centro do coração, ela tem a capacidade de transform ar e neutralizar a energia negativa. Nós podemos não só neutralizar a nossa própria energia, m as podemos aprender a harm onizar a energia de outras pessoas. Essa habilidade de transformar energia no chakra cardíaco é usada na cura espiritual e psíquica. Deve-se tom ar cuidado, entretanto, para não usar este bálsamo de cura para encobrir, ou deixar de tratar, as regiões mais obscuras de nós mesmos. Poderíam os pensar que a abertura do chakra do coração proporciona apenas paz e amor. Sem levar em conta o confronto com nossas dores e com o medo reprim ido de sermos vulneráveis, muitas, dificuldades surgem quando o coração se tom a receptivo. O centro do coração invoca forças intensas da alma e dos reinos espirituais interiores. As atividades, ou a m era presença, de um a pessoa com um centro do coração jovem pode estim ular intensas reações defensivas cm outras, à medida que a vibração do am or penetra nas barreiras e estimula à ressonância o am or que perm aneceu enterrado sob incalculável dor e sofrimento. Em Esoteric Healing, Alice Bailey assinala que as incertezas que acompanham a abertura do chakra cardíaco são algumas das mais típicas e problemáticas experim entadas no cam inho espiritual. Estas incluem reações de outras pessoas que variam desde a devoção primitiva até o ódio extrem ado, causando m uita confusão e perturbação para o aspirante.3

(3) Alice Bailey, Esoteric Healing (Nova York: Lucis Publishing C 1977), pp. 123-24.

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Com o passar do tempo, aprendemos a não nos identificar com essas reações e a afastar nossos apegos c expectativas pessoais desse amor universal. Com compaixão e paciência, permitimos que outros aceitem ou rejeitem as forças de amor no chakra cardíaco.

O Matrimônio Alquímico A conquista de um dragão ou monstro pelo herói para libertar a donzela c um tema comum na mitologia. Alguns heróis familiares são: São Jorge, que extermina um dragão; Tescu, que mata o minotauro para resgatar Ariadne do labirinto de Creta; e Perseu, que corta a cabeça da górgona M edusa e derrota um dragão para libertar Andrômeda. O romance subseqüente entre o herói e a donzela em desgraça simboliza a integração dos aspectos fecundos, intuitivos e mesmo místicos do inconsciente relacionados com o chakra cardíaco. Em História da origem da consciência, Neumann mostra como, na mitologia, a fêmea resgatada não está mais ligada à todo-poderosa e devoradora imagem da Grande Mãe. Liberada de sua dominação, a donzela é uma mulher vulnerável com a qual o herói (símbolo do ego) pode unir-se.4 O herói freqüentemente tem de rebelar-se contra os valores convencionais (patriarcais) para realizar seus feitos heróicos. Esses rnitos obviamente registram uma perspectiva masculina. Do ponto de vista da mulher, a integração bem-sucedida do seu lado masculino (animus) dota-a das forças heróicas necessárias para sua descida ao inconsciente. Com essa força, ela enfrenta os aspectos opressivos da Grande Mãe ou do Grande Pai (dependendo das várias versões míticas), para liberar sua feminilidade essencial. Em qualquer dos casos, o conseqüente casamento do herói com a donzela representa um estágio psicológico importante, uma individuação das forças coletivas e a

(4) Erich Neumann, The Origins and History o f Consciousness, Bollin Scries, Vol. XLI1 (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1970), pp. 195-200.

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Fig. 16. ConiunctioSive. Diagrama do matrimônio místico da Lua e do Sol adapta­ do do texto alquímico Rosarium Philosophorus.

integração da anim a e do anim us de modo que ambos os indivíduos possam crescer. As imagens arquctípicas dessa união atuam dinam icam ente por trás do am or romântico. Infelizmente, é raro com preenderm os o significado dessas imagens quando vamos à procura do cavaleiro de armadura reluzente ou da princesa encantada. Para com preender melhor este ponto, voltemos brevem ente à tradição alquímica que floresceu na Europa medieval. Este obscuro sistema, que apresenta uma forte semelhança com o Tantra, representava a transform ação da psique através de uma serie de rituais, alegorias e contem plações. O estágio principal dessa trans­ formação era simbolizado pelo M atrimônio Alquímico. O termo usado para este matrimônio m ístico, coniunctio, era usado para significar tanto o mistério das com binações químicas como o casamento do místico com Deus. A alquim ia era, basicam ente, uma forma de im aginação ativa, a arte de com unicar-se com conteúdos inconscientes através de sua projeção na realidade objetiva. Os textos e diagramas, usados pelos alquimistas na busca de sua transformação metafórica dos vários metais e substâncias, mostram um rei e uma rainha (Sol e Lua) em várias atividades conduzentes à sua coniunctio. Encontramos uma boa descrição dessas atividades no texto alquímico Rosarium Philosophorus. Num desses diagram as vemos o Rei e a Rainha num abraço sexual enquanto o espírito das profundezas se levanta para absorvê-los. (Veja fig. 16, à p. 121.) Nesse m om ento de enlace aparece o maior dos prodígios; na bem-aventurança de sua união nupcial, eles se fundem um no outro e se dissolvem. T om am -se um, como se fossem um só corpo. O resultado dessa união é um filho mais refulgente e esplêndido que seus pais — ele excede em brilho o Sol e a Lua.5 O texto segue lem brando-nos que o Sol e a Lua são dois vapores que surgem da m atéria-prima como o fogo aum enta dentro do

(5) Para maiores informações, ver Carl Jung, Psychology o f theTransfere (Princeton, NJ: Princeton University Press, 1966), pp. 85-6.

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alambique. Por isso, não nos defrontam os aqui com um a mera relação sexual, mas sim com uma união de ordem superior. Com o aprendem os no segundo chakra, a tendência a essa união mística dá vida a encontros rom ânticos e dá um novo ímpeto à projeção da anim a e do animus. Isso freqüentem ente leva à dor e à confusão porque a síntese não ocorre entre duas pesssoas. Cada pessoa tem a oportunidade, na maioria das vezes m alcom preendida e, portanto, perdida, de reconhecer sua totalidade inata e o estado de am or inerente a ela, que foi projetado no amado. Apesar de os relacionamentos humanos servirem de veículos para essa experiência subjetiva, o M atrimônio Alquímico é um evento intrapsíquico. No Tantra tibetano, o termo Bodhicitta é usado para descrever os efeitos dessa união interior. Vejamos como os tibetanos trabalham com vistas ao seu desenvolvimento.

Geração da Grande Compaixão Em sânscrito, Bodhi significa consciência ilum inada ou desperta; citta tem dupla conotação, referindo-se tanto à mente com o ao coração. Bodhicitta, portanto, significa M ente e Coração Ilum inados que se manifestam quando a Grande Com paixão e experim entada. No coração do Tantra budista, há práticas e ensinam entos baseados na intenção de m anifestar Bodhicitta. A Grande Compaixão existe, em form a de sem ente, em todos nós. Os ensinam entos tibetanos acentuam a im portância d o comprome­ timento no início da germinação desse m inúsculo grão de compaixão. Votos de renúncia a todas as formas de atividade, físicas e psíquicas, que causam dano deliberado a outras pessoas e a nós m esmos são um dos modos de expressar esse compromisso. Todos os pensamentos de fracasso ou negatividade, por exem plo, são vistos com o imorais porque implicam a negação da nossa própria natureza búdica. Q uando nossa pequena semente de com paixão desabrocha, faz-se necessária um a grande paciência para sofrer nossas muitas imperfeições sem perder a coragem e a intenção. Levará tempo para que a semente

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da compaixão produza o fruto divino do Bodhicitta. Enquanto isso, dúvida, desânimo, letargia e sentimentos semelhantes devem ser vistos como oportunidades para exercitar a compaixão e o comprometimento. Um zelo e uma fé firmes c inexauríveis no poder da compaixão são os maiores aliados neste em preendim ento. O Tantra tibetano sugere então que meditemos sobre o nosso sofrimento. Somos encorajados a olhar honestamente para a nossa vida e sentir a dor da doença, das tragédias rom ânticas, dos traumas emocionais, dos medos, do sentido da falta de significado, das perdas materiais e assim por diante. Tudo está em transição, movendo-se através de ciclos interm ináveis de nascimento e morte. Experimentamos a dor como resultado de nossas tentativas de manter uma situação permanente ou estável na esteira da natureza fluida do mundo. Apegando-nos à noção da consciência do ego e lutando compulsivamente para satisfazer-lhe os desejos, andamos aos trambolhos através de numerosas existências, ignorantes da nossa herança espiritual, temendo a dor dilaccrante da mudança c da perda e defendendo-nos dela. Uma vez que, através das defesas e do orgulho do nosso ego, olhamos para a imanência c profundidade de nossas próprias tribulações, podemos verdadeiramente abrir o coração para o sofrimento de nossos pais, amigos, conhecidos e inim igos — e para a carga de sofrimento em todo o mundo. Visto de uma direção, sentim os pesar à medida que conceitos, vínculos emocionais, posses e identidades são arrancados. Se deixarmos fluir e olharmos ao redor, entretanto, veremos que o fluxo da vida está sempre apresentando novos e misteriosos horizontes. A beleza e renovação da criação emergem continuamente. Veja se você consegue se lembrar da sua infância por um momento. Talvez, como eu, você visse o mundo em considerável confusão. Eu não podia com preender por que todos eram tão infelizes. Lembro-me de jurar ardentem ente que eu seria feliz quando crescesse. Dentro de cada um de nós repousa a habilidade para conhecer e experim entar a felicidade. É nesta parte de nós mesmos que a Grande Bem-aventurança de B odhicitta jaz enterrada sob sofrimentos em o­

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cionais inenarráveis e sob desordens mentais. Para encorajar este crescim ento, os lamas tibetanos sugerem a meditação com o se tivés­ semos atingido o estado de perfeição de um Buda. Uma atitude importante para se tornar alguém que está desperto (um Buda) é a im parcialidade — isto é, ver familiares e amigos na mesma luz que inimigòs e estranhos. Todos são seres que sofrem e anseiam por paz e felicidade. Através da visualização, podem os começar a desenvolver a im parcialidade vendo todos os seres encontrando seu caminho para a paz interior. Enquanto cm meditação sobre a libertação de todos os seres das fadigas do mundo, podemos dedicar nossa vida à remoção do peso da ignorância e do sofrimento. Este não é um esforço superficial ou idealista, mas um profundo desejo do coração resultante de um lampejo obtido na meditação. É uma tarefa corajosa, que requer grande integridade. Essa parte ativa da compaixão é a mais im portante, ainda que dependa de passos anteriores. Alim entando outras pessoas com am or divino e verdade, somos autom aticam ente transportados para além das limitações da realidade pessoal auto-orientada. Seres como Cristo ou Buda são janelas abertas para as profundezas espirituais de todos nós. O serviço desses seres demonstra forças espirituais para aqueles ainda atados ao mundo egóico da ilusão e do sofrimento. O esplendor que brilha através deles despertanos dos sonhos terrenos, assim com o cada ato de com paixão sincera em nossa vida clareia o m undo à nossa volta. Havia uma vez um monge tão feio e deformado que, quando passava mendigando de porta em porta, as pessoas o mandavam embora. Às vezes ele se sentia rejeitado, tinha pensamentos am argos e retiravase para a floresta. Buda, com sua onisciência, observou o apuro desse monge e manifestou-se num corpo que era mais grotesco que o dele. Quando o m onge viu aquela criatura infeliz saindo da floresta, ficou tomado de compaixão. Essa com paixão foi tão profunda que o monge alcançou a iluminação. O utra atitude im portante para a geração da Grande Com paixão é tom ar-se mais atento a todas as formas de desejo e aos padrões mentais

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e emocionais negativos. No últim o capítulo, com eçamos a observar o estado comum de caos dentro da mente. Imagine quanta energia psí­ quica precisamos para alim entar todos esses mecanismos mentais e emocionais. A seguir, imagine a energia vital adicional necessária para ativar o corpo físico para responder a todos esses estímulos interiores, e você terá um a idéia de quanta energia nós literalm ente jogam os fora. Ao mesmo tempo, essas forças caprichosas continuamente nos empurram para o labirinto do carma. Uma vez liberadas essas energias psíquicas dos complexos, defesas e compulsões fortes, as práticas tântricas podem dirigi-las espinha acima até o chakra da coroa. Essa reversão da energia psíquica abre o lótus das mil pétalas, inundando o corpo com o “néctar da bem -aventurança criadora”. No Tantra hindu, esse néctar é associado m iticamente ao sêmen transcendental liberado através da união extática da Kundalini Shakti com seu am ante divino, Shiva. Poderia haver algum a base científica para este néctar da bemaventurança criadora? Em seu livro, Biology, H elena Curtis relata que os cientistas especularam em 1972 que o corpo é capaz de produzir narcóticos. Em 1975, ficou provado que, sob certas circunstâncias, o corpo produz narcóticos endógenos (mais tarde cham ados endorfinas). Quatro dessas endorfinas foram analisadas quimicamente; duas delas são encontradas no tecido cerebral e funcionam para inibir impulsos nervosos. As outras duas são liberadas, como hormônios, da glândula pituitária (associada com o chakra da coroa). Um desses hormônios pituitários é 48 vezes mais forte que a morfina quando diretam ente injetado no cérebro. Esses narcóticos, ficou provado, são gerados pela meditação, pela corrida de longa distância, por tratamentos de acupuntura analgésica e pelo sentimento de amor.6 A Grande Bem -aventurança (Bodhicitta) é sim bolizada no Tantra tibetano pela divindade V ajrasattva em abraço sexual meditativo com

(6) Helena Curtis, Biology (Nova York: Worth Publishers, 1968), p. 162.

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sua consorte, Vajra Dignidade. Vajra é o termo sânscrito usado para a qualidade diam antina indestrutível e prístina da Consciência do Ser. Espírito é, provavelmente, o conceito ocidental mais aproximado. Para perceber essa condição prístina, nossa mente deve estar aberta e, por isso, livre de todas as elaborações mentais. O potencial para este estado de claridade é cham ado sattva, traduzido literalmente por essência. Vajrasattva e sua consorte são a personificação da pureza de consciência que traz o bem -aventurado despertar do Ser na sua natureza essencial prístina e indestrutível. Sua união gera a jnana ambrosia, ou sabedoria visualizada com o não-substância leitosa, a qual jorra de seus corações e genitais para prem iar-nos com a Grande Bem-aventurança quando os invocamos em meditação. A analogia de sua união sexual expressa o sentido de fusão que experimentamos quando transcendemos os parâmetros do objeto/sujeito para dissolver-nos na Grande Bemaventurança. Uma vez atingido, esse nível de consciência preenche todas as formas de ligação com o am or e a compaixão divinos.

Ioga da Purificação e da Bem-aventurança Os maiores obstáculos com que nos defrontamos na aquisição da mais plena realização da com paixão são as ações físicas autodestrutivas e a aura de nossas forças mentais e emocionais negativas. Na tradição tântrica tibetana, há uma prática de meditação especialm ente destinada a purificar esses estados obscuros. E la é chamada de Ioga de Vajrasattva e envolve os quatro poderes seguintes, elaborados por John Blofeld em The Tam ric M ysticism o f Tibet:

1. O Poder de “Ajuda” — é um poder protetor que resulta d aspiração a entrar no caminho que conduz ao desenvolvimento de Bodhicitta (compaixão). Reconhecendo o nível de consciência personificado na forma do Bodhisattva Vajrasattva e refugiando-nos neste arquétipo, somos "abençoados” e fortalecidos pela energia psíquica nele corpori ficada.

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2. O Poder de Superar o Carma Malfazejo — é o poder da integridade resultante de um genuíno c profundo remorso pelas más ações e padrões negativos passados. 3. O Poder de Refrear o Mau Comportamento — é o poder da intenção de abster-se das más ações e dos padrões negativos no futuro através da profunda percepção de um carma infeliz que eles produzem e de como obscurecem, como nuvens, a habilidade de banhar-nos na tepidez solar de Bodhicitta. 4. O Poder do Antídoto — é o poder do perdão c da compaixão que resulta das práticas de meditação Vajrasattva.7 A meditação Vajrasattva é realizada como um exercício preliminar pelos neófitos tântricos. Mais tarde ela é usada como um meio de purificação e iniciação no nível de consciência Vajrasattva. Como um rito prelim inar, o Mantra de Cem Sílabas de Vajrasattva é repetido muitas vezes (totalizando ao final umas cem mil repetições num período de dois anos), e Vajrasattva é visualizado sozinho. Nas práticas mais avançadas, Vajrasattva 6 visualizado com sua consorte. Há muitas variações da meditação Vajrasattva nas várias seitas do Budismo tibetano; a meditação que segue é composta de alguns dos elementos preliminares e avançados dessas várias escolas. Antes de com eçar a meditação V ajrasattva, os iogues tibetanos analisam suas más ações pessoais e qualidades desfavoráveis. Assim, depois de realizar a meditação Refúgio, devem os com eçar a contemplar nossas muitas maneiras de agir sem a com paixão de um Buda. Depois disso, podemos afirmar nosso desejo de praticar o amor por nós mesmos e a honestidade necessários para purificar essas manchas. Confiando-nos sinceramente à meta de gerar Bodhicilta (com paixão), nós então meditamos como segue:

(7) John Blofeld, The Tantric Mysticism o f Tibet (Nova York: Du 1970), pp. 160-61. 128

Meditação Vajrasattva Na infinita expansão do claro céu azul, um lótus branco de oito pétalas aparece acima da nossa cabeça no topo da aura. Sobre o lótus, Vajrasattva senta-se abraçado pela Deusa Vajra Dignidade. Seus corpos são brancos e transparentes. Sendo insubstanciais com o o luar, emitem um resplendor imensurável. Am bas as divindades estão adornadas com pedras preciosas (a natureza da m ente de Buda) e suas vestes são de seda preciosa. Ele segura um sino vajra de prata em sua mão esquerda, e na direita um cetro vajra dourado. (Juntos, o sino e o cetro representam os princípios fem inino e masculino associados à sabedoria e à compaixão.) Seus braços estão cruzados por trás de sua consorte. A mão esquerda da deusa segura um crânio (imperm anência), e em sua direita há uma faca vajra (mente discriminadora). No centro de seus chakras cardíacos, que brilham como a lua cheia, vibra a sílaba azul-elétrico HUM. Ela espalha sua luz incandescente por todo o universo. Esta luz penetra os corações de todos os seres iluminados, que em contrapartida focalizam sua divina com­ paixão de volta cm Vajrasattva e sua consorte. (Veja fig. 17, p. 130.) Agora, reze com suas próprias palavras a V ajrasattva e Vajra Dignidade para ser purificado. A seguir, visualize um raio de luar líquido jorrando do m antra-sem ente HUM em seus corações e do local de sua união sexual. Ele cai com o um a cachoeira pela haste do lótus e para dentro do topo de sua aura. Q uando o topo de sua aura começa a preencher-se com seu néctar gerador de bem -aventurança, imagine que ele força toda a ncgatividade e escuridão a escoar-se para fora de sua aura através de um orifício em sua base (associado com o primeiro chakra). De m aneira sem elhante à que você moveu a atenção através da aura durante a meditação intuitiva, conscientize-se do modo cómo o néctar gerador de bem-aventurança substitui as várias áreas densas e escuras da sua aura. Quanto mais você praticar esta meditação, tanto mais cuidadoso você deverá ser para assegurar-se de que essas áreas obscurecidas estão sendo realm ente liberadas e substituídas por Bodhicitta.

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Fig. 17. Vajrasattva e sua consorte Vajra Dignidade. Vajrasattva é às vezes considerado um reflexo do Dhyani Buda Aksobya; em algumas seitas, é também venerado como a expressão ativa de Adibuddha Vajradhara. No Ioga das Purifi­ cações, Vajrasattva e sua consorte produzem ajnana ambrosia, o néctar gerador de bem-aventurança, que purifica a mente do meditante de modo que a essência do Vazio possa ser percebida. Pintura contemporânea de Àge Delbanco, reproduzida com a permissão do artista.

A seguir, visualize o néctar branco entrando no chakra da coroa no topo de sua cabeça. Sinta-o preenchendo o seu corpo do mesmo modo que preencheu a sua aura. De novo, quanto mais você praticar, mais preciso se tom ará na visualização do néctar purificando o corpo. Num determ inado ponto, você vai querer passar algum tempo limpando cada órgão do seu corpo. Quando você se tom ar consciente das tensões, lembranças e atitudes alojadas em cada órgão e as liberar, veja e sinta cada um sendo saturado por esse néctar gerador de bem-aventurança. Talvez você deseje passar pelo menos uma sessão focalizando cada órgão no contexto da m editação normal. Para com pletar esta parte da m editação, imagine o néctar fluindo para baixo na sua espinha e se derram ando de cada chakra. Focalize cada chakra em seqüência, com eçando pelo da coroa. Enquanto repete o mantra com pleto sinta cada chakra relaxando e sendo purificado pela corrente do néctar. A medida que o néctar se derrama por todo o seu corpo e aura, todas as suas indefinições e doenças são expelidas através dos seus poros, dos orifícios inferiores e da base da sua aura para um buraco no chão. M uitas substâncias escuras e deterioradas emergem e se escoam para a terra onde o Senhor da M orte espera com a boca escancarada. Tendo este satisfeito o seu apetite, você está aliviado de suas substâncias nocivas. (V eja figura 18, p. 132.) A gora você está brilhando como um cristal transparente, cheio da bem -aventurança inexaurível do néctar leitoso de Bodhicitta. Com a força da sua devoção, Vajrasattva se dissolve dentro de você e sua consorte está sentada no seu colo. (Como mulher, você pode inverter estes papéis. Pode também visualizar seu consorte como uma encarnação da sua anim a ou animus. Constatei que isso aumenta consideravelm ente a intensidade em ocional desta prática.) OM VAJRASATTVA HUNG — agora com ece a recitar este mantra. Seu corpo é como um arco-íris, manifesto em bora vazio. Como o reflexo num espelho, você é visível mas essencialm ente vazio de substância. Do seu chakra cardíaco irradia-se um a luz brilhante. No

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Fig. 18. Yama e Yami, o Senhor dos Mortos e sua irmã, uma versão budista do deus da morte hindu. Enquanto o deus hindu cavalga um búfalo, aversão tibetana mostra uma cabeça de búfalo. A ilustração é um detalhe de um thanka Avalokiteshvara, do século XIX, da Escola Menri do Tibete Central. Da coleção thanka de Sergei Diakoff, aqui reproduzida com permissão.

ccniro da radiação do seu coração vibra a sílaba azul-elétrico HUM. Dela, raios brilhantes de luz irradiam para todos os reinos imensuráveis purificando todos os seres. Continue por bastante tempo contem plando seus pais, amigos c inimigos banhados no néctar gerador de bem-aventurança que flui do seu coração. Veja cada uma dessas pessoas sendo preenchida com Bodhicitta e por ele transformada. Finalmente, você pode visualizar o planeta inteiro sendo purificado e transformado. Agora você tem uma alternativa viável para as reações emocionais negativas e para os padrões de pensam ento que norm alm ente percorrem o seu corpo-m ente. Com a atenção adquirida na m editação intuitiva e a compaixão que está cultivando na prática Vajrasattva, você pode começar a transform ar essas forças negativas. Antes de com pletar a meditação Vajrasattva, preveja os diversos eventos que você imagina que acontecerão no decorrer do dia. Escolha algum objeto ou experiência que possa lembrar-lhe seu compromisso de ser um Bodhisattva. Visualize-se nesses vários am bientes, agindo como se você fosse Vajrasattva ou Vajra Dignidade. Quando terminar a sessão, imagine seu corpo dissolvendo-se no HUM. O HUM encolhe-se até desaparecer no Vazio, onde você perma­ nece em equilíbrio m editativo, livre de todos os pensam entos e concei­ tos, por tanto tempo quanto puder. Term inada a m editação, ofereça os méritos da sua meditação em benefício de todos os seres sencientes. Q uando tiver um sonho em que todo tipo de coisas impuras estão sendo expelidas de você, o seu Ioga de Purificação está produzindo um bom efeito.8

(8) Para informações mais detalhadas da prática Vajrasattva, você pode l Tantric Practice in Nying-Mapa, de Khets un Sangpo Rinbochay (Ithaca, NY: Snow Lion, 1982), ou The Tantric Mysticism o f Tibet, de John Blofeld (NY: Dutton, 1970). 133

Capítulo Sexto A GRANDE PURIFICAÇÃO O nome sânscrito para o quinto chakra é Visudha que significa limpo ou purificado. Seu elemento é o éter — a substância espacial a partir da qual os outros quatro elementos se cristalizam. No interior de seu lótus de 16 pétalas encontramos a mandala Akasa, um triângulo invertido ou yoni, o qual representa os poderes femininos da criação. Dentro da m andala Akasa, há outro elefante branco com uma das suas sete trombas elevada no ar, talvez anunciando nosso triunfo sobre as forças instintivas dos chakras inferiores. (Veja fig. 19, p. 135.) No Tantra Budista, o chakra da garganta está associado ao elemento ar e é simbolizado por uma lua crescente verde. O ar é aqui relacionado com o movimento e o vento e, segundo Lam a Govinda, ele não apenas representa as qualidades vitais da respiração, mas a origem de todos os sons e vibrações espirituais. Dessas vibrações provêm os atributos específicos de todas as coisas e, por conseqüência, todas as formas de conhecimento discrim inativo.1 Amitabha, o Buda Promordial, cuja energia de sabedoria é Sabedoria Discriminadora, por essa razão senta-se no trono do quinto chakra. Sua paixão obscurccedora é a ganância. (Veja fig. 20, p. 136.)

(1) Lama Govinda, Foundations o f Tibetan Mysticism (York Beach, Samuel Weiser, 1974; e Londres: Rider & Co., 1974), p. 183.

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Fig. 19. O quinto chakraé Visudha. No interior do lótus de 16 pétalas vermelhas esfumaçadas encontramos a mandala Akasa, um círculo branco representando o elemento éter. Ela está no interior do Trikona, um triângulo invertido simbolizando o poder feminino da criação. O mantra-semente para o elemento éter é HAM. Localizado na garganta, o quinto chakra funciona como um ccntro de com unicação. Como um painel telefônico, o chakra laríngco é o mediador entre as cham adas de entrada e saída do sistema nervoso. Quando a com unicação é maior do que o circuito neurológico pode suportar, ou quando há conflito entre estímulos mentais e emocionais, o circuito fica sobrecarregado e o corpo responde com tensão no pescoço e nos ombros. Q uando um a constelação de dor e confusão se formou ao redor do corpo emocional ou físico durante um tempo considerável, e como o corpo mental e o cérebro aprenderam a desligar ou a reprimir estímulos que ativam os padrões de mem ória associados aos traumas originais, a mente pode tom ar-se com pletam ente divorciada da realidade física

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Fig. 20. Amitabha é o senhor do quinto ehakra e personifica a Sabedoria Discriminadora. Sua cor é o vermelho e seu elemento, o fogo. Suas mãos repousam cm seu regaço no Mudrá Dhyana (meditação). Estampa 3 do Foundalions of Tibetan Mysticism, de Lama Govinda (publicado em 1974por Samuel Weiser, York Beach, Maine, e Rider & Co., Londres). Reproduzido aqui com permissão dos editores.

