Est-601 - Apostila Aluno_presencial 2020

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA POLITÉCNICA DA USP

PECE – PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA EAD – ENSINO E APRENDIZADO À DISTÂNCIA

eST – 601 / STR - 601 PSICOLOGIA NA ENGENHARIA DE SEGURANÇA DO TRABALHO, COMUNICAÇÃO E TREINAMENTO

ALUNO SÃO PAULO, 2020

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EPUSP/PECE CURSO: ESPECIALIZAÇÃO EM ENGENHARIA DE SEGURANÇA DO TRABALHO – EEST EDIÇÃO/ANO: 1/2020 CRÉDITOS: Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - EPUSP DIRETORA: LIEDI LEGI BARIANI BERNUCCI Programa de Educação Continuada - PECE COORDENADOR GERAL: LUCAS ANTÔNIO MOSCATO Laboratório de Controle Ambiental, Higiene e Segurança na Mineração - LACASEMIN COORDENADOR: SÉRGIO MÉDICI DE ESTON VICE – COORDENADOR: WILSON SHIGUEMASA IRAMINA ASSESSORIA TÉCNICA E ADMINISTRATIVA: MARIA RENATA MACHADO STELLIN Equipe Técnica PP - ALESSANDRA ISABELLA SAMPAIO MARTINS Conversores Presencial para distância (CPD) - CAROLINA COSTA BATISTA - LUCAS BICUDO TING - KARLA JULIANE DE CARVALHO Filmagem e Edição (FE) - THALITA SANTIAGO DO NASCIMENTO Instrutores Multimídia à distância - IMAD (TUTORIA) - DIEGO DIEGUES FRANCISCA - FELIPE BAFFI DE CARVALHO - RENATA JULIANA LEMOS MARINHO Equipe Administrativa - NEUSA GRASSI DE FRANCESCO - CRISTIANE FIDELIS SOARES RIOS - FERNANDA GABRIELA DE CAMARGO LOPES - RAFAEL DA SILVA CRUZ ASSESSORIA DE NOVOS PROJETOS EDUCACIONAIS: VICENTE TUCCI FILHO Equipe Financeira - GUSTAVO SIQUEIRA DO NASCIMENTO ANTONIO - MADALENA EIKO HASEGAWA

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Equipe de Divulgação - NATALIA FIRMINO GUCCIONI “Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, sem a prévia autorização de todos aqueles que possuem os direitos autorais sobre este documento.”

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Sumário

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SUMÁRIO CAPÍTULO 1. COMUNICAÇÃO E TREINAMENTO .......................................... 3 1.1 TIPOS E TÉCNICAS DE COMUNICAÇÃO .......................................................... 4 1.1.1 Comunicação interpessoal ............................................................................ 5 1.1.2 Comunicação oral (apresentações) ............................................................. 15 1.2 DICAS PARA UM TREINAMENTO DE QUALIDADE ......................................... 26 1.2.1 Planejamento de um treinamento ................................................................ 27 1.2.2 ASPECTOS A SEREM CONSIDERADOS DURANTE E APÓS A APLICAÇÃO DE UM TREINAMENTO .................................................................. 29 1.2.3 O papel do engenheiro de SST na educação prevencionista....................... 35 1.3 POST-IT® ........................................................................................................... 37 1.4 TESTES............................................................................................................. 38

CAPÍTULO 2. NOÇÕES DE PSICOLOGIA: COGNITIVACOMPORTAMENTAL...................................................................................... 39 2.1 NOÇÕES DE PSICOLOGIA .............................................................................. 40 2.2 PSICOLOGIA COGNITIVA-COMPORTAMENTAL ............................................ 41 2.2.2.1 Ivan Pavlov (1849 – 1936).................................................................... 53 2.2.2.2 B. F. Skinner (1904 – 1990).................................................................. 55 2.2.3 O PODER DO HÁBITO ........................................................................... 66 2.3 POST-IT® ........................................................................................................... 73 2.4 TESTES............................................................................................................. 74

CAPÍTULO 3. NOÇÕES DE PSICOLOGIA: HUMANISTA E PSICANÁLISE . 75 3.1 PSICOLOGIA HUMANISTA ............................................................................... 76 3.1.1 Frederick Perls (1893-1970) e Laura Perls (1905-1990) .......................... 76 3.1.2 Kurt Lewin (1890 – 1947) ........................................................................ 85 3.2 PSICANÁLISE ................................................................................................... 85 3.2.1 Sigmund Freud (1856 – 1939) ................................................................. 86 3.2.2 Donald W. Winnicott (1826 – 1971) ......................................................... 87 3.3 POST-IT® ........................................................................................................... 89 3.4 TESTES............................................................................................................. 90

CAPÍTULO 4. NOÇÕES DE PSICOLOGIA: SOCIAL E ORGANIZACIONAL 91 4.1 PSICOLOGIA SOCIAL....................................................................................... 92 4.2 PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL .................................................................... 99 4.2.1 ASPECTOS COMPORTAMENTAIS ASSOCIADOS AO USO DE EPI.......... 107 4.3 POST-IT® ......................................................................................................... 110 4.4 TESTES........................................................................................................... 111

CAPÍTULO 5. CARACTERÍSTICAS DE PERSONALIDADE ........................ 112 5.1 CARACTERÍSTICAS DE PERSONALIDADE .................................................. 113 5.2 CARL G. JUNG................................................................................................ 117 5.3 REQUISITOS DE APTIDÃO NA SELEÇÃO DE PESSOAL ............................. 126 5.4 POST-IT® ......................................................................................................... 131 5.5 TESTES........................................................................................................... 132 BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................... 133

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Sumário

NOTA: Para muitos profissionais da área de exatas, estudar e entender os conceitos de psicologia pode representar um grande desafio, já que são diversas teorias para explicar um mesmo fenômeno e há muito embasamento filosófico. Nada é “preto no branco” ou exato na área de psicologia, o que significa um mundo bem diferente do que estamos acostumados, onde quase sempre 2+2=4! Por essa razão, essa apostila contém sessões chamadas de: “FREUD PERGUNTA: E eu com isso?”. A intenção dessas sessões é mostrar possíveis aplicações das ideias e bases da psicologia no ambiente de trabalho com o foco em prevenção de acidentes, bem-estar psicológico dos colaboradores, engajamento e motivação para as tarefas laborais, possibilidades de erro humano, dentre outros aspectos. Cabe ressaltar que essas sessões são fruto do meu entendimento e interpretação como profissional de SST. De nenhuma forma tenho a pretensão de tornar esses paralelos que foram estabelecidos entre a psicologia e a engenharia de SST como uma espécie de verdade absoluta, até porque para alguns conceitos foi necessário fazer uma extrapolação da ideia original. Um exemplo disso refere-se à psicologia analítica definida por Jung. Ele apresenta os conceitos de arquétipos em um determinado contexto específico. Para que essa ideia possa ser entendida no âmbito da engenharia de SST, foi feita uma extrapolação para outro contexto, o do ambiente de trabalho. De maneira análoga, tem-se também o item que apresenta os experimentos de Pavlov em relação a um determinado cenário específico dentro da análise do comportamento: o chamado “condicionamento respondente”. A extrapolação feita nesse exemplo vai além, ou seja, aproveita a ideia de aprendizado por associação e estabelece uma relação no ambiente de trabalho (que não foi o estudado no experimento e que não condiz exatamente com o tal “condicionamento respondente”). Isso deve ficar claro para que não haja um entendimento equivocado de alguns conceitos da psicologia quando extrapolados para a engenharia de SST. Outros exemplos serão apresentados e discutidos durantes as aulas. Bom estudo e, na dúvida ... pergunte ao Freud!

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

CAPÍTULO 1. COMUNICAÇÃO E TREINAMENTO

OBJETIVOS DO ESTUDO Apresentar conceitos sobre comunicação interpessoal, apontando as barreiras mais comuns no ambiente organizacional. Discutir alguns meios de comunicação, suas características e ferramentas. Fornecer dicas para um treinamento de qualidade, desde a fase de planejamento até a fase de revisão dos conceitos apresentados. Ao término deste capítulo o aluno deverá estar apto a:  Conhecer as principais características da comunicação interpessoal;  Saber os cinco pilares para estruturar uma apresentação no estado da arte;  Compreender o papel do engenheiro de segurança na educação prevencionista.

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

1.1 TIPOS E TÉCNICAS DE COMUNICAÇÃO De acordo com Machado (2014), a palavra comunicação vem do latim communicare e significa associar, trocar, partilhar ideias, dialogar. A comunicação é composta por elementos de emissão, recepção, mensagem, codificação, canais, respostas, feedbacks e ruídos. Terkeurst (2014), por sua vez, diz que a palavra hebraica para revelação é chazown, que significa “divina comunicação”. Onde não há comunicação, as pessoas se desviam (e se conflitam). Por isso esse processo é tão importante e seu entendimento deve ser aprofundado. As pessoas não vivem isoladas nem são auto-suficientes. Todos os seres humanos relacionam-se continuamente com outros através da comunicação interpessoal, que pode ser definida como a forma de transferência de informação e significado entre as pessoas. A comunicação interpessoal é o ponto de conexão para que as pessoas compartilhem sentimentos, fatos, pensamentos, valores e conhecimentos e necessita de pelo menos duas pessoas para acontecer, uma que envia e outra que recebe a mensagem. Bock, Teixeira e Furtado (2011) acreditam que o ser humano foi o que mais evoluiu no aspecto da comunicação, estabelecendo uma linguagem de símbolos coerente e transmissível que permite à espécie tanto a comunicação entre pares como a compreensão de si mesmo. A especializada comunicação humana foi o meio para a consciência e o pensamento, que é o grande diferencial da nossa espécie e que permite a você ler essa apostila. A comunicação humana é um fenômeno complexo e multideterminado, estudado por inúmeras disciplinas. Esse fenômeno refere-se à forma como os seres humanos entram em contato uns com os outros e leva em consideração que o homem é um ser social e que sem a comunicação seria impossível a constituição de sociabilidade e de cultura. A comunicação humana, portanto, é composta pelo conjunto de linguagens verbais (oral e escrita) e não verbais (símbolos, ícones, expressões artísticas) que servem como instrumento para o contato entre um ser humano e outro.

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

1.1.1 COMUNICAÇÃO INTERPESSOAL O processo de comunicação interpessoal funciona como um sistema aberto, logo é comum ocorrer algum ruído ou interferência, que significa uma perturbação indesejável que tende a dificultar, distorcer ou alterar, de maneira imprevisível, a mensagem transmitida. Durante uma conversa entre duas pessoas, um ruído poderia ser a grande diferença entre o sistema de crenças, valores, preconceitos, desejos, percepções e motivações destas pessoas, que dificulta a compreensão do significado da mensagem; uma interferência poderia ser o som intenso gerado por uma máquina (que dificulta que as pessoas ouçam o que está sendo dito). Além dessas barreiras pessoais e do ambiente, há também as chamadas barreiras semânticas, que são as limitações ou distorções decorrentes dos símbolos através dos quais a comunicação interpessoal é feita. As palavras, símbolos ou sinais podem ter diferentes significados para as pessoas envolvidas, distorcendo assim o conteúdo da mensagem. Tratando especificamente das barreiras pessoais, estas agem como um filtro codificador, de modo a condicionar a aceitação e o processamento de qualquer informação. Esse filtro seleciona e rejeita tudo o que for dissonante ou que possa ameaçá-lo. Essa defesa pode prejudicar o processo de comunicação, seja no envio ou na recepção da mensagem, alterando seu significado para ajustá-lo a um padrão aceitável para cada um. São as lentes através das quais as pessoas vêem seu mundo exterior e o interpretam. Deste modo, existe uma forte relação entre cognição, percepção e motivação. O conteúdo comunicado é intimamente relacionado com as percepções e motivações dos envolvidos, dentro de determinado contexto situacional. Diante do exposto, entende-se que o desenvolvimento da competência interpessoal exige a aquisição e o aperfeiçoamento de certas habilidades de comunicação para facilidade de compreensão mútua. Essas habilidades precisam ser treinadas e praticadas constantemente, para obter efetividade em termos de resultados. A comunicação interpessoal constitui a primeira área a ser focalizada no estudo das interações humanas. Cada pessoa pode fazer grandes progressos no que diz respeito a como se relacionar com os outros. É também o ponto de grandes dificuldades e conflitos dentro de uma equipe de trabalho, assim como

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

no ambiente interno das organizações. Portanto, os líderes e engenheiros de SST têm o dever de desenvolver em si e de facilitar o desenvolvimento nos membros de sua equipe, de habilidades imprescindíveis para a melhoria da qualidade da comunicação interpessoal. De acordo com a psicóloga Maria Luiza Sampaio Góes, algumas destas habilidades são descritas a seguir.  Diferenciar fato de inferência: quando nos comunicamos, devemos ter clareza sobre a informação que emitimos. Será que estamos falando sobre fatos ou inferências? Fatos são informações verificáveis e inferências são criações nossas, geralmente fruto de nossa dificuldade em assumir que não sabemos, ou da pressão do ambiente para que saibamos tudo. Como não é possível saber tudo o tempo todo, criamos informações a partir de fragmentos da realidade de que dispomos. Criar inferências é normal, pois podemos construir possibilidades em nossas mentes. Devemos, contudo, ter cuidado em não transformar estas impressões em verdades e assim transmiti-las como tal.  Ouvir com compreensão: ouvir com compreensão significa ir além das palavras que incluindo na habilidades e que o outro

o outro está emitindo; significa tentar entrar no seu mundo, minha compreensão as crenças, valores, dificuldades, sentimentos do outro. É preciso estar atento ao significado do está dizendo, para que se possa ir além das palavras e

verdadeiramente ouvir o que o outro está transmitindo. Para que eu possa ampliar minha compreensão sobre o outro, é importante também estar atento às informações não verbais (postura, tom de voz, olhar, ritmo da comunicação, entonação, movimentos).  Estar atento ao entendimento do outro: ao comunicar algo a alguém é preciso lembrar que entre o que eu falo e o que o outro compreende existe uma grande distância. Quando o outro decodifica minha mensagem, ele insere seus sentimentos, crenças, valores, vivências, expectativas, medos, desejos, conhecimentos e inferências na minha fala. Dessa forma, é preciso mais do que comunicar; é necessário verificar a compreensão do outro sobre o que estou tentando transmitir. Você pode solicitar ao outro que diga o que compreendeu da informação que você está tentando passar.  Verificar o seu entendimento: não é apenas o outro que pode sofrer

equívocos na compreensão da informação. Você também está sujeito a ter uma compreensão equivocada sobre o que o outro diz. Assim, é muito importante que se verifique a compreensão do que o outro está transmitindo.

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

Perguntar: “O que você está me dizendo é...?”, é uma estratégia muito simples que pode impedir grandes problemas de comunicação.  Ampliar a percepção sobre si e observar a adequação da sua comunicação:

o ponto de partida do desenvolvimento humano e do aperfeiçoamento das habilidades interpessoais é o autoconhecimento. Esta habilidade de conhecer-se, saber o que sente, pensa e deseja começa com o exercício cotidiano da auto observação. Muitas vezes nos percebemos fazendo ou dizendo coisas que nos causam estranheza, e nos perguntamos: “Por que eu disse isso?”; ou ainda: “Por que eu não disse o que estava sentindo / pensando?”. Ampliar a percepção sobre si é fundamental para que se possa perceber a adequação da comunicação e assim, corrigir possíveis falhas.  Ampliar a percepção sobre o outro e o ambiente: estar atento a si é muito

importante, mas é necessário também estar atento ao outro e ao ambiente. Encontrar momento e local mais adequados para realizar a comunicação pode ser um fator diferencial no sucesso daquilo que se deseja comunicar. Estar atento à pessoa com quem se comunica pode reduzir muito as falhas na comunicação. Uma das mais comuns é o não ajuste da comunicação em relação às características do ouvinte. É preciso estar atento às diferenças entre as pessoas e utilizar um tipo de comunicação adequado a cada um, aumentando assim as chances de que o outro te compreenda.  Verificar se a informação está fluindo em todos os sentidos: temos o hábito

de acreditar que a comunicação é responsabilidade de nossos superiores, entretanto a comunicação clara e constante é responsabilidade de todos dentro da organização. Verifique se seus colegas possuem todas as informações necessárias para o melhor desempenho de seus trabalhos, se a sua equipe está bem informada e se não possui dúvidas e dificuldades de compreensão; se o seu líder está devidamente informado de suas atividades. Procure as pessoas e esclareça o que achar necessário; peça os esclarecimentos que necessitar. Quadro 1.1: Comunicação Formal e Informal A comunicação formal é composta pelos sistemas definidos pela gestão da empresa como jornal interno, mural de avisos, comunicados, palestras, diálogos diários de segurança etc. A comunicação informal é caracterizada pela comunicação interpessoal e é muito mais delicada e difícil de cuidar, visto

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

que depende de cada indivíduo e de seu sistema pessoal de crenças e motivações intrínsecas.

A psicóloga Maria Luiza Sampaio Góes acredita que em um ambiente corporativo turbulento e tenso, a comunicação formal pode ser controlada, revisada e ajustada de forma a fazer circular apenas as informações que a liderança deseja. Já para a comunicação informal, a forma de cuidar para que esta trabalhe a favor dos interesses prevencionistas é através da manutenção de um clima positivo, seguro e acolhedor para as pessoas. Assim, há um aumento da possibilidade de gerar confiança nas relações interpessoais para que a comunicação aconteça da forma mais transparente possível. As lideranças focadas no conjunto técnico e humano sob sua responsabilidade buscarão a criação de um ambiente salutar, onde seja baixo o nível de conflito interpessoal e a comunicação flua adequadamente; caso contrário, muitas ocorrências adversas poderão perturbar e prejudicar os esforços prevencionistas. Alguns exemplos dessa perturbação são:  Excesso de comunicação informal, configurando a chamada “rádio peão”;  Ampliação de fatos através de percepções distorcidas, criando um clima de medo e caos interno;  Redução dos riscos a partir de crenças pessoais (ex: isso não acontece conosco, somos corajosos e experientes), aumentando a exposição às condições perigosas;  Distorção de informações, transformando em pessoal algo que pertence à esfera da gestão (como a recusa em utilizar equipamentos de segurança, pois “isso é invenção do chefe que quer mostrar serviço para a diretoria”);  Atribuição de conteúdo emocional ao processo de comunicação, gerando um clima de estresse. A repetição deste padrão tende a criar separações na equipe, onde cada grupo desconfia do outro e protege-se comunicando o mínimo possível, o que contribui para cenários de risco por falta e/ou inadequação da informação (ex.: competições entre os turnos diurno e noturno);  Omissão ou distorção de informação quando da investigação de acidentes do trabalho, por falta de confiança ou desejo declarado de prejudicar

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

pessoas. Este comportamento normalmente é fruto de relações tensas e com baixo nível de confiança. A partir dos itens acima apresentados, fica mais fácil entender que esse tipo de comunicação informal é muito sutil e impossível de ser controlado a partir de normas, procedimentos ou ferramentas objetivas de gestão. A melhoria da comunicação interpessoal será resultado da manutenção de uma cultura organizacional que prestigie o respeito pelas pessoas, o reconhecimento e o trato das diferenças individuais e que considere a existência dos sentimentos humanos no ambiente de trabalho. O clima organizacional deverá ser constantemente monitorado e cuidado, impedindo que a inadequação das relações humanas contribua para a ocorrência de uma comunicação interpessoal poluída e destrutiva. Hallinan (2009) relata uma história engraçada ocorrida em 2006 em Las Vegas. Ele pergunta: qual é a coisa mais desajeitada e imbecil que alguém pode fazer no mundo? Sem sombra de dúvida, a lista de possibilidades é infinita. Mas no caso do bilionário e magnata dos cassinos, Steve Wynn, o voto vai para um episódio ocorrido quando ele estava recebendo a visita de alguns amigos famosos, incluindo uma jornalista e apresentadora bem conhecida. Wynn, notório colecionador de arte, aproveitou a oportunidade para exibir um de seus mais estimados tesouros: o quadro do retrato da amante de Picasso. Essa obra estava entre as mais valiosas do mundo. No momento em que Wynn se gabava para os amigos diante do retrato, fez um gesto de ênfase com a mão direita e acabou furando a tela com o cotovelo. “Oh, que me***, vejam o que eu fiz!”, disse ele de acordo com a jornalista, que relatou a ocorrência em um blog. Mas não foi isso que Wynn se lembrava de ter dito. Em entrevista publicada alguns meses mais tarde, ele se lembrou de ter usado uma linguagem um pouco mais delicada. “Simplesmente me virei e disse: Oh, meu Deus! Como pude fazer isso?”. A diferença de palavreado é sutil, porém reveladora. Quando recordamos nossas ações, tendemos a usar óculos com lentes cor-de-rosa. Sem que estejamos intencionalmente tentando distorcer o registro dos fatos (embora às vezes isso seja verdade!), somos propensos a lembrar de nossas próprias palavras e atos sob uma luz mais favorável do que eST-601 - Psicologia na Engenharia de Segurança do Trabalho, Comunicação e Treinamento / PECE, 2° ciclo de 2020

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

o testemunho alheio. Essa característica do uso de lentes distorcidas também faz parte da comunicação interpessoal. Outro aspecto a ser considerado na comunicação interpessoal é o fato de que o ser humano se comunica através dos canais sensoriais. Isso quer dizer que o olfato, tato, visão, audição e paladar devem ser observados com maestria para o estabelecimento de uma comunicação efetiva em qualquer área. Cada indivíduo possui um canal sobressalente e existem vários testes para identificar qual deles é preferencial. Através de uma percepção perspicaz, o comunicador consegue perceber o sistema comunicativo preferencial em cada um, conforme as características a seguir:  Indivíduos visuais: São pessoas que estruturam uma imagem para tomar decisões. Precisam visualizar uma situação em sua mente antes de decidir. Quando acessam lembranças, acessam imagens compostas muitas vezes com cores e detalhes. Costumam ser organizados.  Indivíduos auditivos: São pessoas que compreendem mais a mensagem falada que a escrita. Normalmente possuem uma boa dicção. Sua atenção é facilmente fisgada por uma música ou um som diferente. Preferem o telefone ao e-mail.  Indivíduos cinestésicos: São mais sensíveis, emocionais e sentimentais. Possuem lembranças ancoradas em sensações que viveram. Um abraço que recebeu, um vinho que degustou, um perfume que lembra alguém. Ao se comunicar, alguns sentem necessidades de tocar o receptor ou usar os gestos. Machado (2014) explica que a comunicação interpessoal pode se beneficiar de uma técnica conhecida como rapport. É um método pelo qual as pessoas se conectam, gerando confiabilidade no outro. Rapport é a capacidade de entrar no mundo de alguém, fazê-lo sentir que você o entende e que vocês têm um forte laço em comum. É a capacidade de ir totalmente do seu mundo para o mundo dele. Para praticar o rapport é necessário estar ciente dos próprios conflitos intrapessoais, ou seja, conhecer a si mesmo. Entender como você responde a cada estímulo, como se comunica e como age. O passo seguinte é compreender que o outro interpreta a mensagem de acordo com seu próprio modelo comportamental. Depois desses, deve-se estar habilitado para detectar o canal sensorial dominante (visual, auditivo ou cinestésico) do oponente. O quarto passo é identificar e usar instrumentos que contribuam para estabelecer algo em comum entre o emissor e o receptor da mensagem. As comunicações