(psicose). Constrições menos graves resultam de sentim entos e de comu­ nicações não expressados. Uma análise clarividente do quinto chakra revela seguidam ente a necessidade de expressar em oções reprimidas. A dificuldade de organizar pensam entos e de expressá-los, verbalm ente ou por escrito, também indica constrição no quinto chakra. A oração, no seu sentido verdadeiro, é uma forma de com unicação entre a personalidade e outras dim ensões da psique. O rações são formas de pensam ento que podem ser preenchidas com inform ação de níveis mais profundos da psique e de seres espirituais nos planos interiores. A partir da percepção da condição em pobrecida do ego, rezamos para obter orientação. A m aioria das pessoas compreende mal a oração e a interpreta com o um pedido — ou cm muitos casos, com o uma exigência — de que “ D eus” atenda seus desejos. A oração é mais bem com preendida como um meio de pedir o melhor da parte superior da nossa natureza. É um meio de tornar-se vulnerável a forças inspiradoras, de criar um recipiente para receber a chuva da graça que cai das dimensões espirituais interiores. O analista junguiano John Sanford, em Healing and Wholeness, m enciona que a oração é um instinto e, psicologicam ente falando, um meio de orientar o cgo-self para o Self. Ele diz ainda que os resultados positivos da oração não estão relacionados com as nossas crenças pessoais sobre Deus; o importante é que nos dirijam os ao “Poder Superior” , não importa o conceito que tenham os.2 Poderíam os dizer talvez que a correlação contem porânea com o mau uso da oração é o em prego de afirmações. Há hoje m uitos ensi­ namentos diferentes que encorajam uma repetição deliberada de declarações positivas ou idealizadas. Um efeito desastroso que tenho testemunhado neste uso de afirm ações é uma polarização entre ideais conscientes e sistemas de crenças inconscientes c program ação emo-

(2) John A. Sanford, Healing and Wholeness (Nova York: Paulisl Pre 1977), p. 133.

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cional. Sc falhamos em revelar, aceitar am orosamente e efetivamente mudar as impressões inconscientes, as táticas vigorosas do ego-self criam tensão e resistência no inconsciente, podendo levar a uma cisão perigosa entre as mentes consciente e inconsciente. Um dos temas do quinto chakra é a comunicação. No rela­ cionamento entre o self inconsciente e consciente, precisamos com eçar a pensar em tçrmos de um a m em brana permeável que possibilite um intercâmbio mútuo. Do lado consciente, precisamos ouvir o inconsciente pessoal de modo que possamos com preender “de onde está vindo”. Com essa compreensão, podemos excluir o programa inadequado. Apagando esses velhos programas e substituindo-os por parâmetros de crescimento aperfeiçoados, temos condições de ter acesso à orientação do inconsciente coletivo. Essa m em brana, finalmente, irá dissolver-se assim que a identidade do ego se fundir com o Ser transpessoal do Self. Estamos criando continuam ente o nosso mundo particular com desejos, pensam entos c preconceitos. Quanto mais evoluímos em consciência, tanto mais nossa realidade individual se alinha c se unifica com o todo da existência. Não 6 que nos tornamos melhores em criar nossa realidade, mas mudamos nosso ponto de vista. Mudar de lado, do ego ao Cosm os, é a maior das afirmações. O quinto chakra também está associado à clariaudiência ou telepatia mental, com unicação psíquica com outras pessoas ou com seres desencarnados. Outras experiências clariaudientes incluem ouvir c compreender sons interiores. Por exemplo, algumas pessoas expe­ rimentam a energia psíquica com o tons clariaudientes ao fazerem leituras psíquicas ou trabalhos de cura. Compositores e músicos também têm elevada habilidade clariaudiente. Eles freqüentem ente escrevem ou improvisam música que ouvem com o ouvido interior. O princípio da m úsica interior — o conhecim ento de que o som carrega um significado e estrutura a energia psíquica — fundamenta o uso de mantras c cânticos sagrados. Certos sons interiores musicais c vocais têm habilidade de mudar e de afetar os padrões de energia no corpo etérico e em outros corpos sutis. Quando usados apropriadamente, esses sons podem m anifestar situações c alterar formas físicas. A m ú­

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sica pode ser usada na cura, e os mantras e cânticos podem abrir canais psíquicos e criar estados de consciência psicológicos e espirituais específicos. O poder da voz está à nossa disposição na vida diária, embora raramente o valorizemos e o desenvolvam os. Por exem plo, após anos de trabalho com clientes, Milton Erickson, um renomado hipnoterapeuta, era capaz de transm itir uma sugestão hipnótica sem induzir ao transe. Em poucas palavras habilmente com unicadas, ele podia reverter padrões neuróticos profundam ente estabelecidos e transform ar completamente a vida de uma pessoa. Um ser com grande poder espiritual, ou alguém especialm ente treinado na arte de usar a voz humana, pode produzir efeitos miraculosos. O quinto chakra e a voz podem também expressar a intenção ou o propósito criador de camadas profundas da psique e, através da mediunidade, de entidades espirituais. A voz contém grande quantidade de informações sobre uma pessoa. Qualidades emocionais são prontamente discernidas no som c na inflexão. Atitudes, posturas psicológicas e orientação mental também são claram ente evidentes em padrões de fala e vocabulário. A medicina oriental reconhece esta relação e considera a análise da voz uma parte importante do diagnóstico. Uma maneira de nos tom arm os mais eficazes na vida é nos comunicarm os mais claramente. Quase sempre damos mensagens dúbias. Ao pedir algo verbalmente, pensamos ou sentimos: “Eu não mereço isto” , ou “ De qualquer modo, não me darão isto” . Diga o que você quer dizer c peça claram ente o que deseja. Talvez o segredo da verdadeira com unicação repouse na habilidade de ouvir — tanto a nós mesmos quanto aos outros. O quinto chakra também está relacionado com as dem ais funções mundanas do corpo mental. Esta mente inferior é o aspecto prático e lógico dos processos mentais. É este nível da mente que categoriza fatos e calcula algarismos. Ao gerar conceitos e estruturas, ele dá representação simbólica aos estados subjetivos de consciência, criando uma linguagem pela qual esses estados podem ser objetivados e comunicados.

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A intuição pragmática (a intuição relacionada com as coisas práticas) é outra faculdade associada ao quinto chakra. Por exemplo, quando o telefone toca, nossa intuição pragmática pode nos dizer quem está chamando. Ela também pode informar-nos sobre considerações mundanas, tais como se devemos ir à praia num dia que parece estar muito frio ou ventoso, ou que carro devemos comprar. O quinto chakra assinala a passagem da consciência para o domínio da consciência reflexiva. Além dos modos instintivos, reacionais e habituais da atividade mental, o nível reflexivo oferece ao egoself novas dimensões de pensamento abstrato e maiores poderes para controlar ou dirigir deliberadam ente os eventos e processos da vida.

O Mantra da Compaixão O uso de mantras nas disciplinas religiosas orientais é uma aplicação muito poderosa e articulada do poder do som e do princípio que está por trás das afirmações. Os m anuas constituem sons simbólicos que ativam forças espirituais da psique. Várias sílabas-sementes e combinações de sílabas evocam estados psíquicos específicos através de seus padrões e. medidas de vibração. Um dos mantras mais amplamente conhecidos é OM MANI PADM E HUM. Muitos lamas tibetanos consideram-no o mais im portante dos mantras. É o mantra do Bodhisattva Avalokiteshvara e galvaniza a sabedoria e o poder da compaixão. O mantra e a visualização do Bodhisattva da compaixão constituem um meio para conclam ar e focalizar esta força do nível transpessoal da psique. Analisando o mantra de Avalokiteshvara, Lama Govinda, em Fundamentos do misticismo tibetano, explica que OM simboliza a origem e a soma de todos os sons do universo. Como nota tônica do cosmos, ele representa a harmonia das esferas e é considerado o som supremo ou sagrado. MANI PADM E significa a jóia no lótus, ou o Vazio dentro da manifestação. Ele expressa o equilíbrio de todos os pares de opostos e a divindade essencial em cada um de nós. HUM é uma palavra de poder que rem ove os véus da consciência presa ao ego.

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Enquanto OM representa a ascensão à universalidade, HUM é a descida do universal para a consciência.3 G ovinda esclarece também que o significado de um mantra como OM MANI PADM E HUM não pode ser esgotado na análise de suas partes com ponentes, especialm ente numa breve descrição. Diz-se que este grande mantra contém a síntese viva das cinco sabedorias (associadas aos cinco Budas Dhyani). Portanto, ele reúne e concentra as verdades fundamentais do Tantra tibetano.4 De acordo com a lenda, Avalokiteshvara, o Bodhisattva da Compaixão, dos reinos celestiais de paz, olhava para o sofrimento e confusão nos mundos da ilusão. Tão pleno estava de intensa compaixão, que seus pensamentos, gerando o desejo de libertar todos os seres, fizeram sua cabeça explodir em inúmeras cabeças. De seu corpo saltaram centenas de mãos protetoras. Em cada palm a apareceu um olho. Assim , a com paixão de um Bodhisattva não é um a em oção cega, mas am or com binado com sabedoria; a sabedoria da unidade interior de toda a vida levando à capacidade de sentir o sofrimento do mundo e dos outros como se fosse nosso. (Veja figura 21, p. 142.) John Blofeld, em M antras, Palavras Sagradas de Poder, conta uma bela história chinesa típica dos contos narrados para dem onstrar o poder do mantra de Avalokiteshvara. Um guerreiro cruel, fugindo de uma batalha, refugiou-se num pequeno eremitério onde viviam apenas um jovem servidor e um lama idoso. Depois de forçá-los a encher os alforjes com objetos valiosos do templo, exigiu que lhe preparassem uma cam a na sala do santuário. Ali ele adormeceu perto da estátua de Kuan Yin (um a versão chinesa de Avalokiteshvara). O velho lama, sentindo grande compaixão pelo seu genioso visitante e sua insensatez, sentou-se próximo a ele e em sussurro entoou o mantra OM MANI PADM E HUM durante toda a noite.

(3) Govinda, Foundations o f Tibetan Mysticism, p. 213. (4) Govinda, Foundations o f Tibetan Mysticism, p. 223.

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Fig. 21. Avalokiteshvara. Nesta representação, ele tem quatro braços e uma face e personifica a Grande Compaixão (Karuna) da Mente Iluminada. OM MANI PADME HUM é o seu mantra. Da coleção thanka de Sergei Diakoff, aqui reproduzida com permissão.

O guerreiro teve m uitos sonhos em que gozava de m uita felicidade em vidas anteriores com outras pessoas que eram bondosas e amáveis com ele. Cada um desses sonhos agradáveis era seguido por outro em que as pessoas que haviam cuidado dele eram suas vítimas na vida presente. Nesses sonhos ele sofria a dor dilacerante de matar, decapitar ou de qualquer outro m odo torturar e m altratar essas pessoas que haviam sido tão bondosas com ele. Ele acordou encharcado de suor c cheio de remorso. Lançou-se por terra ante a estátua de Kuan Yin e bateu sua cabeça na laje. Quando o lama lhe serviu o desjejum , o guerreiro curvou-se diante dele e implorou para ser aceito com o discípulo. O lama não o aceitou, dizendo que a vida m onástica não fora feita para ele. Disse-lhe que continuasse seu caminho, encorajando-o a usar sua força e qualquer riqueza que pudçsse adquirir a favor do bem-estar dos oprim idos, pois qualquer um poderia ter sido sua m ãe, seu pai ou um bom am igo numa vida anterior. Surpreso pela semelhança entre as palavras do lam a e sua noite de sonhos, o guerreiro im plorou ao lama que lhe desse algum a coisa em que se apoiar em sua vida dali por diante. O lama disse-lhe que não ha­ via nada m ais forte que o poder da compaixão. Se a sua coragem va­ cilasse devido ao peso de seu mau carm a, ele deveria deixar o poder do mantra OM MANI PADM E HUM dar-lhe a força para não ceder à crueldade. Depois de, envergonhadam ente, devolver os pertences do templo, ele partiu. Conta-se que alguns de seus antigos subordinados certa vez o reconheceram trabalhando com o alm ocreve num a com unidade de monges num rem oto m osteiro no cum e oriental do W u T ’ia.5

(5) John Blofeld. Mantras, Sacred Words o f Power (Londres: Unw Hyman, 1977), pp. 34-35. [Mantras, palavras sagradas de poder, Editora Cultrix, São Paulo, 1987. Págs. 53-5.)

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Ioga do Sonho Os sonhos têm embaraçado a mente consciente ao longo de toda a história — e a com unidade científica moderna não é exccção. Várias escolas de psicoterapia têm suas próprias explicações e técnicas para analisar e decifrar os sonhos. Culturas antigas entendiam que o sonho levava a pessoa a mundos sobrenaturais onde viviam deuses e demônios. Considerava-se m uita tolice m enosprezar as ordens dos deuses en­ contrados no mundo dos sonhos. Em algumas culturas havia lugares e rituais sagrados que as pessoas podiam utilizar para invocar esses deuses em tempos de necessidade. Por exem plo, havia aproximadamente 400 templos de sonho na Grécia antiga. As pessoas podiam dormir no templo para obter orientação ou cura dos deuses ou deusas que ali moravam. Uma prática semelhante existia no antigo Egito. Muitos sonhos são reflexos dos céus interiores nos reservatórios da nossa psique pessoal. Na nossa consciência diária, organizamos eventos e percepções dentro da estrutura do espaço e tempo tridimensional que nos é familiar. Nossa experiência racional é ainda m ais limitada por padrões conceituais culturais e pessoais. A psique m ais ampla não conhece essas limitações. É por isso que é tão difícil compreender os eventos e símbolos que irradiam a partir desses reinos. Apesar disso, algum dia talvez concordem os com as tribos aborígines que acreditam que o tempo de sonho é mais im portante que a vida de vigília. Eles acreditam que a vida, como a conhecem os, é um evento que está sendo sonhado por Algo Mais. Os sonhos são uma grande fonte de discernimento e cura; eles transferem informação de um para outro entre os vários níveis de nossos eus interiores. Experiências do m undo exterior são digeridas nos sonhos, e neles também são m etabolizados eventos e processos que acontecem em todas as dimensões da psique. Nossos sonhos têm um impacto sobre a nossa vida de vigília muito m aior do que imaginamos. A psique mais am pla estende-se sobre o passado e o futuro. Os sonhos, por conseguinte, são com postos por uma incrível integração de informação e experiência — orientação espiritual, pré-cognição, expe­

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riências fora do corpo, telepatia com seres encarnados e desencarnados, dram as arquetípicos, inspiração, auto-reflexão, humor, fantasias selva­ gens, recordações de vidas passadas e da infância, desejos, medos, com pensações, processos corporais, “ruído” no sistem a nervoso e, como Jung dizia, “sabe o céu o que m ais”. Isto tudo é dram atizado em símbolos e metáforas — alguns dos quais talvez nunca sejam entendidos pela mente racional — que galvanizam certos fatores psicológicos e criam, ou nos arrastam para, as várias espécies de eventos físicos que encontram os em nossa vida de vigília. A médium Jane Roberts, em The Nature o f the Psyche, canalizou idéias de Seth sobre com o podem os testem unhar a criação de eventos externos pela psique no estado de sonho. Seth usa a m etáfora do oceano formando ondas para mostrar com o as operações interiores da psique respingam para o dom ínio de nossa consciência desperta. Ele propõe que, pela criação dos eventos, a psique experim enta sua própria realidade, do mesmo modo que, falando, ouvimos nossa própria voz.6 Seth explica com o o ego-self também tem influência na con­ formação do seu próprio destino. Seus padrões em ocionais, preconceitos e hábitos, em vários graus, ressoam com apenas um pequeno número de predileções da psique mais ampla. É através dessas predileções que alguns eventos se manifestam, enquanto outros continuam sendo meras probabilidades.7 Para com eçar a explorar o estado de sonho, precisam os nos aperfeiçoar para lem brar os sonhos. Um pequeno travesseiro cheio de artem ísia estim ula a recordação dos sonhos, o mesm o acontecendo com algum as gotas de um a tintura feita da erva tom ada antes de dormir. O com plexo vitam ínico B também tem sido recom endado para melhorar a lem brança do sonho. Ao adorm ecer, anteveja as aventuras que o esperam na terra dos sonhos e program e-se para lem brar-se delas.

(6) Jane Roberts, The Nature o f the Psyche (Englewodd Cliffs, NJ: Prentice Hall, 1979), p. 130. (7) Roberts, The Nature o f the Psyche, pp. 136-41.

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Quando acordar, em qualquer momento da noite ou pela manhã, permaneça deitado com os olhos fechados e reviva tantos eventos de sonho quantos possa lembrar. Não se preocupe com a seqüência. Ao repassar as imagens várias vezes, você perceberá que é capaz de lembrar mais e mais detalhes e cenas. Nesse estágio, concentre-se apenas nos sentimentos das imagens. Grave esses sentimentos e imagens cuida­ dosamente numa fita ou num diário, sem tentar analisá-los ainda. Acostume-se a reviver esses sonhos do mesmo modo que uma criança ouve uma história. Deixe que o significado dessas histórias emerja espontaneam ente, em vez de interpretá-lo com a razão. O problema da m aioria dos m étodos psicanalíticos que lidam com sonhos é que eles envolvem apenas o ego-consciente. Como vimos, o sonho é um domínio experimental além do mundo do ego; seu significado verdadeiro freqüentemente se perde quando reduzido à estrutura referencial do ego. A participação direta no sonho é, pois, um enfoque mais adiantado. Você pode ter tido a experiência de “acordar” num sonho. Para sua surpresa, você podia raciocinar e talvez até agir deliberadamente, após compreender que estava sonhando. Estes sonhos lúcidos podem parecer tão reais com o a vida normal, ou nos causar m edo quando não conseguimos reconhecer as circunstâncias. Porque os sonhos lúcidos se parecem muito com a lembrança de eventos reais, eles foram rejeitados pelos cientistas até pesquisas recentes na Universidade de Stanford. O pesquisador de sonhos de Stanford, Dr. Stephen L a Berge, elaborou um método pelo qual pessoas que têm sonhos lúcidos podem enviar mensagens para o mundo extem o enquanto dormem. Quando essas pessoas se tomam conscientes do sonho, movem os olhos de uma maneira pré-combinada (padrões de ondas cerebrais provam que elas estão dormindo).8 Na prática do Ioga do Sonho, iogues tântricos concentram a mente meditativa nos sonhos. Uma das proposições básicas dos budistas (8) Stephen La Berge, Lucid Dreaming (Nova York: Ballantine, 1985), p. 80.

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tibetanos é que a encarnação é um ocasião auspiciosa, uma oportunidade a ser valorizada e usada diligentem ente; o estado de sonho não é exceção. De acordo com esses ensinamentos, as conseqüências mais sérias dos pensam entos e ações são as condições que eles criam na psique. Os ensinam entos tibetanos atribuem im portância considerável à mente inconsciente. Eles reconhecem que a m anifestação desses aspectos mais esotéricos da psique é limitada por papéis, condições sociais e os m ecanism os de defesa da vida diária. O valor do estado de sonho está no fato de ficarmos livres dessas restrições. A atenção à conduta tanto quanto à Gestalt ambiental do estado de sonho oferecenos, portanto, uma excelente oportunidade de autoconhecimento. O ioga do sonho é essencialm ente uma extensão da disciplina budista da M editação Intuitiva. Se praticada na vida diária, essa atenção poderá ser com maior facilidade introduzida nos domínios noturnos da consciência. Na tradição tibetana, há inúmeras técnicas utilizadas no ioga do sonho. D urante o dia é im portante manter um forte desejo de reconhecer o estado de sonho. Por isso é proveitoso morar num lugar solitário e serenar a mente, durante o dia, de modo que possa haver maior continuidade da consciência dium a para a notuma. Para m aior reforço dessa intenção, som os orientados a praticar a observação de experiências de vigília com o se fossem sonhos. M anter a consciência ao adorm ecer é outra habilidade importante que devem os dominar. Para que isso aconteça, a tradição tântrica dispõe de diversas variações da técnica: aqui apresentamos um a variação simples. Visualize um AH verm elho brilhante no canal central do seu chakra laríngeo ao entrar nos reinos noturnos. M antenha uma cons­ ciência aguçada dele. Ignorando as divagações errantes da mente, traga à lembrança as qualidades ilusórias da existência fenomênica. Depois de uma prática consistente, você finalm ente estará apto a perm anecer atento enquanto passa pela região de imagens hipnogógicas para entrar no mundo dos sonhos. No sono profundo, o ar vital (prana) acumula-se no chakra cardíaco e no chakra da raiz. Quando o ar vital se move em direção aos

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chakras laríngeo e sacral, o sonho aparece. Quando esse ar sobe aos chakras do plexo solar e da cabeça, nós acordamos. Concentrar-se no centro da garganta, portanto, faz com que o prana do centro do coração fique mais fraco, de modo que o sono será mais leve e a consciência mais clara. Os sonhos produzidos pela focalização no chakra laríngeo supostamente perduram por mais tempo, motivo pelo qual podemos praticar o ioga do sonho por um tempo mais longo. Outro fator relacionado com a qualidade da consciência durante o sono está ligado à quantidade de ar que flui pela narina esquerda ou direita. D eitar sobre o lado direito ao adormecer favorece a passagem de mais ar pela narina direita, o que por sua vez ativa o hemisfério esquerdo do cérebro, estimulando as qualidades racionais do hemisfério esquerdo e aumentando nossa habilidade de “despertar” durante o sonho.9 E também útil dorm ir por pequenos períodos de tempo. Cada vez que você acordar, reveja se estava ou não consciente enquanto dormia. Volte a'do rm ir enquanto revê quaisquer sonhos que possa lembrar com a atenção focalizada na sua visualização do chakra laríngeo. Você pode também dizer a si mesmo: “Acordarei em meus sonhos.” Repita isso várias vezes com convicção. Na pesquisa de La Berge em Stanford, descobriu-se que os sonhos mais lúcidos ocorrem durante os períodos REM (m ovim ento rápido dos olhos) e que a freqüência e duração do sono REM aum enta na parte final do sono noturno. As primeiras horas da manhã, após um bom sono, são portanto as mais propícias para a prática do ioga do sonho. Em determ inado ponto de sua prática, você acordará no sonho. De repente você compreenderá: “Isto é um sonho! Estou sonhando!” Em Journey to Ixtlan, obra de Carlos Castafieda sobre suas experiências com o feiticeiro Don Juan, Carlos foi instruído a lembrar-se de olhar para as

(9) Para maiores informações sobre o ioga do sonho, ver Charles Mu Esoteric Teachings o f Tibetan Tantra (York Beach, ME: Samuel Weiser, 1961), pp. 200-20.

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mãos quando ficasse lúcido durante um sonho. Don Juan estava lhe m ostrando um a maneira de “estabilizar seu corpo de sonho”.10 Depois de conseguir acordar num sonho, a próxima tarefa é permanecer consciente. Um dos problemas que La Berge encontrou em sua pesquisa foi que com freqüência temos a tendência de acordar fisicam ente quando o sonho lúcido começa, em especial quando o conteúdo emocional é am eaçador ou intenso. O conflito emocional costum a ser a causa do término prematuro de um sonho lúcido. Por exemplo, sonhos lúcidos seguidam ente se rela­ cionam com experiências sexuais. Se um a pessoa é sexualm ente inibida, em geral ela interromperá um sonho lúcido de conteúdo sexual na origem , acordando em vez de perm itir conscientem ente a experiência. Em L ucid Dreaming, La Berge explica que, para superar esse obstáculo, é útil m udar nossa atitude consciente para ficarmos menos inibidos.11 Algumas pessoas se tomam muito envolvidas em ocionalmente, o que pode fazer com que percam a objetividade ou se identifiquem com o sonho em si. Em ambos os casos, o distanciam ento emocional é im portante. A solução de La Berge é simples: “Não entre em pânico! Perm aneça calm o”.12 Depois de aprender a perm anecer despertos num sonho, os ensinam entos tibetanos nos encorajam a exercitar nossa vontade para alterar a experiência do sonho. Depois de se tomarem peritos em alterar o conteúdo do sonho, os iogues tibetanos transformam-se em divindades m editativas e transportam-se para suas m oradas-mandala. No plano astral, os blocos principais do edifício da realidade são configurações mentais e emocionais. Pela transform ação de objetos e eventos do sonho, com preendem os a insubstancialidade essencial desses aspectos de nós mesmos.

(10) Carlos Castaneda, Journey to Ixtlan (Nova York: Pocket Books, 1975). (11) La Berge, Lucid Dreaming, pp. 118-20. (12) La Berge, Lucid Dreaming, pp. 118.

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Em L ucid Dreaming, La Bcrge compartilha uma de suas ex­ periências para ilustrar os efeitos terapêuticos de transformação do ambiente do sonho. Sonhando que estava em meio a um tumulto na sala de aula, um grandalhão com o rosto marcado pela varíola mantinha-o fortemente agarrado, e ele tentava escapar. Quando percebeu que estava sonhando, lembrou que cm situações semelhantes havia aprendido a parar de lutar. Então compreendeu que a batalha era um sonho e que o conflito estava dentro dele mesmo. Teve então uma consciência lúcida de que o valentão repulsivo era uma personificação de alguma coisa que ele estava negando dentro de si mesmo. Com preendeu também que a harmonia interior só prevaleceria pela aceitação do que quer que o bárbaro representasse. Sua prim eira tentativa para sentir amor pelo seu ogre falhou, e sucumbiu à aversão pelo valentão. Ele tentou ignorar suas reações viscerais e procurou am or em seu coração. Quando fez isto, olhou o bárbaro nos olhos e palavras de aceitação jorraram de sua boca. O ogre diluiu-se dentro dele e o tumulto desapareceu. O sonho terminou nesse ponto e La Berge acordou sentindo-se m aravilhosamente calm o.13 Lem bre-se de que a nossa mente é realmente um mundo de sonho também. N ossa experiência de vigília, como um sonho, não é uma realidade sólida ou absoluta, mas essencialmente metafórica. Represen­ tamos externam ente nossos dramas psicológicos com co-autores com quem estam os ligados pelo carm a ou com quem pelo menos com ­ partilhamos uma ressonância cármica. Como no estado de sonho, não precisamos sofrer com nossas interpretações desses eventos — estamos livres para alterar nossa percepção deles e a resposta que lhes damos. Até nos tom arm os Budas (despertos), é útil lem brar que estamos sonhando. A prática do ioga do sonho é finalmente usada para penetrar nos estados superiores de consciência. Transformar-nos em várias divin­ dades, de m aneira semelhante às nossas práticas de meditação, e con­

(13) La Bcrge, Lucid Dreaming, pp. 12-3.

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centrar-nos intensam ente em seus estados de contem plação na Luz Clara do Vazio é a meta do Ioga do Sonho. Recebi orientação espiritual, encontrei divindades tântricas, e usufruí muitas experiências m ísticas no plano astral durante o sonho. Eu gostaria de com partilhar um a dessas experiências agora e de mencionar várias outras no decorrer deste livro. Num sonho lúcido, fui certa vez levado por um guia espiritual numa viagem através da m inha coluna. Vi com o o mundo se apresenta em cada chakra. Experim entei cada nível de consciência e percebi como ele é condicionado por im agens e programas a ele associados. Através do chakra coronário, aventurei-m e às regiões radiantes e, por fim, fui absorvido por uma m aravilhosa luz branca-dourada. Só muitos anos mais tarde voltei a viver esse nível de consciência na meditação.

Morte, Transfiguração e Renascimento Estreitam ente relacionado com a prática do ioga do sonho, O Livro Tibeiano dos M ortos treina um iogue para reconhecer a Luz Clara do Vazio no momento da morte e, assim , obter a libertação. Antes de es­ tudar o estado pós-morte e as práticas de meditação que nos prepararam para fazer o melhor uso dele, uma vez mais vamos tratar da psicologia junguiana para explorar a ocorrência universal da iniciação à morte. N a evolução do ego-self a consciência se consolida num a estrutura individual, m as temporal. Há, todavia, um impulso inerente em nós para transcender esta limitação. Antes que isto aconteça, o velho self deve morrer. A transfiguração do “eu” que acontece nesse estágio é relacionada universalm ente com uma iniciação à morte no mito e na religião. No mito, a morte do herói leva ao renascim ento (ressurreição) de um deus ou ser imortal. A morte, ressurreição e ascensão de Jesus é um exem plo perfeito de com o esse mito freqüentemente é projetado em heróis religiosos. No antigo culto egípcio a Osíris, encontramos outro bom exemplo de iniciação através de uma experiência de morte. N a esteira do mito de Osíris, que descreve como ele se uniu ao deus-sol Rá para tornar-se

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imortal através da morte, neófitos eram colocados num sarcófago por alguns dias. Durante este tempo eles passavam por muitos testes nos planos interiores. Se fosse bem sucedido (na verdade, alguns nunca voltavam a seus corpos), o iniciado retom ava com conhecim entos de além da morte. No The Psychology o f the Transference, Jung ponderou que a transfiguração do cgo-self representada no diagrama alquímico do Rosarium Philosophorum segue-se à coniunclio a que nos referimos ao falar do chakra cardíaco. Morte: Aqui o Rei e a Rainha jazem mortos. Em grande aflição, a alma é apressada a partir. (R osarium )14 Tendo-se fundido num único corpo, o casal divino é colocado num ataúde. (Veja fig. 22, p. 153.) Também mencionado com o “putrefação” em textos alquímicos, este estágio simboliza o estado de dissolução em que os agregados que compõem o ego-self são desfeitos. No aspecto sombrio desta fase psicológica, podemos sofrer uma desilusão com o aparente vazio da vida. Se não compreendemos esse processo de degeneração, podemos ir tolamente em busca dos padrões do velho ego. Ou, se o anseio pela transformação foi desvirtuado, poderem os surpreender-nos ponderando sobre o suicídio. Um desejo de morrer poder surgir quando o cam inho para a individuação é bloqueado por atitudes do ego-self. Impulsos suicidas, neste caso, são comunicações sim bólicas do inconsciente de que atitudes que permanecem no caminho da nossa transformação espiritual devem m orrer.’ Além do pré-conhccim ento, ou mesmo da assistência psicológica ou espiritual, isso requer uma boa dose de coragem. O processo de “ morrer” é terrível para o ego-self; o nascimento da

(14) Citado de Carl Jung, The Psychology of lhe Transference (Prince NJ: Princeton University Press, 1966), p. 95. Há também várias publicações sobre alquimia que vocc pode explorar visto que hoje o interesse por esse assunto está aumentando novamente.

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Fig. 22. Animae Exiraclio Vel. Representação extraída do texto alquímico Rosa­ rium Philosophorum, retratando a morte c a purificação (pulreficalion per au) dos corpos unificados da Lua e do Sol enquanto a alma se eleva.

identidade transpessoal que se segue é inimaginável ou, no máximo, duvidoso para o self agonizante. O terapeuta junguiano John Sanford, em Healing and Wholeness, diz que a iniciação à m orte também pode ocorrer sob a aparência de uma doença debilitante. Ele m enciona que nosso relacionam ento com as forças arquetípicas nesse nível da psique é uma questão delicada. Estas impressionantes representações, com o os deuses e deusas de religiões antigas, são muito temperamentais. Se os ignoramos ou os desres­ peitamos, podemos incorrer em sua ira. Assim, quaisquer desordens psicológicas misteriosas ou doenças físicas forçam o self consciente a um período de retirada c de incubação. Esse tipo de doença pode dissolver a estrutura cristalizada do ego, possibilitando que novos aspectos da psique surjam durante a convalescença. Sanford prossegue dando exem plos de como a doença pode servir como iniciação na vida de curadores primitivos. Os xamãs são chamados freqüentem ente a seguir sua vocação através de uma doença iniciática. Durante uma crise psicológica intensa ou doença física, o futuro xamã (masculino ou feminino) passa pela experiência de ser levado pelos demônios da doença e da morte. Um retom o à saúde ocorre somente depois que a pessoa aceita a com unicação do mundo dos espíritos com relação ao tipo de vida que deverá seguir.15 Jung também constatou que o m istério da iniciação à morte pode ser representado num sonho. Em Aion, ele apresentou o seguinte exemplo: um jovem sonha que está subindo uma montanha. No topo, ele vê um altar e um sarcófago com um a estátua dele mesmo sobre o altar. Um sacerdote encoberto por um véu, carregando um báculo com um disco em form a de sol vivo, aproxim a-se dele. De repente, ele percebe que está morto. Sente privação e m edo em vez da sensação de conquista que sentia ao subir a montanha. Assim que se banha nos raios aquecidos do disco-sol, entretanto, sente-se rejuvenescido e forte.

(15) Sanford, Healing and Wholeness, pp. 64-5.

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Jung m enciona que esse sonho mostra a diferença entre a iniciação e o mito do herói. O ato de subir a m ontanha é como um teste de força associado ao desejo de adquirir a consciência do ego na fase heróica. O jovem paciente pensou que a terapia poderia ser um empreendimento heróico. A cena do sonho junto ao altar corrigiu esta suposição errônea. Vendo-se a si mesmo morto c sepultado, o sonho ensinou que ele devia sujeitar-se a um poder m aior do que ele mesmo. Som ente através de sua iniciação à morte e dessa subm issão ele poderia experim entar o renascim ento.16 No Tantra tibetano, a m orte — no seu sentido m ais literal — é usada com o uma iniciação. O Livro Tibetano dos M ortos (BardoThõdol, ou Livro da Liberação pela Escuta no Plano Pós-Morte) poeticamente descreve como, após termos deixado o corpo pela morte, permanecem os por algum tempo nos reinos interiores (Bardo, lite­ ralmente, “estado interm ediário”) e encontramos várias divindades pacíficas e iracundas. Se podemos nos identificar com a Luz Clara do Vazio e m antem os a consciência de que tudo o que experim entam os é ilusão, então conseguim os a libertação. Se não formos capazes de fazer isso, seremos controlados por forças cárm icas que, a seu tempo, nos farão retom ar a outro corpo físico. Há três fases, ou estados Bardo, pelas quais passam os depois da morte em nosso retom o a outra encarnação. De acordo com Joseph Cam pbell, em The M ythic Im age, o primeiro estágio, “Estado Intermediário do M om ento da M orte” (Bardo C hikhai), relaciona-se com os estados de consciência do sexto c sétimo chakras despertos. Depois do momento da morte, podem os não perceber que nos separamos do corpo. Em nossa confusão, ou mesmo em nosso sono-transe, normalmente não reconhecem os a Luz Clara do Vazio e nem permanecem os em sua pureza sem sermos distraídos por pensamentos.

(16) Carl Jung, Aion, Bollingen Series, Vol. IX (Princeton, NJ: Princet University Press, 1959), p. 194.

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Deste modo, para os não instruídos, este primeiro estágio do pós-vida conduz à segunda fase. O Bardo Choyid, ou “Estado Intermediário de Experiência da Realidade”, relaciona-se com as funções psicológicas do quinto chakra. Acordando no segundo estágio e com preendendo que morremos, ficamos intimidados pela luminosidade da luz radiante das Cinco Energias da Sabedoria (os cinco Budas Dhyani) c retomamos à luz opaca das alucinações da nossa mente. O que pensamos e fizemos enquanto estávamos no corpo inunda a nossa consciência em numerosas experiências semelhantes a um sonho. Os ensinamentos tibetanos repetidamente nos lembram, entretanto, que o que vemos neste estágio é uma projeção do nosso próprio conteúdo mental. A prática do ioga do sonho é obviamente uma boa preparação para o conhecimento e a concentração necessários neste momento. O último estágio, “Estado Intermediário de Busca do Renas­ cim ento” (Bardo Sidpa), tem dois subestágios que correspondem à consciência do quarto chakra c dos chakras três, dois e um .17 Os budistas sustentam que inicialmente desfrutam os de visões agradáveis e colhe­ mos os frutos de nossos impulsos e aspirações da nossa natureza superior. Assim que essas forças se esgotam, descemos pelos reinos interiores, onde surgem visões nascidas da nossa natureza inferior. Embora estas nos apavorem , som os inseparáveis delas c não podemos escapar. A medida que as experiências se tomam mais concupiscentes e sensuais, sentimos um desejo irresistível pela vida da carne. Desse modo, o apego à realidade que conhecemos e nossas predileções cármicas arrastam-nos ao terceiro estágio da vida após a morte, a vida intra-uterina. O propósito do Bardo Thõdol é ensinar-nos a nos vincular à visão da Luz Clara do Vazio no prim eiro estágio. Se conseguimos fazer isto,

(17) Joseph Campbell, The Mythic Image, Bollingen Scries, Vol. C (Prin ton, NJ: Princeton University Press, 1974), p. 394.

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então apenas precisam os encontrar as experiências m ais espirituais do primeiro estágio antes de passarm os a outros reinos da existência ou escolhermos o renascimento com o um Buda sem quebrar a continuidade da consciência. Se não conseguim os obter a libertação no prim eiro estágio, então começamos a descer pelos seis reinos da existência. O panteão de divindades encontradas nesses vários domínios (no Bardo Thõdol) representam as forças universais ativas nos diferentes níveis da psique. Seu aparecim ento na m itologia do estado pós-morte sim boliza os estágios e forças que ocorrem no cam inho do desenvolvim ento psíquico. Se somos incapazes de m anter a Luz Clara no primeiro estágio, ainda podem os obter a libertação refugiando-nos nos cinco Budas Dhyani, que aparecem um após outro no segundo Bardo. Abandonando as ilusões da nossa mente, seus vários elementos podem ser transformados na Energia da Sabedoria de cada um dos cinco Budas Dhyani. Com preendendo que as formas temporais do corpo-mentc não são o que som os, despertam os para a Eterna Luz Clara do Vazio e experim entam os o Dharm akaya (corpo da verdade). Se não formos libertados até esse momento, devido às forças pertinazes da mente inconsciente que nos têm controlado por muitas vidas — e que ainda agora nos impelem a descer aos níveis inferiores — , então, no sexto dia, os cinco Budas Dhyani e suas consortes e servidores aparecem sim ultaneam ente. (Veja fig. 23, p. 158.) Se, entretanto, falham os em nos manter unidos à Luz Clara e continuamos a ser indulgentes com as ilusões da nossa mente, no sétimo dia aparecem os M antenedores do Conhecimento (Vidyadharas). Essas cinco divindades e seus consortes manifestam-se com um a hoste de dakinis e seus servidores, conjunto este que com põe a m andala dos Mantenedores do Conhecim ento. Se compreendemos que esses mestres espirituais vieram para guiar-nos ao “Reino Puro do Espaço” c focalizamos a mente em suas cinco luzes coloridas, então a Libertação pode ser alcançada. Não concluindo esta etapa, as divindades acim a transformam-se cm 58 divindades sugadoras de sangue. Esta mandala das divindades

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Fig. 23. A Grande Mandaladas Divindades Pacíficas. Esta mandala retrata os cinco Budas Dhyani aparecendo com suas consortes e é usada em conjunto com as práticas de meditação associadas ao Livro tibetano dos mortos. Ilustração do Livro tibetano dos mortos, de W.Y. Evans-Wcntz. Copyright 1960 de W.Y. EvansWcntz. Reproduzida por gentil permissão de Oxford University Press, Nova York e Londres.

iracundas (veja fig. 24, p. 160) representa as forças m entais necessárias para vencer as ilusões e paixões do ego-self. A pessoa comum muito provavelmente continuará a cair nos reinos inferiores, tentando escapar dessas divindades am edrontadoras. Mas um iogue tântrico, tendo-as vi­ sualizado na m editação, reconhece-as c funde-se com elas. Assimilando seus atributos, a Libertação é finalmente alcançada pelo iogue. O Bardo Thõdol baseia-se na prem issa de que através dos portais da morte entram os nos mesmos reinos de consciência que atingim os cm estados avançados de meditação. Se mantivermos um alto nível de clari­ dade e propósito no momento da morte, teremos a oportunidade de ju n ­ tar-nos à comunidade daquelas alm as iluminadas que Foram Além (Tathagatas). Jung ficou fascinado pelo Bardo Thõdol e escreveu em seu Comentário Psicológico à edição de Evans-W entz que estava fortemente inspirado pelas suas intuições profundas sobre a natureza da psique humana. Ele revela que nossa psicologia ocidental tem explorado apenas o mais inferior dos três níveis da psique, que corresponde aos estados pós-morte. A ciência ocidental, portanto, tem as duas regiões restantes mais sutis para descobrir.18

Cortando Apegos A partir do quinto chakra, o caminho da libertação é muito ín­ greme. Com o um alpinista, precisam os de equipam ento apropriado para a escalada. De acordo com o Tantra budista, há três provisões importantes para esta jornada: o motivo iluminado da compaixão (que estudamos no capítulo anterior), a visão correta da vacuidade (que estudaremos m ais adiante) e renúncia à mente.

(18) Carl Jung, “Comentário Psicológico”, in The Tibetan Book o f t Dead, W.Y. Evans-Wentz, org. (Nova York & Londres: Oxford University Press, 1960), pp. xxxvi, xiii-xliii. [O livro tibetano dos mortos, Editora Pensa­ mento, São Paulo, 1985, p. xxxv.]

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Fig. 24. A Grande Mandala das Divindades Mantenedoras do Conhecimento e Iracundas. Esta mandala contém as manifestações coléricas dos cinco Budas Dhyani, usadas nas práticas de meditação associadas ao Livro tibetano dos mortos. Ilustração do Livro tibetano dos mortos, de W.Y. Evans-Wentz. Copyright 1960 de W.Y. Evans-Wentz. Repnodúzido por gentil permissão da Oxford University Press, Nova York e Londres.

Para muitos de nós, a palavra renúncia traz associações negativas, talvez figuras de monges ou monjas vivendo vidas austeras. Mas o ato de renúncia budista não é a prática de negar objetos ou desejos; é abandonar a crença no ego-self. Nosso apego ao ego-self, com posto pelas ilusórias ramificações das cinco energias da sabedoria, mantém-nos presos ao mundo da ilusão chamado Samsara no Tantra. Em sânscrito, Samsara significa lite­ ralmente “circular”. Refere-se ao círculo da existência (a roda de nascimento e morte). O Sam sara algum as vezes é erroneamente considerado uma situação objetiva da qual precisamos fugir. Numa palestra na Califórnia, o Lama Yeshe relatou a seguinte história sobre o criado de um lama altam ente respeitado. Um dia esse servo começou a usar o hábito de monge. Quando enviado em missão a outro lama, este perguntou-lhe sobre o seu progresso espiritual. O criado respondeu que acabara de trans­ cender o Samsara. O lama ficou muito curioso e suplicou-lhe que lhe revelasse o método que propiciaria tão alto nível de realiza­ ção. O criado respondeu, ao acaso, que simplesmente despira suas roupas de leigo. M udar nossa condição física (roupas de m onge ou vida em mosteiro) não nos retira da roda da morte e do nascimento, assim como da prisão cárm ica dentro da mente.

Meditação Chõd Para aperfeiçoar a renúncia, os iogues tântricos cumprem um ritual chamado Chõd, que literalmente significa “cortar”. Nessa prática, o iogue corta seu apego ao corpo e ao ego por meio de uma oferenda sacrificial do corpo. O Chõd era executado tradicionalm ente na hora do crepúsculo, cm lugares remotos ou assustadores, tais como cemitérios, e muito provavelm ente evoluiu de um rito pré-budista de sacrifícios ao demônio. Tsultrim Allione, em seu livro Women ofW isdom , conta como se julgava que as oferendas feitas nessa hora e nesses lugares saciavam

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os fantasmas famintos de m odo que não afligissem pessoas inocentes.19 O ritual da meditação é acom panhado por um pequeno tambor, um sino, pela voz humana e por uma com eta feita de um osso da coxa humana. Os sons resultantes são muito sinistros, produzindo vibrações específicas no corpo. A prática Chõd está fundamentada no conhecim ento de que sob a turbulência do ego-self existe a M ente búdica em sua bem-avcnturança inerente. Se pudermos cortar as tendências do ego-self, a Mente búdica emerge naturalm ente.20 Comece, como de costume, com a meditação do Refúgio. Ao alcançar um estado de tranqüilidade, visualize o canal central que percorre o eixo do seu corpo desde o topo da cabeça até a base da pelve. Esse canal é oco, com a dim ensão aproximada do seu dedo mínimo e a cor translúcida de uma cham a azul. Dentro dele, na altura do plexo solar, encontra-se uma pequena bola de luz. Ao inspirar, sinta o ar vital sendo aspirado para os canais direito e esquerdo (de cor vermelha e branca) desde as narinas até o primeiro chakra. Aí o ar vital entra no canal central e é forçado para cim a durante a expiração. Isso ventila a bola de luz, tom ando-a mais e mais quente a cada respiração. Repita o mantra OM AH HUNG; as primeiras duas sílabas enquanto inspira e a última enquanto expira. No topo da bola de luz, uma feroz deusa negra está em pé apoiada na perna esquerda (fig. 25. p. 163). Ela está nua, exceto por poucos ornamentos de osso e um colar de crânios humanos. Seus órgãos genitais são claram ente visíveis, vermelhos, inchados e úmidos. A cabeça de um javali projeta-se do lado direito de sua cabeça e sua perna direita está

(19)Tsultrim Allione, Women o f Wisdom (Londres: Arkana, 1986), pp. 145-49. (20) Para maiores informações sobre a prática Chõd, reporte-se a Khetsun Sangpo Rinbochay, Tantric Practice in Nying-Mapa (Ithaca, NY: Snow Lion, 1982), pp. 161-66.

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Fig. 25. Vajra Varahi é uma das principais dakinis tântricas e uma expressão de Vajra Yoguine. Ela é utilizada na meditação para despertar a Kundalini (Fogo Dumo) e no Ritual Chõd, que está baseado na filosofia das escrituras do Prajna Paramita. Às vezes ela é mencionada como a "Sementeira de Diamante” e tem a cabeça de um javali projetando-se do lado direito de sua cabeça, simbolizando a integração dos aspectos inconscientes da psique enraizados nos instintos animais. Da Coleção Avery Brundage, Museu de Arte Asiática de São Francisco, Golden Gate Park, São Francisco, CA. Reproduzido com permissão.

levantada numa postura de dança. Em sua mão direita levantada, equilibrada para golpear, ela segura uma faca. Sua lâmina em forma de lua crescente tem a ponta em gancho. Essa faca era usada para tirar a pele de cadáveres nos cem itérios da índia. O cabo de sua faca é um vajra (cetro tântrico) que sim boliza a energia diam antina do Vazio. Postada sobre seu coração, sua mão esquerda segura uma boina cheia de sangue. Aqui, a boina representa a sua vagina. Como o sêmen branco de divindades m asculinas, o sangue é a sua essência espiritual. Há um bastão que repousa na curvatura do seu cotovelo esquerdo. O tridente no alto do bastão representa a transform ação dos três venenos da mente: desejo, aversão e ignorância. Sob o tridente há um vajra duplo e três cabeças austeras, que representam os três corpos (Kayas) da Mente búdica. O primeiro crânio é velho e seco. É o Dharmakaya, o transcendente Corpo da Verdade. Em bora vazio, ele contém todo o seu potencial. O segundo crânio, com algumas semanas de idade, é o Sambogakaya. Este é como um corpo astral que as divindades tântricas usam para se manifestar a iogues avançados. A terceira cabeça, recentem ente cortada, é o Nirmanakaya, personificação física da Mente búdica. A medida que você continua a projetar os ares vitais para cima, no canal central, a bola de luz e a Dakini Negra (Vajra Varahi, a Sementeira de Diamante) sobem lentamente no interior do canal. Quando elas atravessam o topo da sua cabeça, sua consciência funde-se com elas. Olhando atento para o seu corpo anterior, você pode ver que é muito grande. Como a Dakini Negra, você se agacha e corta o topo da sua cabeça, logo acim a dos olhos. A seguir, coloca esse crânio invertido sobre os três crânios enormes à sua frente. A bola de luz, que se transformou na flamejante sílaba tibetana a, arde intensamente sob o crânio. (Veja fig. 26, p. 165.) Isto faz com que o crânio se expanda até que fique suficientemente grande para receber o restante do cadáver dentro dele. Agora comece a retalhar as outras partes do seu corpo e coloque pedaço por pedaço dentro do crânio-caldeirão. Preste atenção a quaisquer sentimentos ou lembranças que possam surgir à medida que

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Fig. 26. A sílaba tibctana a c o manlra-semenie invertido HAM. A sílaba tibetana a se relaciona com o poder gerador da criação e é visualizada como chama ardente no chakra-raiz em práticas que envolvem o despertar da Kundalini. O mantrasemente HAM é visualizado de cabeça para baixo no chakra coronário. Quando o calor do fogo interior derrete sua essencia-semente como se fora neve, seu néctar embebe de bem-aventurança o corpo da pessoa que medita.

você corta as diferentes partes do seu corpo. Enquanto o corpo se dissolve e ferve, visualize as impurezas surgindo na superfície e transbordando para dentro da boca de demônios selvagens. Ao mesmo tempo, o calor eleva-se sob a form a de vapor para o branco e frio mantra-semente HAM (fig. 26), que está pendurado de boca para baixo sobre o caldeirão. Como neve, seu néctar funde-se para se misturar com a essência clarificada do seu cadáver. No lado do caldeirão oposto a você, linhagens de adeptos e mestres tântricos sentam-se sobre alm ofadas em semicírculo. Bodhisattvas e Protetores do Dharma sentam-se atrás deles. Além destes, estão todos os seus inimigos e pessoas com quem você tem algum débito. Sobre todos eles, no espaço, os Cinco Budas Dhyani e suas consortes, dispostos cm mandala, brilham sobre você. A partir do centro da mandala de quatro pétalas, brilha a luz azul da Pura Sabedoria Absoluta de Vairocana. Debaixo dele, emana a luz branca da Sabedoria Radiante de Aksobya. À esquerda do centro, irradia a luz amarela da Sabedoria da Igualdade de Ratnasambhava. No topo, cintila a luz verm elha da Sabedoria Discriminadora de Amitabha. E à direita do centro brilha a luz verde da Sabedoria Todo-realizadora de Amoghasiddhi. Começando com os Cinco Budas e suas consortes, veja todos os seres presentes participando da oferta do néctar do crânio. Embora todos absorvam o néctar em grande quantidade, ele nunca diminui. Os cinco casais de Budas absorvem o néctar através dos raios de luz que brilham a partir de seus corpos. Os dem ais convidados são servidos por numerosas dakinis azuis, brancas, amarelas, vermelhas e verdes, que tiram néctar do imenso crânio cm conchas e oferecem a eles em seus próprios crânios, que carregam na mão esquerda. Quando todos foram servidos, você agita o néctar fervente c ele se evapora em grandes nuvens. Estas se elevam sobre belos raios de luz e arco-íris que preenchem todo o espaço. As nuvens então deixam cair uma chuva suave de bênçãos, presenteando todos os seres sencientes de todos os reinos. Todos esses seres são curados -e todas as suas necessidades satisfeitas. Depois disso, tudo se dissolve no Vazio. A última coisa a se

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dissolver no Vazio é a leira verm elha flamejante a. Continue meditando na vacuidade celestial do V azio enquanto você puder desfrutá-lo. Antes de sair da m editação, ofereça m entalmente seus pertences mais apreciados para proveito de todos os seres sencientes. Então sinta como os Cinco Budas Dhyani e suas consortes estão satisfeitos com suas oferendas. Em troca, eles lhe darão seus poderes espirituais para ajudálo a rem over todas as suas obscuridades e defeitos remanescentes.

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Capítulo Sétimo O OCEANO DE NÉCTAR O nome sânscrito para o sexto chakra é Ajna, que significa “comando do alto”. O diagram a hindu mostra duas pétalas de lótus ligadas a um disco lunar, considerado este como um reservatório para o néctar que goteja do lótus de mil pétalas no topo da cabeça. O sexto chakra comum ente é conhecido com o o oceano de néctar. No interior do disco lunar encontramos um triângulo invertido, símbolo dos órgãos genitais femininos, com um linga dentro dele. Há dois outros chakras que contêm essa combinação de yoni e linga: o chakra-raiz e o cardíaco. É nesses três chakras que o poder da Kundalini está concentrado. Também mencionadas como “nódulos”, essas três concentrações estão associadas com os corpos físico, emocional c mental. (V eja fig. 27, à p. 169.) O sexto chakra se localiza no centro da cabeça. Está associado à faculdade da percepção e relacionado com o cérebro anterior e o córtex cerebral. Estes, por sua vez, estão divididos em hem isférios direito e esquerdo e nos dois modos básicos de percepção — intuitivo e racional, respectivamente. O hem isfério esquerdo está envolvido predominantemente com processos conceituais lógicos, lineares e analíticos, com o a matemática. Geralmente visto com o o hem isfério mais masculino, ele governa o lado direito do corpo. 168

Fig. 27. O sexto chakra, Ajna, icm duas pétalas. Elas eslão unidas pela mandala Candra, associada ao oceano de néctar que goteja do chakra da coroa e também aos seis estágios de samadhi ou iluminação. Dentro do triângulo invertido, no interior da mandala Candra, está o mantra-semente OM, representando o espírito mais íntimo, associado à Mente pura ou Buddhi. Acima do mantra-semente OM está um nadi c um bindu dourado, os quais, quando acrescentados ao OM, criam o mantra Pranava. Este mantra expressa a relação entre o vazio c os fatores genéricos da criação.