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(incluindo as negociações) bem-sucedidas estão apoiadas na formulação de um rapport efetivo. Ainda sobre essa questão da comunicação interpessoal, o doutor Marshall Rosenberg, um psicólogo americano que cresceu em um bairro turbulento de Detroit, fez sua especialização em psicologia social e o resultado de seu estudo foi a criação da Comunicação Não-Violenta (CNV). Em 1984 ele fundou, na Califórnia, o Center for NonViolent Comunication (CNVC), que se transformou em uma organização internacional sem fins lucrativos. A CNV é um processo de comunicação através da linguagem da compaixão e empatia. Ela nos guia no processo de reformular a maneira pela qual nos expressamos e escutamos os outros. A CNV nos ensina a observar cuidadosamente (e ser capaz de identificar) os comportamentos e as condições que estão nos afetando. Dessa forma, a resistência, a postura defensiva e as reações violentas são reduzidas (ROSENBERG, 2006). Uma premissa básica da CNV é que ao julgarmos que alguém está errado ou agindo mal, o que estamos realmente dizendo é que essa pessoa não está agindo em harmonia com nossas necessidades. Julgamentos de si mesmo, assim como todos os julgamentos, são expressões de nossas necessidades insatisfeitas. Julgamentos moralizadores de quando nos culpamos tendem a perpetuar um estado de autopunição. Melhor do que isso é perguntar: “Quando me comportei da maneira da qual agora me arrependo, qual de minhas necessidades eu buscava atender?”. Quando usamos a linguagem da CNV, pensamos e nos comunicamos em termos do que há de errado com os outros para se comportarem desta ou daquela maneira – ou, ocasionalmente, o que há de errado com nós mesmos para não compreendermos ou reagirmos do modo que gostaríamos. Nossa atenção se concentra em classificar, analisar e determinar níveis de erro, em vez de fazer o que nós e os outros necessitamos e não estamos obtendo. Se tivéssemos sido criados na linguagem da CNV, teríamos aprendido a articular diretamente nossas necessidades e nossos valores, em vez de insinuarmos que algo é ou está errado quando eles não são atendidos. Todo tipo de crítica, ataque, insulto e julgamento desaparece quando concentramos nossa atenção em ouvir os sentimentos e necessidades por trás de uma mensagem. Quanto mais praticarmos isso, mais perceberemos uma verdade simples: por trás de todas essas mensagens que permitimos que nos intimidem estão simples indivíduos com necessidades insatisfeitas pedindo que contribuamos para seu bem-estar. Começamos a sentir essa harmonia quando mensagens que anteriormente recebíamos como críticas ou culpa começam a

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ser vistas como oportunidades de ajudar as pessoas que não estão tendo suas necessidades atendidas. Rosenberg (2006) enfatiza que se o objetivo for mudar as pessoas e seu comportamento ou obter o que se deseja, então a CNV não é a ferramenta apropriada. O objetivo da CNV é estabelecer um relacionamento baseado na sinceridade e na empatia. Quando os outros confiam que nosso compromisso maior é com a qualidade do relacionamento e que esperamos que esse processo satisfaça às necessidades de todos, então elas podem confiar que nossas solicitações são verdadeiramente pedidos, e não exigências camufladas. A empatia é a compreensão respeitosa do que os outros estão vivendo. Ao nos relacionarmos, a empatia ocorre somente quando conseguimos nos livrar de todas as ideias preconcebidas e julgamentos a respeito deles. Em vez de empatia, porém, há uma forte tendência a dar conselhos ou encorajamento ou ainda explicar nossa própria posição e sentimentos. A empatia, por outro lado, requer que a atenção esteja plenamente concentrada na mensagem da outra pessoa. Damos aos outros o tempo e o espaço de que precisam para se expressarem completamente e sentirem-se compreendidos. Acreditar que temos que “consertar” situações e fazer os outros se sentirem melhor impede que estejamos presentes. Quando estamos pensando a respeito das palavras de alguém, escutando como elas se relacionam com nossas teorias, estamos olhando para as pessoas, mas não estamos com elas. O ingrediente-chave da empatia é a presença: estamos totalmente presentes com a outra parte e com aquilo que ela está passando. Essa qualidade de presença distingue a empatia da compreensão mental ou da solidariedade. Para que seja possível incorporar a prática da CNV nas relações interpessoais, é necessário entender seus quatro componentes: 1. Observação 2. Sentimentos 3. Necessidades 4. Pedido Rosenberg (2006) explica que o primeiro componente da CNV acarreta necessariamente separar observação de avaliação. Precisamos observar claramente (sem acrescentar nenhuma avaliação) o que vemos, ouvimos ou tocamos e que afeta nossa sensação de bem-estar. Ao combinar a observação com a avaliação, diminuímos a probabilidade de que os outros ouçam a mensagem que desejamos lhes transmitir. Em vez disso, é provável que eles a

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escutem como crítica e assim, resistam ao que dizemos. Contudo, para a maioria de nós, é difícil fazer observações que sejam isentas de julgamento, crítica ou outras formas de análise sobre as pessoas e seu comportamento. Inferir o que outra pessoa pensa não é o mesmo que observar seu comportamento. Portanto, ao observar a situação, é preciso que haja neutralidade no relato. Diante do observado, faz parte do processo da CNV expressar os sentimentos que aquela situação provocou. Para isso, Rosenberg sugere que sejam utilizadas palavras que se referem a emoções específicas, em vez de palavras vagas ou genéricas. Por exemplo, se dissermos: “Sinto-me bem a esse respeito”, a palavra “bem” pode significar alegre, aliviado, empolgado ou várias outras emoções. Dessa forma, palavras como “bem” ou “mal” impedem que o ouvinte se conecte facilmente ao que podemos estar realmente sentindo. Além disso, expressar nossa vulnerabilidade pode ajudar a resolver conflitos. No terceiro componente da CNV (Necessidades) reconhecemos a raiz de nossos sentimentos. Rosenberg (2006) afirma que a CNV aumenta nossa consciência de que o que os outros dizem e fazem pode ser o estímulo, mas nunca a causa dos nossos sentimentos. Vemos que estes resultam de como escolhemos receber o que os outros dizem e fazem, bem como de nossas necessidades e expectativas específicas naquele momento. A CNV encoraja a pessoa a identificar o que ela está querendo: qual de seus desejos, necessidades, expectativas ou esperanças não foi atendido? Uma boa maneira de conseguir isso é associar seus sentimentos à sua necessidade: “Sinto-me assim porque eu ...” Quando expressamos nossas necessidades indiretamente, através do uso de avaliações, interpretações e imagens, é provável que os outros escutem nisso uma crítica. E quando as pessoas ouvem qualquer coisa que soe como crítica, elas tendem a investir sua energia na autodefesa ou no contra-ataque. Assim sendo, se desejamos obter uma reação compassiva dos outros, expressar nossas necessidades interpretando ou diagnosticando o comportamento deles é jogar contra nós mesmos. A partir do momento em que as pessoas começam a conversar sobre o que precisam, em vez de falarem do que está errado com as outras, a possibilidade de encontrar maneiras de atender às necessidades de todos aumenta consideravelmente. O quarto e último componente da CNV, de acordo com Rosenberg (2006), aborda a questão do que gostaríamos de pedir aos outros. Ao elaborar um pedido, devemos utilizar uma linguagem positiva e formular nossas solicitações na forma de ações concretas que os outros possam realizar.

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Muitas vezes usamos uma linguagem vaga e abstrata para indicar como queremos que as outras pessoas se sintam ou sejam, sem especificar uma ação concreta que os outros possam fazer para alcançar aquele estado. Pode ser difícil formular solicitações claras, mas pense em quanto será difícil para os outros responder à nossa solicitação se nós mesmos não temos clareza quanto ao que queremos. Uma mulher diz ao marido: “Estou aborrecida porque você se esqueceu da manteiga e das cebolas que pedi para comprar para o jantar”. Embora para ela possa parecer óbvio que ela está pedindo para ele voltar à loja, o marido pode pensar que suas palavras foram ditas apenas para ele sentir-se culpado. Sempre que dizemos algo a outra pessoa, estamos pedindo alguma coisa em troca. Pode ser simplesmente uma conexão de empatia como evidência de que nossas palavras foram compreendidas, ou podemos estar pedindo uma ação que satisfaça às nossas necessidades. Quanto mais claro formos a respeito do que queremos da outra pessoa, mais provável será que nossas necessidades sejam atendidas. Rosenberg (2006) enfatiza que a mensagem que enviamos nem sempre é a mensagem que é recebida. Geralmente dependemos de pistas verbais para determinar se nossa mensagem foi compreendida da maneira que queríamos. Mas, se não temos certeza de que foi recebida como pretendíamos, precisamos solicitar claramente uma resposta que nos diga como a mensagem foi ouvida, de modo que corrija qualquer mal-entendido. Em algumas ocasiões, basta uma pergunta simples como: “Está claro?”. Em outras, para nos sentirmos confiantes de que fomos realmente compreendidos, precisamos de mais do que um “sim, eu entendi”. Nessas ocasiões, podemos pedir aos outros para nos repetirem em suas próprias palavras o que eles nos ouviram dizer. Temos então uma oportunidade de reformular partes de nossa mensagem de modo que resolva qualquer discrepância que possamos ter notado no retorno que recebemos. Às vezes, gostaríamos de saber quais os sentimentos que foram estimulados pelo que dissemos e as razões desses sentimentos. Poderíamos dizer: “Gostaria que você me dissesse como se sente a respeito do que acabei de falar e suas razões para sentir-se assim”. Pedidos são recebidos como exigências quando os outros acreditam que serão culpados ou punidos se não os atenderem. Quando as pessoas nos ouvem fazer uma exigência, elas enxergam apenas duas opções: submissão ou rebelião. Em ambos os casos, a pessoa que faz o pedido é percebida como coercitiva, e a capacidade do ouvinte de responder compassivamente ao

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pedido é diminuída. Como saber se é uma exigência ou um pedido? Basta observar a reação de quem fez o pedido caso sua solicitação não for atendida. Como ouvintes, não precisamos de insights sobre dinâmica psicológica, nem de treinamento em psicoterapia. O que é essencial é nossa capacidade de estarmos presentes em relação ao que realmente está acontecendo dentro da outra pessoa: em relação aos sentimentos e necessidades únicos que uma pessoa está vivendo naquele instante (ROSENBERG, 2006). Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

1.1.2 COMUNICAÇÃO ORAL (APRESENTAÇÕES) Galvão e Adas (2011) explicam que grandes ideias, produtos e empresas morrem na praia justamente em encontros importantes, no momento do olho no olho. O contrário também acontece: projetos não tão bons e ideias não tão fantásticas acabam decolando sustentadas por apresentações eficientes e bem conduzidas. Dessa observação, eles constataram que não basta ter um bom negócio; é preciso que fique claro para o cliente o valor desse negócio. Mais ainda: o cliente precisa reconhecer o valor do negócio para ele próprio: “Está bem, sua ideia é fantástica. Mas será que ela pode melhorar minha vida?”. Anderson (2016) diz que uma ideia é qualquer coisa capaz de mudar a visão de mundo das pessoas. Se o palestrante conseguir provocar uma ideia impactante no espírito das pessoas, ele terá realizado um feito estupendo. Mais do que isso, terá dado a elas um presente de valor incalculável. Se você, no papel de um orador, tivesse uma varinha mágica, qual ideia mais gostaria de gravar na mente das pessoas? Para Anderson (2016), a obrigação número um de um palestrante é reconstruir na mente de seus ouvintes algo que faça diferença, o aperfeiçoamento de uma visão de mundo, de modo a melhor refletir a realidade.

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Uma apresentação bem estruturada coloca em foco justamente os benefícios de um produto, conceito ou ideia para quem está na audiência e faz isso utilizando uma comunicação atraente e impactante. No mercado, é comum ver empresas que simplesmente desconsideram as apresentações como parte de seu espectro de comunicação. Mesmo algumas empresas reconhecidas por darem verdadeiros shows em campanhas publicitárias tratam as apresentações com total amadorismo. Anúncios de projetos importantes, propostas de parcerias e convocação de pessoas para a realização de mudanças estratégicas acabam sendo feitas de última hora, a pedido do apresentador, por pessoas que não dominam o assunto e sequer conhecem o perfil da audiência. Algumas vezes a confecção da apresentação fica a cargo do próprio apresentador, que reserva 30 minutos na véspera de um evento importante para abrir o PowerPoint e montar um arquivo, resgatando slides de apresentações anteriores. Copia textos aqui, cola ali e dá um jeito de extrair um conteúdo, ou ao menos uma lógica, a partir de uma verdadeira miscelânea. A emoção, o impacto e a diferenciação gerados em outras mídias se esvaem em apresentações que não criam vínculos emocionais. Justamente no momento de maior proximidade entre pessoas, diante de um importante parceiro profissional, um acionista ou uma equipe inteira de vendas, a empresa se sabota. Prejudica sua imagem, sua ideia e os profissionais nela inseridos. Existe, portanto, uma grande lacuna entre o profissionalismo da comunicação em massa e o amadorismo com que são feitas muitas apresentações corporativas. Nessa lacuna estão incluídas as apresentações internas, externas ou mesmo reuniões estratégicas, agendadas às vezes com muito custo. Momentos relevantes são tratados com displicência, independentemente de qualquer estratégia de marketing previamente traçada. O reflexo disso, além de negócios perdidos na reta final, são profissionais fartos de apresentações corporativas e de cansativas sequências de slides. Para muitos, o PowerPoint se tornou sinônimo de monotonia, de chatice e tempo perdido. A reação da audiência é bem conhecida, já que:  As pessoas ficam entediadas, desinteressadas, sonolentas;  Em vez de se concentrar nas palavras do apresentador, muitos se dispersam;  Alguns se entregam aos maiores concorrentes de uma apresentação: as trocas de mensagens e e-mails via celular;  Uma parcela do público não capta as mensagens que o apresentador está tentando passar;  Muitos se revoltam com o tempo perdido sem ter recebido nada em troca;

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 Os ouvintes fazem de tudo para fugir de futuras reuniões com o apresentador em questão. O pior de tudo isso? O objetivo do apresentador não é conquistado! Por isso que Galvão e Adas (2001) acreditam que a comunicação olho no olho precisa ser encarada com seriedade. As apresentações devem ser valorizadas e trabalhadas em suas minúcias. Eles dizem que, se você ainda não se convenceu ou se está reticente em relação ao assunto, veja alguns argumentos que justificam uma real dedicação diante de toda e qualquer apresentação:  Trata-se de uma oportunidade para reforçar a imagem e a identidade de uma ideia; tanto em relação aos conceitos, quanto em relação ao contexto;  Ela revela momentos decisivos para a conquista de determinado objetivo, seja uma venda, a motivação de uma equipe, a aprovação de verbas para um projeto, a mudança de um comportamento;  Ela coloca o apresentador diante de uma audiência supostamente formada por pessoas e grupos interessados, disponíveis para ouvir;  As pessoas interrompem suas atividades rotineiras para assistir uma boa apresentação e merecem receber algo relevante em troca;  Se bem estruturada, a apresentação valoriza as ideias, propostas e produtos, enquanto uma apresentação ruim pode destruí-los;  Ao contrário de uma campanha publicitária, a apresentação representa uma oportunidade única para a mensagem chegar à audiência e como tal, não deve ser desperdiçada;  Muitas vezes, as impressões que o apresentador deixa em seu público durante uma apresentação são as últimas que ele tem antes de decidir fechar ou não um negócio. É comum representarem a reta final para a venda de um produto ou de uma ideia que levou meses ou anos para ser desenvolvida. Anderson (2016) enfatiza que, na era atual, cada mínimo conteúdo participa de uma guerra pela atenção, pois ele luta contra milhares de outras solicitações de tempo e energia. Isso acontece porque a plateia possui instrumentos fatais de distração chamados smartphones, os quais podem usar para ter diante dos olhos milhares de alternativas ao conteúdo que está sendo apresentado. Quando e-mails e mensagens de texto começam a disputar a atenção do público, a apresentação pode estar condenada. Além disso, há também o problema crônico da vida moderna: o cansaço. Tendo consciência disso, um bom apresentador não deve dar motivos para que as pessoas se distraiam. Mas ... como conseguir essa façanha?

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Aguçar a curiosidade é uma das ferramentas mais poderosas que o orador tem à disposição para garantir a atenção dos ouvintes. Se o objetivo da apresentação é incutir uma ideia na mente do público, a curiosidade funciona como combustível que dá energia à participação ativa deles. Os neurocientistas falam de perguntas que geram lacunas no conhecimento, lacuna essa que o cérebro luta para fechar. E a única maneira de alcançar isso é fazendo seus donos ouvirem com atenção o que alguém tem a dizer. Para provocar essa centelha da curiosidade, a maneira mais simples é fazer uma pergunta. Mas não qualquer pergunta; precisa ser uma pergunta surpreendente. A curiosidade é o ímã que puxa o público atrás do palestrante. É preciso ter em mente que o objetivo de uma apresentação é convencer os ouvintes, em poucos instantes, de que aquele conteúdo merece o investimento da atenção deles. Em primeiro lugar vem a guerra dos dez segundos: o apresentador é capaz de fazer algo para garantir a atenção do público enquanto expõe o tema da palestra? Em segundo lugar vem a guerra do um minuto: o apresentador consegue usar o primeiro minuto para garantir que a plateia se empenhe a empreender com ele a jornada completa? Galvão e Adas (2011) explicam que uma boa apresentação deve seguir os mesmos preceitos de uma campanha publicitária: precisa impactar, encantar e imprimir uma mensagem na audiência até levá-la à ação. Praticamente todas as apresentações têm como objetivo levar pessoas a aderir a algo: pode ser uma ideia, um produto, um conceito ou mesmo uma mudança de comportamento. Considerando uma apresentação no estado da arte como um instrumento que presta um papel efetivo em direção a essa adesão, existem alguns elementos que diferenciam esse tipo de apresentação. A mensagem principal deve representar um benefício para a audiência e a linguagem utilizada para transmiti-la deve facilitar seu entendimento. Quanto ao apoio visual, deve ser capaz de reforçar as mensagens presentes no discurso do apresentador, ajudando a audiência na compreensão e na retenção do que é exposto. Quanto mais coerente tudo isso estiver com o perfil do apresentador, mais eficiente será seu desempenho e mais confiança irá inspirar na audiência. Com isso, despertam e mantêm o interesse do público, possibilitam um bom entendimento, geram brilho no olhar de quem ouve e, consequentemente, criam um cenário tão favorável quanto possível para conquistar a adesão dos ouvintes.

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Quadro 1.2: Elaboração de uma apresentação A elaboração de uma boa apresentação começa com um diagnóstico. Em seguida, tem-se a confecção do roteiro, a posterior divisão do conteúdo, o desenvolvimento do apoio visual (confecção de slides) e, finalmente, o treinamento do apresentador.

 Diagnóstico: a primeira etapa para a realização de uma apresentação é analisar uma série de aspectos a ela relacionados. Nessa fase, é importante questionar e ter respostas a itens como:     

Qual é o perfil da audiência? Que assunto será abordado na apresentação? O que essas pessoas sabem sobre o assunto que será abordado? Qual o objetivo principal dessa apresentação? Se tiver que fixar uma única mensagem na audiência, que mensagem

será essa?  De que forma o que será oferecido pode beneficiar a audiência?  Quanto tempo haverá disponível?  Quais são os pontos fortes do produto, projeto ou ideia que será apresentado?  Roteiro: escrito no Word, o roteiro é a história, a linha condutora da apresentação. Sua estrutura deve ser montada de modo a conduzir o raciocínio da audiência para a mensagem principal identificada ou estabelecida no diagnóstico. Existem vários recursos narrativos que, se bem empregados, podem gerar roteiros extremamente impactantes. Alguns exemplos são as metáforas, clima de suspense, pitadas de humor, uso de questionamentos, tom dramático ou até mesmo ir direto ao ponto.  Divisão do conteúdo: depois de concluído, o roteiro deve ser dividido em pequenos trechos, cada um deles com uma mensagem principal. Posteriormente, cada um desses trechos deverá gerar um slide, se possível composto de imagens e palavras-chave. O texto do roteiro fica apenas no discurso do apresentador.  Confecção de slides: é chegada a hora de elaborar os slides propriamente ditos. Eles são pensados e criados individualmente, cada um priorizando uma mensagem principal. Para que tenham uma unidade visual, os slides devem ser feitos com base em cores e elementos gráficos (fotos, ícones, linhas, formas etc.) previamente determinados. Trata-se do estilo visual da

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apresentação, que deve ser coerente com a marca ou com o tema que estão por trás. O PowerPoint é uma importante ferramenta para a confecção dos slides. Quanto maior o domínio desse recurso, maior será sua liberdade de criação. Anderson (2016) reforça que para qualquer apresentador, o princípio a seguir é sempre válido: melhor não usar slide algum a usar slides ruins!!! Dito isso, deve-se considerar que bons slides ajudam a maioria das apresentações; em algumas, os recursos visuais fazem a diferença entre o sucesso e o fracasso. Muitas vezes, as melhores explicações surgem quando palavras e imagens atuam em conjunto. A mente é um sistema integrado. Grande parte do nosso mundo é imaginada por meios visuais. Para isso, deve-se ter o cuidado de limitar cada slide a uma única ideia central. Um slide muito complexo cuja explicação poderia levar dois minutos pode ser substituído por três ou quatro slides mais simples a serem exibidos durante os mesmos dois minutos. Quando alguém fala e exibe slides, formam-se duas correntes cognitivas que fluem em paralelo. Sabendo disso, o apresentador precisa mesclá-las. Um slide composto de dezenas de elementos tem alta carga cognitiva. Nessas circunstâncias, o cérebro do ouvinte precisa decidir se vai se concentrar nas palavras do orador, nos slides ou nas duas e, em geral, a decisão é involuntária. Por isso, o orador tem que determinar para onde vai a atenção do seu público e evitar que a alta carga cognitiva exigida por um slide fique competindo com o que ele diz. Por fim, Anderson (2016) explica que a finalidade principal dos recursos visuais não deve ser comunicar palavras. A boca do apresentador já faz isso muito bem! A finalidade dos slides é mostrar aquilo que a boca não mostra tão bem: fotografias, vídeos, animações e dados importantes.  Treinamento: roteiro e apoio visual prontos significam o início do treinamento do apresentador, já que o pleno domínio do discurso e do apoio visual são ingredientes indispensáveis para o sucesso de uma apresentação (GALVÃO e ADAS, 2011). Especificamente no quesito treinamento do apresentador, Gina Barnett (instrutora de palestras do TED) afirma que o importante é ser capaz de recitar a fala no dobro da velocidade normal. Quando o orador consegue fazer isso sem dificuldade, reproduzir a palestra à velocidade normal se tornará uma ação automática e ele poderá focar 100% na expressividade. A ideia é não recitar o conteúdo, mas sim vivê-lo. Incorporá-lo. Desta forma, o único objetivo é chegar ao ponto em que lembrar as palavras deixe de ser um esforço e que se possa

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usar o tempo da apresentação para passar paixão e expressividade aos ouvintes. Dan Gilbert (professor de Harvard) aconselha seus alunos a primeiro fazer a apresentação diante de um gravador, depois transcrevê-la e por fim usar a transcrição como primeira versão da palestra. Ele explica: “Quando escreve, a pessoa é levada a usar palavras, frases, estruturas e ritmos que ninguém usa na fala espontânea. É por isso que, se partir de um texto escrito e tentar adaptá-lo para a apresentação oral, o orador estará basicamente tentando transformar uma forma de comunicação em outra e, o mais provável nesse caso é que a alquimia dê errado”. Sir Ken Robinson (um dos oradores mais talentosos do mundo, além de escritor e consultor internacional) acredita que as pessoas devem fazer o que as deixa à vontade quando expostas ao público. Se a memorização funciona, devem memorizar. Para ele, uma de suas prioridades ao fazer uma apresentação é estabelecer uma relação pessoal com os ouvintes e, para isso, precisa de espaço para improvisar. Porém, ele planeja suas apresentações com o maior cuidado. Em suas próprias palavras: “Sempre que subo ao palco, sei o que dizer até a hora de sair. Não importa em quantas salas eu já tenha falado, a plateia do presente é sempre nova e diferente.” Chris Anderson (presidente do TED) acredita que independente do modo de falar do apresentador, existe um instrumento bem simples e óbvio que pode melhorar uma apresentação, mas que a maioria dos oradores raramente usa: ensaiar. Muitas vezes!!! Os músicos ensaiam antes de tocar, os atores ensaiam antes das portas do teatro se abrirem ao público. No caso de uma apresentação, o que está em jogo é tanto ou mais do que em qualquer concerto ou peça, ainda que muitos oradores ajam como se achassem que podem simplesmente ficar diante do público que tudo dará certo de primeira. É por isso que, volta e meia, simplesmente porque alguém não se preparou da forma adequada, centenas de ouvintes precisam suportar minutos intermináveis de uma aflição desnecessária. O maior comunicador corporativo dos últimos tempos, Steve Jobs, não chegou lá apenas com talento. Dedicou horas a cuidadosos ensaios para lançar cada produto importante da Apple. Ele era obcecado pelo detalhe e isso fez toda a diferença na sua marca como apresentador referência. De acordo com o educador Salman Khan, o mérito do treino está menos na memorização e mais em fazer o apresentador se sentir à vontade, reduzindo sua tensão. Se ele estiver confiante e em estado de relaxamento, todos ficarão mais satisfeitos. Já Clay Shirky (escritor e professor americano)