O hemisfério direilo é responsável principalm ente pela orientação no espaço — por exemplo, o reconhecimento de padrões visuais com ­ plexos — e governa o lado esquerdo do corpo, tido com o mais receptivo e feminino. Este hemisfério relaciona-se com a nossa aptidão para a arte e a música, com o reconhecimento e a expressão da emoção e o despertar de estados místicos ou intuitivos. Os dois canais psíquicos sutis primários, que se originam no sexto chakra e descem ao longo da coluna vertebral, podem ser associados às funções dos hemisférios esquerdo e direito do cérebro. Um desses canais está associado ao Sol e representa a força do dia. As energias solares são consideradas centrífugas e movimentam a nossa consciência cm direção à percepção racional. O outro canal está relacionado com a Lua e com as energias da noite. Seu m ovimento centrípeto leva-nos à mente incons­ ciente em que experimentamos os poderes regeneradores c unificadores da psique. Observando o sexto chakra psiquicamente, percebe-se uma pers­ pectiva anterior/posterior mais do que um corte esquerdo/direito. A parte frontal, perto da testa e das sobrancelhas, correlaciona-se com as funções intelectuais e assertivas da consciência. A porção próxima do centro da cabeça é mais receptiva e intuitiva. As pessoas que vivem “racionalmente” — sempre pensando e esquematizando — mostram uma grande quantidade de energia psíquica na região da testa. Na verdade, a energia freqüentemente se distribui pelas sobrancelhas à medida que as forças do intelecto procuram controlar o mundo. Essas pessoas são surpreendidas em seus próprios pensamentos e perdem o contato com “o que é”. Não sendo receptivas à entrada do ambiente externo e intemo, elas parecem ter uma necessidade neurótica de criar e seguir padrões conceituais rígidos, o que lhes dá uma sensação de segurança e conhecimento. Daí que passam o tempo criando suas próprias imagens mentais do m undo e impondoas à realidade. As pessoas que têm como foco o centro da cabeça são mais receptivas às informações em ocionais e intuitivas. Em lugar de tentar manipular a vida para ajustá-la a idéias preconcebidas, elas intuem a

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natureza inerente do universo. Contudo, sem a influência equilibradora das faculdades racionais, esses tipos podem ter dificuldade de funcio­ namento dentro dos parâmetros racionais do nosso mundo mundano. Idealm ente, o intelecto e a intuição se complementam. No mundo moderno, todavia, a ênfase excessiva dada à atividade do cérebro esquerdo tem perturbado esse equilíbrio. Quando o hem isfério direito é desenvolvido e usado, habilidades intuitivas latentes abrem novas perspectivas e a consciência do “eu” tem lampejos de sua unidade essencial com tudo o que é. A percepção psíquica também é estimulada. Às vezes o sexto chakra é cham ado de terceiro olho devido ao seu potencial de clarividência, a habilidade de perceber as energias sutis dos reinos não-físicos. Todos nós tem os este potencial. De fato, em várias culturas antigas estas habilidades eram corriqueiras. Ver auras, ver os chakras, o futuro, vidas passadas ou seres desencarnados, todas são habilidades a que temos acesso com um sexto chakra desperto. P erceb er a diversidade dos sentidos psíquicos facilita a compreensão de como dois videntes podem dizer coisas muito diferentes sobre a m esm a pessoa. A percepção psíquica é mais subjetiva do que muitos sensitivos gostariam de admitir. Uma coisa é ver algo claramente; outra, interpretá-la. Por exem plo, se você pedir a várias pessoas que analisem uma pintura e relatem o que viram, você obterá descrições diferentes. Na percepção psíquica, a informação é traduzida pelo sistem a de crença e de preconcepções da psique. Mesmo informações obtidas por meio de um transe mediúnico profundo, embora ofuscando o intelecto e os padrões conscientes, são filtradas pelo subconsciente. O grau de distorção resultante dessa filtragem por certo varia de pessoa para pessoa. A filtragem e a coloração da informação recebida são exemplos dos perigos envolvidos com o uso de poderes psíquicos antes de alguém ser um “canal lím pido”. Sem desejar fazer isso conscientemente, algumas pessoas usam essas habilidades para m anipular outras e para expandir seu próprio sentido de importância. Eis por que muitas tradições espirituais advertem enfaticam ente contra a concentração no desenvolvimento de poderes psíquicos.

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Num nível mais mundano, nós também freqüentemente usamos mal o poder inerente à percepção. Queremos com preender o que está acontecendo ao nosso redor, ou para exercer controle sobre ele ou como uma forma de proteção. Observando com o objetivo de controlar, colocamo-nos fora da experiência da vida real. Por outro lado, pessoas com o sexto chakra bloqueado não querem ver. Elas freqüentemente se rebelam contra perspectivas da vida que lhes foram impostas tanto por seus pais como pela estrutura social. Ou, devido a associações traumáticas e dolorosas, se recusam a ver vários aspectos da existência humana. N ão é raro encontrar a visão física dessas pessoas prejudicadas por essas atitudes. Sendo um crítico da vida, não a aceitando, querendo mudá-la ou controlá-la, colocamo-nos numa posição de luta contra ela. Se, cm vez disso, pudermos observá-la de uma posição neutra, poderemos chegar à paz com o mundo. Quando, ao pôr-do-sol, nos sentamos e contem ­ plamos os campos e as árvores, observando as cores mudarem no céu, ouvindo os pássaros e sentindo a calma que nos cerca, não estamos tentando controlar nada por estarm os perceptivos. Krishnamurti cham a isto de “percepção sem escolha”. A visualização pode parecer contraditória quando se cultiva a percepção sem direito • de opção, mas em níveis superiores de consciência não há necessidade de um conflito entre a percepção sem escolha e o uso criativo de faculdades mentais. Shakti Gawain, no seu livro Creative Visualization, usa uma metáfora que talvez seja útil aqui. Ela compara a vida a um rio e diz que a maioria de nós se agarra à margem porque tem medo de “ir com a correnteza”. Uma vez que aprendamos a confiar em que o rio nos levará para a frente sem perigo, podemos relaxar e fluir com a correnteza. Sentindo-nos confortáveis com isto, podemos então com eçar a antever como podemos ir com a correnteza para m elhor evitar os obstáculos.1

(1) Shakti Gawain, Creative Visualization (Mill Valley, CA: Whatev Publishing, 1978) p. 44. [Visualização criativa, Editora Pensamento, São Paulo, 1990.]

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Não é o que vemos mas o modo com o vemos que determ ina a nossa experiência. Numa velha história hindu, uma pessoa vê uma corda no chão, no escuro e im agina tratar-se de um a cobra. Seu comportamento subseqüente baseia-se por com pleto em sua fantasia. Do mesmo modo, nossa experiência da realidade é quase inteiramente baseada na projeção psicológica. Estamos presos às ilusões do ego e à sua experiência sam sárica, e não vemos a natureza absoluta do mundo. Não seria benéfico, portanto, desenvolver um método mais iluminado de “visualizar o m undo”? Você pode imaginar-se com o uma pessoa mais relaxada e aberta, fluindo entre as margens do aqui-e-agora enquanto perm anece ligado à sua fonte? Pode você ver-se simplesmente sendo perccptivo e apreciando a beleza e o mistério que se desvela, ou observando as cenas mais desagradáveis sem reação ou identificação, à medida que segue o sinuoso curso da vida? Você pode visualizar-se como um Buda? Habitando serenam ente na Luz Clara, cujo brilho você percebe através do fluxo dos fenómenos efêmeros, você está unido à esseidade da vida e à Bem-aventurança e Com paixão que emanam do coração do Vazio.

A Mente e o Corpo Mental Q uando estamos atentos a algo, é a mente que tom a esse algo consciente e lhe dá significado. A mente, todavia, não e consciência. E um veículo da consciência c, com o o corpo, tem lorm a c funções. Ela pode ser desenvolvida e usada de forma apropriada, ou pode ser lesada e tornar-se enfermiça. A mente também pode ser com parada a um espelho. Através dela não conhecem os as coisas em si mesmas, mas apenas pelos efeitos nela produzidos. Esse espelhamento está sujeito a distorções. Nossa experiência do mundo c resultado das funções da mente. Somos, portanto, vítimas da sua estrutura, de seus padrões conceituais e modos de atração.

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Antes de considerar o modo como os budistas vccm a mente, vamos exam inar suas várias facetas levando em conta a anatomia do corpo mental e suas relações com o sistema nervoso c o cérebro. A ciência m oderna tem sido frustrada na tentativa de compreender o pensamento e a consciência porque a fonte desses fenômenos está no corpo mental, e não nos processos eletroquímicos do tecido nervoso. Eu gostaria de sugerir que o sistema nervoso nada mais é que a “ instalação elétrica” que transporta os sinais dos e para os órgãos físicos da consciência. Não é a mente que está no corpo físico ou no cérebro, o corpo e o cérebro é que estão na mente, ou corpo mental, o qual, como o corpo astral, mas numa freqüência mais alta, envolve o corpo físico. O cérebro e o sistema nervoso são um biocomputador magnífico cujo sistem a de sinais é elétrico e químico. As várias funções do cérebro são operadas por uma com plicada rede de neurônios. Quase todos os neurônios recebem entradas de muitas centenas, às vezes milhares, de outros neurônios. O sistem a nervoso central inteiro (o cérebro e a medula espinhal) consiste em bilhões de neurônios. A informação sensorial atua como entrada de dados no biocom putador, o qual, por sua vez, processa os dados e envia os sinais aos neurônios motores para operar m úsculos e glândulas. J. H. W alle, em seu artigo “The Organization o f the Brain”, afirma que esse biocom putador central é composto por cerca de 99,98% de neurônios cerebrais.2 As funções intem as desse biocomputador ainda não se revelaram ao olho inquiridor da ciência moderna. O que integra e regula as complexas operações desse incrível biocomputador? Poderia ser o corpo mental via corpo etérico e chakras? Embora reconhecidamente especulativas, aqui estão algumas hipóteses de pesquisa que desenvolvi em meu trabalho como terapeuta. Quando, através da clarividência, vejo o corpo m ental, ele aparece como

(2) J. H. Walle e N. & M. Feirtag, “The Organization of the Brain", in Scientific American, Setembro de 1979, Vol. 241, p. 97.

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uma grande abóbada com um raio de nove a 20 pés envolvendo o corpo físico. A dim ensão e o brilho do corpo mental estão aparentemente relacionados com o desenvolvim ento das faculdades mentais. Um nú­ cleo com cerca de um pé de diâm etro estende-se do topo à base através do seu eixo. C om o o sistema nervoso central, este núcleo tem a função de intercam biar comunicações. Ele está ligado aos bancos de memória que emitem raios, gravando c analisando vários estím ulos internos e externos e respondendo a eles. Partes específicas do corpo mental referem-se a posições nos corpos astral, etérico e físico, os quais estão integrados através das funções m ultidim ensionais dos chakras. A infor­ mação relacionada com qualquer aspecto particular do corpo-m entc é arm azenada na área correspondente do corpo mental. A função de análise decom põe autom aticam ente todas as infor­ mações contidas no corpo mental à medida que este registra os estímulos e responde a eles. Este processo nem sempre é lógico ou benéfico, como facilmente o dem onstra uma compreensão básica dos fenômenos psi­ cológicos de associação. O processo de associação é fundamentalmente mecânico e, com o um computador, as capacidades e saídas dependem da natureza da sua programação. No cérebro, aprendizagem e m em ória estão relacionadas com o uso repetido de certos condutos neurológicos. De modo semelhante, no corpo mental, impressões fortes ou preferidas e padrões associados constituem disposições mentais aprendidas e perpetuadas. Essas respos­ tas, atitudes e configurações conceituais estruturadas são relativamente concretas no que concerne à substância do plano mental. Nosso sentido de identidade e nossa construção individual da realidade estão alicerçados nessas estruturas mentais. Embora útil, a principal dificuldade com essas construções é que elas geralm ente nos impedem de expandir os horizontes da nossa percepção. Com o qualquer aparelho de esquadrinham ento, o ego registra apenas aquelas entradas que podem ser relacionadas com a inform ação já arm azenada nos ban­ cos de memória. Experiências estranhas entram no corpo mental e não encontram program a ou modelo com que possam se associar. Elas não são espelhadas na mente, não podem ser aceitas na construção da

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realidade existente e, por isso, permanecem ininteligíveis. Tais expe­ riências ou criam confusão ou são ignoradas por completo, de modo especial quando representam uma am eaça às realidades conceituais existentes. Para com pletar nosso modelo, voltemos à fenomenologia da mente desenvolvida pelos budistas. Os antigos budistas registraram suas intuições sobre a natureza da mente em escritos que receberam o nome de Abhidharma. O Abhidharma inclui percepções dos sentidos, em o­ ções, processos mentais com plexos, transe e estados místicos de consciência. A realidade fcnom ênica é concebida pelos budistas como sendo inseparável do fluxo subjetivo de sensações, percepções, emoções e atividades mentais. A mente está continuamente sintetizando imagens e conceitos que ela crê ser a realidade. O Abhidharma exam ina o modo como a mente faz isso e quais os elementos que ela utiliza para construir essa “realidade”. Pode-se considerar os elem entos mentais usados pela mente mais como fatos do que como coisas. Esses elem entos são forças ou ten­ dências da m ente, em sânscrito chamadas de sarvantranga — literal­ mente, “que vai a todo lugar”. H á cinco elementos mentais essenciais intimaimente relacionados com as cinco Energias da Sabedoria dos Budas Dhyani. O prim eiro desses cinco elementos é chamado sparsa, “estabelecer relação ou contato”. Sparsa descreve as relações entre os objetos, os órgãos dos sentidos e a consciência que está atenta à experiência. Somente a com binação de todos esses três fatores criam a nossa experiência “real”, porque nem o objeto externo nem o observador pode ser experim entado independentemente. Este campo unificado, ou avaliação ou existência gestáltica, significa que não apenas os objetos nos afetam , mas que também a nossa percepção deles os afeta. A física modema descobriu muito recentem ente esse antigo princípio budista. O evento mental que acom panha a relação com um objeto é o vedana, ou sensação tonal. Ele está relacionado com as sensaçõesjulgamentos do segundo chakra. As sensações-julgamentos criam valo-

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res subjetivos de aceitação ou rejeição de experiências. Essas respostas geralmente são programadas a partir de experiências anteriores de prazer ou dor. Elas também podem ser influenciadas por condicionamentos sociais passados ou presentes. À medida que a intensidade da sensação aumenta, ela se torna um efeito, alterando e direcionando o corpo-mente para a ação apropriada. O terceiro processo mental dá sentido aos dados de entrada. Esse processo cham a-se samjna. O aspecto principal do sam jna é conhecer por associação, e está estreitam ente ligado à função do ego e, portanto, à socialização. Qualquer pensam ento na mente im plica a existência de alguém agindo ou pensando. Essa função de conceituação da mente pode ser usada em qualquer nível de experiência, do mais mundano ao mais sublime. Antes da ação, ocorre um processo mental para galvanizar a mente. Essa função dinâmica cham a-se ceiana, traduzida com o volição. Por mais sutil que ela possa ser, quando a mente se detém num objeto ou pensam ento, isto é um ato de volição — houve uma decisão de focalizar o objeto da atenção. Há algum a razão ou m otivo por trás daquilo a que prestamos atenção. Os budistas também se referem a essa força cetana com o a “m ente-m acaco”, porque ela está sem pre pulando de uma coisa para outra. Agora você está bem ciente desta irrequieta força cetana. Quando, nos capítulos precedentes, você experimentou fazer as meditações, deve ter observado a tendência de a mente ser arrastada de um a idéia ou lembrança para outra e de ser afetada pela atenção da nossa entrada sensorial. A mente parece ter mesmo uma mente própria! Essa é a força cetana. Com o com plemento da força cetana, temos a manaskara, traduzida como “concentração” ou “aplicação”. A mente corre selvagem, a menos que seja domada. Há dois aspectos dessa força de concentração. O primeiro é o samadhi, a capacidade de estabilizar a m ente num único objeto de pensam ento e, segundo, o prajna, a capacidade de manter uma atenção precisa ou intensificada. O sam adhi normalmente é associado a um estado profundo de meditação, em bora também possa denotar um estado de concentração

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intenso porém descontraído. Esse estado dissolve toda separação que possa existir entre nós c qualquer atividade em que possamos estar envolvidos. Quando um artista está pintando, por exemplo, ele está completamente absorto no seu trabalho. Nesse estado de sintonização com o que estamos fazendo, todos os cinco processos mentais estão operando em harmonia. O prajna é um elemento mental muito respeitado. Ele nos proporciona a capacidade de um a compreensão precisa de todos os outros eventos mentais. Por isso é considerado a mãe da sabedoria. O prajna também tem duas qualidades: a primeira é discriminadora, capacitando-nos a articular os outros eventos mentais; a segunda qualidade e a da valoração. Não só podemos ter muita clareza em nossa percepção das experiências, mas podemos ainda avaliar as qualidades singulares inerentes à sua com posição assim que se formam na matriz de nossos eventos mentais. Há certa beleza nessa fusão da atenção com esse misterioso fluxo de eventos. E há jovialidade e brilho no olhar quando esse aspecto da sabedoria sorri de dentro de nós. Walt Andcrson, em Open Secrets, dá a conhecer uma metáfora que ouviu de um mestre budista. A mente pode ser comparada a um bando de aves que revoam em formação mudando constantemente de forma e direção. Quando começamos a observar a mente, ela se move de um lado para outro como essas aves. Às vezes somos o observador, às vezes o bando de pássaros. Quando aprendermos a ser ambas as coisas ao mesmo tempo, teremos desenvolvido o prajna, o “poder da atenção simultânea”, como é chamado algumas vezes.3 Quando estudamos os eventos da mente, tom am o-nos cônscios do seu movimento incessante, um caleidoscópio de imagens compostas de padrões intrincados de processos mentais, preconceitos, sensaçõesjulgamentos, lembranças, associações, tudo mudando muito rapida­ mente. Através da auto-observação começamos a ver como muitos de

(3) Walt Anderson, Open Secrets (Nova York: Penguin, 1979), p. 50.

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nossos problemas originam -sc dc interpretações errôneas, de projeções, de desejos e dc aversões. Tudo isso surge nos processos dos eventos mentais, nenhum dos quais está envolvido com a Realidade Absoluta.

A Mente Búdica Conta-se que, quando Buda atingiu a iluminação, perguntaram-lhe o que havia obtido. Ele respondeu com um sorriso: “ Nada.” Na m editação profunda, a mente tom a-se concentrada e observadora e podemos ver com o todos os fenômenos mentais são processos vazios. Neles, não há “self” a ser encontrado. Quando temos uma percepção profunda do vazio do self e do vazio dc todos os fenômenos, essa percepção subjuga o nosso desejo de aderir a qualquer objeto ou condição mental. Na última seção eu disse que a mente é como um espelho; no entanto, se procurarm os por esse espelho não o acharemos. Ele é transparente, claro, um a percepção lúcida que permite que as coisas se reflitam nele mas, quando o objeto é removido, a mente em si é invisível. A natureza absoluta da Mente pode ser experimentada diretamente como o estado supremo da consciência, mas não pode ser conceitualizada ou com preendida intelectualmente. Os budistas referemse a ela com o o Dharmakaya, que significa o corpo da verdade, ou o corpo sem forma de Buda (a personificação da Mente Iluminada). A meditação, em últim a instância, leva à condição dc “ não mente”, um estado além da dualidade inerente às atividades mentais normais, para experim entar a pura lucidez da M ente Iluminada. Há quatro métodos básicos para viabilizar o alto nível dc concentração necessário a esse esforço. Esses métodos são: o uso do mantra, a visualização, a respiração e a postura. A palavra mantra vem do nome sânscrito manas, que significa mente, c da raiz verbal tra, proteger. Os mantras protegem a mente dos pensamentos instáveis. Mantras são forças cósmicas personificadas na estrutura do som. Cada m antra contém vibrações com poderes específicos. A repetição de um mantra produz certos ritmos c padrões

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de energia psíquica nos corpos sutis, ritmos e padrões esses que desfazem bloqueios c abrem caminho para a energia Kundalini. Intimamente ligados aos mantras estão os yantras, os quais personificam forças cósm icas em diagramas geom étricos ou circula­ res. Cada yantra tom a visível os padrões de força ouvidos no mantra. (Veja fig. 28.) A visualização de yantras concentra e focaliza a mente na meditação. Os yantras, também cham ados mandalas, são compostos por configurações gráficas abstratas ou por figuras de divindades colocadas em composições geométricas. Identificar-se in­ teiramente com o yantra é compreender, ou libertar, as forças inerentes que cada form a denota. Os yantras ou mandalas não são exclusivos da tradição tântrica; eles são facilmente associados a projeções arquetípicas de dimensões

Fig. 28. O Shri Yantra representa o cosmos criado pelo equilíbrio dos princípios masculino e feminino, aqui simbolizados pelas várias combinações de triângulos que apontam para cima e para baixo.

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transpessoais da psique encontradas em todo o mundo. Jung percebeu que seus pacientes espontaneamente desenhavam padrões de m andala/ yantra e sonhavam com eles, especialm ente quando todas as funções de cura ou de criação do Self estavam ativas. Ele também notou que essas expressões do Self são evidentes em muitas culturas através do curso da história. Tam bém intim amente associado à entoação de mantras e à vi­ sualização de yantras e divindades está o uso de posturas específicas do corpo, cham adas mudrás. As mudrás estão funcionalmente relacionadas com certos estados de consciência e com o m ovim ento de energias psíquicas pelo corpo. Enquanto alguns desses gestos da m ão e do corpo são sim bólicos, não é raro pessoas perceberem seus corpos movendo-se espontaneam ente em mudrás específicas no m om ento em que ex­ perimentam o despertar de forças espirituais. Quem quer que tenha passado por essa experiência pode prontam ente testem unhar que as forças com o que m agnéticas que modelam o corpo durante esses encontros intensos com energias psíquicas poderosas não são gestos simbólicos. São expressões literais dessas forças. Uma m udrá de meditação muito comum é a posição de lótus ou posição vajra, a mudrá do Buda Dhyani Varicona. As m ãos repousam no regaço um a sobre a outra. Para o homem, a direita sobre a esquerda; para a mulher, a esquerda sobre a direita. As pernas se dobram de maneira que as solas dos pés fiquem voltadas para cim a. Nessa posição, a energia recircula através dc todo o corpo, em vez de perder-se pelos membros. Essa posição é muito estável, e a coluna fica perfeitamente ereta, perm itindo um fluxo livre do ar vital através dos principais canais de energia ao longo da espinha. Esta mudrá propicia paz e tranqüilidade e representa um equilíbrio harm onioso de energias. Exercícios de respiração, em sânscrito cham ados pranayama, são também usados para aquietar e concentrar a mente. A respiração está diretamente relacionada com estados emocionais e m entais. Quando estamos am edrontados ou com raiva, a respiração é rápida. Quando em estado de choque ou co ncentrados, a respiração pode parar. Inversamente, a respiração pode ser usada para controlar ou alterar

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estados emocionais e mentais. Um padrão de respiração lento, profundo e regular tem um efeito muito calmante e tranqüilizador sobre o corpomente. Algumas formas de meditação baseiam-se quase que exclu­ sivamente nesse método simples. Usando a respiração como objeto de concentração, a mente é acalm ada e conduzida à meditação. Técnicas respiratórias mais com plicadas são usadas em conjunto com visua­ lizações elaboradas para circular o ar vital (a respiração) e dirigi-lo ao canal central. A palavra sânscrita prana com freqüência é traduzida sim ­ plesmente como respiração. Na verdade, ela conota uma força vital rarefeita que permeia e sustenta todas as formas manifestas. Ayama significa expansão ou retenção. Pranayama, portanto, significa expansão ou retenção da força vital, de form a que o corpo-m ente possa ser vitalizado no seu potencial mais elevado. Um fenômeno básico associado ao sistema nervoso é importante aqui. O sim ples fato de dirigir a atenção a uma área específica do corpo estimulará o sistema nervoso nessa região. A concentração intensa envolvida na prática da m editação sobre os chakras e os exercícios respiratórios especiais do Tantra estimulam o sistem a nervoso. A localização dos chakras no corpo etérico coincide com os principais nervos e gânglios ao longo da coluna. Do tamanho da medula espinhal, esse canal pode transmitir uma carga neurológica tremenda. Porque a concentração repetida nos chakras ativa condutos neurológicos, a habilidade e preferência da medula espinhal para propagar cargas elétricas de grande magnitude é aumentada. O Tantra sustenta que alguns dos principais canais psíquicos do corpo etérico são equivalentes sutis do sistema nervoso. Diz-se que o prana flui através desses canais. Um fluxo ampliado de corrente elétrica é, portanto, resultado do prana em movimento através dos canais sutis do corpo etérico. À medida que abrim os esses canais e aprendemos a dirigir a força prânica através deles, alteramos gradualm ente a anatomia e a capacidade dos corpos sutil e físico. Acredita-se que o prana entra no corpo através dos chakras do corpo etérico. A doutrina tântrica delineia cinco classificações distintas

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dos ares vitais, correspondendo à m odificação do prana de acordo com sua localização e função nos chakras. Duas delas representam o foco principal das técnicas respiratórias. Apana, a respiração para baixo, está localizada no prim eiro chakra, e prana, o ar vital principal, está relacionado com o centro do coração. O prana é m anipulado para fluir para baixo, vitalizando a energia prim ordial latente da Kundalini e promovendo a subida do apana. Invertendo seus cam inhos Usuais e juntando-os no terceiro chakra, uma grande quantidade de calor psíquico é gerada. Esse fogo interior é usado para abrir o canal central. Entre as m uitas mandalas e yantras do Tantra, o corpo-m ente é a mais im portante. Com põem -no os ritm os e forças que se movem através de toda a criação. Ele é, portanto, um sím bolo potente do cosm os. Seus poderes e segredos são revelados pela liberação e harmonização do fluxo da força vital através dos chakras. Pelo uso preciso da postura do corpo, do mantra, do controle da respiração e da visualização, podemos focalizar e purificar o corpo-m ente, criando condições favoráveis para que a luz C lara da M ente búdica inunde o canal central e penetre na nossa consciência com o a luz do Sol num quarto escuro.

O Ioga da Divindade O ioga da Divindade é uma técnica muito eficiente para transformar a m ente finita em M ente búdica. Este aspecto do Tantra é tão positivo que se diz que leva à ilum inação em uma só vida. Para praticá-lo corretam ente, precisamos estar antes na posse de três princípios: 1) renúncia, a determ inação de desprender-se da identidade do ego e de sua visão do mundo; 2) compaixão, o desejo ardente de tom ar-se um Buda em favor de todos os seres sencientes; e 3) a visão correta, a consciência profunda de que todos os fenômenos são temporais e destituídos de existência inerente. Já discutim os os dois primeiros princípios; vam os considerar agora o terceiro. A palavra sânscrita para Vazio (Shunyata) significa literalmente vacuidade, mas tem um a conotação m ais sutil quando usada na filosofia budista. O conceito de vazio relaciona-se à experiência, com preendida

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na meditação, de que não há princípio permanente nas coisas. Não existe substância independente e irredutível a partir da qual as coisas são feitas; portanto, nada existe de e por si mesmo. Todas as coisas são compostas por outros elem entos temporais, que surgem continuamente, combinando-se e desaparecendo do e para o grande nada do Vazio. Quando olhamos para o m undo físico, vemos normalmente as formas delim itadas dos objetos, mais do que o campo em que esses objetos aparecem. Do m esm o modo, os pensamentos predominam na mente, c o espaço em que ocorrem é ignorado. O Vazio é como o espaço negativo no qual as coisas existem. Todavia, longe de ser um estado vazio ou negativo, é um estado muito positivo, um estado que contém um potencial infinito. Essa abertura é onipresente e pressuposta por todo o objeto. Todas as coisas extraem dele sua forma e só existem em relação a ele. O Vazio é a Realidade últim a e sem forma. É um mistério indefinível, em que o fluxo incessante da realidade fenomênica existe. Compreendê-Lo como a verdadeira natureza de si mesmo é tom ar-se um Buda; não com preendê-Lo é perm anecer no estado de existência cíclica e na ilusão. Através de um estado elevado de atenção, o Vazio é expe­ rimentado como consciência pura. Há um tremendo sentido de liberdade nesse estado, uma sensação de ter ido além. A natureza essencial da mente é com o o espaço; é toda permeante. Em sua instrução Mahamudrá, o iogue M ahasiddhi Tilopa diz-nos para permanecermos silenciosos e relaxados, para ficarmos quietos e deixar que o som reverbere com o um eco vazio. Quando formos capazes de manter a mente cm silêncio, então veremos o fim de todos os mundos. A compaixão e a renúncia são o portal e o caminho para o Tantra tibetano; a meditação profunda sobre o Vazio é a morada da tranqüilidade. Através do ioga da Divindade unimo-nos à mente da divindade que habita neste lar sereno. Para com eçar, precisamos aprender a destilar os cinco agregados essenciais da mente (skandhas). A palavra sânscrita skandha significa carregar ou “sustentar”. Como aprendemos no estudo do Abhidharma, os cinco skandhas (elementos mentais) dão

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suporte às ilusões da realidade do nosso ego. Quando esses elementos da mente são transform ados em sua natureza prim itiva, as sombras da mente finita são purificadas pela claridade transparente da Mente búdica. O verbo sânscrito nirva significa literalmente “extinguir . Sua conotação, quando usado no Tantra, refere-se a um fogo que se extingue porque o com bustível se esgotou. Quando os cinco skandhas são transmutados, não há mais combustível para o ego mental. A consciên­ cia é então purificada das m áculas que obscureciam o seu vácuo essencial. Em sânscrito, esse estado de consciência cham a-se jnana. Tanto a palavra jnana com o prajna contêm a raiz jn a , ligada aos potenciais cognitivos da consciência. O prefixo pra significa elevar ou “intensificar”. Portanto, prajna refere-se a uma intensificação das facul­ dades cognitivas. A consciência é assim purificada de suas obscuridades, e a claridade transparente do Vazio é percebida. Jnana refere-se à natureza prim ordial da M ente búdica. Enquanto o Vazio é um objeto percebido pela qualidade prajna, jnana preexiste a uma dualidade entre sujeito c objeto. Jnana é a coisa em si, não-dual, da prístina Consciência do Vazio personificada cm Vajradhara, o Adhibuddha. Vajradhara é venerado com o o guru raiz, porque Ele e a forma que a Mente búdica assume para ensinar o Tantra. Prajnaparam ita, consorte de Vajradhara, representa a cognição cm seu estado mais sublime (prajna) vivenciando Sabedoria Transcendente (param ita). Ela perso­ nifica a Sabedoria da Praia Além, a consciência que nos transporta através do oceano da existência cíclica. Um ritual de m editação diária, cham ado guru puja, é praticado para que você se transforme no estado elevado de uma personificação de Vajradhara e Prajnaparam ita. Este é um exem plo do ioga da Divindade. Há vários m étodos tântricos budistas superiores mais complicados que se baseiam num a divindade particular e em sua hoste de auxiliares. Essas divindades com o Hevajra, Chakrasambhara, Guhyasamaja e Kalachakra têm, todas elas, suas próprias mandalas e métodos diferentes de trabalhar com os chakras e canais sutis, e até mesmo diferentes descrições dos mesmos.

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As diferenças nos vários sistemas lântricos podem provavelmente ser explicadas pela distância no tempo e no espaço que os separa. Assim como os motivos universais encontrados no mundo da mitologia manifestam características individuais de várias culturas, também os elementos arquetípicos dos rituais tântricos aparecem como expressão única nas diferentes seitas. Devido à natureza m ística e simbólica desses sistemas, não é apropriado julgar qual deles é o mais correto, ou mesmo desejável. A menos que você esteja sendo guiado por um mestre ligado a um método em particular, é melhor aproxim ar-se desses assuntos com a mente aberta. Por isso, tem sido minha intenção apresentar princípios básicos c encorajá-lo a estar alerta à sua própria intuição. Por exemplo, minhas experiências com o despertar do Fogo Interior não se adaptaram ao “dogm a” dos ensinamentos em que fui iniciado. Os budistas dizem que introduzir a mente cm práticas tântricas elevadas de ioga da Divindade sem antes prepará-la é com o jogar uma pedra na água; ela não absorverá nada. Tradicionalmente, além das meditações Refúgio, Intuitiva, Vajrasattva e Chõd, o estudante também executa 100 mil prostrações e oferendas de m andala ao guru-raiz Vajradhara e a toda a linhagem de mestres budistas. O valor dessas práticas preliminares não pode ser suficientemente enfatizado. Elas são a razão primeira da eficácia do m étodo tântrico. As práticas tântricas superiores apresentam-se em estágios: o estágio de geração, em que imaginamos o movimento do ar vital atra­ vés dos canais e a nós mesmos como a divindade em sua mandala; e o estágio de realização, em que o ar vital realmente entra e se dissolve no canal central e nos tomam os uma encarnação literal da divindade. Daniel Cozort, em Highest Yoga Tantra, ira ta da importância do “orgulho divino” no estágio de geração. É como uma forma de autohipnose em que acreditam os ser, e agimos como se fôssemos, a divindade em meditação. Pelo cultivo dessa auto-imagem divina, não apenas em meditação mas em todas as atividades de cada dia, ficamos protegidos da nossa percepção ordinária do mundo. O “eu” criado neste 186

ioga da Divindade baseia-se na nossa com preensão do vazio e é um antídoto poderoso contra as ilusões comuns do ego-self.4 Q uando o ar vital entra no canal central, a pressão da inalação e da exalação e a quantidade de ar que se move em cada narina são iguais. Em níveis mais avançados de prática, a respiração torna-se mais lenta e, afinal, parece parar. Com a manipulação do ar vital, também somos instruídos a usar a união sexual (com um consorte ou visualizado) para unir sua bem -aventurança com a nossa contem plação do vazio. A união dos dois produz as condições necessárias para que a M ente búdica seja compreendida. O exem plo de m editação que segue é com posto de práticas tântricas superiores, incluindo uma breve guru puja para Vajradhara, os Quatro Reforços Tântricos, uma técnica respiratória cham ada R espi­ ração do Vaso, visualização do ar vital e dos canais de energia sutil, trabalho com o Fogo Interior e um a form a condensada do Tantra de Shri Chakrasambhara. Deve-se observar que essas diferentes práticas tradi­ cionalm ente não são com binadas desta maneira. Esta sim ulação apenas ilustra os com plexos elementos envolvidos nos m étodos tântricos superiores.

O Tantra de Shri Chakrasambhara Chakrasam bhara é uma expressão iracunda de Vajradhara usada num ritual de m editação para obter a iniciação na Grande Bem-aventurança. Sambhara significa literalm ente “coleção” ou “juram ento”. A m andala de Chakrasambhara (que inclui cerca de 62 dividandes) repre­ senta a Suprem a Bem-aventurança. Porque o Tantra de Shri Cha­ krasambhara tem o poder de libertar-nos da roda da existência cíclica, ele é realizado numa vasta área de crem ação que sim boliza o fim da existência mundana. Diz-se que V ajradhara passou este Tantra ao guru

(4) p. 117.

Daniel Cozort, Highest Yoga Tantra (Ithaca, NY: Snow Lion, 1986

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celestial e Bodhisattva Vajrapani, o qual, por sua vez, deu-o ao budista indiano santo, Saraha. Ele passou de mestre a mestre desde os tempos antigos, incluindo mestres veneráveis, como Tilopa e Naropa. Na vasta extensão do céu, há um trono dourado sustentado por oito leões (simbolizando o destem or e a vitória sobre os poderes detestáveis). Sobre esse trono está um lótus absolutam ente branco (inviolado pelo mal), em que a Lua e o Sol descansam como almofadas (respec­ tivamente, a dispersão de toda a escuridão da ignorância espiritual e a emanação da luz da consciência transcendente). Aqui, sentado na posição de lótus, Vajradhara segura o cetro e o sino (sabedoria e compaixão) na mão esquerda e direita, que se cruzam em frente ao coração. Seu corpo é da cor do azul do céu da meia-noite e está adom ado com jóias e seda celestial. Ele está resplandecente de luz e aureolado pelo arco-íris de cinco cores dos Buda Dhyani que partiram para a Bem-aventurança. (Veja fig. 29.) Agrupados abaixo de Vajradhara, estão todos os gurus que foram discípulos do Guru-Raiz Vajradhara. À esquerda está o Buda Shakyamuni na forma em que aparece na meditação do Refúgio. Acima de Vajradhara, senta-se Prajnaparamita (fig. 30, p. 190). Seu corpo é da cor do azul-claro do céu diurno. Suas mãos se encontram na frente do coração na mudrá do “elo de expansão”, significando coroação ou casamento entre o acima e o abaixo. Uma haste de lótus, presa na mão esquerda, levanta-se para apoiar um livro sagrado que contém os ensinamentos sobre o Vazio. À direita de Vajradhara estão os Bodhisattvas Tara (fig. 31, p. 191) e Avalokiteshvara, que representam a com unidade inteira dos praticantes budistas. Reconhecem os a linhagem dos m estres iluminados e solicitamos suas bênçãos e assistência. Eles então se dissolvem no Guru-Raiz, Vajradhara, que os incorpora. A seguir Shakyamuni, Prajnaparamita, Avalokiteshvara e Tara se dissolvem em Vajradhara. Você pode orar com suas próprias palavras ao G uru-Raiz para que ele abençoe o seu fluxo mental, purificando-o de suas máculas. Orações tradicionais aju­ dam no desenvolvimento da Grande Compaixão, da renúncia sincera e

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Fig. 29. Vajradhara é considerado o Buda Supremo (Adibuddha) por duas das principais seitas do Budismo libetano. Ele é venerado como o Gum-Raiz e como a forma que a Mente búdica assume para transmitir os ensinamentos tântricos. Pintura contemporânea de Àge Delbanco, reproduzida com permissão do artista.

Fig. 30. Prajna Paramita é a divinização da escritura budista do mesmo nome. Ela personifica a Sabedoria Transcendente e por isso é considerada a "Mãe de todos os Budas . Algumas seitas do Budismo tibctano identificam-na como consorte de Vajradhara, o Buda Supremo. Da coleção Avery Brundage, Museu de Arte Asiá­ tica de São Francisco, Golden Gate Park, São Francisco, CA. Reproduzida com permissão.

Fig. 31. Tara é uma das mais populares deusas do Tibete; há dela 21 expres­ sões diferentes. A lenda diz que Tara nasceu de uma lágrima que caiu do olho do Buda da Compaixão (Avalokiteshvara) quando ele olhou para a humanidade e sentiu todo o seu sofrimento. Com a inocência e a pureza de uma adolescente de 16 anos. Tara prometeu libertar todos os seres sencientes. Seu nome tibetano, Dolma, significa libertadora. Da coleção thanka de Sergei Diakoff, reproduzida com permissão.

da correta visão da vacuidade. Finalmente, solicitamos permissão para praticar os dois estágios tântricos de geração e realização. Vajradhara então lhe tom ará propícios os quatro reforços tântricos. Do branco OM no seu sexto chakra, a luz derram a-se sobre a pequena gota de luz no canal central em seu próprio sexto chakra. O Vaso da Iniciação é oferecido, purificando e corrigindo os canais de energia sutil em seu corpo. Isto o revigora para realizar os estágios de desen­ volvimento das práticas tântricas superiores e planta a semente que desabrochará num Corpo de Emanação de um Buda (Nirmanakaya). Receber esses reforços perm itir-lhe-á refletir sobre a importância e potencial criador do seu corpo físico. Quando purificado, ele será o veículo da Mente búdica. A seguir, a luz verm elha do AH do seu chakra laríngeo irradia e ativa a gota de luz do seu chakra da garganta (no canal central). O ar vital que, entre outras coisas, gera a palavra, é assim purificado — a Iniciação Secreta. Isso o revigora para que use o m antra corretamente, levando-o a m editar sobre os sistemas de energia sutil do corpo, e planta a semente para o desenvolvim ento de um Corpo Ilusório de um Buda (Sambhogakaya). Esse corpo é mais permanente do que a forma temporal que você possui agora; ele sobreviverá à morte física. Esse reforço também transforma seus modos de comunicação interna e externa. Assim como algum as pessoas falam desatentamente sobre coisas essencialmente insignificantes, também suas mentes estão taga­ relando sem parar. O uso do m antra é comunicação num nível diferente. Ele cria uma relação com verdades superiores e protege sua mente de sua divagação neurótica habitual. Agora, a luz azul do HUM do chakra cardíaco de Vajradhara brilha em seu chakra do coração. A gota de luz do canal central é ativada à medida que você recebe o Reforço da Sabedoria. Isso o capacita a engajar-se na prática da esseidade não-dual e planta a semente para o Corpo da Verdade de um Buda (o Dharmakaya). As pessoas normalmente criam conceitos e imagens mentais para representar ou rotular eventos e, então, confundem esses rótulos e imagens com a realidade que representam. Essas “visões errôneas”, e a predileção por

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criá-las, são interrom pidas pela M ente Vajra através desse reforço. Além disso, os ventos que se movem pelos canais sutis são purificados. A transformação de desejos mundanos na Grande Bem -aventurança é potencializada e você se transform a num receptáculo para essa beatitude. O Reforço da Palavra integra as outras três iniciações. Por isso você deverá visualizar os raios branco, vermelho e azul dirigindo seu brilho para os três chakras superiores. Isso purifica a base subjacente de todas as obstruções à onisciência. Você é assim transformado num repositório para a Suprem a Perfeição. Quando esta iniciação é orientada por um lama, você recebe perm issão para praticar M ahamudrá (que será analisado no próxim o capítulo). Vajradhara é a personificação da unidade do Vazio básico do qual emanam as cinco Energias da Sabedoria. Por meio do ioga do guru, você está unindo o seu corpo, a sua fala e a sua mente com ele a fim de fundir-se cm seu Estado de Ser.5 Neste ponto, você deverá visualizar a si mesmo transform ando-se em Vajradhara. A medida que sua mente entra em concentração focalizada sobre o Vazio, você se dissolve na Luz Clara. Quando você não conseguir m ais perm anecer neste delicado equilíbrio de ausência de pensam ento, sua mente aparecerá na forma de uma lua crescente, branca, com traços de vermelho. Abaixo dela, no espaço, visualize um disco solar no centro de um lótus de oito pétalas. Há outro círculo em torno deste; ele tem um lótus azul de oito pétalas e é a Mandala da Mente. Fora deste, outro círculo contém um lótus vermelho de oito pétalas, a M andala da Palavra. Em volta deste está a Mandala do Corpo, branca, com oito pétalas.

(5) Para maiores informações sobre o ioga do guru e os Quatro Reforç Tântricos, reporte-se a The Mahamudra: Eliminating the Darkness o f Ignorance, do Nono Karmapa, Wang-Ch’ug Dorje, traduzido e editado por Alexander Berzin (Dharamsala, índia: Library of Tibetan Works and Archives, 1978), pp. 17-20. 193

Formando um santuário, tudo isto está circundado por um imenso templo quadrado (fig. 32 p. 195). Suas paredes são feitas de cinco materiais preciosos: no nível da base, uma substância negra semelhante ao ônix; sobre esta, conchas brancas; a seguir, ouro, rubis e, finalmente, esmeraldas. Um telhado de estilo chinês apóia-sc sobre esses materiais. Cada parede tem uma entrada e um pequeno pórtico sustentado por pilares. Uma cornija de quatro níveis, de cor azul no portão leste, verde no norte, vermelho no oeste e am arelo no sul, repousa sobre esses pilares. Circundando o templo, há uma parede de chamas, o fogo resplandecente da Sabedoria Transcendental. Em itindo raios alem desse templo, há oito Grandes Campos de Cremação. Cada um deles tem uma grande árvore, um rio, um fogo e um santuário; sobre cada um deles paira também uma grande nuvem. Este cem itério imenso existe no topo do Monte Meru, o ponto mais alto imaginável do mundo. Os seguintes devatas habitam nos oito cem itérios; o Indra, amarelo, sobre seu elefante segurando um raio-trovão; o Yaksha, am are­ lo, sobre um cavalo segurando uma clava; o Varuna, branco, sobre Makara com seu focinho; o Yama, azul, sobre um búfalo segurando uma lança; o Ágni, vermelho, com quatro braços, cavalgando uma cabra; o Rakshasa, negro, segurando uma espada e um crânio c montado num cadáver revivido; o Marut, verde, empunhando um estandarte c cavalgando um veado, c o Vang-Dan, branco, m ontado num boi com um raio-trovão de três pontas. Todos esses devatas estão acompanhados de suas consortes e olham fixamente para você, que agora aparece como Devata-chefc no centro dos círculos concêntricos da m andala quádrupla. Como Chakrasam bhara (fig. 33, p. 197), você deve visualizar o seu corpo com o um azul-celeste translúcido e profundo maculado com as cinzas dos cam pos de cremação. Você tem uma face e dois braços cruzados diante do seu coração abraçando sua consorte, Ioguine Vajra. (Chakrasambhara também aparece com 16 braços e quatro faces.) Em suas mãos, você segura um cetro vajra e um sino. Para significar que adquiriu a medida colmada de méritos, seu cabelo está amarrado em nó no alto da cabeça. Está enfeitado com uma pedra preciosa que concede

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Fig. 32. Mandala Chakrasambhara. Esta é a mandala visualizada no Tantra Chakrasambhara, uma das práticas tântricas mais esotéricas e elevadas. Ela mostra o lótus central de oito pctalas, as quatro dakinis em seus pontos cardeais c, no interior, os dcvatas principais, Chakrasambhara e loguine Vajra. Fora desse es­ paço, as très mandatas do corpo, da palavra e da mente. Um templo localizado en­ tre oito campos de cremação circunda todo o conjunto. Da coleção Avery Brundage, Museu de Arte Asiática de São Francisco, Golden Gate Park, São Fran­ cisco, Califórnia. Usado com permissão.

todos os desejos àqueles que oram a você. Uma lua crescente repousa no lado esquerdo do nó; isto mostra que você atingiu o nível mais elevado de consciência. No topo do nó, há um cetro vajra multicolorido de quatro pontas que denota que suas ações servem a todos os seres. Você usa ainda uma coroa de cinco crânios secos porque consumou as cinco sabedorias dos Budas Dhyani. Um colar de 50 cabeças austeras representa as letras do alfabeto sagrado. Para m ostrar que a deusademônio do desejo foi dom inada, você franze as sobrancelhas e mostra suas presas. Você também usa uma pele de tigre folgada, para demonstrar seu desprezo heróico pela crença na realidade da matéria e da mente. Você está sério, enérgico, inflexível e inspira temor; todavia, você é com passivo e está sem pre pronto a salvar as alm as errantes subjugadas por paixões e pensamentos irrequietos. Para dem onstrar que ainda existe no mundo dos seres sencientes, você pisa com a perna direita esticada sobre o corpo vermelho macérrimo da deusa do tempo. Sua perna esquerda, curvada, descansa sobre uma figura negra para lembrar a todos os seres que evitem doutrinas extremadas, com o a doutrina de que o Nirvana é a única realidade. Seu corpo é viril e gracioso quando você abraça Ioguine Vajra. Ela é vermelha, a cor da paixão e do am or intenso, porque ama todos os seres. Ela o agarra ardentem ente, contudo é tão sensível ao seu menor m ovimento que você mal pode sentir o seu toque. E la tem dois braços; o esquerdo o abraça e segura um recipiente em form a de crânio cheio com o seu sangue. Ela então concede a sua essência — a Suprema Bemaventurança. Sua mão direita segura a faca vajra, com a qual corta todos os pensamentos discursivos e desejos obscurecedores. Para mostrar que desatou o nó que segura todas as coisas quando aparecem, seu cabelo pende longo e solto. E la está nua, expondo a verdade do seu ser livre de todos os véus do desejo e dos conceitos errôneos. Ela tem três olhos, está coroada com cinco crânios secos e usa cinco enfeites de ossos. Suas pernas estão entrelaçadas na altura dos quadris. Sua união sexual com você faz com que os dois se tomem inseparáveis da unidade da Sabedoria e Bem -aventurança Supremas.

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Fig. 33. Chakrasambhara e Ioguine Vajra. Chakrasambhara é uma forma iracunda do Adibuddha, Vajradhara, usada em métodos tântricos avançados. Sua consorte, loguine Vajra, é uma das principais deusas do Tantra tibctano. Ela está associada à vacuidade, que é a matriz de onde emerge toda a criação, sendo portanto considerada a "Mãe da Criação". Pintura contemporânea feita por Àge Delbanco, reproduzida com permissão do artista.

Nas quatro pétalas de lótus das quatro direções cardeais da mandala interior que circunda os dois, quatro jovens dakinis nuas com longos cabelos revoltos estão cm pé com a perna direita esticada. Cada uma tem uma face, três olhos, estão coroadas com cinco crânios secos, usam colares de 50 cabeças secas e presas projetando-se de sorrisos sensuais. Nas duas mãos direitas elas seguram um a faca curvada e um pequeno tam bor de duas faces. Nas mãos esquerdas, seguram um recipiente cm forma de crânio e um bastão. Cada dakini tem na lesta um OM branco sobre um disco lunar, na garganta um AH vermelho num lótus e no coração um HUM azul dentro de um disco solar. A dakini negra posiciona-se na pétala oriental, a dakini verde na pétala ao norte, a dakini vermelha está sobre a pétala ocidental e sobre a pétala ao sul está a dakini amarela. Sobre as pétalas de lótus dos quatro pontos intermediários da bús­ sola estão quatro umas feitas de metais preciosos. Elas estão cheias com as águas da sabedoria. Sobre elas estão crânios cheios com os cinco nécta­ res, compondo assim o Chakra (roda) da Suprem a Bem-aventurança. Além deste ponto, estão as três m andalas da mente, da pa­ lavra e do corpo. Em cada uma das oito pétalas de lótus cm todas as mandalas, deuses e deusas se abraçam. As divindades masculinas têm quatro braços. Duas de suas mãos seguram um cetro vajra e um sino cruzados às cosias de suas consortes, que eles abraçam. A outra mão direita segura um tam bor e a m ão esquerda, um bastão. As divindades femininas se parecem todas com Ioguine Vajra nos adornos e na postura. Todos esses deuses e deusas estão plenos da Suprem a Bem-aventurança. As três mandalas exteriores representam os três corpos da Mente búdica. A mandala branca, m ais exterior, é o Corpo da Manifestação. A m andala verm elha da palavra é o corpo de Emanação. E a mandala azul mais interior da mente é o Corpo da Verdade. Todos os casais divinos que habitam essas m andalas representam coisas que acontecem no Caminho da Libertação, como os impulsos benéficos e os estados alcançados por esses meios. Tendo criado uma imagem vívida das três mandalas e de suas respectivas divindades, você deverá repetir o m antra OM AH HUM. À

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medida que entoa cada síiaba, os pares de suas respectivas mandalas são ativados. Ao entoar OM , concentre-se na mandala exterior do corpo; ao entoar AH, concentre-se na mandala vermelha da palavra; ao entoar HUM, fique atento à m andala azul da mente. Repita esse processo três vezes. Ao final de cada repetição, concentre-se nas quatro dakinis da mandala central e no abraço do seu consorte. A bem-aventurança gerada pelos pares nas m andalas exteriores será focalizada em você e em sua consorte. Isso leva o a vermelho de seu primeiro chakra a aquecer e zumbir. Seu calor surge para dissolver o ponto de luz no Thig-Le da cabeça. Ele então com eça a zum bir e a gotejar néctar. O néctar branco gotejante mistura-se com o calor vermelho que surge no chakra cardíaco. No Tantra pensa-se que a bem -aventurança é gerada na extremidade inferior do canal central durante a relação sexual pelo aquecimento da letra a. Quando esse calor sobe pelo canal central, dissolve a HAM invertida no centro da cabeça. O néctar que provém dele goteja produzindo sensações sexuais prazerosas. O canal central, que corre para cim a através de todos os chakras como um eixo, de um azul transparente (algumas fontes descrevem-no como azul-claro com coloração vermelha) e do tam anho do dedo mínimo, é retratado expressivam ente. Na sua extrem idade mais inferior (o primeiro chakra), a sílaba-sem ente a (fig. 26, p. 165) é visualizada, fina com o um cabelo, uma polegada de altura e tão verm elha como um filamento incandescente. Esse a está transbordante m isteriosam ente de energia vital e produz um som semelhante ao de um fio esticado que vibra com o vento. Na outra extrem idade do canal central está o sexto chakra; a sílaba-semente HAM (fig. 26) é visualizada, branca como a luz e preenchida com o néctar de Bodhicitta. Ela produz um zumbido semelhante ao de um enxam e de abelhas. Para aum entar o calor do a, é usada uma técnica de respiração chamada Respiração do Vaso. Durante a inalação, o ar é visualizado entrando pelas narinas e enchendo os canais direito e esquerdo com o se fossem balões. Depois de com pletar a inalação, o abdômen se dilata

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(fazendo o corpo parecer um vaso), enquanto o ar é absorvido e forçado para baixo. Isso em purra o ar para fora dos dois canais e para dentro do canal central na sua extrem idade inferior. O m úsculo esfíncter é então contraído para prender o ar no canal central e forçá-lo para cima. Essa postura deve ser m antida p elo tempo que você puder reter confortavelmente sua respiração, enquanto im agina o a incandescendo cada vez mais e produzindo sua vibração. Durante a exalação, a língua de fogo de um calor elétrico abrasase para dissolver o Thig-Le (o ponto branco-neve sob a sílaba-semcnte invertida HAM). Isso faz com que o néctar gerador da bem-aventurança goteje no líquido que sobe pelo canal central. Quando esse elixir chega ao nível de cada chakra, dissolve as obstruções e escoa para fora através de condutos de energia sutil que dele partem. Várias espécies de bemaventurança são assim experim entadas.6 A morte é simulada recolhendo e dissolvendo o ar vital de cada chakra. No momento da morte, os nós psíquicos de cada chakra são relaxados e os ares vitais entram espontaneamente no canal central. Isso provoca o aparecimento da Luz Clara do Vazio. Em meditação, somos capazes de perm anecer focalizados nela e não somos arrastados para as alucinações cármicas do segundo estado Bardo. Podemos, portanto, obter um corpo sutil constituído pelos ares vitais e pela mente da divindade da meditação. Isto nos leva à nossa m anifestação final como um Buda, em vez de encarnar sem pre de novo num a existência formada carmicam ente no mundo fenomênico. Todos os conteúdos da m andala devem ser mantidos simultanea­ m ente na sua consciência, e você deve meditar sobre si mesmo como o Vazio em que tudo está contido. A unidade essencial que permeia esse microcosmo é a sua verdadeira natureza. Enquanto reflete, você deve repetir estes mantras:

(6) Para maiores informações sobre a Respiração do Vaso e o Ioga do C reporte-se a The Esoteric Teachings o f Tibetan Tantra, traduzido por Charles Muses do original chinês de Chang Chen Chi (York Beach, ME: Samuel Weiser, 1961), pp. 173-200.

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OM SHUNYATA JNANA VAJRA SVABHAVA ATMAKOHAM (Eu sou o Vazio. Sou a Sabedoria de Vajra.) OM V AJRA SH U D D H A SARVA DHA RM A

VAJRA

SHUDDHOHAM (Eu sou pura Vacuidade. Ela é a natureza verdadeira de todas as coisas.) Para com pletar a m editação, imagine um lótus branco de oito pétalas no seu terceiro chakra. No centro desse lótus, sentado num disco lunar, está Vajrasattva e sua com panheira, Vajra Dignidade. Eles estão na mesma postura que você adotou para meditar sobre eles no chakra cardíaco, no capítulo 5. Do HUM azul em seus corações, raios de luz de um azul-elétrico irradiam em todas as direções através de todas as mandalas. Com o o campo m agnético de um ímã que atrai a limalha de ferro, esses raios azuis atraem todos os conteúdos da sua visualização e os devolvem para você. A seguir, sua consorte é absorvida no seu corpo e você, por sua vez, recolhe-se cm Vajrasattva. C om o Vajrasattva, você absorve sua consorte em si m esmo e recolhe-se na sílaba HUM azul no seu coração. A sílaba HUM é então absorvida pelo pequeno ponto de luz (bindu) que está acima dela. E, finalm ente, o ponto de luz extingue-se aos poucos no Vazio com o o sal se dissolve na água.7 Ao deixar a m editação para começar as atividades diárias, você deve imaginar-se com o sendo Chakrasam bhara ou Ioguine Vajra. Ao comer, você faz oferendas a você mesmo como um a divindade. Ao ir à toalete, você expele as obscuridades do mundo dos séres sencientes através do seu poder divino. A o abrir uma porta, você ilumina o caminho para a libertação de todos os seres sencientes. Desse modo você deve pensar e agir com o se de fato fosse o Devata a cada instante.