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diz que os slides ajudam, mas é particularmente importante ensaiar a transição de um para o outro. O público precisa perceber na voz do apresentador quando ele está reforçando uma ideia e quando está mudando de assunto. Em relação ao controle do tempo, uma boa sugestão é considerar o tempo real como sendo 90% do total. Se a apresentação for de uma hora, leve em conta que terá apenas 54 minutos. Se for concedido apenas 10 minutos, o conteúdo deve ser preparado para falar em 9 minutos. Dessa maneira, haverá tempo para andar de lá para cá, fazer micro pausas para respirar, retomar os prováveis segundos de esquecimento e lidar com pequenos imprevistos. Além disso, o conteúdo ficará mais enxuto e o apresentador se destacará entre os demais que dançarão conforme a música no limite do tempo ou pior: extrapolando-o e pedindo desculpas por isso. Anderson (2016) sempre recomenda que o palestrante se imagine num encontro de ex-colegas de escola contando o que tem feito nos últimos tempos. Esse é o tom de voz que o apresentador deve buscar: autêntico, natural, mas sem medo de “botar pra quebrar” se for o caso. Tom Chatfield (escritor inglês) mencionou que o principal conselho que daria sobre apresentações é fazer todo o esforço possível para ser ousado e corajoso, procurando fugir da zona de conforto ou do que outras pessoas já falaram. O desafio é dar ao mundo perguntas e motivações que mereçam mil conversas. O importante não é estar certo ou se sentindo seguro, mas essencialmente ter uma chance incrível de criar algo capaz de gerar novas ideias. Para realizar uma apresentação eficaz, o orador tem de ir onde estiver o ouvinte e dizer: venha, vamos construir algo juntos. Ele precisa mostrar a razão pela qual vale a pena construir aquela ideia. Há um gesto de busca de comunicação, um apelo para o compartilhamento de valores, desejos, esperanças e sonhos. Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

Em complemento às dicas do conteúdo TED e do blog SOAP, há um livro bem bacana escrito por Mauro Fantini denominado “Holofotes: como planejar apresentações que conectam”. Em formato PDF e gratuito, o livro tem uma abordagem bem didática. Extraí algumas ideias que compartilho na sequência. Fantini (2018) faz um convite para imaginar que seus olhos são um holofote! Eles emitem uma luz que forma uma área iluminada. A área iluminada

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representa o que realmente está acontecendo em uma apresentação. Ela não se refere apenas aos slides que estão sendo exibidos, ou ao que o apresentador está falando. A área iluminada representa mais do que isso: diz respeito à velocidade da fala do apresentador, a duração da apresentação, ao conteúdo não verbal, etc. Cada holofote representa um elemento fundamental de uma apresentação: 1) apresentador; 2) conteúdo; 3) público. Apresentador: “Quem é você para me falar isso?”. Essa pergunta sempre está, conscientemente ou não, na cabeça do público durante uma apresentação. O que credencia o apresentador a falar sobre um determinado assunto? Qual a sua experiência a respeito desse tema? Conteúdo: é tudo aquilo que está relacionado com o assunto da apresentação e obviamente precisa estar na área iluminada. Ele é importante, mas não é a única coisa que importa. Dependendo de como ele é abordado, pode ser superdivertido, como também muito entediante. “Ele entende do conteúdo, sem dúvida, mas não tem didática”. Conhece alguém que ou já falou ou já ouviu algo parecido de um apresentador? Conteúdo é, sem dúvida, importante para uma apresentação, mas não é a única variável que vai definir a satisfação do público. Público: determinar o seu público vai ajudar a definir quais partes do conteúdo abordar e quais deixar de fora. Vai ajudar a entender o que é importante compartilhar. Uma pessoa se interessa por uma apresentação que esteja, de alguma forma, ligada a ela. A figura 01 a seguir ilustra esses três elementos fundamentais de uma apresentação.

Figura 01: Elementos fundamentais de uma apresentação Fonte: Fantini, M. (2018)

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De acordo com Fantini (2018), em uma apresentação os 3 holofotes são importantes e precisam ser colocados na área iluminada. Quando um ou mais holofotes ficam fora da área iluminada, há desconexão entre o apresentador e a plateia. Conteúdo fora da área iluminada: desconexão entre a expectativa do público e o foco do apresentador (“Putz, não era bem o que eu queria saber”); desconexão entre o aprofundamento necessário e o conhecimento do público (“Ah, o apresentador nem manjava muito do assunto.”; “Essa palestra era para especialistas, não entendi nada!”) Público fora da área iluminada: desconexão entre o conhecimento do público e a abordagem do apresentador (“Não acredito que eu saí de casa para isso.”); falta de clareza sobre o motivo de apresentar um assunto para um público determinado (“Até agora eu não entendi porque fui convocado para essa reunião. Eu tenho tanta coisa para fazer e estou aqui, perdendo meu tempo.”); falta de preocupação com o repertório que o público já tem (“Foi legal, mas seria ainda mais interessante se tivesse aberto para a participação da plateia.”). Colocar o público na área iluminada é saber das dificuldades que esse público tem e incluir na apresentação as dúvidas, incertezas e resistências que podem surgir na mente de cada pessoa da plateia. O público quer se sentir ouvido. Apresentador fora da área iluminada: abordagem do conteúdo é a mesma feita por outros autores (“Não entendo para que serve esse professor se ele só vai repetir o que está no livro.”).A experiência de vida do apresentador com relação ao tema não é compartilhada (“Eu entendi a explicação, mas queria saber como é isso na prática de um engenheiro de SST”). O palestrante entra no “modo apresentador” e não se expressa como faria se estivesse em uma conversa normal (“Como será que ele é fora desse papel teatral?”). Uma reflexão que um apresentador pode (e deve) se fazer é: “O que eu trago de exclusivo para esse evento?” Pensar nos holofotes individualmente já é bom, mas o grande salto de qualidade nas apresentações está na relação entre os 3 holofotes e na sobreposição deles. Sobrepor holofotes dá mais dinamismo, autenticidade e relevância a uma apresentação. Histórias pessoais são um excelente jeito de colocar você na apresentação, para dar vida e relevância ao seu conteúdo. Quando contamos uma história que vivemos, colocamos muito de nós para o público: opiniões,

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linguajar, gestos, costumes, crenças. Quanto mais mostramos, mais fácil é para o público se conectar conosco. PÚBLICO + CONTEÚDO: se você investir um tempo para mapear seu público, poderá trazer versões e edições do seu conteúdo mais apropriadas ao contexto da sua apresentação. PÚBLICO + APRESENTADOR: quanto mais o público se identificar com você (e para isso você tem que se mostrar para ele), melhor será a conexão. A relação entre público e apresentador é a ponte pela qual caminha o conteúdo. Porém, se quer se mostrar para o público, vai ter que mostrar tudo: o bom, o ruim, seus talentos e suas falhas. Quando mostramos nossa vulnerabilidade, nos tornamos mais humanos e mais parceiros do público, afinal estamos todos no mesmo barco. Ao contrário, quanto mais super-herói o apresentador se mostra, mais distante ele fica do público, pois parece não pertencer à mesma espécie. Ao revelar seu lado falível, o apresentador mostra ao público que embora tenha conseguido construir uma carreira sólida, por exemplo, ele também teve dificuldades, dúvidas e medos, assim como qualquer um. Boas apresentações deslocam constantemente os holofotes para dentro e para fora da área iluminada, gerando sobreposições diferentes a cada instante. A figura 02 a seguir ilustra esse dinamismo.

Figura 02: A apresentação é uma dança de holofotes Fonte: Fantini, M. (2018)

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Deixe que a apresentação tenha momentos diferentes: às vezes com mais conteúdo; às vezes com mais público e às vezes com mais apresentador. Nenhum espetáculo é estático; tem que haver movimento. Por exemplo, para os que gostam de filmes de terror, é certo que nenhum deles tem susto toda hora. É preciso que existam momentos de calmaria para que o susto tenha um impacto maior. De maneira análoga, uma boa apresentação é definida pela soma dos momentos de interação entre os três holofotes com a área iluminada. Quanto mais você se preocupar com a disposição dos holofotes, maior conexão você conseguirá nas suas apresentações. Contudo, preste atenção: se há um holofote inteiro dentro da área iluminada, os outros dois são expulsos e não têm nenhum espaço. Por isso, saber quais partes deixar de fora é saber focar no que interessa e assim, tornar a sua apresentação mais interessante (FANTINI, 2018). A figura 03 indica essa interação explicada.

Figura 03: Dosagem dos holofotes em busca da conexão Fonte: Fantini, M. (2018)

1.2 DICAS PARA UM TREINAMENTO DE QUALIDADE A psicologia nos ajuda a entender as pessoas e como elas se relacionam entre si e com o ambiente em que estão inseridas. Somos diferentes, pensamos diferentes e reagimos de forma diferente a um mesmo estímulo. Um supervisor ou gerente de SST precisa estar atento a essas características singulares e usar esse conhecimento para aperfeiçoar a efetividade de cada um na organização. Se fizermos uma relação dessa

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singularidade com os treinamentos na área de SST, veremos que a maioria segue um padrão para todas as pessoas. Mas na pressa, na ânsia de querer (e precisar) treinar, não conseguimos mensurar quanto do conteúdo foi realmente entendido; por quanto tempo o volume de informações ficará retido; se o que foi transmitido será usado e incorporado à rotina de trabalho (SMITH, 2009). De acordo com Bohrer (2013), o que se busca através de programas de capacitação dos trabalhadores (que incluem treinamentos, palestras e reuniões), é a aprendizagem de comportamentos adequados, dentre os quais, o comportamento seguro. Para tanto, vai depender muito da história de vida do trabalhador, de sua personalidade e de aptidões inatas que podem ser indicadas já nos processos de recrutamento e seleção de pessoal. A conscientização é uma etapa importante no aprendizado; o trabalhador precisa saber como proceder, ter clareza de sua função e do modo como agir diante das condições perigosas. Porém, esse aprendizado, por ser algo novo, muitas vezes encontra resistências que são comuns a qualquer ser humano em face de qualquer situação nova. Além disso, exigirá do trabalhador mudanças em seus padrões de comportamento, em seus valores, em sua postura e em suas atitudes, elementos da estrutura psíquica mais profunda do que a simples aprendizagem de procedimentos ou de conteúdo. Trata-se, portanto, de uma aprendizagem muito especial, no qual é preciso analisar as causas dos comportamentos para poder gerar, como consequências, comportamentos adequados. O ambiente de trabalho precisa oferecer condições para que tais comportamentos se constituam. A experiência do trabalhador com seu trabalho deve favorecer a manifestação desses comportamentos. 1.2.1 PLANEJAMENTO DE UM TREINAMENTO Um aspecto importante a considerar na fase de planejamento de um treinamento é não se fixar em apenas um modelo para todas as necessidades. Ainda que se considere apenas treinamentos internos para diferentes departamentos de uma mesma empresa, é preciso assegurar que esses departamentos estejam diante do mesmo problema que poderá ser tratado através de um único formato. Uma boa prática é fazer uma reunião com o supervisor e/ou gerente das áreas e obter suas perspectivas e necessidades, de forma a planejar um conteúdo e uma dinâmica que seja capaz de cobrir

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essas lacunas identificadas. Caso contrário, um único modelo de treinamento pode não ser prático e útil para aquele momento e para aquele público, o que representa uma perda considerável de tempo e esforço por parte de todos: facilitador(es), organizador(es) e participantes. Como parte da avaliação das necessidades de treinamento, faz-se necessário identificar as descrições de cargo / função (job description), conversar com os inscritos e seus supervisores e, se possível, observar os futuros participantes trabalhando. Dessa maneira os exemplos, demonstrações, dicas e referências que serão incluídas no conteúdo do treinamento poderão enriquecer muito a sessão (LUCAS, 2010). Para dimensionar um treinamento de forma adequada, é importante considerar o conhecido “cone da aprendizagem” (desenvolvido pelo professor americano Edgar Dale em 1969), que estabelece uma relação entre o grau de envolvimento que um participante tem durante um treinamento com sua capacidade de reter informações. Esse cone está ilustrado na figura 04.

Figura 04: Cone da aprendizagem Fonte: CORDEIRO, 2013

Essa figura indica que para a compreensão de tarefas que envolvam movimentos corporais, uma participação ativa deve considerar a prática de exercícios simples ou de uma série de ações, que aumentam a retenção do conhecimento. Para tarefas complexas e de alto risco (como pilotos de avião, por exemplo), uma experiência em um simulador é uma excelente prática. O mesmo se aplica às tarefas que têm relação direta com SST, em que normalmente não é suficiente apenas a leitura e a escrita para se considerar apto; é necessário fazer, atuando na parte “ativa” do cone. No caso específico

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de tarefas como operação de salas de controle, trabalhos em rede elétrica de alta tensão ou em operações mecânicas de grande porte, outra parte vital de um treinamento é assegurar que os participantes tenham uma boa compreensão de todo o sistema e da integração entre suas partes, principalmente para saber compreender e lidar com potenciais falhas dos componentes do sistema ou até mesmo identificar mudanças sutis que possam comprometer a operação e a segurança do operador (GLENDON, SHARON e MCKENNA, 2006). Anderson (2016) explica que parte fundamental do planejamento de uma apresentação consiste em acertar o equilíbrio entre os conceitos introduzidos e os exemplos e as metáforas necessárias para torná-los compreensíveis. Se uma explicação está construindo um pequeno modelo mental num amplo espaço de possibilidades, é útil, antes de tudo, reduzir a dimensão desse espaço. Ou seja, antes de expor as ideias, é importante deixar claro o que ela não é. Além disso, também é relevante considerar que para ser satisfatória, uma explicação precisa fazer uma ligação entre os fatos não compreendidos e o modelo mental que temos do mundo. As metáforas e as analogias são os principais meios para isso, pois ajudam a dar forma à explicação até ela se encaixar no lugar. Portanto, é fundamental levar isso em conta no planejamento. 1.2.2 ASPECTOS A SEREM CONSIDERADOS DURANTE E APÓS A APLICAÇÃO DE UM TREINAMENTO Em busca de resultados mais tangíveis após um treinamento, Lucas (2010) enfatiza que os participantes precisam e querem reconhecimento, obter sucesso, poupar tempo na execução de uma tarefa, se sentir mais seguros e desenvolver uma autoestima. Para garantir que essas (e outras) expectativas de um treinamento sejam atingidas, é necessário que o facilitador faça algumas perguntas:  Que tipo de ambiente de trabalho você prefere para maximizar o seu potencial de aprendizado?  Qual o perfil de facilitador que prende mais a sua atenção e que desperta o melhor em você?  Você aprende melhor vendo uma tarefa ser executada, ouvindo instruções sobre essa tarefa ou executando essa tarefa?  Quais treinamentos mais te marcaram no sentido de você ter retido a informação e ter se sentido motivado? Em quais aspectos? Dê detalhes.

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Em relação ao apresentador, sua primeira tarefa é encontrar a maneira de construir um laço humano de confiança com seus ouvintes, para que eles se disponham a lhe dar pleno acesso à suas mentes. Grandes oradores encontram formas de entrar em sintonia com o público em pouco tempo. Pode ser por meio de ações simples, como caminhar com segurança, olhar em volta, fazer contato visual com duas ou três pessoas e sorrir. Apoiado por um ocasional sorriso amistoso, o contato visual é uma ferramenta espantosa capaz de transformar a receptividade de uma palestra. Uma das melhores maneiras de desarmar uma plateia é revelar primeiro a vulnerabilidade do apresentador. Porém, deve-se ponderar se essa revelação beneficiará a apresentação ou servirá apenas como meio de atingir os objetivos. No primeiro caso, será eficaz; no segundo, vai prejudicar a confiança dos outros no orador. Outro instrumento fantástico para estabelecer conexão é fazer a plateia rir. A finalidade evolutiva do riso é, até certo ponto, criar vínculos sociais. Quando você ri com alguém, os dois sentem que estão do mesmo lado. Além disso, o riso derruba as defesas e, de repente, se tem a chance de comunicar de verdade com o público, sem barreiras (ANDERSON, 2016). Uma “sutileza” que pode fazer a diferença na hora de apresentar os benefícios do treinamento é substituir a palavra “o participante será capaz de ...” por “você será capaz de ...”. Dar um toque mais pessoal e direcionado a cada um imprime um tom mais direto e as pessoas se sentem parte do processo. Além dessa sutileza, é importante também garantir que todos os participantes do treinamento entendam os principais conceitos durante a sessão. Para isso, sugere-se ao facilitador que, em diferentes momentos, questione: Como você pode aplicar esse conceito em seu próprio ambiente de trabalho? Quais desafios você percebe na aplicação desses conceitos? Por quê? Mudar o tom da sessão de treinamento através do uso de slide show (onde as imagens vão continuamente passando na tela de forma automática à medida em que os participantes vão chegando) é outra boa dica. Dependendo do tema e do formato do curso, o facilitador pode projetar imagens de participantes de turmas anteriores durante as várias fases do treinamento com seus nomes, funções, comentários engraçados, informações sobre a empresa ou funcionários específicos que merecem algum destaque ou qualquer outra relevância que julgar apropriada dentro daquele tema.

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Para o caso de o facilitador fazer uso de vídeo, se este for tomar mais do que 20 minutos, recomenda-se mostrar trechos sequenciais mais curtos e intercalar com a participação do público, fazendo de uma pergunta ou um comentário que permita que os participantes expressem suas opiniões. Através dessas pausas, o facilitador faz com que sua audiência se sinta mais engajada no conteúdo do vídeo. No início de uma sessão (minutos antes) ou durante os intervalos é interessante colocar músicas associadas ao tema do treinamento ou ritmos de interesse geral, deixando que o fundo musical propicie um momento de relaxamento e descontração. Pessoas predominantemente cinestésicas processam as informações realizando algum movimento ou atividade. Enquanto eles pensam ou escutam, eles frequentemente estão movimentando suas mãos. Para estimular o aprendizado desse público específico, o facilitador pode direcionar a captação inconsciente de sua atenção através de objetos coloridos e “manipuláveis” à disposição. Além disso, caso o facilitador observe que muitos participantes estão brincando com esses atrativos, pode inferir que estão cansados e precisam de uma pausa. Com o intuito de manter a turma atenta, um recurso que costuma funcionar bem é alterar o formato de transmitir as informações (da explicação à discussão; do filme ao exercício) a cada 15 minutos. Essa alternância ajuda a manter os participantes interessados e os retêm mentalmente engajados. Jensen (2008) explica que a primeira maneira pela qual o facilitador influencia sua audiência é através da observação. Esse processo foi estudado por dois pesquisadores italianos (Iaccomo Rizzolati e Vittorio Gallasse), que descobriram que a observação ativa o sistema do cérebro conhecido como “neurônio espelho”. Em decorrência dessa atividade cerebral, a audiência pode, em graus variáveis, absorver o humor, as expressões faciais e os trejeitos do facilitador. Esse “efeito espelho” pode interferir de forma favorável ou desfavorável no processo de aprendizagem, já que os ouvintes se conectam com o estado emocional do orador, interferindo nos processos cognitivos. Por isso, facilitadores que costumam sorrir, brincar, usar o humor e expressar uma diversão genuína durante os treinamentos, costumam provocar um elevado nível de aprendizado e aproveitamento da sua audiência. Além do neurônio espelho, Jensen (2008) cita também a importância de passar credibilidade para o público, que é determinada pela habilidade de ganhar o respeito dos ouvintes. Essa credibilidade é influenciada pela aparência, pois foi observado que os facilitadores que se vestem de maneira

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adequada (“apresentável”, sem roupas muito informais ou que demonstrem um visual desleixado) experimentam poucos problemas de disciplina e mais aderência às ideias e propostas de trabalho. Concordando ou não, é fato que a natureza humana julga os outros (consciente ou inconscientemente), inclusive pela aparência. Por essa razão, a vestimenta do facilitador se torna um aspecto a ser ponderado. No final do treinamento, é importante deixar um tempo para que o participante prepare um rápido resumo dos principais conceitos abordados. Em pequenos grupos, permita que cada um expresse o que foi mais relevante para si. Ao final, peça um feedback dos grupos. Essa técnica ajuda a ativar o envolvimento e obriga o participante a refletir diante de tudo o que foi apresentado. Além do mais, quando se explica com as próprias palavras o que se entendeu, se está consolidando um conceito e o próprio aprendizado. Uma estratégia para encorajar os participantes a assumirem riscos é pedir a eles para compartilhar algo que eles gostam e que não gostam em seu trabalho e como consertariam aquilo que não gostam se eles tivessem o poder para isso. Caso você já tenha experiência com treinamento, compartilhe com a audiência as coisas que você já testou e que realmente funcionam e aquelas que não deram certo. Essa sua exposição permite a eles assumirem riscos e ajuda a promover ideias para lidar com situações semelhantes no seu futuro profissional. Uma das formas de evitar que o conteúdo não seja compreendido ou seja muito elementar é aplicar um questionário antes do treinamento. Essa ferramenta ajuda a identificar áreas de enfoque e direcionamento da profundidade em que os tópicos serão abordados. As respostas dos futuros participantes também ajudarão a identificar experiências na área que podem ser úteis durante o treinamento. Para sintetizar os principais conceitos, uma boa ideia é desenvolver uma parede do aprendizado, que dá aos participantes a oportunidade de recordar cada ponto chave que foi discutido durante o treinamento e identificar aqueles que são mais significativos e úteis para ele, em sua vida pessoal e/ou profissional. A sessão de fechamento é crucial para o processo de

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aprendizado. Normalmente deve ser considerado de 5 a 10% do tempo total do treinamento para essa sessão de resumo / revisão. De acordo com Ukens (2000), um dos recursos que pode ser usado nessa parte de fechamento e revisão dos principais conceitos é o exercício chamado de “um estranho no ninho”. Seu principal objetivo é fazer com que os participantes consigam identificar aquele item que não pertence ao grupo (porque não está alinhado ao conceito ou às características dos demais). Depois que essa prática for realizada, é interessante discutir sobre como foi feito o exercício: o grupo unido identificou o estranho no ninho ou isso foi feito individualmente? Por quê? É mais fácil trabalhar em grupo ou sozinho? Caso tenha sido feito em grupo, houve algum momento de tensão? A pressão do tempo para o término do exercício influenciou em alguma coisa o andamento do trabalho? Transferindo esse cenário para o ambiente de trabalho, como esses fatores e a tomada de decisão sob pressão impactam as tarefas e a segurança no trabalho? A figura 05 a seguir fornece uma sugestão resumida sobre o exercício.

Figura 05: Exemplo de exercício “Um estranho no ninho” Fonte: arquivo pessoal.