(7) Esta versão resumida foi parafraseada de Sri Chakra Sambhara Tantra, editado por Kazi Dawa Sandup (Londres: Luzac & Co., e Calcutá: Thatcher, Spink & Co., 1919).

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Capítulo Oitavo A PRAIA ALÉM O chakra da coroa é chamado Sahasrara, em sânscrito. É o lótus de mil pétalas. As pétalas desse lótus estão pendentes para recobrir o Portal do Ser — a fontanela anterior (o ponto mais mole na cabeça do bebê). Esse ponto mole começa a endurecer por volta dos seis meses de idade, supostam ente cortando nossa conexão com o mundo espiritual. Antigos iogues desenvolveram práticas para reabri-lo. Diz-se que, se alguém puder deixar o corpo conscientem ente através desse Portal do Ser na hora da morte, im pulsionado pelo seu últim o suspiro, a libertação do ciclo da morte e renascim ento involuntário é obtida. Sobre as pétalas do lótus estão as 50 letras do alfabeto sânscrito (repetidas 20 vezes, para totalizar mil). Essas letras circundam o Sa­ hasrara da direita para a esquerda e têm origem nas linhas do Triângulo Supremo (Kamakala), a raiz de lodo o som no centro deste Lótus Supremo. O triângulo forma simbolicamente o corpo do “som” pri­ mordial imanifestado do qual deriva o universo. Os raios emitidos por esse lótus luminoso, semelhantes aos raios da Lua, são considerados o néctar da imortalidade. (V eja fig. 34, à p. 203.) No Tantra budista, o chakra da coroa é sim bolizado por uma gota de luz azul flamejante (Thig-Le), representando o elemento éter. A qualidade da consciência prístina, assem elhada ao espaço, aqui no nível do topo do templo sagrado, é presidida por Vairocana, o Buda Primor-

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dial que representa a Sabedoria da Lei Universal. Suas paixões obscurecedoras são a ilusão e a ignorância. (Veja fig. 35, p. 205.)

Fig. 34. Sahasrara, o chakra coronário, o lótus de mil pétalas, mais alvo que a Lua cheia c matizado com as cores do Sol da manhã. Seus raios são o néctar da imortalidade e sobre suas pétalas estão as 50 letras do alfabeto sânscrito (repetidas 20 vezes para totalizar mil). No centro desse lótus está o triângulo supremo, Kamakala, o "som" primordial imanifestado da criação. Os textos hindus variam consideravelmente na descrição do complexo simbolismo ligado a este que é o mais sublime dos chakras. Seus segredos são aprendidos na meditação.

De nossa perspectiva psicológica, idéias relativas a “Deus”, ao mundo espiritual e à nossa relação com eles norm alm ente são encon­ tradas neste chakra. Esses conceitos podem originar-se de existências anteriores ou de doutrinação religiosa na vida presente. E les nos cegam ao despertar intuitivo do chakra da coroa. Com freqüência estreitamente vigiadas pelo ego, essas crenças sagradas na verdade são difíceis de questionar. Não obstante, questionam entos devem ser feitos se queremos sondar o mistério e a verdadeira natureza do Self.

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O chakra da coroa também se relaciona com o nível de percepção de nossa alma. Ele está associado à mediunidade e nos dá acesso às regiões mais sublimes das dimensões interiores e aos seres espirituais que as habitam. A forma manifestada do universo (incluindo os vários planos in­ teriores) é semelhante ao corpo do planeta. Assim como espécies di­ ferentes de animais e vegetais vivem em diferentes condições geográ­ ficas e climáticas, uma variedade de seres “não-hum anos” existe em outras dimensões. O reino Deva, por exemplo, inclui um grupo de espíritos da natureza que trabalha em conjunto com os reinos mineral e vegetal. Talvez o resultado mais notório do trabalho com espíritos da natureza, hoje, seja o desenvolvimento dos incríveis jardins na comunidade de Findhom , na Escócia. Em culturas antigas, os rituais eram realmente usados com o meio de com unicação e trabalho com espíritos da natureza. Intimamente ligados aos espíritos da natureza estão os elementais, freqüentemente associados às forças do vento, da água, do fogo e da terra em vários sistemas primitivos e xamânicos. Os livros de Carlos Castafíeda, por exemplo, estão cheios de relatos de seus encontros com esses “aliados” durante seu aprendizado com o feiticeiro yaqui, Don Juan. O Tantra tibetano não desconhece esses elementais. Por exemplo, o ritual Chõd, realizado no capítulo sexto, originalmente era um meio de invocar a ajuda dessas estranhas criaturas desencarnadas que povoam os reinos inferiores do plano astral e de se com unicar com elas. Antes de prosseguir na discussão sobre os seres que existem nos níveis mais espirituais dos planos interiores, eu gostaria de esclarecer uma pequena questão. Até agora, no texto, apresentei o ponto de vista budista de que todos os fenômenos são ilusórios e dependentes da percepção subjetiva (o que naturalm ente se ajusta de modo muito confortável à teoria junguiana dos arquétipos e à m aneira como estes são projetados na experiência exterior). Mais adiante, neste capítulo, esclarecerei estas posições. Por agora deixem -m e dizer que esses seres “não-físicos” não são menos reais do que nós. Eles também têm uma realidade objetiva relativa e temporariam ente condicionada.

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Fig. 35. Vairocana é o Buda Dhyani, senhor do chakra da coroa. Ele personifica a Sabedoria Dharmadhatu. Sua cor é o azul e seu elemento, o éter. Ele expõe a mudrá Dharmachakra, ou do Ensinamento. Estampa 1 do Foundations o f Tibetan Mysti­ cism, de Lama Govinda (publicado em 1974 por Samuel Weiser, York Beach, Maine, e Rider & Co., Londres) reproduzida com permissão dos editores.

Cada alm a tem pelo menos um tutor espiritual, em geral conhecido como Guia Espiritual. Penso que a maioria das pessoas tem vários desses mestres e que recebem os novos mestres à medida que evoluímos. Embora os guias espirituais possam fazer sugestões à alma, é de livre escolha e responsabilidade da alm a seguir a orientação oferecida. Porque o ego-self norm alm ente está tão divorciado da percepção da nossa alma, os guias espirituais são mais influentes no período intermediário das existências, quando nos é dado tempo para refletir sobre as lições passadas e fazer planos para a vida seguinte. Os guias trabalham muito próximo de nós nesses períodos. De minhas experiências com regressões a vidas passadas e a períodos entre vidas, as pessoas identificadas prim ariam ente como o ego-self podem até mesm o não compreender que estão mortas e continuar dormitando em alucinações fantasiosas no estado de pósmorte. Para essas pessoas, as leis do carma trabalham automaticamente e elas são arrastadas ao renascim ento sem muita informação sobre o processo. Seus guias aparecem com o em sonhos; qualquer orientação dada pode ou não ser reconhecida. Poderemos aprender com nossos guias até o grau em que estivermos conscientes no nível da alma depois da m orte, tanto quanto o estivemos durante a encarnação. Esses guias também podem ser responsáveis por certos lampejos intuitivos e eventos auspiciosos cm nossas vidas. Períodos regulares de meditação e de atenção aos sonhos aumentarão a receptividade a essa orientação interior, que é muito sutil e que com freqüência nos aconselha de maneira oposta aos desejos e exigências do ego. Concluindo, o nível de consciência do chakra coronário é o ponto central em que tem origem a teia da nossa identidade individual. Ele é, portanto, o lugar onde ela se reconstitui, desem baraçando a rede de imagens que compuseram a nossa noção de self. Além da forma, além do pensamento, além dos conceitos do ser e do não-ser, a consciência m ergulha no oceano insondável da Luz Clara do Vazio através dp Portal do Ser no chakra da coroa. À medida que integramos essa experiência de pico, começamos a nos identificar com

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o lodo-que-vive-através-de-suas-m iríadcs-de-partes; o corpo-m ente indi­ vidual tom a-se um hologram a consciente do universo. N ada mais resta a fazer senüo “Ser”, permitindo que o fluxo da criação passe através do desobstruído. Neste ponto, o “com plexo da alm a” tom a-se imortal, no sentido de que com partilha de sua Natureza Absoluta. Tom ando-nos um a paradoxal expressão individual do Tudo o que existe, entram os numa vida de serviço às forças cósmicas c aos outros seres que as dirigem e de cooperação com elas.

A Alma e sua Jornada Nossa alm a é com o mera centelha de partículas de ondas subatômicas na matriz cósmica. Entretanto, da nossa perspectiva terrena, essa centelha parece etem a. De fato, é uma suposição comum que a alma é imortal, imutável e perfeita. Nós projetam os no conceito de alma alguns dos atributos do nosso corpo mais sublim e, a Bem-aventurança ou corpo búdico. M as mesmo esse corpo não é um a entidade ou coisa; é um estado de “Estar Consciente da Bem-aventurança” . Como tal, é inseparável do que é etem o e imutável. Mas a parte de nós mesmos que é ativa nos reinos fenomênicos, aquela parte que sobrevive à morte e transmigra (a alma) não é imortal nem imutável. Os budistas sim ­ plesmente a vêem com o um corpo de tendências m entais. Ela nasce, evolui e finalmente passa por algum a experiência de morte-renascimento do tipo “cósm ico”. Algumas alm as começam seu crescimento e aprendizado muito antes de vir à Terra. Elas vêm aqui por várias razões. Para encarnar no mundo físico, a alm a assume os corpos que lhe são necessários: o mental, o emocional, o etérico e o físico. Estes são os seus veículos durante sua perm anência tem porária aqui. N a m orte, há uma desintegração gradual desses corpos assim que a alm a volta a se recolher em si mesma. A alm a cresce em consciência por meio de experiências em todas

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as suas existências. Essas aventuras acumuladas no plano terrestre não apenas lhe permitem crescer em compreensão, mas ainda representam um importante papel na determ inação de condições de existências futuras. Se o sétim o chakra está fechado, a sabedoria acumulada e o propósito da alma perm anecem inconscientes para a personalidade encarnada. Por outro lado, um sétimo chakra aberto tom a um canal de comunicação entre a alm a e a personalidade. Outras existências e uma ampla perspectiva dos vários elementos que definem nossa indivi­ dualidade tom am -se m anifestos. Quando o nível de consciência da alma começa a despertar no corpo-mente, as pessoas das vidas passadas são facilmente reconhecidas e podemos trabalhar mais depressa qualquer carma que tenhamos com elas. A alm a pode ser com parada com o Sol e suas várias encarnações podem ser vistas como planetas. Da sua coordenada espaço-tempo, cada personalidade vê as outras existências tanto à frente com atrás em suas órbitas. Mas a alm a, num determ inado nível de desenvolvimento, pode experimentar essas muitas existências, de sua perspectiva central ou de outra dimensão, com o se ocorressem simultaneamente. Nos estágios finais da jornada da alm a no plano terrestre, o equilíbrio dos fatores psíquicos que abarcam todas as existências é posto em foco mais claramente. Eles podem ser vistos como uma m andala em que a cor e o significado de todos os fatores desenhados se inter-relacionam para criar a com posição total. A alm a é condicionada pelos seus conceitos de realidade, mas no final precisará abandonar os apegos aos dramas e conceitos que compuseram sua visão de mundo. Através de m iríades de encarnações, as almas descobrem mais e mais de sua sabedoria inata. Depois de muitos experim entos, e com a benevolente tutela dos guias espirituais, elas desvelam gradualm ente sua verdadeira natureza de Estar Consciente da Bem-aventurança. Embora um tanto extenso, quero compartilhar o seguinte excerto de uma leitura psíquica, porque constitui um excelente exemplo de alguns dos experim entos pelos quais a alma passa na buscá de sua natureza espiritual.

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Vejo que seu desejo de se desenvolver espiritualmente é muito puro e sincero. Antes você alcançou aspectos superiores de consciência, sendo um eremita e dirigindo toda a atenção para o seu interior. É muito difícil para você estar numa forma física. Você é muito sensível e considera as condições deste mundo repulsivas. Para ser espiritual, você sente que deve separar-se do mundo. É isto o que o está impedindo de concretizar seu aprendizado agora. Você pre­ cisa compreender que pode ser tão espiritual no mundo como afastado dele. Consideremos agora algumas de suas existências passadas para darlhe uma melhor compreensão do desenvolvimento desses temas. A primeira que estou vendo é uma vida como um santo homem hindu. Vejo duas épocas, uma no scculo IX c outra no XI. Aparentemente você repetiu o mesmo padrão, duas vezes consecutivas. Observando sua vida no século IX, vejo-o como criança numa família de dez filhos. Seus pais são comerciantes razoavelmente ricos. A medida que vai crescendo, você ouve narrativas e lendas sobre homens santos. Você está fascinado e excitado por essas histórias de homens que vivem nas montanhas, cavalgando tigres e fazendo outras coisas miraculosas. Como menino, você freqüentemente sonha cm, algum dia, tomar-se um desses homens santos das montanhas... Vejo-o agora com a idade de 20 anos, trabalhando nos negócios de seu pai e sentindo-se aprisionado. O mundo material parece banal, e você se sente entediado com ele. Você ainda mantém a imagem dos homens santos de sua infância, e carrega consigo o sonho da transcendência e da libertação. Você não sabe o que isso tudo significa, mas é alguma coisa mágica que queima dentro de você. Vejo-o renunciando à sua família c tomando-se um buscador espiritual andarilho. Vários dos primeiros anos foram muito difíceis para você, porque estava acostumado a ser muito bem cuidado. Você quase morre de fome c fica exausto de viajar e caminhar. Passa de ashram cm ashram, experimentando diferentes mestres. Este processo é muito decepcionante porque a fantasia que carrega consigo não está sendo preenchida. Você continua buscando por ela e nunca fica satisfeito. Vejo que esta busca persiste por dez anos. Você tem um desejo intenso de descobrir o que é a transcendência. Finalmente, você parte para as montanhas e toma-se um eremita. Durante esse período, você atinge um ponto crítico de desilusão extrema; todavia não há para onde voltarse. Há uma morte real do ego nisto — rendição total. Vejo mais dois ou

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três anos de vida nas montanhas dessa maneira. A única coisa que preenche a sua mente é atingir esse estado de consciência que vocc sente que lhe é inerente. Você coleta plantas silvestres e come apenas uma pequena refeição por dia. Você passa a maior parte do tempo em meditação c está cheio de um ardente desejo de libertação. Você está com 43 ou 44 anos quando começa a ter experiências de estado místico de consciência. Nos dez anos seguintes, continua a apro­ fundar-se mais e mais nessas experiências. Vejo-o no final desse período com barba e cabelos longos e brancos. Você não retoma à civilização. Morre nas montanhas. Apesar de ter atingido altos níveis de consciência, há ainda uma parte de você que não está satisfeita. Suas idéias precon­ cebidas são a causa que o levam a crer que ainda não atingiu o último estágio. Você deixa sua vida neste IX século com traços de insatisfação. Você reencama, ainda atento à busca da libertação. Desta vez, escolhe uma família pobre, de modo a não ser desviado pela riqueza ou pelos confortos da vida. Vejo-o menino pequeno deixando sua família e indo a um templo. Você implora para ser aceito na vida monástica. Fica desanimado com os muitos rituais que tem de realizar. Mas permanece no templo e avança no caminho espiritual bastante rapidamente. Vejo-o agora jovem no papel de um alto oficial do templo. Mas ainda há esse saber que arde dentro de você — de alguma forma não c isso o que está procurando. Você se sente culpado por iludir as pessoas que vêm ao templo em busca de orientação religiosa. Por volta dos 30 anos, você toma-se outra vez um buscador errante, deixando o templo e renunciando à sua posição. Encontra um mestre que mora numa pequena vila nas montanhas. Você o reconhece como um Ser Iluminado. Sente-se muito agradecido, porque crê ter encontrado o que estava procurando. Vejo-o permanecer ali por muitos anos, finalmente despertando a kundalini. Durante esse tempo, você recebe tudo o que pode desse mestre e o deixa quando está com 45 anos. Ao partir, você imagina ir para o Himalaia. Esta metáfora de subir as montanhas representa a busca de estados de consciência mais rarefeitos e puros. Mais uma vez você se toma eremita. E, contudo, ainda há alguma coisa que você está buscando. Você tem um quadro, um conceito, um sentimento básico de que há algo mais, um sentimento de que não está compreendendo tudo. Assim, você morre nessa existência na mesma atitude de busca.

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Devido a seus preconceitos sobre espiritualidade segundo a tradição iogue, você está surdo à ajuda de seus guias dos planos interiores. Sua alma está fixada nos conceitos de libertação e de Brahma (o conceito hindu da Realidade Absoluta). É como uma pessoa que cresce na tradição cristã e espera ser levada ao céu por um homem grande que sai das nuvens. Você morreu com o conceito de alcançar o Nirvana c não ter de retomar à Terra. Está tão ligado a isto que se passa um longo tempo antes que recncame novamente: Você simplesmente não quer ouvir seus guias. O simples pensamento de voltar à Terra lhe é repulsivo. Finalmente, entretanto, você se convence da necessidade de retomar c reencama no mundo ocidental numa tentativa de alargar sua perspectiva da vida — mas, claro, você rapidamente a leva a um mosteiro. Vejo-o como um monge cristão na Alemanha. Você passa por um período difícil relacionando seus desejos espirituais com os conceitos da tradição cristã. Você transfere o conceito de alcançar Brahma ao conceito cristão de Deus. Isto se transforma num desejo e súplica ardentes a Deus para salvá-lo. Nesta vida, você é um monge enclausurado; vive uma existência completamente alienada. Dificilmente se relaciona com qual­ quer dos outros monges c se abstém de quaisquer tarefas que tenham contato com o público. Passa a maior parle do tempo consigo mesmo, meditando e copiando escrituras. Está um tanto assustado com o nível de inteligência de seus colegas monges e com o modo como se aproximam de Deus. Por outro lado, você se sente embaraçado cm comunicar suas experiências a eles. Vcjo-o meditando no meio de energias incríveis. As energias Kundalini que você despertou na vida anterior sobem de você novamente. Mas na tradição cristã não há meios de compreender o que está acontecendo dentro dc você. Você se apega à Virgem Maria. Oferccc-lhe orações como a Mãe Divina c suplica-lhe que o liberte. Desta vez sua alma está um pouco mais disposta após a sua morte, c você recebe importantes preleções dc seus guias sobre os benefícios de trabalhar e servir à humanidade. Eles lhe dizem que é nisso que encontrará o significado profundo que satisfará c preencherá seus anseios. Eles o convencem de que seria uma boa idéia tentar este enfoque. Vejo-o criancinha, o primeiro de uma família. Isso é logo após a metade do século XV. Seu pai é impressor. Você tem uma vida familiar bastante normal, bem ajustada. Sinto a atmosfera da Bavária — há uma qualidade impetuosa em sua mãe c cm seu pai. Como criança, você passa

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um bocado de tempo às voltas com materiais de impressão e trabalha na impressora de seu pai. O material impresso nesse período é de caráter religioso, e você desenvolve um fervor ardente pela leitura. À medida que cresce, continua a trabalhar com seu pai, mas também o vejo indo a mosteiros. Você está interessado em reunir materiais para impressão, a fim de difundir a palavra das escrituras. Nessa vida você se casa. É difícil para você estar em intimidade com outra pessoa. Vejo que sua esposa é muito sensível, meiga, suave e muito dependente de você. Você se sente impelido a tomar conta dela. Também tem um filho, um menino. Alguns anos depois, você assume os negócios do seu pai. Assim, eis você, um responsável pai de família e negociante. Isso pesa consideravelmentes sobre você. É uma pressão enorme, c seu zelo ardente na impressão de livros religiosos e no tomálos acessíveis ao público logo diminui. Você percebe que sua intenção de inspirar as massas não está sendo concretizada. As pessoas ainda continuam bebendo e gozando a vida. Assim, você se desilude. A medida que o tempo passa, você tem outro filho. Sente-se mais e mais aprisionado. Não há saída para você — está enredado com os negócios. Não pode de fato ganhar a vida de outra maneira e sente-se com obrigações com relação à família. Vive infeliz o resto dessa vida c monre relativamente jovem. Agora sua alma está imersa na desilusão. Outra vez você se mantém inacessível aos conselhos de seus guias e é mandado imediatamente de volta ao mundo envolto em suas frustrações. Você vem à Itália numa época de muita inquietação política, um período em que houve uma reforma na Igreja, em que todos os manuais estão sendo queimados. Vejo-o envolvido nisso. Você quer reformar o mundo e purificar tudo. Assim, isto foi uma representação de algumas de suas frustrações e desilusões c da veemência de sua necessidade de buscar pureza espiritual. Você está totalmente consumido por esse fanatismo. Depois de sua morte nessa vida, você se parece com um lunático religioso. Há ódio nessa época, um ódio justificado. Vejo-o entrando em choques bastante sérios com vários de seus guias. Eles realmente o desafiam e irrompem cm seu ódio numa tentativa de mantê-lo cm contato com a essência suave da sua natureza espiritual. O carma dessa vida é posto de lado por algum tempo, e você é orientado a rccncamar num corpo feminino. Espera-se que você, agora, desenvolva os aspectos

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femininos de si mesmo, mas você projeta suas frustrações e desilusões no seu papel de mulher. Desse modo, você novamente consegue se alienar. Mais tarde, na sua vida atual, quando começar a trabalhar como mestre, encontrará algumas das mesmas pessoas com as quais já manteve relações como sacerdote na Conira-Reforma. A natureza do canna é que você precisará aprender a se comunicar, a estar com eles de maneira a ajudálos em vez de alienar-se e condená-los. *

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Enquanto o corpo-m entc c o veículo, a alma é o condutor. Embora vagamente no início, a alm a funciona através do cgo-sclf cm muitas existências, crescendo na consciência de si mesma e das dimensões transpessoais do cosmos. Todos os temas arquetípicos associados aos chakras são vividos pela alma. O conjunto todo desses padrões de desen­ volvimento pode ser visto como o labirinto através do qual a alm a final­ mente penetra nos mistérios do seu Ser para receber a iniciação final. Até aqui, associamos a sede de identidade individual ao cgo-self. Deve agora ser perceptível que o sentido fundamental de separação surge no nível da alma. Esse “eu” é projetado no “corpo-m ente” pela alma que o habita por várias encarnações. É apenas nas horas finais da alma que esse “eu” se tom a mais transparente.

O Arquétipo do Self Em Aion, Jung identifica o Self com a “ imagem de Deus”. Pelo menos esse Self não pode ser distinguido da imagem de Deus como Jung a carateriza. As tendências politeístas das culturas antigas demonstram a riqueza dos níveis arquetípicos da psique; mas, com o aponta Jung, o monoteísmo revela o Self.1

(1) Carl Jung, Aion, Bollingen Series, Vol. IX (Princeton, NJ: Princet University Press, 1959), p. 22.

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A imagem de Deus, projetada das profundezas espirituais da alma, foi por ele cham ada de função transcendente porque seu poder nos leva além do dualism o do nosso ego. Símbolos transformadores emergem do Self e nos inspiram a buscar nossa totalidade. Com o um rio, somos im ­ pelidos a voltar à nossa fonte. É como se a vida m esm a evoluísse através de nós, lançando-se sempre para a frente para fundir-se no Oceano Ilimitado da Consciência do Ser. O fim da nossa jornada está próximo. Qual é a natureza da transformação que está logo adiante? Com a finalidade de pôr essa questão em perspectiva, vamos resumir o processo de individuação de Jung, referindo-nos ao simbolismo religioso da nossa cultura nativa e ao símbolo de Cristo. Ainda cm Aion, Jung fala de Cristo como o nosso herói cultural e, apesar de sua realidade histórica, é ele que ocupa o centro da mandala cristã com o modelo do Self.2 Conta-se que Jesus nasceu na aura de sinais divinos auspiciosos e seu nome significa “M essias”, ou Salvador, em hebraico. De acordo com as escrituras hebraicas, foi profetizado que nasceria um salvador na família da linhagem de Davi, para ser o rei dos judeus. Os hebreus tinham sofrido opressão, conflito e exílio através de toda a sua história, que pode ser traçada, remontando ao passado, até Ur e a Caldéia, por volta de 2000 a.C. Suas escrituras falam de uma votação no contexto de suas tentativas e fracassos para entrar em acordo com um Deus às vezes colérico, outras vezes benevolente, Javé. Os profetas do Velho Testamento antecipavam com satisfação a vinda de um líder que os reconduziria à virtude e à paz. Jesus foi aclam ado como este rei espiritual por um número relativamente pequeno de judeus. Diz-se que, ao ser batizado por João, Jesus foi encoberto pelo “Espírito Santo” e o “Espírito de Deus” entrou nele. Ele se tornou assim conhecido como o Cristo (palavra grega que significa “o ungido do Senhor”, ou “rei por direito divino”) pelos que acreditavam que Jesus era o Messias esperado.

(2) Jung, Aion, pp. 36-7.

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O bservando o contexto da vida de Jesus e a natureza do seu impacto, podem os ver nele uma m etáfora perfeita das provações e tribulações da consciência do ego e da ação redentora do Self. Em meio ao tumulto político da opressão romana, em meio às seitas religiosas conflitantes, às esperanças messiânicas e à agitação revolu­ cionária, Jesus, “o C risto”, aparece com o o mensageiro da paz e da inteireza interior. (Outro nom e associado a Cristo é Emanuel, “o Deus interior”.) A imagem de Cristo é, assim , o arquétipo dos aspectos transpessoais e totalizadores da psique. Em termos psicológicos, Cristo é, portanto, o m ediador ou modelo do Self em relação ao ego. O sim bolism o da crucificação, por exem plo, ilustra dram atica­ mente a psicologia da morte do ego e a necessidade de reconciliar o antagonismo dentro da psique. A realidade transpessoal do Self já não pode ser evitada e a identidade pessoal é pendurada na cruz, que representa a quatem idade de opostos integrados em sua convergência central ou transcendente. Até que alcancemos esse nível crítico de desenvolvim ento, a tensão e o dualism o básicos da psique não são tão perceptíveis. Durante os estágios anteriores do desenvolvim ento do ego, nós nos identificamos com o ego, que organiza a percepção dos conteúdos psíquicos em categorias lógicas, ao mesmo tempo em que reprime os elem entos que ameaçam a sua integridade. Estávamos, porianto, desesperadamente fixados num lado da polaridade e evitávam os o outro. Jung afirma, ainda, que sem pre que há uma ênfase na imagem de Cristo, ela estimula uma ativação sim ultânea da som bra, seu com plem ento inconsciente e, conseqüentem ente, aumenta a tensão entre as duas.3 É através do am or e da aceitação de todas as partes de nós mesmos que nossa redenção psicológica se com pleta. E isso é precisamente o que a imagem de Cristo, como expressão do Self, requer de nós. No mito

(3) Jung, Aion, p. 43.