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As empresas (e principalmente os níveis hierárquicos superiores) deveriam enxergar os treinamentos como um processo e não apenas como uma atividade pontual. É importante estabelecer um vínculo entre um treinamento e os anteriores, demonstrar ao participante a utilidade prática do conteúdo que está sendo apresentado e, tão importante quanto, oferecer ao participante a oportunidade quase que imediata que colocar em prática o que foi aprendido. Se ele retornar à sua rotina e não exercer os novos conceitos e as novas práticas / habilidades adquiridas, ficará apenas a sensação de que o treinamento foi tempo perdido. Por isso, escalar um funcionário que logo após o curso sairá de férias não é uma boa ideia. Se o treinamento envolver algum software, a empresa deve assegurar que o departamento responsável (normalmente TI – Tecnologia da Informação ou equivalente) instale tudo o que for preciso antes do início do curso, caso contrário uma parte da informação será perdida se não for possível praticar e usar o software em seguida. Em cenários como esse, o retrabalho consumirá ainda mais tempo (um recurso bem escasso atualmente !!). Por mais que a teoria seja necessária, sempre que possível é importante conduzir atividades e exercícios, de forma que os participantes possam usar os novos conceitos e habilidades. Quanto mais eles virem, sentirem, ouvirem ou executarem algo, mais eles ganham, retém, recordam e usam o conteúdo após o treinamento. Dessa maneira, o facilitador aumenta a chance de que o conteúdo seja absorvido e transferido para o local de trabalho, além de aumentar a confiança do funcionário para aplicar os novos conhecimentos. Outra forma de reforçar a importância dos treinamentos é através da presença e do envolvimento do supervisor. Por isso, é de extrema relevância que o supervisor se mostre presente no início do treinamento, de maneira a enfatizar os objetivos, o que é esperado dos participantes em termos de resultados práticos após a aquisição dos novos conhecimentos e destacar as expectativas da empresa diante daquele investimento. Ao final, deve haver uma interação do supervisor com aqueles que foram treinados, de modo a discutir como foi o processo, se restou alguma dúvida, quais os principais pontos de destaque e, tão importante quanto, proporcionar situações em que o novo conhecimento e/ou habilidade possa ser usada antes que se perca. A mensagem que fica para quem foi treinado é: “Se meu supervisor (ou o gerente) está aqui, isso deve ser mesmo importante”. Para manter a chama acesa, Lucas (2010) sugere que o supervisor envie ao participante, algumas semanas após o término do treinamento, uma mensagem relembrando as expectativas da empresa sobre o que foi aprendido

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e se colocando à disposição para trocar ideias, discutir sobre os resultados percebidos pelo funcionário ao aplicar os novos conhecimentos (ou as dificuldades e resistências que ele está encontrando). Ao invés da mensagem, um breve bate papo pessoalmente também pode ser uma boa opção. 1.2.3 O PAPEL DO PREVENCIONISTA

ENGENHEIRO

DE

SST

NA

EDUCAÇÃO

Fazendo um link entre os programas de educação / capacitação e os aspectos motivacionais, pode-se estabelecer uma relação direta entre a pirâmide das necessidades primárias e secundárias e o processo de treinamento. Maslow definiu que as pessoas precisam ter suas necessidades básicas atendidas antes de partirem para patamares superiores. Nesse sentido, migrando esses conceitos para os treinamentos, é fácil entender a razão de normalmente haver água/café e algum tipo de comida (por mais simples que seja) em boa parte das sessões. Para atender a hierarquia da pirâmide de Maslow, a organização precisa considerar aspectos físicos, psicológicos e de segurança. Informações prévias a respeito de rotas de fuga, recursos disponíveis em caso de emergência e telefones de contato representam um bom começo. Em relação à segurança pessoal, é preciso assegurar que não há vazamentos e/ou derramamentos que possam provocar um escorregão, que as instalações elétricas estejam adequadas, que não haja bloqueio nos corredores e saídas de emergência e nem que estejam sendo usados equipamentos precários que possam provocar ferimentos aos participantes. Em relação às necessidades sociais, o facilitador deve lembrar que as pessoas precisam socializar e se sentirem parte de um grupo. Para tanto, atividades práticas e exercícios que permitam a interação proporcionam um atendimento a esse tipo de necessidade. Para a questão de estima e autoestima, é preciso lembrar do “ego” do participante, o que os outros pensam dele, respeito, cumprimento de metas e reconhecimento pelos esforços executados. Assim, cabe ao facilitador oferecer oportunidades e atividades em que os participantes possam demonstrar suas competências, cumprir ou

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superar metas, receber aprovação e reconhecimento (através de um sistema de premiação, por exemplo) e deixá-los sentir que deram alguma contribuição. É importante manter um ambiente em que os colaboradores sintam a satisfação pelas conquistas obtidas. No topo da hierarquia, Maslow definiu a evolução pessoal. Quando uma pessoa tem suas necessidades básicas satisfeitas nos níveis mais baixos da pirâmide, normalmente direciona sua atenção no cumprimento de objetivos pessoais ou em atingir novos padrões. Para essa necessidade, usar métodos de ensino de alta qualidade, mesclando diferentes técnicas e apresentando conceitos sólidos e atualizados, contribui significativamente para que o participante saia da zona de conforto e se sinta motivado a buscar mais sobre aquele assunto. Quadro 1.3: Maslow e o Treinamento O que é fundamental lembrar em relação à pirâmide de Maslow é que aquilo que motiva uma pessoa não necessariamente motiva a outra. Com isso em mente, ao planejar minuciosamente um treinamento, deve-se levar em conta diferentes recursos para tentar satisfazer a totalidade do público. Assegure uma ampla variedade de incentivos, recompensas, exercícios, momentos de relaxamento e diversidade dos recursos tecnológicos e lúdicos disponíveis.

Nessa direção, as chances de obter êxito com um treinamento considerado “estado da arte” aumentam consideravelmente (LUCAS, 2010).

Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

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1.3 POST-IT® Insira nesse post-it os pontos mais importantes referentes a esse capítulo: Quais foram os conceitos que você mais gostou? Qual assunto mais te chamou a atenção? Algum ponto específico que você se identificou? Depois de tantas coisas vistas e discutidas, do que você se lembra? De nada? Ops!

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Capítulo 1. Comunicação e Treinamento

1.4 TESTES 1) Como a comunicação interpessoal pode ser definida? a) Forma de transferência de informação e significado entre as pessoas. b) Forma de transferência de símbolos e ícones que são expressões de contato entre um ser humano e outro. c) Conjunto de linguagem oral e escrita que são instrumentos de relacionamento. d) Sistema de informação e troca entre duas pessoas em um ambiente de trabalho. e) Meio de relacionamento onde podem ocorrer ruídos que interferem nas mensagens transmitidas. Feedback: item 1.1. 2) Quais os três principais elementos de uma apresentação no contexto dos holofotes? a) Percepção, resposta e tempo de processamento. b) Público, palco e vestimenta do apresentador. c) Timbre da voz, movimentação no palco e conteúdo. d) Apresentador, conteúdo e público. e) Tempo de apresentação, posicionamento dos holofotes e postura do apresentador. Feedback: item 1.1.2. 3) Quais os preceitos de uma campanha publicitária que influenciam diretamente numa boa apresentação? a) Impactar, encantar e imprimir uma mensagem na audiência até levá-la à ação. b) Provocar uma identificação com a marca. c) Seduzir a audiência, despertando o desejo pelo foco da propaganda. d) Valorizar uma ideia e mostrar que a audiência está inserida nesse contexto. e) Revelar um momento marcante que sensibilize e toque o coração da audiência. Feedback: item 1.1.2.

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Capítulo 2. Noções de Psicologia: Cognitiva-Comportamental

CAPÍTULO 2. NOÇÕES DE PSICOLOGIA: COGNITIVACOMPORTAMENTAL

OBJETIVOS DO ESTUDO Apresentar as principais abordagens da psicologia. Apresentar alguns nomes que fazem parte da história da psicologia cognitiva-comportamental. Apresentar os conceitos e pesquisas que compõem cada uma dessas abordagens. Ao término deste capítulo o aluno deverá estar apto a:  Conhecer as quatro principais abordagens da psicologia adotada nessa disciplina;  Saber as diferenças entre os experimentos de Pavlov e Skinner;  Entender as contribuições de alguns dos conceitos da psicologia cognitiva e a relação destes com o comportamento humano, dentro e fora do trabalho.

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Capítulo 2. Noções de Psicologia: Cognitiva-Comportamental

2.1 NOÇÕES DE PSICOLOGIA De acordo com Kleinman (2015), a psicologia é o estudo dos processos mentais e comportamentais. Aqueles que trabalham no campo da psicologia tentam dar sentido aos seguintes itens: 1) O que o motiva a agir assim; 2) Como você vê o mundo. Esses dois itens aparentemente simples abrangem muitos temas diferentes que incluem emoções, processos mentais, sonhos, memórias, percepção, personalidade, doença e tratamento. O termo “psicologia” deriva de psyche (palavra grega para “espírito, alma e respiração”) e de logia (palavra grega para o “estudo de algo”). Embora as raízes da psicologia remontem aos filósofos da Grécia Antiga, somente em 1879, quando o psicólogo alemão Wilhelm Wundt criou o primeiro laboratório totalmente dedicado ao estudo da psicologia, é que o campo de fato começou a decolar. Desde então, a psicologia tem se expandido significativamente, muitas vezes sobrepondo-se a alguns estudos científicos tais como medicina, genética, sociologia, antropologia, linguística, biologia etc. Para Bock, Teixeira e Furtado (2011), a psicologia contribui no sentido de produzir leituras mais complexas e completas da realidade, analisando os aspectos da subjetividade que compõem qualquer ser humano. Para o propósito dessa disciplina, a psicologia será dividida em quatro grandes áreas:    

Cognitiva-Comportamental; Humanista; Psicanálise; Social e Organizacional. Ao optar por uma ou outra área, o que vai mudar na prática é o caminho

escolhido para chegar ao objetivo. O que difere uma da outra é a base teórica que a sustenta, bem como as técnicas usadas pelo profissional para atender seu cliente/paciente. A abordagem cognitiva trabalha nos processos de memória de curto, médio e longo prazo, em como o cérebro processa as informações e toma decisões. Já a abordagem comportamental trabalha em termos de antecedentes e consequentes. Acredita-se que a pessoa se comporta pela consequência de comportamentos anteriores. É uma linha de cunho educativo. A abordagem humanista abarca conceitos apropriados da filosofia, tais como existencialismo e fenomenologia. Está mais centrada em acolher o sujeito em sua singularidade, importando-se menos com o sintoma (transtorno/doença) e mais com o que o provoca, bem como o modo como o indivíduo interage com o mundo.

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De um modo simplista, a psicanálise trabalha com o inconsciente e com conceitos como id, ego, superego, pulsões, dentre outros. O método básico da psicanálise é o manejo da transferência e da resistência em análise. Por fim, a abordagem social e organizacional centra nas relações de grupo e na influência que a história de vida do indivíduo interfere no seu espelhamento diante do outro e nas suas decisões para ser aceito em um grupo. Considera também as práticas no ambiente de trabalho, os fatores que motivam e que levam ao absenteísmo e as relações interpessoais em diferentes ambientes laborais. 2.2 PSICOLOGIA COGNITIVA-COMPORTAMENTAL 2.2.1 COGNITIVA A vertente da psicologia cognitiva trata de como uma pessoa adquire, processa e armazena informações. Esse campo da psicologia começou a se afastar do estudo de comportamentos observáveis e passou a estudar processos mentais internos, tratando de temas como atenção, memória, resolução de problemas, percepção, inteligência, tomada de decisões e processamento da linguagem. Na psicologia cognitiva a atenção refere-se à forma como um indivíduo processa informações presentes em seu ambiente. Ao ler essa apostila, você também está absorvendo inúmeras sensações ao seu redor: o peso da apostila, os sons de uma pessoa próxima que fala ao telefone, o ruído externo, a sensação de estar sentada ou deitada, a visão do lado de fora da janela, a lembrança de uma conversa que teve e muito mais. O conhecimento de que uma música te deixa alegre e o conhecimento de que você gosta da cor vermelha são cognições. Os psicólogos que estudam a psicologia cognitiva querem entender como uma pessoa consegue absorver todas essas sensações diferentes e ainda se concentrar em apenas um único elemento ou tarefa (KLEINMAN, 2015). Quando uma pessoa fica sobrecarregada de sensações, acontece o que a psicologia chama de “cegueira por desatenção”, que pode ser entendida como um momento onde o indivíduo não percebe estímulos óbvios, mesmo quando estão bem diante de si. Essa cegueira se dá com todas as pessoas porque é mental e fisicamente impossível notar todos os estímulos. Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

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Capítulo 2. Noções de Psicologia: Cognitiva-Comportamental

A cegueira por desatenção anda de mãos dadas com a necessidade que muitas pessoas têm de fazer várias coisas simultaneamente, normalmente para ganhar tempo. Os ganhos que se julga obter com a capacidade multitarefas são quase sempre ilusórios. Isso porque o cérebro diminui o próprio ritmo quando se vê obrigado a revezar entre diferentes tarefas. Entremear uma e outra tarefa cria também outros problemas. Um deles é que esquecemos o que estávamos fazendo ou planejávamos fazer. Essa lista de coisas a fazer em nosso cérebro é conhecida como memória operacional; ela é que nos mantém informados sobre todas as coisas de curto prazo de que precisamos lembrar, como um endereço de e-mail que alguém acabou de nos dar. Mas o conteúdo de nossa memória operacional pode evaporar. Depois de cerca de dois segundos, as coisas começam a desaparecer. E os pesquisadores demonstraram que após quinze segundos de ponderação sobre um novo problema, já teremos esquecido os velhos. Isso implica em um alto potencial de ocorrência de grandes erros (HALLINAN, 2009). Outro custo da alternância de tarefas é a paralisação da atividade ou o tempo ocioso: quando estamos trabalhando em alguma coisa e somos interrompidos para fazer outra tarefa, leva um tempo para que voltemos a nos concentrar no que estávamos fazendo originalmente. Estudos sobre ambientes de trabalho constataram que depois de uma distração (um telefonema, por exemplo), demoramos até quinze minutos para recuperar um estado de atenção profunda (óh céus !!!). Os pesquisadores estão, cada vez mais, descobrindo que a capacidade multitarefas podem ser bastante perigosa. Consideremos, por exemplo, uma atividade simples como falar ao celular enquanto dirigimos. No finalzinho da década de 90 o Exército dos EUA estudou os efeitos que esse hábito acarreta a capacidade de dirigir. A conclusão? Todas as formas de uso de telefone celular implicam em significativos decréscimos na capacidade de reagir a situações de tráfego em rodovias. Esse estudo salientou que tal efeito é especialmente percebido no caso de motoristas mais velhos. A idade desempenha um papel significativo no efeito distrativo de conversas ao telefone celular. Quanto mais idosos, mais difícil de nos livrarmos das distrações. E você nem precisa ser tão experiente (leia-se = velho) assim: o declínio dessa capacidade de concentração é perceptível já a partir dos quarenta anos (Putz! Agora complicou !!). Ainda mais preocupante é o fato de que a atenção dividida pode gerar a “cegueira por desatenção”, que como já foi comentado anteriormente, é quando uma pessoa olha diretamente para alguma coisa e ainda assim não a vê. A

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Capítulo 2. Noções de Psicologia: Cognitiva-Comportamental

Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária dos EUA fez um estudo em que os carros foram equipados com câmeras e os pesquisadores puderam observar o que os motoristas faziam enquanto dirigiam. Ficou constatado que em 78% das colisões e em 65% das situações de quase colisão, os motoristas estavam olhando para outro lugar que não a estrada ou ocupados com uma tarefa secundária, como fuçando no celular ou mexendo no GPS. Na Europa, por exemplo, certos modelos da Volvo estão equipados com o Intelligent Driver Information System (IDIS: sistema inteligente de informação ao motorista), que bloqueia ligações telefônicas quando o condutor está mudando de pista ou fazendo uma curva (situações em que a atenção deve estar completamente voltada para a tarefa de dirigir). Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

Além do foco nas sensações, a psicologia cognitiva também estuda o funcionamento da memória, que se refere aos processos utilizados em aquisição, armazenamento, retenção e recuperação de informações. Para criar uma nova memória, a informação deve, em primeiro lugar, passar pela codificação, de modo que mude para uma forma utilizável. Após a codificação, a informação é armazenada na memória para poder ser utilizada mais tarde. Na verdade, a maior parte da memória está fora da consciência, até que seja necessária. Quando há essa necessidade, essa informação passa pelo processo de recuperação, permitindo que a memória armazenada seja trazida para a consciência. Para entender melhor esse processo, cabe detalhar os tipos de memória:  Memória sensorial: a informação auditiva é armazenada por três ou quatro segundos, enquanto a informação visual é geralmente guardada por não mais do que meio segundo.  Memória de curto prazo: essa informação será guardada por vinte a trinta segundos e é gerada prestando atenção às memórias sensoriais. Embora as memórias de curto prazo sejam rapidamente esquecidas, se essa informação precisar ser levada em conta por repetição, então passará para o próximo estágio.  Memória de longo prazo: Freud se referia à memória de longo prazo como inconsciente. A informação nesse tipo de memória está fora da consciência de uma pessoa, mas pode ser chamada e utilizada quando necessário.

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Capítulo 2. Noções de Psicologia: Cognitiva-Comportamental

Enquanto umas informações são fáceis de recuperar, outras podem ser de acesso muito mais difícil. De acordo com Kleinman (2015), como somos capazes de acessar e recordar informações da memória de longo prazo, uma pessoa consegue usar essas memórias ao interagir com outras, tomar decisões e resolver problemas. No entanto, a forma como a informação é armazenada ainda é um mistério. O que se sabe é que as memórias são organizadas em por meio de um processo conhecido como agrupamento (clustering). Em 1956, o psicólogo cognitivo George A. Miller publicou um artigo denominado “O mágico número sete, mais ou menos dois: alguns limites em nossa capacidade de processar informações”. Neste documento, Miller teorizou que a memória de curto prazo só consegue armazenar cerca de sete itens, mais ou menos dois, em cada momento. Por exemplo: um indivíduo terá dificuldade para conseguir se lembrar da sequência a seguir porque ela tem mais de sete números: 4 2 1 9 6 9 2 0 1 5 No entanto, agrupando naturalmente esses números em blocos, nossa memória de curto prazo será capaz de recuperar todos eles. Tente: 4 – 2 – 1969 – 2015. Antes, teríamos dificuldade para recordar os dez números individualmente, mas agora só temos uma sequência que consiste em quatro blocos e é mais fácil de lembrar. Ao tomar partes pequenas e organizá-las em conjuntos maiores (clustering), uma pessoa consegue melhorar sua memória.

Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

Hallinan (2009) cita que um jovem alemão chamado Hermann Ebbinghaus passou anos memorizando milhares de sílabas disparatadas, como DAX e QEH. De manhã, de tarde e de noite, ano após ano, ele fixava longas listas, repetidas vezes, até memorizar tudo. Apesar das dores de cabeça e da exaustão que sentia após essas sessões, ele fazia um intervalo de uma hora e depois testava sua memória. Ebbinghaus descobriu que quando as sílabas não faziam sentido algum (como DAX e QEH), eram rapidamente esquecidas. Após apenas uma hora, ele já não era mais capaz de se lembrar metade das sílabas que, com grande esforço, havia decorado.

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Capítulo 2. Noções de Psicologia: Cognitiva-Comportamental

Uma das formas que ajuda a superar esse esquecimento é recompor as informações sem sentido de maneira a atribuir um significado a elas. Esse é um velho truque conhecido como mnemônica, técnica posta em prática desde a Grécia antiga. Para que a comunicação boca a boca fosse precisa e sem quaisquer erros, as pessoas precisavam de uma maneira de memorizar blocos de informações. Por isso os gregos aprenderam a associar coisas sem sentido a coisas com sentido. Tente memorizar a seguinte sequência de números: 1–5–0–0–1–8–2–2–1–8–8–8 Nada fácil, certo? Agora, divida-os em três datas significativas da história do Brasil: 1500, 1822 e 1888 (descobrimento; independência; fim da escravidão). Beeeeeeeeeem mais fácil, de acordo? Esse agrupamento com atribuição de algum sentido aos blocos também é um exemplo de “clustering”. Além das sensações e do funcionamento da memória, outro fenômeno estudado nessa área da psicologia cognitiva é chamado de “dissonância cognitiva”. Em 1957, o psicólogo Leon Festinger sugeriu em sua teoria da dissonância cognitiva que cada pessoa tem um impulso e desejo interno de evitar a dissonância (ou desarmonia) em todas as suas atitudes e crenças (cognições) e que, em última análise, deseja alcançar a harmonia (consonância). Se uma pessoa tem uma sensação de desconforto em virtude da existência de cognições simultâneas e conflitantes, isso é reconhecido como dissonância cognitiva. Para reduzir esse desconforto e restaurar o equilíbrio, uma cognição precisa passar por algum tipo de alteração. A dissonância pode ser criada quando uma pessoa é forçada a fazer algo em público, mas que em caráter privado não gostaria de fazer. Isso cria uma dissonância entre a cognição que afirma “eu não quero fazer isso” e o comportamento. Esse conflito também é conhecido como conformidade forçada, que ocorre quando uma pessoa faz algo que é inconsistente com o que acredita. Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

Adicionado aos conceitos de sensações, memória e dissonância cognitiva, outro aspecto estudado dentro da psicologia cognitiva é a “heurística”, que aborda as estratégias mentais rápidas que as pessoas utilizam para resolver problemas. Elas são muitas vezes chamadas de estratégias “regras de ouro” e permitem que uma pessoa tome uma decisão rápida sem

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precisar parar e ponderar sobre qual seria o próximo curso de ação. Embora seja geralmente muito útil, a heurística também pode levar a erros, que são chamados de vieses (KLEINMAN, 2015). A heurística ajuda uma pessoa a decidir a probabilidade ou possibilidade de um evento ocorrer usando exemplos baseados naquilo que consegue lembrar. Isso pode levar a vieses porque, em vez de se basear em dados completos para fazer um julgamento sobre uma possibilidade, uma pessoa se baseia exclusivamente em suas lembranças. Os cientistas acreditam que os eventos recordados de forma fácil e rápida são geralmente os mais recentes. Por exemplo: se um indivíduo assiste ao noticiário e vê várias histórias sobre mortes por raios, pode acreditar que, em geral, há uma probabilidade elevada de ocorrência de mortes dessa natureza. Se um indivíduo consegue rapidamente fornecer exemplos de amigos que estão se divorciando, pode inferir que a taxa de divórcios está mais elevada, independentemente de quais possam ser as estatísticas reais. A heurística também pode fazer as pessoas superestimarem a probabilidade de eventos improváveis; elas podem ficar com medo de voar depois de ver um artigo sobre um recente desastre de avião. Por outro lado, podem subestimar a probabilidade de outros eventos que são mais prováveis. Por exemplo: as pessoas podem achar que sua probabilidade de contrair uma doença sexualmente transmissível (DST) a partir do sexo sem proteção é baixa porque seus amigos tiveram relações sem proteção e não contraíram uma DST, embora na verdade estejam no grupo de risco. Essas ancoragens e ajustes heurísticos são baseados na ideia de que as pessoas muitas vezes fundamentam suas decisões ou estimativas em “âncoras” ou pontos de referência. Essas âncoras são pedaços de informações que são recuperados da memória e ajustados em uma tentativa de se encaixar nos critérios da decisão. Alguém lhe pergunta: “A muralha da China tem a extensão maior ou menor do que 5.000 quilômetros? Será que ela é maior ou menor do que 8.000 quilômetros?”. Ao responder à primeira parte da pergunta, você terá uma âncora para responder a segunda parte e, assim, baseará sua resposta a partir dessa âncora. A heurística descreve também como as pessoas muitas vezes determinam a probabilidade de um evento procurando por algo parecido e conhecido com o qual podem comparar e, então, assumem que as probabilidades serão as mesmas. Nesse caso, o maior erro é a suposição de que a semelhança em um aspecto resultará em semelhanças em outros aspectos. Ao ver um homem com braços cobertos por tatuagens vestindo uma

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jaqueta de couro, uma pessoa pode assumir que esse homem provavelmente dirige uma motocicleta. A pessoa acredita que ele é representativo do que seria um motoqueiro e agrupa o homem nessa categoria, apenas pela tatuagem ou pela jaqueta de couro. A heurística ainda pode ser usada para explicar a falácia do jogador, em que as pessoas supõem incorretamente que têm a capacidade de prever eventos aleatórios ou uma série de vitórias ou derrotas consecutivas com base em informações anteriores, embora a probabilidade de ocorrência do evento seja a mesma. Se uma moeda for lançada várias vezes e o resultado for sempre “cara”, uma pessoa pode afirmar que no próximo lançamento certamente sairá “coroa”, porque “cara” já saiu muitas vezes. Nesse caso, ela estará ignorando completamente o fato de que há uma chance de 50% de dar qualquer uma das faces (KLEINMAN, 2015).

Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

Outro conceito da psicologia cognitiva é o chamado “viés de retrospecto”, que pode ser entendido como uma atitude comum quando a pessoa acredita (depois do fato) que algum evento passado era completamente previsível e óbvio, quando na prática o evento não poderia ter sido previsto. Antes do evento indesejado, tudo é obscuro e cheio de significados conflituosos. Basta pensar em qualquer processo de investigação de acidentes: o óbvio só é visto tarde demais! O psicólogo norte-americano John Ridley Stroop escreveu que o processamento de informações para a realização de uma tarefa pode causar interferência em outra atividade. Ele conduziu um estudo em que pedia a participantes que identificassem a cor de uma palavra (verde), porém impressa em outra cor (vermelho, por exemplo). Notou que as pessoas tinham dificuldade de identificar a cor correta. Esse fenômeno ficou conhecido como “Efeito Stroop” e ocorre quando duas tarefas se misturam e se confundem. Grande parte dos erros que cometemos no dia a dia deriva do fato de que percebemos ou olhamos de maneira errada para as coisas e situações. Esses cenários são conhecidos como problemas de “framing” (ou de interpretação / enquadramento).