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cristão, Cristo é considerado o Filho dc Deus, isto é, a encarnação de Deus, o qual às vezes é igualado ao puro amor. Psicologicamente, isso representa a abrangência do Self. As qualidades transpcssoais do Self procuram ser realizadas dentro dos limites pessoais da consciência do ego, assim como a consciência presa ao ego finalmente é levada a entrar no domínio do transpessoal. A figura lendária de Jesus Cristo é realm ente um m odelo para o tipo de ser cm que qualquer um pode se transformar quando transfigurado. A ressurreição e a ascensão são m itos que denotam a transcendência das condições temporais c pessoais da existência centrada no ego. Quer falemos de Buda ou de Cristo, há uma transformação radical que ocorre quando nos rendemos ao Self. Parece que Jung aproximouse desses portais, mas, porque a possibilidade de ilum inação não aparece nos relatos que fez do processo de individuação, podem os concluir que ele não os ultrapassou. Ele afirm a que a m eta da individuação nunca é realizada plenamente; a individuação é apenas um processo que leva rumo à totalidade. Em outras palavras, ela não é um fim, mas o meio pelo qual acontece o processo de integração transpessoal. Por fim, Jung considerava o ego um recipiente que cresce constantem ente para afinal circunscrever e conter uma fonte inesgotável de expressões simbólicas do Self. Este Self, todavia, permanece transcendente — uma m eta oculta e inatingível, de acordo com a analista junguiana Aniela Jaffé, em The M yth o f Meaning.* Jung sem dúvida aborda aqui um grande mistério, mas ainda que o self racional não possa assim ilar todo o potencial do Self, há a possibilidade de manifestação de níveis superiores de consciência em que o Grande M istério é com preendido plenamente. O êxtase do místico é um evento muito real que afeta profundam ente o self pessoal. Em sua autobiografia, The Life o f Teresa o f Jesus, Santa Teresa fala de visões

(4) Aniela Jaffé, The Myth o f Meaning (Nova York, Penguin, 1971), p. [O mito do significado na obra de C. G. Jung. Editora Cultrix, São Paulo, 1989.]

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e êxtases que têm um efeito purificador m aravilhoso. Mais deta­ lhadamente, ela diz que esses efeitos são como uma grande cham a que consome a nossa natureza sensual c todos os desejos da vida. O que perm anece é uma profunda veneração.5 Fenômenos espirituais extraordinários, com o os comumente as­ sociados aos homens santos do O riente, foram atribuídos a Santa Teresa. Por exem plo, ela era propensa à levitação, e quando m orreu seu corpo tinha o perfum e das flores frescas e não se decompôs! Santa Catarina de Sena também teve êxtases em que seu corpo se erguia no ar e emitia uma doce fragrância. Nesses estados de transe, ela às vezes verbalizava uma efusão de diálogos “ inebriados de Deus”. Posteriorm ente ela com pôs alguns deles, anotados pelos que presenciavam seus êxtases nos D iálogos divinos. Nesses diálogos ela menciona a visão de coisas ocultas de Deus que a faziam explodir em suprem o esplendor e ser transformada na “Sua” providência imensurável. Ela diz que, em bora a alma fique saciada com essas experiências, ainda continua faminta de ver Deus na Sua luz e pela Sua luz. É essa luz que mostrou a ela a Sua verdade e a mais alta e infinita Beleza de Deus que está além de toda a Beleza e a Sabedoria de Deus que está além de toda a Sabedoria. Outro exem plo foi o místico Jan Van Ruysbroeck, que se retirou para a floresta quando o Espírito Santo o moveu a isso. Certa vez, depois de uma prolongada ausência, vários monges foram procurá-lo. Eles o acharam sentado sob uma árvore resplandecendo de luz. Ele estava em êxtase profundo c cercado por uma aura brilhante de Luz Divina. Ruysbroeck era flam engo, contem porâneo de M eister Eckhart. Foi um autor fecundo de literatura mística; escapando por pouco da censura da Igreja, não com partilhou com Eckhart a acusação de herege. Repetindo Eckhart, Ruysbroek escreveu em The Sparlding Stone que aqueles que vêem a Deus intuitivam ente transcendem todas as distinções

(5) The Life o f Teresa o f Jesus, citado in The Laughing Man, Vol. 2, N° Dawn Horse Press, 1981, p. 50. 217

e são transfigurados por uma luz inata com a qual estão unidos e através da qual vêem.6 Poderia essa luz inata — ou o resplandecente Espírito Santo da graça de Deus — relatada por esses místicos cristãos, ser realmente a Luz Clara do Vazio? Quando lemos os relatos dos místicos das várias tradições espirituais, a referência mais comum a Deus que encontramos é a de uma luz celestial perene. É necessário, ou mesmo útil, sobrepor uma imagem de Deus a essa experiência do Absoluto? Em The Blissful Life, Robcrt Powell conta a história de um santo hindu moderno, Shri Nisargadatta Maharaj, que afirm a ter viste Deus e nada saber sobre coisas religiosas normais. Vendo o mundo como uma ilusão criada numa tela de cinem a, ele sabe que a luz (a consciência pura) é que ilumina a projeção das imagens sem pre em mudança. Ele não leva em consideração a idéia de um Deus exterior, porque com preendeu que “Eu sou Isso” (a luz da consciência pura).7

Essência da Sabedoria que Foi Além A teoria do Vazio foi exposta de várias maneiras no desen­ volvimento do Budismo. O seguinte Sutra do Coração, supostamente pregado por Buda (500 a.C.), é o exem plo de um enfoque não-racional ou devocional. Assim cu ouvi. Certa vez o Abençoado residia cm Rajagriha, no Pico do Abutre, com uma grande assembléia de monges e Bodhisaltvas. Nessa época, o Abençoado estava totalmente absorto na concentração que analisa todos os fenômenos, chamada “Iluminação Profunda”.

(6) O material acima mencionado foi discutido num artigo do The Laughing Man, Vol. 2, N8 2, Dawn Horse Press, 1981, p. 46, 61 -2. (7) Robert Powell, The Blissful Life (Durham, NC: Acom Press, 1984), p. 27. 218

Na mesma cpoca, o Nobre Avalokitcshvara... contemplava a prática profunda da Sabedoria que foi Além, analisando os cinco agregados, vazios por natureza. Então, por inspiração de Buda, o venerável Shariputra falou ao Nobre Avalokitcshvara... dizendo: “Como podem os de boa família aprender a identificar os que querem seguir a prática profunda da Sabedoria que foi Além?” Assim falou, e o Nobre Avalokitcshvara... replicou ao venerável Shariputra: “Ó Shariputra, qualquer filho ou filha de boa família que deseje seguir a prática profunda da Sabedoria que foi Além deve considerá-la deste modo: analisando os cinco agregados, vazios por natureza. “A forma é vazia, o vazio é forma. O vazio não é outra coisa senão forma, a forma não é outra coisa senão vazio. Do mesmo modo, sensação, reconhecimento, formações cármicas c consciência, tudo é vazio. Portanto, Shariputra, todos os fenômenos são vazios, sem características. Eles são não-nascidos c incessantes; não são impuros nem livres de impureza. Não diminuem nem aumentam. “Portanto, Shariputra, no vazio não há forma, nem sensação, nem reconhecimento, nem formações cármicas, nem consciência; não há olho, nem ouvido, nem nariz, nem língua, nem corpo, nem mente. ...Não há ignorância, nem destruição da ignorância. Não há nada disso ao longo do caminho: não há velhice e morte, nem destruição da velhice e da morte. Assim, não há sofrimento, nem causa de sofrimento, nem cessação do sofrimento e nem caminho. Não há sabedoria, nem realização e nem nãorealização. “Portanto, Shariputra, porque não há realização, todos os Bodhisattvas aderem à Sabedoria que Foi Além, e, porque não há obscuridade da mente, eles não têm medo. Indo totalmente além da falsidade, eles vão além dos limites da tristeza. Todos os Budas que habitam nos três tempos, por confiar na Sabedoria que foi Além despertam plena e claramente para a insuperável, para a mais perfeita e completa iluminação... “Ó Shariputra, é assim que um Bodhisattva Mahasattva deve aprender a profunda Sabedoria que foi Além.” Então o Abençoado levantou-se da concentração c louvou o nobre Avalokitcshvara... dizendo: “Muito bom, muito bom, ó filho de boa famí-

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lia. É exatamente assim. A profunda Sabedoria que foi Além deve ser praticada exatamente como você falou, e Aqueles que Assim Fizerem rejubilar-se-ão...”8 Em Tibetan Yoga and Secrel Doctrines, W. Y. Evans-W entz suge­ re que a Doutrina do Vazio é uma revisão dos ensinam entos hindus de Maya (a Grande Ilusão) feita pelos grandes filósofos budistas que inspiraram a forma M ahayana do Budismo. Ele também menciona que cm geral, acredita-se que Buda ensinou esotericam enie a PrajnaParamita (a Sabedoria que Foi Além) cerca de 600 anos antes para seus discípulos mais adiantados.9 Apesar disso, os ensinamentos sobre o Vazio só foram divulgados esotericamenie depois do século II d.C. Conta-se que o filósofo budista Nagarjuna recebeu esses ensinamentos num reino celeste, onde se supõe que o Buda Gautama tê-los-ia escondido, e articulou uma dialética negativa (a filosofia Madhyamika) para provar logicam ente a teoria do Vazio. Mais tarde, os iogues M ahasiddha (aproximadamente 700-1000 d.C., no apogeu do Budismo tântrico indiano) reagiram existencialm ente aos métodos analíticos dos Sutras M ahayana para praticar métodos tântricos vivenciais. A lógica filosófica dos Sutras e as técnicas vivenciais dos Tantras foram assim aglutinadas num corpo dc ensinamentos conhecido como Mahamudrá. Em níveis avançados de meditação, a Luz Clara do Vazio gera um estado de consciência que chega aos extremos da bem -aventurança. E s­ se êxtase transcende qualquer outro prazer e é, portanto, “grande” (maha). Uma vez experim entados a Bem-Aventurança e o Plenum do Vazio, jam ais poderemos esquecê-los: essa experiência fica selada (mudrá) na nossa mente, o que explica o significado do Grande Selo ou Mahamudrá.

(8) O Sutra do Coração. (9) W.Y. Evans-Wentz, Tibetan Yoga and Secrel Doctrines (Oxford: Oxford University Press, 1958), pp. 344, 349. [-4 ioga tibetana e as doutrinas secretas. Editora Pensamento, São Paulo, 1987.]

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O Primeiro Pachem Lama, em The Great Seal o f Voidness, apre­ senta uma etim ologia oculta para o termo tibetano que corresponde a M ahamudrá, Chaggya Chenpo. Chag refere-se a Vazio, Gya é libertação do samsara e Chenpo significa a grande unificação entre a compreensão do Vazio e a libertação da visão do m undo de ilusão (samsara). Ele também sugere outro significado para M ahamudrá. Mudrá significa prérequisito necessário; Maha significa grande compreensão. Daí não haver técnica para a obtenção da ilum inação sem uma com preensão profunda do V azio.10 Os métodos dos Sutras começam com uma análise filosófica do Vazio e prosseguem com técnicas de m editação para aquietar a mente. Uma vez controlada e fixada, a mente é usada na meditação para provar a com preensão filosófica do Vazio através de um a intuição penetrante na própria natureza da mente. M étodos tântricos enfatizam a purificação das forças psíquicas nos chakras que sustentam as funções do ego mental e sua articulação no canal central de energia ao longo da espinha. Quando a mente está purgada de suas obscuridades fcnom cnicas, a Luz Clara da verdadeira natureza da mente brilha espontaneamente. Para conseguir o Grande Selo, M ahamudrá, a mente deve estar preparada. A parte m ais difícil e im portante do cuidado de um jardim , por exem plo, é a preparação inicial do solo. Da m esm a forma, a mente deve estar pronta para receber as sementes da sabedoria proporcionados pelos ensinam entos M ahamudrá. Se não for treinada de modo apro­ priado, ela pode confundir as idéias sobre o Vazio com a experiência em si, ou nutrir concepções errôneas niilistas. Para com eçar, vamos tentar com preender com o a m ente cria a “visão errada” do mundo. Os budistas sustentam que a nossa percepção do mundo é uma alucinação coletiva desenvolvida desde o com eço da história da consciência. Essa ilusão foi criada por um processo m ental chamado “rotulação”, no qual a mente racional percebe um grupo de fatores con-

(10) Primeiro Pachem Lama, The Great Seal o f Voidness (Dharamsal índia: Library of Tibctan Works and Archives, 1975), p. 7.

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vergcntcs c os organiza seletivamente num objeto. Um nome, ou rótulo, c então atribuído ao objeto, e ele assume o status de “realidade”. A m en­ te na verdade cria a sua própria realidade através da interpretação do fluxo constante de forças e substâncias à medida que aparecem, para as­ sumir formas particulares em segmentos isolados dc espaço e tempo. E s­ sa realidade nada mais é do que uma coleção de imagens ou conceitos mentais. Os budistas ilustram o modo como somos levados a essa alu­ cinação com a metáfora dc uma tenda iluminada internamente pela luz de uma centena de lamparinas. Estando fora da tenda, não percebemos se uma dessas lamparinas se apaga ou se outra é acesa. Do mesmo modo, a ilusão coletiva do mundo continua, imperceptivelmente afetada pelas mortes e renascimentos individuais. O objetivo principal da com preensão penetrante do Budismo tânirico é minar a “visão ordinária”. Esta é uma tarefa muito tediosa e difícil. Não apenas a mente foi educada nessa visão, como tem uma propensão inata para criar esse ponto de vista ilusório. A falta de “ vida própria” é também um conceito importante para a compreensão do significado do vazio. Ter vida própria significa existir independentemente de qualquer fator condicionante. Mas nada no mundo fenomcnico existe independentemente das partes que o compõem e do rótulo que a mente colocou na aparência do conjunto dos elementos transitórios. Mas a nossa visão comum da realidade está baseada por inteiro na ilusão de que as pessoas e coisas têm vida própria ou independente. Por exemplo, um carro não tem vida própria. Quando removemos todas as partes mecânicas que em conjunto o compõem, não há mais carro. “Carro” é apenas um rótulo, um conceito da mente projetado na aparência de um conjunto singular de componentes. Toda a fortaleza da consciência do ego está construída na visão comum da realidade exterior e numa crença igualmente obtida num sentido de self independente e concreto. Nosso sentido de “eu” é uma suposição inquestionável a priori. Entretanto, trata-se de um mero rótulo — o “eu” tem vida própria. Quando buscamos por este “eu” na meditação, não há onde encontrá-lo.

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Outro aspecto im portante da obtenção de uma “visão correta” é a com preensão de que as “coisas” que são rotuladas em nossos conceitos convencionais da realidade têm certas qualidades. Essas qualidades podem ser experim entadas em sua nudez quando rem ovem os nossas preconcepções sobre o que constitui um objeto. Fenôm enos empíricos têm um a existência objetiva relativa que não contradiz o seu vazio essencial. E de fato o vazio das coisas (a falta de vida própria) que permite ao mundo fenomênico desdobrar-se e mudar; essas qualidades multiformes seriam destruídas se seus elementos tivessem uma exis­ tência independente e permanecessem fixos em suas naturezas. O Vazio depende, portanto, da aparência do mundo fenomênico. Na mente, a aparência (da realidade dos objetos) é inseparável da natureza vazia da consciência prístina, da mesma forma que o reflexo da Lua na água é inseparável da superfície irradiante da água. Além disso, não podemos m edir e definir realmente o Vazio; palavras como essência ou espírito são as mais próxim as a que podem os chegar, mas elas ainda implicam “alguma coisa”. Edwin Bem baum , em The Way to Shambhala, propõe a seguinte metáfora: é com o um claro e indestrutível vazio — com o um diamante cintilante — que encontram os no âmago de nós mesmos e que penetra em todas as coisas. Ele diz ainda que, quando experim entam os essa realidade, as coisas não desaparecem; elas se tom am translúcidas, com o lanternas de papel encerado, iluminadas pela Luz Clara do Vazio.11 O niilismo pode ser considerado um repúdio à autenticidade das experiências e, portanto, uma negação de qualquer significado ou valor associado. As implicações negativas do niilismo conduzem à deses­ perança e à futilidade. Embora a teoria do Vazio sugira que a busca do significado no mundo fenomênico é principalm ente uma tentativa egoísta de validar a nossa existência, ela não encoraja uma visão pessimista da existência. Chogyam Trungpa, cm Cutting Through

(11) Edwin Bembaum, The Way to Shambhala (Nova York: Doublcday, Anchor, 1980), pp. 108-09.

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Spiritual M aterialism, diz que, em vez de querer encontrar uma grande profundidade nos eventos e coisas, precisamos com preender que as coisas são simplesmente o que são.12 Ele continua contando a história de com o alguns dos arhats (literalmente, “os vitoriosos”, isto é, discípulos avançados de Buda) morreram de ataque cardíaco quando Buda lhes comunicou os primeiros ensinamentos sobre o Vazio.13 Esses discípulos aparentemente tinham experimentado a fusão no espaço na m editação, mas ainda estavam se relacionando com o espaço com o “alguma coisa”. Ainda estavam envolvidos numa experiência dualista de sujeito e objeto. O impacto da teoria do Vazio, que implica estar “em lugar nenhum ” e experimentar “coisa nenhum a”, foi devastador para o seu sentido de realidade. Nagarjuna aprofundou as implicações da teoria do Vazio propondo que nem sequer podemos com eçar a considerar a natureza da realidade. Fazer isso exigiria uma abordagem dualista — um observador separado da realidade, que pode perccbê-la, defini-la e nomeá-la. O conceito de tathata (a coisa em si) tomou-se assim associado à teoria do Vazio. O mundo fenomênico sim plesm ente é. O processo pelo qual ele aparece e desaparece simplesmente é. O vazio do espaço e o vazio da qualidade radiante da consciência prístina simplesmente é. Mesmo que concordemos que a realidade é um mistério, estamos afirmando que ela é “alguma coisa”. Trungpa mostra que a crença em qualquer filosofia ou religião, do ponto de vista dos ensinamentos Madhyamika, de Nagarjuna, é meramente um processo de projeção de um rótulo sobre o mistério. Além disso, continua ele, como não há ninguém para perceber a realidade e nenhum conceito resultante dessa percepção, as coisas e eventos surgem em sua essência na vastidão da consciência lúcida, essencial.14

(12) Chogyam Trungpa, Cutting Through Spiritual Materialism (Boston: Shambhala, 1973), p. 189. (13) Trungpa, Cutting Through Spiritual Materialism, p. 190. (14) Trungpa, Cutting Through Spiritual Materialism, pp. 194, 196.

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Num contexto mais moderno, as im plicações da T eoria do Vazio são demonstradas na Teoria do Cam po Unificado de Einstein. As descobertas da física contem porânea enfatizam que uma existência separada, independente, é uma impossibilidade. Não há limites rígidos na grande matriz de energias multidim ensionais que é o universo. Quando abandonamos nossa insistência nos limites ilusórios criados pela mente racional, a energia infinita de “tudo-o-que-existe não encontra obstáculos ao se mover através do corpo-mente. Livres das construções mentais da estrutura seqüencial de tempo e espaço, consideram os massa, energia e consciência com o um cam po unificado. A Luz Clara do Vazio não muda e não depende de nenhum a causa. Como um espelho, ela não é afetada por nenhuma forma que nela se reflita. No Tantra budista, a manutenção da claridade do Vazio em nossa experiência diária é sim bolizada pelo peixe. No livro M aslers o f M ahamudra, Keilh Dowman descreve com o o peixe nada sem esforço, sem piscar e, aparentem ente, sem nunca dormir. Além disso, os peixes não ficam molhados; eles estáo na água mas não são da água.15 Para os antigos iogues, o peixe era uma metáfora para o modo com o podemos estar no mundo fenomênico um a vez que nos tom emos budas. Dowman ilustra um dos últimos obstáculos do caminho na biografia do M ahasiddha Kanhapa — o meditador que compreende a Luz Clara do Vazio na meditação, mas cuja com preensão se perde ao se envolver nos dramas da existência diária.16 A prática do M ahamudra implica a transferência da experiência do Vazio para as atividades diárias. A vida em si é o cam inho. Cada obstáculo, cada problema ou desejo é uma oportunidade para libertar o ego apegado e para dar-se conta de que não há separação entre as aparências e o Vazio. Por si mesma, sem esforço, a vida apresenta todas as experiências e situações que mostram quando precisam os soltar as amarras de nossos

(15) Keith Dowman, Masters o f Mahamudra (Albany, NY: State University of New York Press, 1985), p. 78. (16) Dowman, Masters of Mahamudra, pp. 123-29.

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pensamentos discursivos, de nossa aversões e desejos. Não importa qual seja o evento — sensação ou orientação conceituai — tudo é oportunidade para praticar o Mahamudrá. Renunciando a todos os desejos e elaborações conceituais relacionados com as ações do passado, do presente e do futuro e desenvolvendo um estado ininterrupto de equilíbrio meditativo através do fantástico sonho da vida, finalmente integramos o estado primordial do Estar Consciente da Bcm-aventurança na nossa existência diária. Pelo progresso na com preensão do fluxo da consciência através dos chakras, obtivemos algum conhecimento de nossas predisposições instintivas, da ocorrência de sentimentos e dc emoções e das tendências da nossa mente. Estamos agora num ponto em que podemos expe­ rim entar o vazio desses fenômenos — não há sclf inerente a esses eventos. Com a renúncia à ilusão da identidade do self, nossa expe­ riência do mundo é alterada radicalmente. Deixando dc ser escravizados pelo ego, assumimos um modo de agir espontâneo, não mais dirigido pelo self. A vida torna-se admiravelm ente simples; há apenas uma resposta a qualquer coisa que ela coloque cm nosso caminho — aceitação e compaixão incondicionais.

O Presente da Dakini Tive as experiências que relato a seguir pouco tempo depois de minha iniciação no Budismo tibetano. Nessa época, meu conhecimento das várias divindades e das práticas mais avançadas era muito limitado. Eu não estava sob a orientação pessoal de nenhum guia ou mestre, apesar de ter sido aceito por Karmapa e ter recebido alguns ensinamentos e iniciações menos importantes. Os eventos que seguem ocorreram de forma totalmente espontânea. (Eu poderia acrescentar que esta não foi a minha prim eira experiência com a Kundalini. Cerca de dez anos antes, eu havia sido inspirado a viver nas florestas como um iogue. Durante esse tem po, tive minha experiência inicial com o despertar da Kundalini.) Vários anos depois que os eventos que vou relatar ocorreram , participei dc um retiro M aham udrá e fui iniciado em

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prálicas tântricas superiores. Apesar de ter tido as experiências abaixo registradas e também as iniciações e instruções M aham udrá, não sinto que possa escrever sobre esses estágios finais do cam inho tântrico com uma autoridade genuína; se pudesse, penso que não seriam de grande valor para você. Por essa razão, decido concluir com o diário do meu relacionamento com a dakini que me iniciou na com preensão sim ­ bolizada nas prálicas tântricas mais elevadas, na esperança de levar o leitor a procurar a única fonte viável de conhecim ento — sua própria experiência. Enquanto a tradição tântrica enfatiza o relacionam ento com um guru encarnado, o folclore tântrico contém muitas lendas de iogues que receberam iniciações das dakinis que lhes apareceram em sonhos, na meditação ou sob a forma de uma m ulher encarnada. A pesquisa moderna também indica que a Kundalini pode despertar espon­ taneamente fora de uma relação entre discípulo e m estre — na maioria dos casos, presumo, devido a existências anteriores em que ela havia sido desenvolvida. Ou, em outras situações, as forças arquetípicas em jogo podem estar tentando contato por iniciativa própria. Ao revelar este trecho do meu diário de m editação, espero transmitir o valor intrínseco dos símbolos e experiências como eles ocorreram naturalm ente. Assim fazendo, espero convencer o leitor de que essas divindades, isto é, suas qualidades de consciência, realmente existem nas dim ensões mais sublim es da psique.

8 de março, 1980 Um espírito feminino veio a mim hoje enquanto eu meditava. Ela pediu que eu m editasse regularm ente e me abstivesse de contatos sexuais durante vários meses; em troca, ela me ajudaria na minha prática espiritual. Para minha surpresa, ela sentou-se sobre mim na posição tântrica yabyum. Senti uma imensa troca de energia psíquica, especialmente nos canais esquerdo e direito (Ida e Pingala) ao longo da espinha. Esta experiência profunda de ressonância entre nós inspirou-me

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a reflelir sobre as antigas práticas sexuais do Tantra. Isso levou-me à lembrança espontânea de um a vida como professora tântrica na índia antiga. Depois dessa experiência de meditação, fiquei muito intrigado c fui deixado num estado de expectativa.

9 de março Hoje a dakini começou a meditação traçando um círculo cm volta de mim no assoalho. Dentro do círculo ela desenhou uma estrela de seis pontas (dois triângulos entrelaçados). Ela então assum iu a posição yabyum e eu comecei a sentir uma vigorosa sensação de concentração. Também percebi uma concentração de energia no meu primeiro chakra e então notei que minha “consorte” estava sugando energia de seus canais esquerdo e direito e direcionando-a para o seu primeiro chakra. Isso estava criando um vazio no meu sistema de energia que puxava a energia para o meu prim eiro chakra. Novamente fiquei m aravilhado com a ressonância que houve entre nós. Era com o se duas vozes cantassem em harmonia: a mistura das duas energias criava algo que é mais do que a soma de suas partes. Senti uma profunda paz e um equilíbrio total no meu cam po de energia. (A mandala dos dois triângulos entrelaçados era a única chave que tinha para atribuir uma identidade à dakini que estava me instruindo. Essa é a mandala da deusa Vajra Vahari, a deusa associada ao fogo Dumo do Tantra tibetano. (Veja fig. 36, p. 229.)

10 de março Hoje m inha guia sentou-se à minha frente e m inha atenção foi atraída novam ente para o prim eiro chakra. Percebi que os canais esquerdo e direito que lá se encontram estavam maiores. Então o lugar onde eles se encontram pareceu se abrir e eles viraram para cima, como duas serpentes, para entrar no canal central. Depois de cerca de quinze

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Fig. 36. Mandaladc Vajra Vahari. Nessa mandala de meditação, Vajra Vahari está cercada por quatro dakinis. Todas estão numa postura de dança e parecem idênticas a Vajra Vahari, exceção feita ao colar e aos ornamentos em suas facas vajra, o que identifica cada uma com uma das cinco famílias dc Budas. Vajra Vahari emana do ventre cósmico, simbolizado por um triângulo invertido. Sua cor é o vermelho c ela está radiante de bem-aventurança; a energia primordial com a qual está relacionada é o fogo interior (Dumo). Da colcção thanka, de Scrgci Diakoff, reproduzida com permissão.

minutos, senti uma energia densa começando a mover-se para cim a no canal central. A imagem de um tubo de vidro sendo enchido com um líquido dourado veio à m inha mente. Quando o líquido dourado chegou ao nível do meu terceiro chakra, ele estava im pedido de continuar a subir por uma substância densa e escura. Depois que a pressão aum en­ tou, a energia densa foi em purrada para cima c eu a senti correndo pelo meu tórax e braços. Continuando a subir, o líquido dourado foi expelido pelo topo de minha cabeça. Tornei-m e uma fonte de luz dourada. M inha guia então veio e sentou-se na posição yabyum. Isso fez com que o fluxo de energia no canal central aumentasse. Havia a sensação de grande calor e am or quando nos sentam os abraçados sob esse chuveiro de energia dourada. Também tive a sensação estranha de estar sendo aberto de dentro para fora. Camada por cam ada parecia ser retirada, revelando vastos horizontes de espaço interior. Finalmente, tudo foi retirado e nada restou, nem eu, nem guia, nada, exceto uma brilhante luz dourada. Não faço idéia de quanto tempo permaneci nesse estado. Regressando, senti-me com o um Buda irradiando luz em todas as direções.

11 de março A meditação recomeçou hoje com o desenho do círculo e dos triângulos entrelaçados. Quando minha guia assumiu a posição yabyum, ela me disse para visualizar-me com o Vajrasattva. Quando o fiz, tive um lampejo vívido de uma iniciação que recebi de Gongpo Tsedam Rinpoche e senti a mesma expansibilidade que tivera naquela época. Essa expansão continuou até que meu corpo tomou as dimensões do cosmos. Havia espirais dentro de espirais de energia dentro de mim. Planetas espiralavam em volta do Sol que, por sua vez espiralava em volta do centro da galáxia, a qual movia-se através do espaço do meu corpo cósmico. Havia duas espirais principais de energia movendo-se para cim a e para baixo ao longo da minha espinha. Elas eram táo poderosas que todo o meu corpo girava.