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Em inglês, o substantivo frame significa moldura, estrutura, composição, construção. O verbo to frame é moldar, modelar, enquadrar, ajustar. Na psicologia, esses são termos metafóricos relacionados à construção de esquemas de interpretação. A ideia de framing se relaciona aos ângulos de abordagem dados aos assuntos e ocorrências. O frame é o quadro a partir do qual um determinado tema é processado e discutido. Essa elaboração de quadros é definida por um processo cognitivo; é como uma estocagem mental de ideias que guiam o processamento de informação e interpretação ou atribuição de sentido por parte do indivíduo. Boa parte da nossa compreensão do poder do framing é resultado do trabalho de Daniel Kahneman, professor da Universidade de Princeton, agraciado com o prêmio Nobel. Ele realizou uma série de pesquisas sobre como tomamos decisões, especialmente em condições de incerteza. Com os resultados, demonstrou que o modo como enquadramos as coisas pode afetar tremendamente nossa reação. Como produto de um de seus experimentos, Kahneman mostra que quando uma hipótese é formulada tendo como uma potencial consequência a morte, optamos pela alternativa mais arriscada, na qual há uma perspectiva (mesmo que bem pequena) de salvar quem estiver envolvido. Porém, quando consideramos ganhos, ficamos mais conservadores: simplesmente queremos nos agarrar ao que é mais garantido. Esse padrão deriva em parte do nosso modo de ver a percepção de riscos. Muitos outros fatores podem alterar a maneira como enquadramos nossas decisões. Um dos menos óbvios é o tempo. Quando as consequências das nossas decisões são distantes no tempo, estamos propensos a fazer apostas maiores. Contudo, quando as consequências são mais imediatas, somos invariavelmente mais conservadores. Dois exemplos dessa influência do tempo podem ser vistos na figura 06, através dos itens 2 e 8. No item 2, compara-se exposição futura versus exposição presente. Quando há exposição futura à condição perigosa (ex.: terei uma entrevista para um novo emprego no próximo mês), percebo esse risco como baixo hoje, porque ainda há um mês até a entrevista e não tenho com o que me preocupar agora. O item 8 indica que percebemos um risco como baixo (aceitável) quando as consequências são posteriores (ex.: fumante que sabe que provavelmente, depois de muitos anos fumando, poderá contrair um câncer de pulmão).

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Figura 06: Percepção do risco em função do tempo Fonte: Arquivo pessoal.

A percepção é, acima de tudo, seletiva: percebemos algumas coisas, outras não. Temos a tendência de prestar muita atenção ao início de uma frase, pois esperamos que esteja repleta de sugestões sobre o que pode vir a seguir. Lemos às pressas, passamos por cima. E quanto melhores somos em alguma coisa, mais provável que simplesmente comecemos a pular etapas. Dessa maneira, a precisão é sacrificada e os detalhes podem ser perdidos. Hallinan (2009) enfatiza que quanto mais familiarizados ficamos com algo, menos o percebemos. Vemos as coisas não como elas são, mas como supomos que deveriam ser. Um caso bizarro sobre esse aspecto aconteceu poucos dias antes do Dia das Bruxas, numa cidadezinha do interior do estado de Delaware (EUA). Por volta das nove horas da noite, uma mulher de 42 anos aparentemente subiu em uma árvore e usou uma corda para se suicidar por enforcamento, bem em frente às casas, numa rua relativamente movimentada. No momento do enforcamento estava escuro, mas assim que amanheceu seu corpo, suspenso a cerca de quatro metros do chão, podia ser facilmente visto pelos veículos e pedestres que por ali passavam. E mesmo assim ninguém viu ou notou o ocorrido. Só chamaram a polícia próximo ao horário do almoço, porque acharam que era uma decoração para o Dia das Bruxas (!!!). Por mais triste (e até absurdo) que seja esse exemplo, ele ilustra o quanto dependemos do contexto para orientar nossa percepção dos eventos cotidianos. O contexto é a grande âncora: confiamos e estamos sujeitos a ele, mais do que temos consciência dessa ancoragem. Isso não se aplica apenas

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às coisas que vemos, mas também àquilo que lemos. Para entender certas passagens, o contexto é pré-requisito. O problema com o contexto é que muitos de nós sentimos vontade de fazer diferente. Estudos demonstram que as pessoas não gostam de seguir instruções e, uma parte daquilo que lemos nós ignoramos ou não compreendemos. Num teste, por exemplo, pediu-se a 24 adultos que instalassem uma tomada residencial comum. Apenas 10 deram-se ao trabalho de ler as instruções. Desse pequeno grupo, sete consultaram as instruções apenas para verificar o código de cores da fiação elétrica. As demais informações foram ignoradas. Não é de surpreender que a maioria foi reprovada. Dos 24, apenas 5 instalaram a tomada da maneira correta. Ao invés de ler o manual, as pessoas preferem cortar caminho. Mesmo no caso de tarefas com a qual não se tem a menor familiaridade, as pessoas preferem agir a refletir. Quando temos alguma tarefa a realizar, deixamos de lado as instruções e partimos de nosso próprio modelo mental de como as coisas funcionam (ou deveriam funcionar). Mas nossos modelos, ao contrário daqueles formados pelos verdadeiros especialistas, invariavelmente contêm falhas ocultas que nos induzem ao erro. Independentemente da frequência com que erramos, nem sempre conseguimos aprender com nossos erros, porque não compreendemos sua causa básica. Essa análise das causas fundamentais requer um entendimento profundo das motivações humanas, já que acreditamos que vamos agir de uma maneira, mas muitas vezes agimos de outra. Pior ainda é o fato de que muitos sequer sabem quando estão sendo influenciados ou sugestionados. Nossos julgamentos e opiniões podem ser distorcidos pelo excesso de confiança ou por algum viés cognitivo, conforme já discutido. Quando você imagina uma cobra bem próxima ao seu pé, você acredita que ela seja inofensiva (componente cognitivo) se baseando apenas na sua imaginação. Assim, presume-se que você não sentirá medo e que estará preparado para lidar com essa situação (componente comportamental). Entretanto, se você realmente se deparar com uma cobra bem próxima ao seu pé, diferentes reações poderão ser observadas: aumento dos batimentos cardíacos; estado de alerta; medo; pânico; apreensão; desmaio etc. De acordo com Glendon, Clarke e Mackenna (2006), essa comparação do imaginário versus real mostra que apenas dizer às pessoas para imaginar uma reação diante de uma hipótese que tenha alguma ameaça (uma cobra), não prevê o suposto comportamento na “hora H”. Esse conceito é válido para o caso de simulados de emergência. O treino em si é válido, mas não é garantia

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de que tudo funcione conforme o esperado no ato da ocorrência. Dessa forma, para mudar um comportamento de SST no ambiente de trabalho, é necessário atuar tanto no componente cognitivo (atitude, percepção, motivação) quanto no componente comportamental.

Figura 07: Steve Jobs e o excesso de confiança Fonte: www.fazerseguranca.com

Sintetizando, Bohrer (2013) acredita que não basta um ambiente com estímulos favoráveis, um ambiente que reúna todos os critérios de conforto, ferramentas, preocupações ergonômicas e demais condições físicas adequadas para que o trabalhador execute suas funções, por mais simples que elas sejam. Um programa de treinamento ou aperfeiçoamento que serviu de base para o aprendizado da função também não é suficiente para garantir a efetividade na execução das atribuições. Para atingir a excelência na execução precisa-se atuar nas respostas para se chegar ao comportamento pretendido. Para modelar esse comportamento, utilizam-se os reforços. Ou seja, não basta ter consciência, não basta ter o conhecimento daquilo que se tem que fazer; é preciso que este fazer seja visto. Trata-se de direcionar a visão num sentido mais abrangente, para que se perceba a relação entre causa e efeito de uma determinada atividade; o que se faz e o que se tem de consequência do que foi feito, da resposta àquilo que se obteve de reforço de forma a reduzir os comportamentos inadequados e enfatizar os comportamentos desejáveis. No caso específico da Segurança do Trabalho, o comportamento a ser evitado é o comportamento de risco, que pode resultar em acidentes com danos à integridade física de quem o executa ou a integridade de algum colega. O comportamento a ser enfatizado é o comportamento seguro, a ser adotado de forma proativa, reduzindo a probabilidade de erros e de acidentes

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no trabalho. E por falar nisso, vamos agora tratar da abordagem comportamental para entender mais a fundo seus conceitos principais. 2.2.2 COMPORTAMENTAL De acordo com Andery, Micheletto e Sério (2007), tomar a espécie humana como um dos resultados do longo processo de variação e seleção pelo qual com que também processo. descreve

passaram os seres vivos faz olhemos o comportamento como um produto desse O termo comportamento sempre uma relação entre

atividades do organismo, que são chamadas genericamente de respostas, e eventos ambientais, que são chamados genericamente de estímulos. Dessa forma, define-se comportamento como a relação entre estímulo e resposta. O behaviorismo é a filosofia que suporta a análise do comportamento e dedica-se ao estudo das interações entre o indivíduo e o ambiente; ou, dito de outra forma, dedica-se ao estudo entre suas ações (respostas) e o ambiente (estímulos). O comportamento reflexo ou respondente é o que usualmente é chamado de “não voluntário”. Como exemplo, basta pensar na contração das pupilas quando uma luz forte incide sobre os olhos; na salivação provocada por uma gota de limão colocada na ponta da língua; no arrepio da pele quando um ar frio atinge o corpo; nas famosas “lágrimas de cebola”. Já o comportamento operante abrange várias atividades humanas – como os comportamentos do bebê de balbuciar, de agarrar objetos e de olhar os enfeites do berço – aos comportamentos mais sofisticados, apresentados pelo adulto. Nesse caso de comportamento operante, o que propicia o aprendizado é a ação do organismo sobre o meio e o efeito dela resultante: a satisfação de alguma necessidade. Desta maneira, o aprendizado está na relação entre uma ação e seu efeito; na relação entre um estímulo e uma resposta. Uma análise do comportamento pode auxiliar a descrevê-lo em uma determinada situação, ajudando a modificá-lo. É bastante conhecida uma prática de controle do comportamento utilizada no metrô das principais cidades.

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Um estímulo (campainha) é acionado quando a porta do vagão está prestes a se fechar. As pessoas se comportam (ou respondem) da seguinte maneira: ou entram/saem rapidamente ou param imediatamente. Os dois comportamentos garantem a segurança do usuário e evitam que as pessoas fiquem presas durante o fechamento das portas. De acordo com Kleinman (2015), embora o behaviorismo não seja mais tão popular quanto havia sido em meados do século XX, sua influência ainda pode ser encontrada nos métodos de educação pelos pais, nos métodos de ensino, no adestramento de animais e na mudança do comportamento de pessoas que são portadoras de patologias específicas (como por exemplo, compulsões – por comida, por compras, por sexo, por drogas, por ordem e limpeza etc.) Os principais nomes da linha comportamental da psicologia são Pavlov e Skinner, ainda que outros como John Watson e Steven Pinker também tenham dado suas contribuições. 2.2.2.1

IVAN PAVLOV (1849 – 1936)

Ivan Pavlov nasceu em Ryazan (Rússia) em 14 de setembro de 1849. Em 1930, ele começou a utilizar sua pesquisa sobre reflexos condicionados para explicar as psicoses humanas. Reflexo condicionado é uma resposta que fica associada a um estímulo com o qual não tinha relação anterior. Isso ocorre em função do pareamento do estímulo com outro que normalmente gera a resposta. De acordo com Kleinman (2015), o condicionamento clássico foi o trabalho mais famoso e influente de Pavlov e estabeleceu grande parte das bases da psicologia comportamental. Em essência, a ideia é simplesmente aprender algo por associação. Em seu experimento, Pavlov estudou a digestão em cães pela medição da quantidade de saliva que os animais produziam quando itens comestíveis e não comestíveis eram introduzidos. Ele notou que os cães começavam a salivar toda vez que um assistente entrava na sala. Acreditando que os animais estavam respondendo aos aventais brancos que os assistentes vestiam, Pavlov levantou a hipótese de que essa produção de saliva ocorria realmente em resposta a determinado estímulo e que os cães estavam associando os

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aventais brancos com a chegada da comida. Além disso, ele observou que a produção de saliva que ocorria quando o alimento era apresentado aos cães era um reflexo incondicionado, enquanto a produção de saliva resultante da visão dos aventais brancos era um reflexo aprendido (ou condicionado). Uma variação desse experimento pode ser feita substituindo os assistentes de aventais brancos pelo som de um sino. Para iniciar o processo, os cães são repetidamente expostos ao estímulo neutro (som do sino) e recebem imediatamente a comida. Passado um período, os cães começam a associar o som do sino com a chegada de comida. Quanto maior o tempo do experimento, mais profundamente arraigado fica o condicionamento. Concluída a fase de condicionamento, apenas o estímulo do som do sino já é capaz de fazer com que os cães comecem a salivar na expectativa de comida, independentemente dela ser ou não trazida e oferecida aos animais. Assim, a salivação tornou-se uma resposta condicionada. A figura 08 ilustra esse experimento. O experimento de Pavlov com os cães mostrou que condicionamento e resposta aprendida desempenham um papel importante para compreender a alteração de comportamento em seres humanos e o avanço do tratamento de problemas de saúde mental, como transtornos do pânico, transtornos de ansiedade e fobias.

Figura 08: Experimento com cães (resposta condicionada) Fonte: Kleinman, 2015

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Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

2.2.2.2

B. F. SKINNER (1904 – 1990)

Burrhus Frederic Skinner nasceu em 20 de março de 1904, na Pensilvânia (EUA). Aos 24 anos, matriculou-se no departamento de psicologia da Universidade de Harvard e começou seus estudos. O trabalho mais influente de Skinner, a invenção da câmara de condicionamento operante, veio desse período. Esse experimento com ratos, conduzido na universidade, é ainda uma das pesquisas mais importantes no que diz respeito ao behaviorismo, e compõe-se de quatro partes, descritas a seguir. Parte A: Reforço Positivo Coloque um rato faminto dentro de uma caixa. A figura 09 ilustra esse cenário. Toda vez que o animal pressionar uma alavanca dentro da caixa, ele receberá uma pastilha de alimento. Dessa forma, o rato aprenderá que ao pressionar a alavanca, ele obtém comida (condição positiva) e assim, um comportamento é incentivado através desse reforço positivo. Parte B: Reforço Negativo Coloque um rato dentro de uma caixa e aplique um leve choque elétrico em suas patas (condição negativa). Cada vez que o rato pressionar a alavanca, o choque é interrompido. De tempos em tempos, envie pequenos choques ao rato e sempre que ele pressionar a alavanca, interrompa o estímulo negativo. Através desse processo, o rato aprende que para interromper o choque é preciso acionar a alavanca. Ele aprendeu um comportamento com o intuito de eliminar uma condição negativa. Parte C: Punição Coloque um rato dentro de uma caixa e aplique um leve choque elétrico toda vez que ele pressionar a alavanca. O comportamento de pressionar a alavanca

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será enfraquecido por causa da condição negativa (choque). Esse é um exemplo de punição. Parte D: Extinção Coloque um rato dentro de uma caixa e não lhe dê comida nem choque elétrico quando ele acionar a alavanca. Ele não associará nem uma condição positiva (comida) nem uma condição negativa (choque) ao comportamento de pressionar a alavanca e assim, o comportamento de pressionar a alavanca será enfraquecido, até a extinção.

Figura 09: A caixa de Skinner Fonte: Kleinman, 2015

O condicionamento operante é aquele em que alguém aprende um comportamento como resultado de recompensas e punições associadas a esse comportamento. Quadro 2.1: Condicionamento Operante Skinner, através de seu experimento com ratos, estabeleceu quatro tipos de condicionamentos:  Reforço positivo: um comportamento é reforçado e a chance de se repetir aumenta por ter uma condição positiva como resultado.  Reforço negativo: um comportamento é reforçado a fim de evitar ou interromper uma condição negativa.  Punição: um comportamento é enfraquecido e a chance de se repetir

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diminui por ter uma condição negativa como resultado.  Extinção: um comportamento é enfraquecido até a extinção porque o resultado não levou a uma condição positiva ou negativa.

As técnicas operantes de Skinner ainda são úteis aos profissionais de saúde mental para ajudar no tratamento de crianças com autismo. Suas ideias de reforço e punição são usadas no ensino e adestramento de cães (KLEINMAN, 2015). Atualmente esses conceitos também são aplicados para tratar fobias e transtornos obsessivos e compulsivos, em processos de alfabetização, nas práticas esportivas para melhorar o desempenho dos atletas e até mesmo para lidar com os distúrbios do sono. Conforme Andery, Sério e Micheletto (2009), o comportamento operante descreve uma relação específica ambiente - organismo (estímulo - resposta). O que caracteriza essa relação é que a resposta produz alterações no ambiente, que são chamadas de consequências. Estas podem, por sua vez, fortalecer ou enfraquecer a resposta que as produziu. Quando retroagem fortalecendo a resposta (ou seja, aumentando a probabilidade de que voltem a ocorrer), essas consequências são chamadas de reforçadores (positivos ou negativos). Definindo essa relação na nomenclatura da análise do comportamento, tem-se a simbologia: S(ant) : R – S(conseq.), onde S(ant) representa o estímulo antecedente, R representa a resposta (um comportamento específico) e S(conseq.) representa a consequência decorrente daquela resposta ou comportamento. Essa simbologia indica a chamada tríplice contingência, que pode ser entendida como uma relação de dependência do tipo “se ... então”. Teixeira Jr., de Souza e Dias (2005) definem contingência como componentes das relações comportamentais que apresentam relação de dependência entre si. Para o comportamento respondente, se trabalha com as relações de estímulo e resposta. Para o comportamento operante, é mais comum se trabalhar com as relações entre estímulo antecedente, resposta e consequência (contingência de três termos ou tríplice contingência). Uma vez entendido o conceito da contingência, vamos voltar à simbologia: S(ant) : R – S(conseq.). É preciso agora entender os tipos de consequências possíveis advindas dessa relação. Como já dito anteriormente, quando as consequências fortalecem a resposta (ou seja, aumentam a probabilidade de que voltem a ocorrer), essas são chamadas de reforçadores (positivos ou negativos). Desta forma, a grafia mais apropriada para expressar essas duas possibilidades é:

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 S (ant) : R – Sr + (quando se trata de reforço positivo)  S (ant) : R – Sr - (quando se trata de reforço negativo) De acordo com Teixeira Jr., de Souza e Dias (2005), reforçamento ou simplesmente “reforço” é um processo utilizado para aumentar a frequência de um comportamento, sendo que o reforço positivo é um processo operante em que a apresentação de um estímulo positivo (reforçador) aumenta a frequência de respostas e o reforço negativo é um processo operante em que a retirada de um estímulo aversivo aumenta a frequência de respostas. Na tentativa de facilitar a compreensão, tenha em mente que na análise do comportamento, algo positivo introduz alguma coisa e algo negativo remove alguma coisa. Dito de forma resumida: positivo = introdução; negativo = remoção. Guarde essa informação porque ela será útil também para entender o conceito de punição baseado nas ideias de Skinner. Com o intuito de exemplificar um reforço positivo, imagine que você postou uma foto em uma rede social e recebeu muitas curtidas. Esse cenário representa um reforço positivo e é provável que você se sinta estimulado a fazer novas postagens, para receber mais curtidas. Do ponto de vista da linguagem da análise do comportamento, teríamos: S (ant) : R – Sr +, onde o S(ant) seria o Facebook ou o Instagram (por exemplo), o R seria seu comportamento de postar a foto e o Sr+ seria representado pelas curtidas que sua foto recebeu, o que te estimula a repetir o comportamento de postar mais imagens ou vídeos. De maneira análoga, vamos agora para o exemplo de um reforço negativo: imagine que você está com uma terrível dor de cabeça. Se você for como eu, não vai pensar duas vezes e vai logo ingerir um comprimido de Cafiaspirina com a intenção de se livrar do incômodo. Do ponto de vista da linguagem da análise do comportamento, teríamos: S (ant) : R – Sr -, onde o S(ant) seria a dor de cabeça, o R seria seu comportamento de ingerir um comprimido e o Sr - seria representado pelo fim da dor (remoção do desconforto), o que te estimula a repetir o comportamento de ingerir um comprimido nas próximas vezes em que sentir dor de cabeça. Repare que em ambos os exemplos, a consequência (independente se + Sr ou Sr -) te estimula a repetir o comportamento. Por isso se diz que um reforçador (positivo ou negativo) aumenta a probabilidade de respostas futuras, sejam elas respostas que introduzem algo bom (no exemplo, as curtidas) ou que removam algo ruim (no exemplo, o desconforto da dor). Para Skinner, o que define se um estímulo é um reforçador (positivo ou negativo) ou uma punição é a história de reforçamento. Dito de outra forma, a

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história comportamental, que Teixeira Jr., de Souza e Dias (2005) definem como as condições a que um organismo tem sido exposto e que afetam o seu comportamento presente. Isso quer dizer que para algo ser considerado reforçador, é preciso que tenha ocorrido algumas repetições de comportamento. Outro fator atrelado à definição de reforçadores e à história de reforçamento é a distinção entre Sr + e Sr -. Vamos aos exemplos que tentarão esclarecer essa ideia. Para você, o comportamento de estudar psicologia nesse curso de pós graduação em SST gera uma consequência do tipo Sr + ou Sr -? Caso você responda que estuda com o objetivo de adquirir novos conhecimentos e/ou evoluir como profissional, trata-se de um Sr +, ou seja, sempre que você estuda você aprende, se sente bem com os novos conceitos, fica satisfeito e portanto, estimulado a estudar mais daquele assunto (aumenta a probabilidade de repetir um determinado comportamento). Por outro lado, caso você responda que estuda apenas para não ser reprovado nessa disciplina, mas que ler e assistir as aulas de psicologia é uma verdadeira tortura para alguém da área de exatas, trata-se então de um Sr -, ou seja, você estuda para remover uma reprovação, que pode ser visto como um estímulo aversivo. No primeiro caso, você adiciona algo bom (conhecimento, satisfação); no segundo caso, você remove algo ruim (reprovação). Voltemos agora à definição de Andery, Sério e Micheletto (2009) sobre o comportamento operante, que descreve uma relação específica ambiente organismo (estímulo - resposta). O que caracteriza essa relação é que a resposta produz alterações no ambiente, que são chamadas de consequências. Estas podem, por sua vez, fortalecer ou enfraquecer a resposta que as produziu. Quando retroagem fortalecendo a resposta (ou seja, aumentando a probabilidade de que voltem a ocorrer), essas consequências são chamadas de reforçadores (positivos ou negativos). Até aqui, abordamos o conceito e exemplificamos alguns reforçadores. Agora é o momento de discutir as consequências que podem enfraquecer a resposta que as produziu, que são chamadas de processos punitivos ou simplesmente punição. Teixeira Jr., de Souza e Dias (2005) definem punição como um processo comportamental utilizado para reduzir a frequência de um comportamento e essa redução pode ocorrer de duas maneiras: a apresentação de um estímulo aversivo diminui a frequência de respostas (punição positiva); a retirada de um estímulo reforçador diminui a frequência de respostas (punição negativa). Lembra que foi pedido para guardarem a ideia de que: positivo = introdução; negativo = remoção? Ela será útil novamente aqui, para entender o conceito de