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Senti então a unificação de forças que fluíam de um lado para outro desde o chakra da coroa até o prim eiro chakra. Isso resultou numa concentração de forças no chakra do coração. Tive a sensação como de milhões de sóis irradiando ondas de com paixão e de amor. Isso foi am pliado pela grande energia que eu estava recebendo da união com minha consorte. Senti que éram os o coração da criação e que todas as polaridades da vida emanavam de nós. Tive a profunda sensação de que tudo estava contido dentro de mim. Minha guia disse-m e que o yabyum de Vajrasattva era todoabrangente, que ele é o estado que antecede a entrada no Vazio. Ela então m e levou para dentro do Vazio. O intenso m ovim ento de energias dentro de mim estabilizou-se, e uma luz branca brilhante irrompeu em minha consciência. Senti como se fosse explodir e houve uma dolorosa pressão no meu sexto chakra. Isso durou pouco tempo. Depois, senti uma profunda paz, enquanto um som agudo ecoava pelos meus chakras superiores. Uma tepidez surgiu dentro de mim e com ecei a chorar. Sentimentos poderosos de amor estavam brotando de meu interior mais profundo — os sentimentos que eu havia buscado nos meus relacio­ namentos. Eu estava imerso em gratidão quando percebi que este amor é “m eu” ou, realmente, eu sou ele! Este am or jam ais pode ser tirado.

12 de março Hoje minha guia começou desenhando uma estrela de seis pomas em baixo de mim. Senti que minha aura estava sendo selada e alicerçada no interior dessa mandala enquanto a guia sentava-se à minha frente. Comecei a sentir uma sensação no meu corpo etérico, começando na minha pélvis e movendo-se através do meu estôm ago e do meu tórax. A frente do meu tronco eu sentia com o se estivesse sendo esticada e aberta. Essa sensação m oveu-se para cim a e sobre a m inha cabeça e, a seguir, para baixo, através do meu pescoço, dos ombros e da parte superior da espinha. A o mover-se para baixo através da região lombar, senti que alguns bloqueios estavam sendo abertos. A força então moveu-

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se para minhas pernas, para abrir a energia com prim ida nos meus joelhos. Depois que a força circulou pelos meus pés e de volta à pélvis, meu corpo etérico com eçou a pulsar com luz. Minha guia veio sentar-se na posição yabyum. Percebi que os canais esquerdo e direito pareciam ainda mais am plos hoje. Enquanto focalizava isso, percebi que a guia havia realmente fundido seu sistema de energia sutil com o meu. Quando o fluxo da Kundalini subiu pelo canal central, ele me parecia muito mais poderoso hoje, e me movi muito rapidamente para o Vazio. A pressão em meus chakras superiores era mais intensa e a luz me pareceu mais ofuscante. Até o final da m editação, toda essa intensidade estava concentrada no meu chakra laríngeo. M inha guia disse-me telepaticamente que o meu chakra da garganta estava sendo programado para desenvolver novos circuitos neurológicos no meu sistema nervoso.

13 de março Esta manhã, minha guia começou ficando em pé na minha frente e drenando alguma energia escura do meu corpo astral. Eu podia ver um remoinho de energia astral no nível do segundo chakra, cerca de dois pés à minha frente. Ela puxou o funil desse remoinho para a beira d a minha aura, onde ele se dissipou. M inha guia continuou de pé na minha frente, e eu podia sentir algo acontecendo no meu corpo astral. Ela me disse que estava colocando uma imagem de Vajrasattva na minha aura; visualizando-me como esse Buda, ela estava purificando o meu corpo astral. Ela então me pediu para assumir a identidade de Vajradhara e, quando o fiz, a vibração de m inha aura tom ou-se mais intensa. Senti uma grande alegria e uma profunda sensação de paz. Senti-m e confiante e triunfante — exaltado. Senti de novo a pressão em meus chakras superiores; a pressão tom ou-se tão forte que foi ficando cada vez mais difícil respirar (minha respiração realmente parecia parar diversas ve­ zes). Ao final da sessão, hoje, a energia estava tâo espessa, embora con­ tinuasse clara, que achei que meu corpo havia se transformado em cristal.

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14 de março Por cerca de uma hora e meia, m inha guia e eu sentamos na posição yabium concentrando-nos no primeiro chakra. T ive dificuldade para perm anecer concentrado na intensificação da Kundalini nesse ponto. Ao final da sessão, entretanto, eu estava virtualm ente vibrando de energia. A dakini me informou telepaticam ente que m inhas experiências na tradição tibetana haviam criado um veículo de consciência mais perfeito do que em qualquer outra vida, e que eu estava me reunindo com ele agora. Isso fez com que me lembrasse da m inha prim eira leitura psíquica. O sensitivo disse-m e que eu atingira a ilum inação numa vida passada com o lam a tibetano. Isto na ocasião confundiu-m e, pois eu não podia me im aginar como um iluminado numa vida anterior, se estava em tal confusão na presente. Eu tinha a idéia de que quando se alcança a iluminação, não se tem mais a necessidade de retom ar. Compreendi claramente então que em cada vida refazemos m uitos de nossos passos no caminho espiritual. Ainda que possamos ter feito algum avanço na vida, não obstante temos muitos padrões cárm icos que precisam scr desenvolvidos para que possam exaurir-sc. Podem os ter vidas posteriores nas quais nossos níveis mais amplos de realização não tenham plena expressão na m edida em que esses padrões estão atuando dificultando o autoconhecim ento. A vida nem sem pre se passa nos altos do Himalaia! Há também a probabilidade de subseqüente abuso do poder e conhecim ento com vistas ao auto-engrandecim ento, o que cria mais carm a e o fortalece.

16 de março Q uando m inha guia assumiu a posição yabyum no início da sessão, ela intensificou novamente o fluxo de energia dos canais direito e esquerdo para o canal central. Depois de uma hora mais o u menos, uma força purificadora retom ou pelos canais direito c esquerdo para

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encontrar-se no sexto chakra. Isso fez com que uma brilhante luz dourada se irradiasse do sexto chakra. Essa luz moveu-se para baixo através dos canais direito e esquerdo, aumentando a força através deles e para dentro do canal central. Pelo resto da sessão, senti novos níveis de energia percorrendo velozmente o canal central. Eu estava arrebatado, numa bem-aventurança extasiada, abraçando minha consorte. Essas dimensões de consciência estiveram dentro de mim o tempo todo. Esse é o estado a que sempre aspirei. R etom ar a essa felicidade tranqüila é como um sonho que se tom ou realidade. Estou muito grato por receber esta graça.

17 de março Hoje a sessão com eçou com o sempre, com m inha guia assumindo a posição yabyum. Durante cerca de quinze minutos ela criou um vazio no seu canal central para estim ular a energia no meu canal central. Logo apareceu um rio de luz branca-dourada fluindo do prim eiro até o sétimo chakra. Esse rio de luz continuou aumentando em volume e velocidade. De repente, o rio estancou e nível após nível de dimensões de luz começaram a surgir do âm ago do canal central. Eu resvalava ocasio­ nalmente para estados hipnagógicos e linha visões, mas era capaz de puxar-me de volta para manter a claridade do Vazio. Sinio-me ator­ doado, meus ouvidos estão zumbindo e há um a alta vibração zunindo através do meu corpo.

18 de março A sessão de hoje foi virtualmente a m esma de ontem, exceto que antes de entrar no Vazio m inha guia trouxe-me a imagem de Manjusri. Na mão direita ele em punha um a espada que sim boliza a claridade que quebra a ilusão do samsara. Na m ão esquerda ele segura o Dharma, livro que contém a sabedoria dos estados de consciência superiores atingidos

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durante a meditação. M inha guia instruiu-me a contem plar a qualidade de aparência da realidade comum. Eu estava mais uma vez mergulhado no oceano infinito de luz e paz. Fui deixado com uma verdade: a liberdade obtida com o corte dos apegos do ego é sinônim o de prosperidade! “Q uando perdemos a nós mesmos, ganham os a Fonte de tudo.”

19 de março Hoje, quando o rio de luz dourada fluiu para o canal central, minha cabeça caiu espontaneam ente para a frente; meu queixo pressionou meu tórax. Isto represou o fluxo do rio, que se tom ou tranqüilo c silencioso. Depois de certo tem po, m inha cabeça se ergueu e entrei no Vazio. A imagem translúcida de um Buda primordial (m ais tarde identifiquei-o como sendo o Buda Dhyani Vairocana) apareceu, e eu me identifiquei com sua consciência m editativa, o que me proporcionou uma profunda solenidade; um a serenidade muito mais profunda do que as palavras paz e tranqüilidade podem exprimir. Eu me sentia no fundo de um oceano de sossego; o m undo m anifesto parecia tão distante que sua superfície estava totalmente “ fora da mente e da visão”.

20 de março Esta manhã, as coisas começaram como de costum e, mas logo tomaram um curso interessante. M inha consorte parecia estar delibe­ radamente despertando sensações sexuais em mim . Eu estava chocado, mas tinha aprendido a confiar nessas experiências. De fato, tive uma ereção quando sua bela form a etérica dançou eroticam ente diante de mim. Sensações sexuais muitos fortes me inundaram quando ela veio para unir-se a mim na postura yabyum. Repentinam ente, tive uma forte reação: senti-m e desconfortável com a intensidade das sensações sexuais — “Preferiria estar m editando no Vazio!” (Uma bela frase de pára-

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choque.) A essa percepção, a energia sexual diminuiu. Compreendi que minha guia estava me encorajando a tomar uma decisão importante. Se a energia em que eu estava sendo iniciado fosse liberada para alimentar velhos padrões rom ântico-scxuais, eu seria escravizado por eles. M os­ traram-me com o isso, de fato, tinha acontecido num a vida passada e como esses apegos tinham-me afetado nessa vida. Compreendi isso, mas havia ainda uma parte de mim que argumentava: “Não é um a mulher com a qual eu poderia partilhar a sexualidade tântrica?” Uma coisa muito interessante aconteceu depois que concordei em soltar meus apegos. Meu prim eiro chakra parecia ser uma vagina, e havia um grande pênis crescendo dentro dela. Ele aum entou de tamanho até chegar ao chakra da coroa. Isto foi acompanhado por fortes sensações físicas e por uma poderosa sensação da força do linga. A metáfora yoni-linga evocou um intenso sentimento de satisfação e de auto-suficiência. Depois de cerca de dez m inutos de fruição desse estado, o linga com eçou a se expandir até o infinito. Novamente eu estava dissolvido no Vazio.

21 se março Na sessão de hoje, minha guia concentrou-se no meu corpo mental. Tive imagens da minha mente como um chip de com putador que estava sendo ligado à m ente-com putador cósmica. Quando isso aconteceu, uma vibração de freqüência muito alta e uma luz resplendente moveu-se do topo do meu corpo mental para baixo, até o meu chakra da coroa. A vibração e a luz se concentraram no sexto chakra, e senti que minha cabeça ia explodir. Quando m inha consciência se difundiu na mente universal, mergulhou no mar infinito da consciência da luz. Dessa perspectiva, vi ondas interm ináveis de vida ondulando em direção às praias dos mundos fenomênicos. Vi mundos inumeráveis sendo criados e destruídos por essas ondas. O sem-significado essencial dessas pulsações cósm icas inspiravam -m e uma grande alegria e uma sensação de libertação. Eu realm ente não sei por quê.

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22 de março Hoje meu corpo mental sentiu-se grande e pesado, como um grande sino de bronze. No topo dele, tive uma visão de minha alma sentada na posição de Vajradhara. Esse Buda parecia em anar do âmago do espaço — o mais profundo Self. Senti-me ilimitado e sereno, en­ quanto m inha consciência era trazida de volta a este nível.

23 de março M inha guia começou pedindo-m e para rever o que eu tinha experim entado ontem. Quando o fiz, uma quantidade enorm e de energia psíquica jorrou através de chakra da coroa para o meu sexto e o meu quinto chakras. Pensei que estava sendo dotado do poder de manifestar esses níveis de consciência em minha vida. Quando essas forças se moveram para o centro do meu coração, fui inundado com paz c com uma clara sensação de harmonia. Apesar da intensidade das formas psíquicas, continuei a m ergulhar mais e mais profundam ente nessa paz. Saindo da m editação, estou novamente cheio de gratidão.

24 de março Hoje m inha guia começou fazendo algum a cura e equilibrando todos os meus chakras e corpos sutis. Em seguida, sugeriu que eu me visse com o Vajradhara. Quando o fiz, senti sua claridade espalhar-se por todos os níveis de meu ser. Meu corpo etérico parecia eletrizado. Meu corpo astral estava impregnado de entusiasm o e fervor. Meu corpo mental cintilava com o uma estrela. Ela então disse-m e para meditar sobre Vajradhara, o que despertou em mim algum as fortes sensações negativas. O otim ism o juvenil e a positividade de V ajradhara desafiaram minha resistência a estar aqui na Terra. Achei muito difícil abraçar a poluição psíquica e material do nosso mundo. Eu era muito pouco

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tolerante em relação à ganância, à violência, c à exploração que opri­ mem o globo. Hoje tive uma clara intuição: se eu pudesse me manter focalizado no estado de consciência de Vajradhara, eu não seria afetado por essas forças ambientais. De fato, isso poderia ser a coisa mais benéfica que eu poderia fazer pelo resto do mundo. Vajradhara é “o mantenedor do Vajra”, o poder do indestrutível Vazio. Permanecendo no estado de consciência de Vajradhara, e não sucumbindo ao fluxo constante de sensações de julgam ento e pensamentos negativos, eu poderia ser uma unidade receptora e transmissora da vibração de Vajradhara nesta dimensão.

25 de março M inha guia começou a sessão de hoje sintonizando e clareando meus chakras e corpos sutis. Ela então sentou-se à minha frente em meditação profunda e projetou a imagem de Vajradhara no meu sexto chakra. Meditei sobre essa imagem durante toda a sessão. Percebi que, se todas as minhas ações se originassem nesse nível, minha vida seria automaticam ente dirigida pelo poder criador do cosmos. Enquanto meditava em Vajradhara, senti que meu corpo mental estava sendo programado para funcionar a partir da perspectiva de Vajradhara.

26 de março Minha guia chegou, sentou-se à minha frente e entrou em meditação profunda. Ela irradiava luz, e eu entrei em ressonância com ela. Isto levou-me imediatamente para o Vazio. Durante este último m ês tenho tido sonhos especiais. Hoje, ao final da m editação, lembrei de um sonho que tive a noite passada no qual havia um fluxo de energia saindo de minhas mãos quando entrei numa nova dim ensão de consciência. Relem brando a experiência do sonho, vi­ me transportado para uma vida passada. Eu era um eremita sentado

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numa caverna na índia, absorvido em meditação. Ao entrar mais pro­ fundamente nessa vida, vi que ela foi vivida em serenidade e harmonia com a natureza. Em justaposição à serenidade que experim entei hoje, estou agu­ damente consciente da ansiedade e tensão que carrego no meu corpo atual. Vi hoje quão m aravilhoso seria viver sem elas.

27 de março Esta m anhã minha guia dissolveu-se no Vazio logo depois de se sentar à m inha frente para meditar. Fui deixado a contem plar o Vazio em que vivemos. Submergi mais e m ais profundam ente nesse Vazio até sentir que estava de novo no fundo do oceano. Não importa quão tumultuada é a superfície da vida; as profundezas do Vazio são sempre calmas. Estou tendo um a idéia mais clara de como seria a vida vivida a partir das profundezas desta “m orada serena”.

28 de março Hoje m inha guia assumiu a posição yabyum e elevou a força Kundalini novam ente. Quando me tom ei consciente da pressão no sexto chakra, lembrei-m e de um sonho da noite anterior. N o sonho, a Kundalini havia subido pelo canal central e transpassado as pétalas do sexto chakra para revelar um a jóia que cintilava com a luz de um diamante. Senti que algum grande segredo havia sido revelado — o significado do m antra OM M ANI PA D M E HUM. No sonho, eu tentava dizer isso às pessoas porque tinha medo de esquecer essa verdade. Próxim o ao fim da sessão, tive uma imagem espontânea da porta de uma fornalha ardente sendo aberta e o fogo da Kundalini me quei­ mou com o um fogo devastador. Assim que as cham as diminuíram gradualmente, um a paz desceu sobre mim. Outra vez sentimentos de gratidão jorraram do meu íntimo.

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29 de março No começo da sessão, fui surpreendido por um a aura de cerimônia. Ao focalizar minha atenção nos planos interiores, tom ei-m e consciente de cerca de cem monges tibetanos. Eles estavam cantando, e pareceu que a atm osfera estava impregnada de incenso. De repente, me vi revivendo um sonho da noite anterior. Eu estava caminhando numa plataforma que havia sido pintada para parecer que não estava lá. Eu tinha medo de pisar nela, mas era impelido a fazê-lo. Em seguida, notei que um fio elétrico de alta tensão corria através da plataforma. Eu não podia ver muito bem e estava com medo de pisar nele porque não queria ser eletrocutado. Eu estava me vendo no sonho. Eu parecia um ser angelical vestindo um longo roupão branco. Quando saltei sobre o fio, passei para outra dimensão e meu campo de visão apareceu como se eu estivesse olhando através de um caleidoscópio. Estar em todos esses lugares ao m esm o tempo confundiu-me. Eu não sabia onde estava. Meus conceitos norm ais de espaço e tempo era inúteis. O lhando “para baixo”, vi uma imagem m ovendo-se na minha direção. Quando chegou mais perto, eu a vi como uma divindade tibetana. Tive um a sensação estranha de já tê-la visto antes, mas não a reconheci. Lem bro que tentei segurar a imagem da divindade ante mim, mas ela finalmente desapareceu. Na meditação a m esm a divindade tom ou a aparecer. Como os monges continuassem a cantar, minha guia disse-m e para contemplar aquela divindade. Eu estava muito impressionado com o seu poder, que parecia personificar o poder do Tantra. Seu corpo foi consumido numa espiral de cham as e ela afastou-se dinam icam ente sobre sua perna direita. Senti seu fogo queimando em mim; era uma energia transfor­ madora. O canto dos monges tom ou-se mais intenso. Comecei a pensar que estava sendo iniciado. Tive a impressão de que era algo que tinha que ver com o ensino, que. eu estava sendo habilitado para ensinar o Tantra. Desconfiei desses pensamentos; suspeitei que meu ego estava sendo tentado novamente. M ais tarde descobri que essa divindade era Vajrapani. Uma das implicações da iniciação Vajrapani é o potencial para propagar as sementes de realização quando esta desabrocha em nós.

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Fig. 37. Vajrapani é retratada na iconografia tântrica como um Bodhisattva ro­ deado de chamas, simbolizando a sabedoria que destrói todos os obstáculos. Ele usa jóias de um Bodhisattva e um cinto de serpente. Sua forma vigorosa pisa à direita numa casca de semente de uma flor de lótus. A flor e as se­ mentes do lótus se desenvolvem nesse mesmo tempo. Este e um símbolo tântrico tanto para a unidade como para a multiplicidade e para a relação sincrônica de causa e efeito. Pintura contemporânea de Àge Delbanco, reproduzida com permissão do artista.

Sete anos mais tarde, ao concluir este manuscrito, ainda continuo atento, cuidando para que as sem entes dessas experiências interiores floresçam em minha vida exterior. Olhando para trás, parece que a intensidade do fogo interior purgou-m e no meu mais profundo âmago. Seis meses depois da mais incrível experiência de pico, o entulho começou a ser vomitado em minha vida extem a. Estes últimos sete anos têm sido um dram a intenso após outro; os padrões cármicos mais profundos e negros dentro de mim têm sido estim ulados implacavel­ mente pelo poder da Kundalini. Em bora os laços do carma e do ego ainda se estendam para prender-me, a liberdade a que o cam inho tântrico conduz tom a-se mais evidente a cada dia. M inha convicção e saber crescem , enquanto meu orgulho e defesa se consomem. No entanto, de quando em quando, me pergunto se a necessidade de deixar acontecer nunca cessará. Mas sei que não; o cam inho tântrico é sem fim; não há lugar para estar, nenhum lugar de onde vir, ninguém a ser e nada a tomar-se. E sta é a essência da Sabedoria que Foi Além.

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GLOSSÁRIO DE TERMOS JUNGUIANOS Anim a: o aspecto feminino da psique do homem. Anim us: o aspecto m asculino da psique da mulher. A rquétipo: imagens ou configurações nas profundezas coletivas da psique, que definem os parâm etros da identidade pessoal. Inconsciente coletivo: a totalidade dos elementos transpessoais incons­ cientes da psique. Individuação: uma expansão gradual dos limites da identidade pessoal conducente à integração de um núm ero cada vez m aior de fatores pessoais e transpessoais reprimidos. Um sentido de totalidade e plenitude é atingido por esse processo. Self, a esfera toda de fatores arquetípicos e transpessoais da psique atuando como uma força unificadora ou transcendental. Sombra', os aspectos da psique inaceitáveis pela sociedade e rejeitados pela própria pessoa que podem atuar com o subpersonalidades autônom as abaixo do nível normal de percepção do ego-self.

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GLOSSÁRIO DE TERMOS TÂNTRICOS

Abhidharma: ram o metafísico e filosófico da doutrina budista. Arhat: literalmente “o vitorioso”, termo usado no budismo Hinayana para indicar o praticante que deixa a roda de nascimento e morte ao entrar no nirvana. Bardo: literalmente “um estado interm ediário”, geralm ente aplicado ao período entre a morte e o renascimento. Bija-M antra: sílaba primordial que denota um a força cósmica ou psíquica específica, usada em mantras e visualizações. Bindu: (Thig-Le, em tibetano): literalm ente “ponto”, denotando pontos potentes de vacuidade ou essência primordial. Bodhicitta: “M ente e Coração Ilum inados” de um Buda. M etafori­ camente visualizado com o um néctar branco-leitoso gerador de bem-aventurança. Geralm ente entendido com o uma atitude de compaixão e m otivação para atingir a iluminação visando o benefício de todos os seres sencientes.

244

Bodhisattva: pessoa que se esm era para gerar Bodhicitta e faz voto de uma vida de serviço abnegado, inclusive renunciando ao nirvana até que todos os seres atinjam a iluminação. Buddha: tanto a pessoa de Gautama, fundador do Budismo, como qual­ quer ser desperto. Chakra: “roda”, termo usado para descrever os centros principais de energia psíquica ao longo da coluna. D akini: “a que vai pelo céu”, espírito feminino que revela conhe­ cim entos secretos. Dharma: os ensinam entos universal.

integrados de

Buda Gautama, ou lei

Dharmakaya: o corpo celestial da Mente-Buda. Gelupa: uma das principais seitas do Budismo tibetano. Guru: “Portador de Luz”, i.é., mestre. Heruka: qualquer expressão iracunda da Mente-Buda usada como uma divindade em práticas tântricas avançadas. Hinayana: “Pequeno Veículo”, a forma original do Budismo propagada pelos discípulos de Buda Gautama. Ida: o canal psíquico secundário feminino ao longo da espinha. Jina: conquistador, nome dado aos cinco Budas prim ordiais porque sua sabedoria dissipa as ilusões do ego-mente. Jnana: o estado cognitivo inato no Vazio, c portanto a quintessência da Sabedoria.

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Kargyu: uma das principais seitas do Budismo tibetano. Karma: literalmente “ação”, referindo-se à relação de causa e efeito entre nossas ações mentais, emocionais e físicas e seus resultados em nossas vidas.

Klesa: obscuridade cármica causada pelo desejo ou ilusão que funciona como um obstáculo no cam inho da iluminação.

Lama: m onge ou mestre budista tibetano possuidor do conhecimento excelso da doutrina c prática do Budismo e/ou do Tantra.

M adhyam ika: escola de filosofia que serviu com o precursora da divulgada doutrina do Budismo M ahayana, baseada na teoria do Vazio e iniciada pelo sábio Nagarjuna no século II d.C.

M ahamudrá: literalmente “o grande gesto”. O Grande Selo ou símbolo que aponta em direção à m eta mais elevada do caminho tântrico, que é a união da intuição perfeita com o Vazio e a Libertação.

M ahayana’. “Grande Veículo”, em justaposição ao Hinayana, ou “Pe­ queno Veículo”. Uma doutrina mais difundida que se caracteriza por basear-se no Juram ento Bodhisattva, num grande panteão de divindades, meditação sobre o Vazio, c a importância do guru com relação à palavra da escritura.

Mandala\ o círculo divino usado na meditação e que representa forças psíquicas ou cósmicas específicas. Para Jung, as mandalas são a expressão do Sclf, o aspecto curador e globalizador da psique.

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M antra: canto sagrado que produz certos efeitos psíquicos. Cada divindade tem seu próprio mantra, usado para invocar suas qualidades na meditação. Maya: a grande aparição do m undo fenomenico, associada ao poder feminino de criação no Tantra hindu. Mudrá: gesto que simboliza a qualidade de uma divindade particular. Nada: canal sutil de energia psíquica do corpo-mente. Nirmanakaya: um Buda encarnado. Nirvana: “extinguir ou expirar”, a liberação do sofrim ento causado pelas ilusões do self egóico. Nyingmapa: a principal seita do Budismo tibetano. Pingala: o canal de energia psíquica secundário m asculino ao longo da coluna. Prana: a energia psíquica associada à respiração, relacionada com diferentes chakras e estados da mente, que circula nos canais sutis do corpo-mente. Prajna: consciência intensificada, associada às divindades femininas no Tantra budista. Sarnadhi: literalmente, “união com o Senhor”, estado profundo de meditação cm que a natureza de Vazio da realidade é plenamente compreendida; o termo 6 sinônimo de iluminação. Sambogakaya: corpo astral ou ilusório da M ente búdica. A forma que as divindades meditativas assumem durante a meditação ou ioga do sonho.

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Samsara: estado de existência cíclica condicionado pela ignorância e sofrim ento do self egóico. Siddhi: obtenção de poderes ou habilidades, tanto mundanos quanto espirituais. Shunyata: “ vazio”. No uso tântrico, denota a natureza de Vazio da realidade. Sushumna: canal psíquico principal ou central ao longo da coluna através do qual a Kundalini sobe. Tanira: antigo verbo significando “entrelaçar” e im plicando o contínuo urdir das forças cósmicas m asculinas e femininas que criam o teci­ do da realidade. Como um corpo de ensinam entos, o Tantra em ­ prega um panteão de divindades e seus rituais de meditação específicos. Tathata: a “coisa em si”, ou elementos precisos que compõem qualquer fenômeno; em outro nível, os atributos principais da existência, isto é, do Vazio. Thig-Le: veja Bindu. T ulku: um a reencarnação reconhecida de um teoricam ente uma em anação da Mente búdica.

ser

ilum inado,

Vajra: indissolúvel ou indestrutível e prístino, como um diamante, usado para sim bolizar o Vazio. Vajrayana: a escola tântrica do Budismo Mahayana. Yabyum: literalm ente “Pai-M ãe”, referindo-se às divindades masculinas e fem ininas em abraço sexual tântrico e sim bolizando a união da Sabedoria e da Compaixão.

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Yantra: um diagram a sim bólico que invoca uma divindade específica. Yidam: qualquer divindade m asculina ou feminina usada como objeto de m editação. Yoga: litcramenie, “união”, im plicando a ligação do m undano com o divino no corpo-mente. Em geral, inclui vários métodos físicos e mentais em pregados para estim ular essa união.

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