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punição, que Skinner (em 1953) definiu como: “apresentação de um estímulo reforçador negativo ou a retirada de um estímulo reforçador positivo”. Tá confuso? No começo é assim mesmo, mas vamos aos exemplos para tentar ajudar a esclarecer. Não desanime ... ou melhor, na linguagem da análise do comportamento ... não veja isso como um estímulo aversivo! Até essa parte, o que deveria estar gravado na sua memória: Quadro 2.2: Reforço e Punição Para entender alguns dos conceitos do condicionamento operante, é preciso ter em mente que, para os analistas do comportamento: 

positivo = introdução (de um estímulo)



negativo = remoção (de um estímulo)



reforço = aumenta a frequência de respostas / comportamentos



punição = diminui a frequência de respostas / comportamentos

Se esses quatro itens estiverem entendidos, vamos continuar. Caso você ainda se sinta meio perdido, recomendo voltar e reler até esse trecho, porque a explicação sobre punição depende do entendimento do conceito de reforço. Retomando a definição de punição positiva: a introdução de um estímulo aversivo diminui a frequência de respostas. Imagine que você adora vinho, mas passou por um período de detox e está há dois meses sem ingerir nada alcoólico. É aniversário do seu melhor amigo e você, empolgado com as comemorações, ingere quase que uma garrafa inteira de um delicioso Norton Malbec safra 2013. Na manhã seguinte você se sente muito indisposto, com tontura, enjôo e uma dor de cabeça fenomenal. Representando esse cenário na simbologia da análise de comportamento temos: S (ant) : R – Sr -, onde S(ant) seria o vinho, o R seria seu comportamento de ingerir váááárias taças e o Sr seria a ressaca / indisposição. Interpretando sob a ótica da punição positiva, em que a introdução de um estímulo aversivo diminui a frequência de respostas, o que é muito comum ocorrer em situações assim é que no dia seguinte a pessoa jura de pés juntos que nunca mais vai beber tanto. Ou seja,

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a introdução de um estímulo aversivo (ressaca / indisposição) desestimula a repetição de um comportamento (beber várias taças de vinho). Vamos a um segundo exemplo: você adora velocidade e acabou de comprar um Porsche 911 GT2 Turbo com seu bônus de final de ano (não custa nada sonhar, né?!). De carro novo, você decide testá-lo na estrada e resolve acelerar a quase 200 km/h, esquecendo de que está no Brasil (e não na Alemanha, onde as condições da estrada são bem melhores). Infelizmente você perde o controle do veículo e capota seguidas vezes, mas sobrevive e ganha algumas contusões, nada grave. Um verdadeiro milagre! Representando esse cenário na simbologia da análise de comportamento temos: S (ant) : R – Sr -, onde S(ant) seria, por exemplo, o gosto por velocidade, o R seria seu comportamento de dirigir em alta velocidade (acelerando a quase 200 km/h) e o Sr - seria a perda do controle / capotamento. Interpretando novamente sob a ótica da punição positiva, em que a introdução de um estímulo aversivo diminui a frequência de respostas, o que é muito comum ocorrer em situações assim é que o acidente gera um trauma e durante um longo intervalo de tempo, o condutor do veículo vai manter o pé de leve no acelerador, dirigindo em velocidades menores. Dito de outra maneira, a introdução de um estímulo aversivo (perda de controle / capotamento) desestimula a repetição de determinado comportamento (dirigir em alta velocidade). Por fim, vamos retomar a definição de punição negativa: a retirada de um estímulo reforçador diminui a frequência de respostas. Consegue imaginar um exemplo para essa situação punitiva? Você é um funcionário que leva a sério a questão de pontualidade, chegando sempre no horário ou alguns minutinhos antes em seus compromissos. Porém, numa manhã qualquer, seu corpo exausto resolveu ignorar o despertador. Com isso, você acabou perdendo a hora e chegou atrasado justamente no dia em que haveria a reunião sobre o desempenho de segurança com a diretoria. Quem faria a apresentação seria você, mas como se atrasou seu chefe teve que substituí-lo e acabou exposto, já que não estava tão preparado e mal conhecia os slides. Depois da reunião, veio o puxão de orelha e você foi informado que teria um desconto no salário por esse atraso. Representando essa situação na simbologia da análise de comportamento temos: S (ant) : R – Sr +, onde S(ant) seria o horário de trabalho, o R seria seu comportamento de chegar atrasado e o Sr + seria o desconto no salário. Repare que para a punição negativa, há a retirada de algo bom, que é o seu salário. Por isso a grafia aparece indicando

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algo bom, Sr +, com um corte (tachado duplo), indicando que houve uma remoção. A figura 10 a seguir resume os conceitos.

Figura 10: Reforço e punição. Fonte: arquivo pessoal.

Carlos Eduardo Costa (doutor em psicologia experimental pela USP) explica que um mesmo evento será reforçador ou aversivo para uma mesma pessoa (ou para pessoas diferentes) em momentos diferentes. A função reforçadora ou aversiva dos eventos é adquirida na história dos indivíduos e muda a depender da situação. Como estamos em um curso de pós graduação, é prudente fazer uma ressalva em relação à definição de punição. De acordo com a psicóloga e mestre em psicologia experimental pela PUC, Paula Grandi de Oliveira, o tema punição é fruto de muitas discussões acaloradas na área. Alguns autores acreditam que a punição diminui a frequência de respostas (como Azrin e Holz). Outros autores (como Skinner e Sidman) acreditam que a punição não diminui a frequência de respostas e que ela não poderia ser considerada o oposto do reforço. Se pensarmos no conceito de reforço, o definimos como uma consequência que altera a probabilidade futura da emissão de respostas. Veja que definimos reforço a partir do seu efeito (alterar a probabilidade da resposta). Já a punição (para Skinner e Sidman) não é definida pelo seu efeito, mas sim pelo seu procedimento: de apresentar um estímulo aversivo ou de remover um reforçador positivo. Mas porque Skinner e Sidman argumentam que não é possível definir a punição pelo seu efeito? Pois o efeito de diminuição da frequência da resposta é temporário. Você pode punir uma criança por brincar de videogame. No momento talvez ela pare de jogar, mas se jogar videogame for um comportamento reforçador, essa resposta voltará a aparecer. Resumindo: é importante saber que existe divergência de opiniões entre especialistas dessa área sobre o conceito de punição. Para nós, de exatas, acho mais do que suficiente para o propósito dessa disciplina (que tem como objetivo apresentar noções de psicologia), vocês entenderem a figura 3 e terem

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em mente que o processo de punição diminui a frequência de respostas no curto prazo. Finalmente, vamos ao conceito de extinção. Teixeira Jr., de Souza e Dias (2005) definem extinção como a quebra da relação de contingência entre uma resposta e uma consequência pela suspensão do reforçamento, enfatizando que em geral a extinção é um processo mais lento, menos aversivo e com efeitos mais permanentes do que os observados na punição. Já Andery, Sério e Micheletto (2009) explicam que a extinção ocorre quando os comportamentos operantes deixam de produzir os reforços que vinham produzindo. Nesse sentido, Skinner (1953) afirma: “Uma resposta torna-se cada vez menos frequente quando o reforçamento não mais acontece”. Imagine que você terminou um relacionamento afetivo, mas a outra pessoa insiste em continuar tentando e não aceita o rompimento entre vocês. Um comportamento comum nessa situação é você querer se afastar e se desligar, enquanto o outro lado quer manter o contato e o vínculo. Para isso, essa pessoa te procura com frequência, seja por telefone ou pessoalmente. Liga inúmeras vezes num só dia, te envia mensagens via SMS ou WhatsApp, faz plantão na porta da sua casa ou do seu trabalho, chama a sua atenção através de postagens nas redes sociais. Como você lida com essa insistência? Se o seu objetivo é a extinção do comportamento dela, você precisa suspender qualquer tipo de reforço oferecido a essa pessoa. Isso significa que você não deve atender nenhuma ligação, nem responder as mensagens de texto, muito menos curtir e/ou comentar qualquer postagem e, se possível for, dar um jeito para não encontrar essa pessoa. Lembre-se que a extinção não é um processo imediato, portanto você precisa ter paciência e ser firme em não oferecer nenhum tipo de resposta em nenhuma ocasião, já que a extinção de um comportamento só ocorre com a ausência de reforço ao longo do tempo. Segundo Skinner: “A extinção é um modo efetivo de remover um comportamento indesejado”. E o autocontrole? Como ele pode ser explicado através das lentes da filosofia behaviorista? Skinner diz: “Com frequência o indivíduo vem a controlar parte de seu próprio comportamento quando uma resposta tem consequências que provocam conflitos (...)”. Algumas situações que provocam conflitos são: você quer devorar uma barra inteira de chocolates, mas está fazendo regime; você vê uma roupa nova na vitrine e quer muito compra-la, porém seu saldo já está negativo; um alcoólatra deseja muito beber, porém sabe que isso causará problemas na família e no trabalho. Conflito, nesse contexto, deve ser entendido como uma situação que, de um lado representa um reforço e, do

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outro lado, representa uma punição. Tomando como referência uma resposta de ingerir bebida alcoólica com frequência, quais as consequências conflitantes (reforço e punição)? De imediato, o reforço positivo decorrente da ingestão de álcool pode ser, por exemplo, o próprio prazer proporcionado pela bebida, um estado de relaxamento, se sentir mais extrovertido e socializar. O reforço negativo dessa ingestão de álcool pode ser, por exemplo, esquecer momentaneamente de um problema ou se esquivar de alguma tarefa entediante. Por outro lado, há que se olhar para as características punitivas, que podem ser uma dependência química, uma ressaca, problemas familiares, sofrer um acidente e etc. Teixeira Jr., de Souza e Dias (2005) definem autocontrole como um comportamento que envolve a troca de um reforçador de menor magnitude a curto prazo, por outro de maior magnitude a longo prazo; ou ainda a submissão a uma condição aversiva de menor magnitude no presente para evitar uma outra de maior magnitude no futuro. Acredito que um bom exemplo (quase sempre) vale mais que mil palavras, então vamos lá: “trocar um reforçador de menor magnitude a curto prazo por outro de magnitude maior a longo prazo” seria, numa situação hipotética, imaginar que você deixa de se saciar com uma barra de chocolates ou um delicioso pastel de carne com queijo agora (reforçadores), para se olhar no espelho um mês depois e notar que a medida da sua cintura e do seu quadril diminuíram consideravelmente (imagem reforçadora = você emagreceu!). De maneira análoga, “submissão a uma condição aversiva de menor magnitude no presente para evitar uma de maior magnitude no futuro” seria, também num cenário hipotético, imaginar que você se abstém hoje de comprar aquele equipamento eletrônico de última geração para evitar um déficit ainda maior na sua conta, que já está no vermelho há tempos ... ou ... usar o saldo do FGTS de uma conta inativa que foi liberado pelo governo para pagar uma dívida grande (ao invés de comprar um novo celular e uma TV de 65 polegadas) com o intuito de limpar o seu nome e sair da lista de inadimplentes. Independente da definição adotada, o autocontrole comportamento como outro qualquer e que depende ambiente. Posso controlar o meu próprio comportamento variáveis e preciso do autoconhecimento (conhecer a

é, na verdade, um das variáveis do em função dessas minha história de

reforçamento), enxergando todas as variáveis que concorrem com o comportamento desejado. Quando somos bem sucedidos em eliminar os estímulos aversivos do ambiente, pode-se dizer que o autocontrole está instalado (ex.: o compulsivo por compras sai de casa sem o cartão de crédito e

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o cheque, com o mínimo de dinheiro apenas para algo específico; a pessoa que está fazendo regime tira de perto qualquer guloseima que possa instiga-la a ceder à tentação). O autocontrole depende das variáveis presentes, que você próprio já aprendeu a lidar. Porém, quando uma nova variável surgir, é bem provável que um novo mecanismo de autocontrole precise ser desenvolvido. Voltemos ao exemplo do alcoólatra: essa pessoa desenvolveu um mecanismo para se manter longe da bebida e a cada dia consegue manter essa disciplina. Só que num belo dia, uma nova variável aparece (seu melhor amigo morre num trágico acidente de carro). Nesse contexto, a menos que um novo comportamento seja desenvolvido, essa nova variável com alta carga emocional tem grandes chances de fazer com que o alcóolatra recorra à bebida na tentativa de suportar a situação de dor. Nota: a análise do comportamento e os conceitos baseados na filosofia behaviorista vão muito além do que foi apresentado e incluem temáticas sobre efeitos emocionais (frustração, raiva etc.), ressurgência, esquemas de reforço, discriminação e generalização, encadeamento, operações estabelecedoras, comportamento verbal, modelagem etc. Essa disciplina tem o intuito de apresentar apenas noções de psicologia e por essa razão se restringe ao conteúdo aqui discutido e exemplificado.

Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

Bock, Teixeira e Furtado (2011) mencionam que, por meio de inúmeras pesquisas Skinner comprovou que a melhor forma de eliminar o comportamento indesejado é atribuir reforço (prêmio) ao desejado e não reforçar o indesejado. A falta de reforço tende a extinguir os comportamentos. Um gerente muito severo que pune os seus funcionários quando não cumprem suas ordens, irá produzir mais efeitos negativos do que efeitos positivos. A punição tende a diminuir o comportamento indesejado, mas também diminui outros comportamentos que podem estar entre os desejados pelo gerente. Um comportamento que certamente será incluído no rol daqueles que terão sua frequência diminuída será o comportamento criativo. A punição induz o grupo a um temor e a uma tensão que serão prejudiciais ao desempenho geral.

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2.2.3

O PODER DO HÁBITO

O repórter Charles Duhigg publicou um livro onde explica que os hábitos são poderosos, porque dão forma à nossa vida muito mais do que percebemos. São tão fortes que fazem com que nosso cérebro se apegue a eles a despeito de todo o resto, inclusive o bom-senso. Os hábitos surgem sem a nossa permissão. O que acontece é que um padrão de uma vez por mês lentamente se torna uma vez por semana e então duas vezes por semana. Aos poucos, vai-se criando uma rotina “espontânea”, onde o hábito se instala. Ele diz que os hábitos surgem porque o cérebro está o tempo todo procurando maneiras de poupar esforços. Se deixado por conta própria, o cérebro tentará transformar quase qualquer rotina num hábito, pois estes permitem que nossas mentes desacelerem com mais frequência. Este instinto de poupar esforço é uma enorme vantagem. Um cérebro eficiente também nos permite parar de pensar constantemente em comportamentos básicos, tais como andar e escolher o que comer, de modo que podemos dedicar energia mental para outras coisas. Mas preservar o esforço mental é uma questão complicada, pois se o cérebro desligar no momento errado, talvez deixemos de notar algo importante. Por isso, nossos gânglios basais desenvolveram um sistema inteligente para determinar quando devem permitir que os hábitos assumam o comando. É algo que acontece sempre que um bloco de comportamento começa ou termina. Duhigg (2012) explica que o cérebro despende muito esforço no começo de um bloco de comportamento, procurando alguma coisa (uma “deixa”) que lhe forneça uma pista de qual hábito usar. Ao final, quando a recompensa aparece, o cérebro desperta e confere se tudo correu conforme o esperado. Esse processo é um loop de três estágios. Primeiro, há uma “deixa”, um estímulo que manda seu cérebro entrar em modo automático e indica qual hábito ele deve usar. Depois, há a rotina, que pode ser física, mental ou emocional. Finalmente, há uma recompensa, que ajuda seu cérebro saber se vale à pena memorizar este loop específico para o futuro. A figura 11 ilustra esse processo.

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Figura 11: O loop do hábito Fonte: Duhigg, 2012.

Ao longo do tempo, esse loop (deixa, rotina, recompensa) se torna cada vez mais automático. A deixa e a recompensa vão se entrelaçando, até que surja um poderoso senso de antecipação e desejo. Desta forma, um hábito nasce. Quando isso ocorre, o cérebro para de participar totalmente da tomada de decisões. Ele para de fazer tanto esforço ou desvia o foco para outras tarefas. A não ser que você lute deliberadamente contra um hábito (encontrando novas rotinas), o padrão irá se desenrolar automaticamente. Os hábitos são o que nos permite fazer uma coisa com dificuldade da primeira vez, mas logo fazê-la de modo cada vez mais fácil e, por fim, com a prática suficiente, fazê-la de modo mecânico ou no piloto automático. Se você acredita que pode mudar (se faz disso um hábito), a mudança se torna real. Esse é o verdadeiro poder do hábito: a revelação de que seus hábitos são o que você escolhe que eles sejam. Uma vez que essa escolha ocorre e torna-se automática, ela não é apenas real, mas começa a parecer inevitável. Os pesquisadores descobriram que as deixas podem ser desde um estímulo visual, como um doce ou um comercial de tevê, até certo lugar, uma hora do dia, uma emoção, uma sequência de pensamentos ou a companhia de pessoas específicas. As rotinas podem ser incrivelmente complexas ou fantasticamente simples. As recompensas podem variar desde comida ou drogas que causam sensações físicas, até compensações emocionais, tais como os sentimentos de orgulho que acompanham os elogios ou as autocongratulações. Os pesquisadores também descobriram que algumas deixas e recompensas têm mais poder que outras (DUHIGG, 2012). Um executivo americano chamado Claude Hopkins mostrou como novos hábitos podem ser cultivados e alimentados. Ele descobriu que é o anseio que faz com que as deixas e recompensas funcionem. Esse anseio é o que alimenta o loop. Isso explica por que os hábitos são tão poderosos: eles criam

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anseios neurológicos! Na maior parte das vezes, esses anseios surgem tão gradualmente que não estamos cientes de que eles existem e, portanto, muitas vezes não enxergamos sua influência. Conforme associamos as deixas a certas recompensas, surge em nosso cérebro um anseio inconsciente que coloca o loop do hábito em movimento. Não há nada programado que nos faça ver uma caixa de chocolates e automaticamente querer algum doce, mas uma vez que nosso cérebro aprende que uma caixa de chocolates contém um açúcar delicioso, ele começa a antecipar esse efeito de bem estar que o açúcar proporciona. Nosso cérebro nos impulsiona em direção à caixa. Esses anseios não têm plena autoridade sobre nós. Há mecanismos que podem nos ajudar a ignorar as tentações. Mas, para superar o hábito, precisamos reconhecer que esse anseio está acionando um determinado comportamento. Contudo, uma deixa e uma recompensa não são suficientes para que um novo hábito dure. Só quando seu cérebro começar a nutrir uma expectativa pela recompensa (ansiar pelas endorfinas ou pelo senso de realização) é que o ato de amarrar os cadarços do tênis de corrida todas as manhãs se tornará automático. A deixa além de deflagrar um comportamento rotineiro, também precisa deflagrar um anseio para que a recompensa venha. A figura 12 ilustra esse processo.

Figura 12: A deixa deflagrando um anseio. Fonte: Duhigg, 2012.

Qualquer pessoa pode usar essa fórmula básica para criar seus próprios hábitos. Quer fazer mais exercícios? Escolha uma deixa (como ir para a academia assim que acorda) e uma recompensa (um sorvete de iogurte depois de cada sessão de treino). Então pense nesse sorvete de iogurte ou na injeção de endorfina que você vai sentir. Permita-se desfrutar antecipadamente da recompensa. Por fim, esse anseio vai acabar fazendo com que seja mais fácil entrar na academia todo dia. Quer criar um hábito alimentar? Tenha em mente

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uma recompensa específica para se manter na dieta. Deve ser algo escolhido com cuidado, para que seja possível focar no anseio por essa recompensa quando as tentações surgirem. Lembre-se que é o anseio que coloca o loop do hábito em movimento! São eles que impulsionam os hábitos e descobrir como criar um anseio torna mais fácil implantar um novo hábito (DUHIGG, 2012). Quadro 2.3: O loop do hábito De acordo com Charles Duhigg, o loop do hábito é composto basicamente por quatro elementos: 

deixa = gatilho (disparador da ação)



rotina = comportamento específico



recompensa = o que você “ganha” repetindo um comportamento



anseio = expectativa pela recompensa

Foi descoberto que é mais fácil convencer alguém a adotar um novo comportamento se existe algo familiar no começo e no fim do loop. Dito de outra forma, você precisa manter a velha deixa e oferecer a velha recompensa, mas inserir uma nova rotina. Quase todo comportamento pode ser transformado se a deixa e a recompensa continuarem as mesmas. Os Alcoólicos Anônimos (AA) explicam que essa prática funciona porque o programa obriga as pessoas a identificarem as deixas e recompensas que estimulam seus hábitos de beber e as ajuda comportamentos. A figura 13 ilustra essa mudança.

a

encontrar

novos

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Figura 13: Inclusão de nova rotina para transformar um hábito Fonte: Duhigg, 2012.

Duhigg (2012) enfatiza que para que a transformação de um hábito ocorra, é preciso que a pessoa que deseja mudar descreva o que deflagra seu comportamento habitual, para que possa haver uma conscientização de suas ações. Esse é o primeiro passo para a reversão de um hábito e é extremamente importante porque na maior parte das pessoas, os hábitos vêm acontecendo a tanto tempo que elas não prestam mais atenção ao que os provoca. Importante considerar que entender as deixas e os anseios que impulsionam seus hábitos não vai fazer com que eles desapareçam de repente, mas vai lhe fornecer um meio de planejar como mudar esse padrão. A boa notícia é que com planejamento, é possível mudar um hábito que não nos agrada. A má notícia é que os pesquisadores observaram que apesar da mudança ocorrer, os hábitos substitutos só se tornam novos comportamentos duráveis quando são acompanhados por mais alguma coisa. Para situações assim, os Alcoólicos Anônimos têm a experiência: identificar deixas e escolher novas rotinas é importante, mas sem outro ingrediente, os novos hábitos nunca se fixam de verdade. No caso do AA, era a própria fé que fazia a diferença. Uma vez que as pessoas aprendiam a acreditar em alguma coisa, essa habilidade começava a transbordar para outras partes da sua vida, até que começavam a acreditar serem capazes de mudar. A fé era o ingrediente que transformava um loop de hábito retrabalhado num comportamento permanente. Mesmo que você dê às pessoas hábitos melhores, isso não conserta o motivo que as levou a começar a beber. Em algum momento, vão acabar tendo um dia ruim e nenhuma nova rotina vai fazer com que tudo pareça estar bem.

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O que pode fazer a diferença em situações assim é acreditar que elas são capazes de enfrentar esse estresse sem o álcool. Sem a fé, sem acreditar que é possível e que você consegue, quando as coisas ficam turbulentas é provável que você se volte para a sua zona de conforto dos seus velhos hábitos. Dezenas de estudos mostram que a força de vontade é a mola propulsora mais importante para o sucesso individual. E o melhor modo de aumentar a força de vontade é transformar isso num hábito. Às vezes parece que pessoas com um grande autocontrole não estão se esforçando, mas é porque elas passaram a fazer isso no automático, já que sua força de vontade acontece sem que elas precisem pensar nisso, ou seja, virou hábito. Nos anos 80 surgiu uma teoria que se tornou aceita de um modo geral: a força de vontade é uma habilidade que se pode aprender, algo que pode ser ensinado assim como as crianças aprendem matemática. Uma habilidade, afinal, é algo que permanece constante de um dia para outro. Se você tem a habilidade de dançar gafieira aos sábados, também saberá dançar aos domingos e segundas. Porém, se a força de vontade é uma habilidade, por que ela não permanece constante de um dia para outro? Será que a força de vontade é um recurso finito? Conforme Duhigg (2012) relata, os pesquisadores descobriram que força de vontade não é só uma habilidade. É um músculo, como os dos seus braços ou pernas e ela fica cansada quando faz mais esforço, por isso sobra menos força para outras coisas. Isso ajuda a esclarecer por que bons médicos cometem erros primários (o que ocorre com maior frequência depois que um médico terminou uma tarefa longa e complicada que exige concentração intensa). De acordo com o doutorando em psicologia da Universidade de Case Western, Mark Muraven: “Se você quer fazer alguma coisa que exige força de vontade (como sair para correr depois do trabalho), precisa preservar seu músculo da força de vontade durante o dia. Se você gastá-lo cedo demais em tarefas entediantes, como escrever e-mails ou preencher formulários burocráticos, toda a sua força terá se dissipado quando você chegar em casa.” Dessa forma, as pessoas aprendem a controlar melhor seus impulsos; aprendem a se distrair das tentações. E uma vez que se entra nesse ritmo criado pela força de vontade, o cérebro ajuda a pessoa a se concentrar num objetivo. Os indivíduos e os hábitos são todos diferentes e por isso as maneiras específicas de diagnosticar e mudar os padrões em nossas vidas diferem de uma pessoa para a outra e de um comportamento para o outro. Parar de fumar é diferente de deixar de comer compulsivamente, que é diferente de mudar o

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modo como você se comunica com seu cônjuge, que é diferente de como você prioriza as tarefas no trabalho. Além disso, os hábitos de cada pessoa são guiados por anseios diferentes. Lembre-se que a mudança pode não ser rápida e nem sempre é fácil. Mas com tempo e esforço, qualquer hábito pode ser remodelado. No entanto, para modificar um hábito, você precisa decidir mudálo. Deve aceitar conscientemente a dura tarefa de identificar as deixas e recompensas que impulsionam as rotinas do hábito e encontrar alternativas. Você precisa saber que possui o controle e ser autoconsciente o bastante para usá-lo. Uma vez que você entende que os hábitos podem mudar, você tem a liberdade e a responsabilidade de transformá-los. Quando você entende que os hábitos podem ser reconstruídos, o poder do hábito torna-se mais fácil de controlar e a única opção que resta é fazer acontecer! (DUHIGG, 2012). Nota: o mecanismo do loop do hábito explicado por Duhigg nada mais é do que o modelo de comportamento definido por Skinner, ou seja: estímulo (=deixa), resposta (=rotina) e consequência (=recompensa). A única ressalva é que Skinner define a consequência como reforço positivo, reforço negativo ou punição, enquanto Duhigg aborda apenas o reforço positivo (= recompensa). Além disso, o que Duhigg chama de “anseio”, os analistas do comportamento (baseados nas ideias de Skinner) definem como “operação estabelecedora” (é uma operação que altera o valor reforçador de uma consequência e que aumenta a probabilidade de ocorrência de comportamentos relacionados a esses estímulos; ela adquire propriedades motivacionais). Conclusão: mesmos conceitos, porém com nomes de batismo diferentes!!

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Capítulo 2. Noções de Psicologia: Cognitiva-Comportamental

2.3 POST-IT® Insira nesse post-it os pontos mais importantes referentes a esse capítulo: Quais foram os conceitos que você mais gostou? Qual assunto mais te chamou a atenção? Algum ponto específico que você se identificou? Depois de tantas coisas vistas e discutidas, do que você se lembra? De nada? Ops!

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Capítulo 2. Noções de Psicologia: Cognitiva-Comportamental

2.4 TESTES 1) Em que sentido a psicologia contribui para o entendimento do homem em seu meio? a) Produz leituras mais complexas e completas da realidade, analisando os aspectos da subjetividade que compõem qualquer ser humano. b) Ela é uma ciência que ajuda a conhecer a influência do homem no meio. c) Como ela remonta à filosofia, ela traz fundamentos teóricos que se combinam com a prática. d) Ela acaba vulgarizando a clínica psicológica porque se presta ao atendimento de patologias, ao invés de colocar o foco no bem estar. e) Ela estuda os processos mentais e inconscientes, mas nem sempre consegue dar sentido à motivação humana nem à visão de mundo de cada indivíduo. Feedback: item 2.1. 2) Os reforços positivos e negativos definidos por Skinner: a) Fortalecem determinado comportamento. b) Enfraquecem determinado comportamento. c) Influenciam os comportamentos desejáveis e às vezes os indesejáveis. d) Interferem em todos os tipos de comportamentos. e) Servem para domesticar cães e outros animais para cativeiro. Feedback: Quadro 2.1.

3) Quais os 4 elementos que compõem um hábito, de acordo com Duhigg? a) Deixa; rotina; recompensa; anseio. b) Gatilho; comportamento; punição; motivação. c) Deixa; rotina; reforço negativo; punição. d) Rotina; recompensa; anseio; reforço. e) Gatilho; rotina; comportamento; anseio. Feedback: Quadro 2.3.

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Capítulo 3. Noções de Psicologia: Humanista e Psicanálise

CAPÍTULO 3. NOÇÕES DE PSICOLOGIA: HUMANISTA E PSICANÁLISE

OBJETIVOS DO ESTUDO Apresentar alguns nomes que fazem parte da história da psicologia humanista e da psicanálise. Apresentar os principais conceitos que compõem cada uma dessas abordagens. Ao término deste capítulo o aluno deverá estar apto a:  Saber as diferenças entre a influência de Freud, Winnicott, Perls e Lewin;  Entender as contribuições de algumas ideias da Gestalt para o dia a dia;  Conhecer um pouquinho mais sobre as influências de Freud e Winnicott em um ambiente de trabalho.

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Capítulo 3. Noções de Psicologia: Humanista e Psicanálise

3.1 PSICOLOGIA HUMANISTA A abordagem humanista surgiu na década de 50 e ganhou força nos anos 60 e 70, como uma reação às ideias da análise do comportamento e do enfoque no inconsciente e seu determinismo, defendido pela psicanálise. A grande divergência com a abordagem comportamental é que o humanismo não aceita a ideia do ser humano como máquina ou animal, sujeitos aos processos de condicionamento. Já em relação à psicanálise, a reação foi à ênfase dada no inconsciente, nas questões biológicas e eventos passados, nas neuroses e psicoses. De forte influência existencial e fenomenológica, a abordagem humanista busca conhecer o ser humano, tentando humanizar seu aparelho psíquico, contrariando assim a visão do homem como um ser condicionado pelo mundo externo. No existencialismo, o ser humano é visto como ponto de partida dos processos de reflexão e na fenomenologia, esse ser humano tem consciência do mundo que o cerca, dos fenômenos e da sua experiência consciente. A maior contribuição dessa abordagem psicológica é a da experiência consciente, a crença na integralidade entre a natureza e a conduta do ser humano, o livre arbítrio, a espontaneidade e o poder criativo do indivíduo. Os principais nomes dessa linha da psicologia são Frederick Perls e Kurt Lewin, ainda que outros como Abraham Maslow, Carl Rogers e Kurt Goldstein também tenham dado suas contribuições. 3.1.1

FREDERICK PERLS (1893-1970) E LAURA PERLS (1905-1990)

Frederick Salomon Perls (mais conhecido como Fritz Perls) nasceu em 8 de julho de 1893, em Berlim (Alemanha). Era filho de pais judeus e vivia num ambiente familiar pouco estruturado, no qual sua mãe era agredida por seu pai. Se formou como médico e logo depois especializou-se em psiquiatria. Serviu no exército e, posteriormente, trabalhou com Kurt Goldstein no instituto de soldados com lesões cerebrais. Através dessa experiência, compreendeu a importância de considerar o organismo como um todo e não como um aglomerado de partes funcionando independentemente. Foi um psicoterapeuta e psiquiatra que, junto com sua esposa Laura Perls, desenvolveu uma abordagem que chamou de Gestalt-terapia. eST-601 - Psicologia na Engenharia de Segurança do Trabalho, Comunicação e Treinamento / PECE, 2° ciclo de 2020

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Laura Posner Perls nasceu em 15 de agosto de 1905, em Pforzheim (Alemanha). Ela começou a se interessar por psicologia aos 16 anos, depois de ler uma das publicações de Freud conhecida por “A interpretação dos sonhos” e se formou psicóloga. Em 1930 ela se casou com Fritz Perls, depois de terem trabalhado juntos por anos no instituto de psicologia de Frankfurt. Após o casamento, passaram dez anos na África do Sul e escreveram o primeiro livro juntos: “Ego, fome e agressão”. Foi desse livro que se originou os princípios da Gestalt-terapia. Depois que se separaram, Laura permaneceu nos EUA e deixou uma significativa contribuição com ênfase na terapia do contato e suporte, enquanto que seu ex-marido abordava a ênfase aos fenômenos intrapsíquicos e ao conceito de “awareness” (consciência de si e consciência perceptiva; é a tomada de consciência global no momento presente, a atenção ao conjunto da percepção pessoal, corporal e emocional, interior e ambiental). Gestalt é um termo alemão sem tradução. O mais próximo em português seria “boa forma”, que não é utilizado por não corresponder exatamente ao seu real significado. A Gestalt está dentro da abordagem humanista, com influências da psicanálise e da filosofia oriental. O seu modo de fazer psicoterapia não se concentra na doença, e sim em gerar saúde a partir das potencialidades que a própria pessoa possui. É focada no tempo presente, no “aqui e agora”, sem muitas interpretações sobre o passado como propõe a psicanálise. Trabalha as experiências da pessoa englobando corpo, sentimento, sensações, emoções, pensamentos, sonhos, fantasias e tudo o que está presente no momento da terapia e da vida. Com o passar do tempo, se dividiu em duas correntes: a criada por Laura Perls (focada em um processo mais teórico) e a criada por Fritzs Perls (focada no processo vivencial do próprio desenvolvimento pessoal). Quadro 3.1: Gestalt A psicologia da Gestalt é uma escola de pensamento baseada na noção de que o comportamento

e

os

meandros

da

mente

não

devem

ser

estudados

separadamente, mas analisados como um todo, pois é assim que em geral os seres humanos vivenciam os acontecimentos. A Gestalt afirma que o todo não é simplesmente o mesmo que a soma de suas partes.

Por meio desse conceito, os psicólogos dessa linha conseguiram dividir a organização perceptual em uma série de princípios e explicar como objetos

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pequenos podem se agrupar para criar objetos maiores. Utilizando essa mesma ideia, a Gestalt olha para o comportamento e como um indivíduo vivencia o mundo ao redor para se tornar pleno e mais consciente (KLEINMAN, 2015).

Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

Essa linha da psicologia trabalha a percepção e a sensação de movimento. Há uma preocupação em compreender os processos psicológicos envolvidos na ilusão de ótica, quando o estímulo físico é percebido de uma forma diferente da que ele tem na realidade. Um exemplo dessa ilusão de ótica estudada pela Gestalt pode ser visto através da figura 14, onde ora se enxerga uma mocinha, ora se enxerga uma senhora. E você, consegue ver as duas?

Figura 14: Ilusão de ótica: mocinha ou senhora Fonte: arquivo pessoal

Por falar em ilusão de ótica, cabe aqui mencionar o famoso “cubo de Necker”, que foi descoberto em 1832 por um suíço chamado L. A. Necker. Essa figura apresenta uma ilusão de ótica que trabalha com as capacidades de percepção. Foi utilizado para demonstrar um aspecto da cognição no qual, quando ela está focada, isso a torna naturalmente cega a outros. Parece confuso? Mas é! Por isso, não se assuste!!! Coragem para seguir em frente.

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O exemplo do cubo é o mais simples possível: quando um dos vértices parece estar à frente, naturalmente colocamos o outro para trás, e vice-versa. Tendemos a atribuir tridimensionalidade ao objeto com um dos vértices à frente e vemos a totalidade do objeto de um ou outro jeito, mas podemos “trocar” o foco do vértice e ganhar, literalmente, outra perspectiva. O aspecto interessante é que, quando temos uma, não temos a outra. A figura 15 ilustra o cubo. Tente esse desafio!

Figura 15: O cubo de Necker Fonte: Kleinman, 2015

Fácil? Conseguiu alternar a figura de um lado para outro, mudando completamente a perspectiva? Que bom, porque eu demorei uma eternidade até entender como isso funciona (rsrsrsrs). Não conseguiu? Fique tranquilo, você não está sozinho. Tente através dessa dica, apresentada na figura 16 a seguir. Ela ajuda a entender para onde se deve direcionar sua visão para mudar a perspectiva.

Figura 16: O cubo de Necker em perspectivas Fonte: Hurlburt, 2002.

De acordo com Hallinan (2009), quando olhamos para alguma coisa ou para alguém, julgamos estar vendo tudo o que há para ver. Mas não vemos.

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Por exemplo: as mulheres tendem a perceber detalhes da outra mulher que está sendo roubada (roupa, aspecto físico, maquiagem, cabelo); já os homens costumam reparar no ladrão. O olho tem alta resolução apenas até um ângulo de 2 graus (quase nada!). Além desse valor, as coisas ficam progressivamente borradas e indefinidas e aí somos obrigados a enxergar com a visão periférica. Mas o que conseguimos aprender com essa visão é um conjunto de informações gerais e indistintas. Saber que somos suscetíveis a erros visuais como a cegueira da mudança não nos dá condições de compensar seus efeitos; ainda assim continuamos vulneráveis. Dê uma olhada nos dois tampos das mesas ilustradas na figura 17 a seguir. Qual deles é maior?

Figura 17: Comparação entre o tamanho das mesas Fonte: Hallinan, 2009.

Nenhum (háháhá!!!!). Essa ilusão horizontal / vertical foi descrita pelo alemão Adolf Fick na sua tese de doutorado, em 1851. Ele demonstrou diferenças entre propriedades geométricas simples e como elas são percebidas. Esse tipo de disparidade é chamado de ilusão de ótica geométrica. Fick observou que uma linha vertical parece ser maior que uma linha horizontal, as duas tendo o mesmo tamanho. Essa ilusão de perspectiva se explica pelo fato de o cérebro escolher interpretar o desenho como duas mesas. Dessa forma, o cérebro enxerga a mesa da esquerda com o tampo maior que o da direita. Veja se a figura 18 ajuda a te convencer de que o tamanho dos tampos é o mesmo!

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Figura 18: Mesas com o mesmo tamanho Fonte: Hallinan, 2009.

O interessante é que saber que se trata de uma ilusão de ótica não nos permite corrigir o defeito. Não importa quantas vezes olhamos para as mesas da figura 17, elas ainda continuarão parecendo ter formatos diferentes. Portanto, não precisa cortar seus pulsos: você não está sozinho!!!! A percepção é o ponto de partida e sendo assim, os experimentos nessa área levaram os teóricos da Gestalt ao questionamento de um princípio implícito na teoria behaviorista: o de que há relação de causa e efeito entre o estímulo e a resposta – porque, para os gestaltistas, entre o estímulo que o meio fornece e a resposta do indivíduo, encontra-se o processo de percepção. O que o homem percebe e a maneira como percebe são dados importantes para a compreensão do comportamento (BOCK, TEIXEIRA E FURTADO, 2011). Max Wertheimer (psicólogo tcheco) publicou, no início do século XIX, um ensaio sobre percepção que é tido como um dos princípios da psicologia Gestalt. O conteúdo enunciado sobre a organização perceptiva demonstrou que o olho humano tende a agrupar as várias unidades de um campo visual para formar um todo. Este princípio conceitua a visão como uma experiência criativa, não como um simples ato de ver. É essa nossa capacidade de reunir e de agrupar padrões visuais, de perceber unidades de uma maneira global, que nos permite aceitar uma página impressa como um todo único. Os conceitos da Gestalt não apenas ensinam como podemos combinar dados sensoriais para formar objetos, como também sugerem explicações para o fato de admitirmos a ilusão da tonalidade criada por pontos, a arte

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simplificada dos cartoons, o significado dos símbolos e a inquietação da arte abstrata. Os trabalhos da linha Gestalt sobre a visão humana conseguem explicar por que algumas vezes somos capazes de ver imagens que não existem ou imagens mutáveis. A figura 19 ilustra um exemplo de uma suposta imagem (um homem) que não existe.

Figura 19: A imagem do homem que não existe Fonte: Arquivo pessoal.

Quadro 3.2: Percepção Conforme os psicólogos da Gestalt, a percepção é uma complexa operação que consiste em reunir e ajustar as informações visuais e compará-las com o vasto mosaico de nossas imagens mentais. Embora haja evidências de que alguns fenômenos visuais (como a percepção de profundidade) sejam inatos, a maior parte de nossa percepção visual é adquirida através do conhecimento e da experiência.

Quando a nossa retina reage a determinados estímulos, agrupando-os de modo a formar uma imagem incorreta, o resultado é uma ilusão ambígua. A mais conhecida das ilusões ambíguas é a reversão de uma forma positiva para uma negativa e vice-versa. O mundo da ilusão está repleto de fenômenos visuais inexplicados. Um dos mais comuns é a seta de Müller-Lyer, em que duas linhas do mesmo tamanho parecem ter comprimentos diferentes,

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dependendo da direção das pontas da seta (para dentro ou para fora). A figura 20 demonstra uma dessas ilusões ambíguas.

Figura 20: Seta de Müller-Lyer Fonte: Hurlburt, 2002

O objetivo da Gestalt na comunicação visual do dia a dia é trabalhar o conceito de imagens para que possam ser identificadas imediatamente com percepção rápida e instantânea. O grande desafio é comunicar e criar entendimento apenas por meio de símbolos e assim conseguir passar a mensagem desejada para todos, universalmente, independente de quem, em que país, em qual idioma ou alfabeto a mensagem está sendo compreendida. Isso caracteriza um bom processo de comunicação visual, independente de qual meio seja usado para atingir esse propósito. Alguns exemplos simples ajudam a entender melhor essa questão da compreensão imediata. Uma seta significa uma seta em todos os lugares do mundo, assim como o vermelho pode simbolizar perigo dependendo de onde aparece (em uma placa com o desenho de um cigarro com uma faixa cortando-o, que significa proibido fumar). Aeroportos também são bons exemplos, pois as pessoas circulam no espaço automaticamente sem olhar placas, porque o ambiente é claro e óbvio, assim como nos supermercados, onde as placas de sinalização são autoexplicativas (seja pela foto, ilustração, plano de fundo, cores ou

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texturas que foram utilizadas, muitas vezes não sendo necessário nem mesmo texto para passar a mensagem). Nossa percepção ocorre de acordo com nossos filtros perceptivos, que podem variar de acordo com a cultura, etnia, educação, idade e outros fatores. A verdade é que essas variáveis externas devem ser consideradas para dar uma previsão de como será a percepção de uma determinada comunicação visual. Sabe-se que dois indivíduos podem estar sujeitos aos mesmos estímulos sob as mesmas condições aparentes, mas a maneira como cada um deles os reconhece, seleciona, organiza e interpreta é um processo altamente individual baseado nas necessidades, valores e expectativas. É a partir da percepção e consequentemente dos sentidos que o consumidor terá envolvimento emocional com uma marca. Nesse sentido, o objetivo da Gestalt no mercado de consumo é fazer com que tudo que gire em torno da marca tenha imediata identificação, independente das variáveis que possam ser encontradas. Veja na figura 21 alguns exemplos de logotipos onde a Gestalt está presente. Observe que há sempre uma mensagem por trás da imagem.

Figura 21: A Gestalt empregada nas imagens e marcas Fonte: Viggiani, 2015.

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3.1.2

KURT LEWIN (1890 – 1947)

Kurt Lewin nasceu em 9 de setembro de 1890, na Prússia (atual Polônia), em uma família judia de classe média. Estudou biologia na Universidade de Munique e obteve seu doutorado em filosofia e psicologia na Universidade de Berlim. Lewin inspirou-se na psicologia da Gestalt e foi muito influenciado pela teoria de campo de Albert Einstein, que afirmava que os objetos interagem continuamente com a gravidade e o eletromagnetismo. Ele tentou aplicar a ideia de Einstein para a psicologia e postulou que o comportamento era o resultado do indivíduo interagindo o tempo todo com o ambiente. De acordo com sua teoria, uma pessoa se comportará de forma diferente de acordo com a maneira como são trabalhadas as tensões percebidas entre o “eu” e o ambiente. Para que se entenda plenamente o comportamento de um indivíduo, há a necessidade de avaliar todo o campo psicológico, seja ele a escola, o trabalho, a igreja, a família (a que Lewin se referiu como espaço vital). Sua teoria de campo exerceu enorme influência na psicologia social e ajudou a popularizar a ideia de que o comportamento é causado pela interação entre o ambiente e as características do indivíduo.

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3.2 PSICANÁLISE A psicanálise é uma das linhas mais conhecidas da psicologia e começou a ir além do trabalho clínico quando Freud generalizou sua teoria para situações que ele denominou inicialmente de “psicopatologia da vida cotidiana”. Desde então, passou a se configurar como um poderoso instrumento de análise para diversas situações, não necessariamente patológicas. Através dessa análise diversa, se tornou possível compreender

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inúmeras manifestações nos grupos de trabalho, no cenário familiar, no lazer e nas situações rotineiras. Os principais nomes / personalidades dessa linha da psicologia aqui abordados são Freud e Winnicott, ainda que inúmeros outros como Melanie Klein, Jacques Lacan, Wilfred Bion, Sandor Ferenczi e Andre Green também tenham dado suas contribuições. 3.2.1

SIGMUND FREUD (1856 – 1939)

Sigmund Freud nasceu em 6 de maio de 1856, em Freiberg (atual República Tcheca). Frequentou a escola de medicina na Universidade de Viena em 1873, com foco em neurologia. Conforme Kleinman (2015), durante sua formação fez amizade com um médico e psicólogo chamado Josef Breuer. Esse relacionamento se mostrou extremamente importante para o desenvolvimento dos trabalhos de Freud, pois Breuer começou a tratar os pacientes histéricos utilizando a hipnose e incentivando-os a falar sobre o passado. Permitia que os pacientes discutissem lembranças das quais não conseguiam se recordar durante o estado de consciência. Assim, os sintomas da histeria podiam ser aliviados. Freud viajou à Paris para aprender mais sobre hipnose com o renomado neurologista francês Jean-Martin Charcot. Em 1886, voltou à Viena e começou a atender em um consultório particular. Inicialmente, utilizou a hipnose com alguns de seus pacientes, mas percebeu que poderia obter mais deles deixando-os sentados em posição relaxada e incentivando-os a falar sobre aquilo o que lhes viesse à mente (técnica conhecida como associação livre). Freud acreditava que conseguiria analisar o que foi dito e determinar qual acontecimento traumático do passado era responsável pelo sofrimento atual do paciente. Os trabalhos mais famosos de Freud vieram em rápida sucessão. Em cinco anos, lançou três livros que influenciaram muito a psicanálise:  A interpretação dos sonhos: apresentou ao mundo a ideia de mente inconsciente;  Sobre a psicopatologia da vida cotidiana: teorizou que os lapsos da fala (mais tarde conhecidos como atos falhos) eram, na verdade, comentários significativos revelados pelo inconsciente dinâmico;  Três ensaios sobre a teoria da sexualidade: falou, entre outras coisas, sobre o famoso complexo de Édipo.

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Não há como negar a influência de Freud para os campos da psicologia, da psicanálise e da psiquiatria. Suas ideias mudaram completamente a forma como as pessoas viam a personalidade, a sexualidade, a memória e a terapia. Dentro de suas pesquisas, Freud definiu a cocaína como o terceiro flagelo da humanidade, ao lado do álcool e da morfina.

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3.2.2

DONALD W. WINNICOTT (1826 – 1971)

Donald Woods Winnicott nasceu em 7 de abril de 1826, no Reino Unido. Estudou medicina com enfoque em pediatria. Tendo convivido em meio a pediatras e psiquiatras, ele despertou para o fato de que a saúde (e mais do que a saúde, o sentir-se vivo), não pode resumir-se ao bom funcionamento dos órgãos e das funções; separar o físico do psíquico é um procedimento intelectualmente possível, mas altamente artificial. Abram (2000) salienta que o ambiente intelectual frequentado por Winnicott provocou um tremendo impacto na sua maneira de pensar, o que poderia explicar os aspectos empíricos de sua teoria. Foi em 1935, ano em que obteve seu reconhecimento como psicanalista, que a Sociedade Britânica de Psicanálise passou a ser sua organização profissional, sendo que por duas ocasiões distintas ele ocupou a presidência. Winnicott acreditava na proposta inicial da psicanálise como forma de “mergulhar” no mundo da mente inconsciente. Para ele, a grande dificuldade da psicanálise tradicional em tratar os casos de tendência antissocial (delinquência, distúrbios de caráter e outros tipos de psicopatia) estava no fato de associá-los aos conflitos psíquicos. Sua experiência lhe dizia que, muitas vezes, a patologia estava em primeiro lugar no ambiente. Dessa forma, Winnicott tentou alertar os profissionais da psicanálise sobre a importância do fator ambiental na elaboração do diagnóstico e do tratamento dos pacientes. Abram (2000) também enfatiza que com bastante frequência, Winnicott fazia referência ao holding, um termo que pode ser associado ao cuidado e ao eST-601 - Psicologia na Engenharia de Segurança do Trabalho, Comunicação e Treinamento / PECE, 2° ciclo de 2020

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Capítulo 3. Noções de Psicologia: Humanista e Psicanálise

fornecimento de suporte físico e emocional. É uma espécie de manejo terapêutico usado pelos analistas que lidam com pessoas que não podem tomar conta de si mesmas. Manejo também foi o termo utilizado em relação ao cuidado dispensado a determinados pacientes em uma relação analítica, onde a atenção dada pelo terapeuta, juntamente com o trabalho interpretativo, cria um ambiente de holding, que norteia as necessidades psicológicas e físicas de quem foi em busca de um processo de terapia. Além do holding, Winnicott acreditava que brincar apresentava-se como parte da teoria do desenvolvimento emocional. Ao brincar, o bebê, a criança e o adulto estabelecem uma ponte entre o mundo interno e o mundo externo. Para ele, brincar é sinônimo de viver criativamente e constitui a matriz da experiência de self que se estende por toda a vida, pois é somente através do brincar que o self é descoberto e fortalecido. Alguns estudiosos acreditam que muitas ideias de Winnicott sobre a importância do desenvolvimento humano foram inspiradas na obra de Charles Darwin (A origem das espécies). Em seus estudos, Darwin observou a importância do ambiente no desenvolvimento das espécies, assim como a necessidade do organismo de cumprir as exigências de seu ambiente. Desse modo, os organismos precisavam se adaptar e se individualizar para aumentar suas chances de sobrevivência. Aqueles que não tinham as aptidões necessárias para a adaptação ao ambiente não conseguiam sobreviver. Assim, o ser humano seria um animal dependente. Ele atribuiu ao homem diferentes etapas de dependência do ambiente. No início, ela é absoluta, seguida de estágios de dependência relativa, até que ela atinja a independência. Considera-se que os trabalhos de Winnicott transformaram a teoria tradicional da psicanálise do desejo sexual para uma teoria de cuidado emocional (COSTA, 2015).

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3.3 POST-IT® Insira nesse post-it os pontos mais importantes referentes a esse capítulo: Quais foram os conceitos que você mais gostou? Qual assunto mais te chamou a atenção? Algum ponto específico que você se identificou? Depois de tantas coisas vistas e discutidas, do que você se lembra? De nada? Ops!

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Capítulo 3. Noções de Psicologia: Humanista e Psicanálise

3.4 TESTES 1) De que maneira a Gestalt explica a ilusão de ótica? a) O estímulo físico é percebido de uma forma diferente da que ele tem na realidade. b) A percepção psicológica é percebida de uma forma diferente daquela que o cérebro entende. c) O estímulo físico é percebido da mesma forma que ele tem na realidade, porém com pequenas distorções. d) O estímulo psicológico é transformado e distorcido entre a visão e as cognições cerebrais. e) Quando algo está em foco, ele naturalmente cega a percepção e altera a visão. Feedback: item 3.1.

2) A maior parte de nossa percepção visual é adquirida de que maneira? a) Através do conhecimento e da experiência. b) Por comparação. c) Pela visão e pelo tato. d) Pelo estímulo e resposta. e) Através da instauração de um hábito. Feedback: Quadro 3.2.

3) O termo “holding”, empregado por Donald Winnicott, pode ser associado ao: a) Cuidado e fornecimento de suporte físico e emocional. b) Sustentação corporal. c) Suporte físico. d) Apoio psiquiátrico. e) Cuidados específicos com a saúde alimentar e psicológica. Feedback: item 3.2.2.

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Capítulo 4. Noções de Psicologia: Social e Organizacional

CAPÍTULO 4. NOÇÕES DE PSICOLOGIA: SOCIAL E ORGANIZACIONAL

OBJETIVOS DO ESTUDO Apresentar alguns nomes que fazem parte da história da psicologia social. Apresentar os principais conceitos que compõem cada uma dessas abordagens. Ao término deste capítulo o aluno deverá estar apto a:  Saber as diferenças entre os experimentos de Asch, Zimbardo e Milgram;  Entender as contribuições da psicologia social para o dia a dia;  Conhecer um pouquinho mais sobre os conceitos da psicologia organizacional e sua relação com um ambiente de trabalho;  Refletir sobre os aspectos comportamentais associados ao uso de EPIs.

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Capítulo 4. Noções de Psicologia: Social e Organizacional

4.1 PSICOLOGIA SOCIAL O escritor Norbert Elias aponta que a satisfação pessoal e a eficiência social são aspectos interdependentes. Só é possível uma vida coletiva livre de tensões e conflitos se os sujeitos que fizerem parte dela tiverem satisfação suficiente e isso só ocorrerá se cada membro da coletividade for livre de perturbações e conflitos. O modo como a maioria se comporta ou pensa acaba por estabelecer o padrão de normalidade, que interfere nas expectativas sociais: todos devem se comportar como a maioria! Portanto, o recado implícito é que os demais deveriam se adequar a esse padrão. O que é diferente, fora do esperado, causa estranheza, reprovação ou menosprezo. E quando atender esse padrão é insatisfatório para o indivíduo? E quando, por algum motivo, é impossível dar conta dessa expectativa social? Esse comportamento deve ser considerado uma patologia? Ou apenas excentricidade, uma peculiaridade daquela pessoa? Onde cabe o diferente? Há tolerâncias? Atrelado a essa discussão de comportamento coletivo, torna-se importante definir o conceito de grupo. Um grupo não é uma soma de indivíduos reunidos num espaço físico, um aglomerado de pessoas que se encontra por um determinado tempo num lugar comum. Por exemplo: pessoas em um ônibus não configura um grupo. Por mais que se dirijam ao mesmo destino, que estejam ali pelas mesmas razões (transporte público) e que compartilhem das normas internas do uso do transporte público, falta-lhes interação e interdependência de seus componentes, algo que é fundamental para a constituição de um grupo. O espaço físico não pode ser simples determinante de uma relação grupal. O termo grupo designa dois ou mais indivíduos que compartilham um conjunto de normas, valores e crenças com relações definidas a tal ponto em que o comportamento de cada um traz efeito para os demais, de forma implícita ou explícita. Essas propriedades do grupo e a definição dos vínculos entre seus membros emergem da interação entre eles, algo que também traz efeitos para estes membros, que estão comprometidos com pelo menos um objetivo comum (BOHRER, 2013).

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Capítulo 4. Noções de Psicologia: Social e Organizacional

Kleinman (2015) destaca que mesmo que uma pessoa não perceba, os grupos têm um efeito muito poderoso e expressivo sobre o comportamento humano. Todos os indivíduos agem de maneira diferente ao redor de outras pessoas em comparação a quando estão sozinhos. Os grupos desempenham um papel bastante importante na vida cotidiana e afetam significativamente as decisões que tomamos. Um grupo pode ser desde uma união de colegas de trabalho responsáveis por tomar decisões de segurança importantes até um grupo de amigos que decidem para onde viajar nas próximas férias. A teoria mais elementar da psicologia social é que quando uma pessoa está sozinha, ela fica mais relaxada e não se preocupa com a forma como o seu comportamento pode ser visto. Ao acrescentar apenas mais uma pessoa à equação, os comportamentos começam a mudar e as pessoas se tornam mais conscientes do que está acontecendo ao redor. Assim, estudos demonstraram que uma pessoa consegue realizar tarefas simples ou bem aprendidas com um nível de desempenho superior. Entretanto, ao realizar algo novo ou difícil perto de outra pessoa, o nível de desempenho cai. Isso é conhecido como facilitação social: por causa da presença de outras pessoas nos esforçamos mais e nosso nível de desempenho realmente diminui em tarefas novas ou difíceis. Outro aspecto interessante que ocorre quando se fala em psicologia social é o chamado “efeito espectador”, que é um dos fenômenos mais trágicos que acontece dentro de grupos. Quando um grupo fica maior, a motivação interna para ajudar outras pessoas em dificuldade diminui. Embora isso seja semelhante à lei do mínimo esforço quando em grupo, o efeito espectador ocorre porque as pessoas passam a ser seguidoras e apenas ajudam a outra em dificuldade se virem mais alguém tomar a iniciativa. Como se trata de um fenômeno estritamente de grupo, se não houver mais ninguém presente exceto uma pessoa e a vítima, aquele indivíduo geralmente ajudará a vítima. Um dos exemplos mais famosos do efeito espectador ocorreu em 13 de março de 1964, às 3h20 da madrugada. Catherine Genovese (“Kitty”), com 28 anos, foi abordada por um homem quando estava chegando em casa do trabalho. Ele a atacou e a esfaqueou. Ela insistentemente pediu ajuda, mas nenhuma das testemunhas que ouviram seus gritos de socorro e que viram o desenrolar dos acontecimentos chamou a polícia. Todas acharam que outra pessoa já havia feito isso. Somente às 3h50 é que a polícia foi finalmente avisada. Esse “deixa que eu deixo” que ocorreu no caso do assassinato de Kitty é explicado por Hallinan (2009). Como princípio geral, as pessoas se sentem mais responsáveis por suas ações do que por suas inações. Se vamos cometer

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Capítulo 4. Noções de Psicologia: Social e Organizacional

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um erro, preferimos errar por omissão, ou seja, deixando de agir. Isso porque temos a tendência de ver a inação como um evento passivo – não fizemos nada. E já que não fizemos nada, nos sentimos menos responsáveis pelo resultado que daí advém. Retomando a discussão sobre a atuação em grupo, ceder à pressão e atuar contra seus princípios em nome de uma postura de grupo pode levar a um estado de patologia. Embora esse fenômeno da doença mental tenha sido inicialmente uma área restrita à psiquiatria, a psicologia (como área que busca a compreensão da subjetividade humana) tem contribuições importantes. A abordagem psicológica encara os sintomas e, portanto, a doença mental como desorganização da vida subjetiva da pessoa. Essa desorganização pode ocorrer a partir da interdependência entre acontecimentos crônicos ou excepcionais (traumáticos) no mundo físico ou social (precariedade de condições de vida, riscos iminentes de catástrofes, perda de um ente muito querido) e as condições da constituição de sua subjetividade (sujeito em sua totalidade: seu corpo físico, seu funcionamento orgânico, psicológico e seu lugar social). O maior problema enfrentado nas relações de trabalho e em seus grupos é a maneira como elas se estruturam a partir do fator competitivo e de disputa. Esse clima de competição produz distorções nas relações entre as pessoas que convivem nas organizações de trabalho. Mesmo quando há uma boa política de gestão de pessoas e dirigentes capacitados para lidar com os conflitos interpessoais, sabe-se que não é fácil a convivência por meses e anos a fio em um ambiente dessa natureza. O clima autoritário presente nas organizações é um tema estudado desde o início do

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século passado pela psicologia e atualmente têm se revelado na intensa discussão de assédio moral. Conforme Bock, Teixeira e Furtado (2011), esse assédio é danoso para as relações interpessoais e pode prejudicar seriamente as pessoas a elas submetidas. O assédio se expressa como terrorismo psicológico, subestimação e exigências excessivas pode produzir, em suas vítimas, adoecimento (insônia, gastrite, hipertensão, ansiedade, depressão) ou quadros mais graves, ao que é nomeado pelos estudiosos do tema como Síndrome de Burnout, uma exaustão mental. 4.1.1 EXPERIMENTO DE SOLOMON ASCH Outra abordagem sobre essa temática da relação do indivíduo inserido em um grupo foi dada pelo psicólogo Solomon Asch. Ele nasceu em 14 de setembro de 1907, em Varsóvia (Polônia). Na década de 1950, Asch recebeu ampla atenção por sua pesquisa em psicologia social e suas séries inovadoras de experimentos conhecidos como “Experimento de Conformidade de Asch”, que o ajudaram a colocá-lo no centro das atenções no mundo acadêmico e estabeleceram várias teorias duradouras sobre a influência social. Seu experimento consistiu em formar um grupo de seis a oito pessoas. Quase todos (exceto um) eram os aliados (ou cúmplices), mas essa única pessoa não sabia disso. Esses aliados tinham que agir como participantes reais. Havia uma série de 18 testes visuais simples, em que a resposta era sempre óbvia. Todos respondiam cada pergunta na presença dos demais. Os participantes eram posicionados sentados em fila, com a exceção (o único que não sabia do experimento) na extremidade, sendo o último ou o penúltimo a dar a resposta. Depois de montado o cenário, o condutor do experimento mostrava aos participantes um cartão com uma linha desenhada, semelhante ao cartão da esquerda que está ilustrado na figura 22 (esse é apenas um exemplo dos dezoito testes). Na sequência, mostrava o cartão da direita, com as três linhas identificadas por A, B e C.

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Figura 22: Amostra de cartões dos experimentos de conformidade Fonte: Kleinman, 2015

Pedia então para cada pessoa do grupo dizer em voz alta qual das linhas A, B ou C era mais semelhante à linha da esquerda. As primeiras duas respostas deveriam ser corretas, para que a pessoa que não sabia do experimento se sentisse confortável. A partir do terceiro participante, os aliados deveriam indicar outra resposta (errada - a mesma para todos). Dos 18 testes, os aliados deveriam responder doze com a mesma resposta incorreta. O objetivo desse experimento era ver se o único que não conhecia o método era capaz de dar a mesma resposta que a maioria do grupo, mesmo sendo óbvio que era a resposta errada. Quadro 4.1: Experimento de Asch - Conformidade O experimento de Asch concluiu que a conformidade ocorre por dois motivos principais: porque as pessoas querem se ajustar ao grupo (influência normativa) ou porque as pessoas acreditam que o grupo deve estar mais informado ou entender mais do assunto do que elas (influência informacional). Ambos os tipos de influência podem exercer grandes impactos sobre os indivíduos dentro de um grupo.

Embora muitos psicólogos suspeitem que a dinâmica de grupo possa influenciar a percepção individual, foi somente a partir do famoso experimento de Solomon Asch que o mundo finalmente compreendeu como a percepção pode ser alterada pela pressão externa (KLEINMAN, 2015).

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4.1.2 EXPERIMENTO DE PHILIP ZIMBARDO Mais uma abordagem sobre essa temática da psicologia social foi dada pelo psicólogo Philip Zimbardo. O experimento liderado por ele visava investigar o comportamento humano, através da inserção do indivíduo em grupos. Tal experimento foi realizado no ano de 1971, na Universidade de Stanford, em um porão do Instituto de Psicologia, onde se reproduziu o ambiente de uma prisão. 24 estudantes foram escolhidos a partir de uma lista de 70 alunos voluntários e a cada um deles foi oferecido U$15 dólares por dia pela participação. O grupo selecionado foi então dividido aleatoriamente em dois grupos: metade faria papel de guarda e a outra metade, de prisioneiro. Os guardas foram divididos em grupos menores e cada um deles trabalhava em turnos de 8 horas por dia. Todos deveriam cumprir o horário com um uniforme específico e óculos de sol espelhados. A equipe de Zimbardo que acompanhava o experimento encorajava os guardas a serem cruéis com os prisioneiros, mas sem cometer nenhum tipo de agressão física. Os guardas eram instruídos para provocar tédio, um sentimento de frustração e medo nos alunos prisioneiros, de forma a tirar a liberdade deles e criar uma sensação de esmagadora impotência. Eles possuíam bastões de madeiras e utilizavam óculos para evitar o contato visual. Seguidamente tentavam dividir os presos em blocos de “bons” e “maus” em celas diferentes, o que evidentemente contribuiu para a motivação da discórdia entre o grupo. Os alunos que fariam os prisioneiros só sabiam que seriam “presos”. Todos eles foram detidos em suas próprias casas, sendo carregados e alertados sobre seus direitos legais – como se eles fossem realmente culpados por algum crime. Os vizinhos puderam ver cada um deles sendo algemados e levados por um carro aparentemente oficial. Depois, eles foram colocados em salas, onde permaneceram com os olhos vendados. Eles vestiam roupões, sem roupa de baixo, e chinelos de borracha. Tinham números e não nomes. Usavam meias-calças nas cabeças a fim de simular o cabelo raspado e contavam com correntes amarradas nos pés. A duração reduzida do experimento (de apenas seis dias) se deu pelo fato de que a situação saiu de controle, já que os prisioneiros passaram a aceitar tratamentos humilhantes e sádicos por parte dos guardas, apresentando assim sérios distúrbios emocionais. Além disso, embora num primeiro momento tenha sido negado o uso da força física contra os presos, observou-se que os guardas iam dando mostras de um crescente sadismo, especialmente à noite, quando pensavam que as câmeras se encontravam desligadas, pois eram monitorados por um grupo de pesquisadores.

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O Experimento de Prisão de Stanford tornou-se um marco – tanto pelo seu fracasso quanto pelos aspectos psicológicos que, de fato, conseguiu comprovar. Até hoje ele é citado como um mau exemplo na ética do uso de humanos em experimentos, mas também é referenciado quando se debate, por exemplo, como indivíduos aceitam perpetuar a crueldade se recebem uma “autorização” para isso. Esse experimento é muito usado em discussões sobre a influência do ambiente no comportamento humano e a capacidade corruptora do poder. Quadro 4.2: Experimento de Zimbardo - Prisão O experimento da prisão de Stanford concluiu que os voluntários foram capazes de verdadeiras atrocidades do ponto de vista ético em relação aos outros do grupo. Os guardas encarnaram o papel de torturadores, enquanto os prisioneiros cada vez mais entraram no papel de vítima, assumindo como real o que era para ser apenas um experimento da psicologia social.

4.1.3 EXPERIMENTO DE STANLEY MILGRAM Stanley Milgram foi um psicólogo norte-americano graduado na Universidade de Yale, nascido em 1933 e falecido em 1984. Entre 1959 e 1960, trabalhou em Paris com Solomon Asch, que desenvolvia investigações sobre a conformidade. Quando regressou aos Estados Unidos, ele decidiu orientar o seu trabalho no sentido de conhecer o comportamento da obediência. Considerado um dos experimentos mais abomináveis de todos os tempos, o teste desenvolvido por Milgram em 1961 tinha por objetivo averiguar como as pessoas tendiam a obedecer às autoridades, mesmo que o comando delas fosse contra questões morais e éticas. Sua principal inspiração para estudar o assunto foi o depoimento de Adolf Eichmann, um dos tenentes do exército da Alemanha nazista durante o Holocausto, na Segunda Guerra Mundial, que afirmou que realizava atos desumanos com judeus e outros grupos porque estava seguindo ordens. Em termos gerais, o psicólogo queria saber: as pessoas praticam atos horríveis com outros seres humanos ao receber um comando de autoridade? Para averiguar a hipótese, Milgram recrutou 40 voluntários homens, entre 20 e 50 anos. Todos eles foram apresentados a dois atores: um que representava um suposto pesquisador e outro que fingia ser um voluntário.

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Posteriormente, o pesquisador “sorteava” os papéis que cada um iria exercer – embora sempre fosse combinado que o ator que fingia ser voluntário seria sempre o aluno a receber os supostos choques. O aluno era amarrado a uma cadeira com eletrodos em uma sala do laboratório e ele deveria decorar uma lista de pares de palavras. O professor (os 40 voluntários), em outra sala do laboratório, deveria testar a memória do aluno, pedindo para que ele relembrasse as palavras associados aos termos que pronunciava. Cada vez que o aluno errasse, o professor era instruído pelo pesquisador a administrar um choque elétrico no indivíduo. O nível do choque aumentava gradualmente – ia de 15 até 450 volts. Como fazia parte do estudo, o aluno errava propositalmente grande parte das vezes. Caso o professor se recusasse a acionar o choque elétrico, o pesquisador o induzia a realizar o ato. Logo em seguida, era possível ouvir um espasmo de dor do ator (um choro fingido, já que os choques não estavam sendo aplicados de verdade). Embora Stanley Milgram acreditasse que somente uma parcela mínima dos participantes administraria todos os choques exigidos pelo pesquisadorator, o resultado do experimento mostrou que cerca de dois terços dos voluntários foram até o fim, mesmo no ponto onde o ator fingia já estar inconsciente. Quadro 4.3: Experimento de Milgram - Choque O experimento da aplicação dos choques como forma de punição permitiu identificar alguns fatores que explicam a obediência à autoridade: o desejo de ser aceito, baixa autoestima e aceitação da autoridade.

Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

4.2 PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL O pioneiro dos estudos organizacionais, considerado o pai da administração científica, foi Frederick W. Taylor. Ele estabeleceu um método que priorizou a organização das tarefas no ambiente de trabalho, mas não levou em consideração as condições de trabalho do operador (KLEINMAN, 2015). eST-601 - Psicologia na Engenharia de Segurança do Trabalho, Comunicação e Treinamento / PECE, 2° ciclo de 2020

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Por falar em organização das tarefas e condições de trabalho, faz-se necessário entender o histórico desse cenário onde o homem encontra-se inserido. Sabe-se que o trabalho é muito importante em nossas vidas e que isso é contraditório, porque em alguns momentos o trabalho é visto como atividade penosa. A primeira coisa que as pessoas afirmam quando perguntamos o que fariam se ganhassem uma grande bolada na mega sena é que iriam parar de trabalhar no mesmo dia. Por outro lado, todos nós consideramos que uma das principais formas de realização pessoal é a satisfação profissional, pois construímos nossas identidades a partir da escolha da profissão. Como essa atividade pode ser tão desprezada e ao mesmo tempo tão valorizada? Somente com a chegada do capitalismo e a exigência de um trabalhador livre é que a humanidade pode experimentar uma nova relação com o trabalho. É preciso considerar que, pela primeira vez na história das sociedades de classe, um grupo dominante (a burguesia) foi trabalhar. Não exatamente como os demais trabalhadores, mas administrando a produção dos bens de consumo. A primeira revolução industrial (final do século XVIII, na Inglaterra), com a invenção do tear movido a vapor, foi um dos elementos que incrementou a produção, levando a uma nova relação de trabalho com o aparecimento das fábricas. O trabalho deixa de ter o seu caráter artesanal, com um trabalhador envolvido somente com um produto, para concentrar um grande número de mão de obra em um mesmo espaço (a fábrica). Os trabalhadores estão todos envolvidos com a mesma tarefa (como a de cuidar do tear mecânico, por exemplo). O que mudou profundamente com o advento do capitalismo foi a base de crenças e valores no ambiente de trabalho, que envolvem e justificam socialmente o processo de produção. Primeiro, o trabalhador precisou se considerar livre para poder vender a sua força de trabalho. Segundo, foi preciso que o trabalho fosse valorizado como atividade humana. Assim, o trabalho ganhou um novo patamar e, a despeito de continuar sendo uma atividade penosa, passou também a ser considerado como atividade que valoriza o ser

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humano. Isso porque o trabalhador passou a ser detentor de uma mercadoria chamada força de trabalho e foi preciso que tal mercadoria fosse valorizada pelo empregador. Tem-se então uma nova realidade, que inclui o trabalho livre, a grande concentração de trabalhadores no local de trabalho, a mecanização da produção, as novas formas de comercialização dos produtos, o aparecimento de um mercado consumidor. O crescimento dessa nova forma de produção foi exponencial e exigiu novas formas de administração e gerenciamento e, ao mesmo tempo, novas soluções tecnológicas. A partir de 1850 e da segunda revolução industrial, houve a descoberta e o uso da eletricidade e da produção em série (o fordismo) e a criação de um modelo específico de administração. Desde o início dessa nova forma de apresentação do trabalho, tudo se tornou muito complexo. A enorme quantidade de trabalhadores no chão de fábrica passou a exigir um contingente semelhante na organização do sistema. Trabalhadores para gerir o complexo, para vender os produtos, para organizar a vida de outros trabalhadores. Surgiram os trabalhadores de escritório; apareceu a classe média, a exigência da qualidade de vida, os executivos como trabalhadores contratados para ocupar o lugar do dono dos complexos de produção (BOCK, TEIXEIRA e FURTADO, 2011). Nessa fase, esses complexos passaram a significar muito mais do que um grande galpão com enormes máquinas tocado por uma espécie de capataz e controlado a certa distância pelo próprio dono. Tais complexos se transformaram em sociedades anônimas, com muitos donos investidores; a especialização da produção exigiu a terceirização, os trabalhadores já não moravam mais nos arredores das fábricas e estas foram deixando de ser o núcleo central desse conglomerado. A mudança seguinte foi representada por dois fenômenos importantes. O primeiro foi a informatização do processo produtivo, com a produção dos componentes eletrônicos miniaturizados que evoluíram para as máquinas automatizadas e a robotização da produção. O segundo fenômeno foi a revolução na administração do processo produtivo, com a introdução do modelo toyotista de

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produção. Esse modelo previa a maior participação dos trabalhadores no processo produtivo com as células de produção, a flexibilização das tarefas, a substituição do sistema de estocagem pela produção a partir de encomendas. Mais uma vez o trabalho mudou de característica. Do ponto de vista do futuro das relações de trabalho, pode-se projetar fábricas completamente automatizadas e controladas à distância pelos técnicos. Hoje mesmo, já são encontrados alguns segmentos industriais com essas características. Alguns estudiosos do assunto apontam para o fim do emprego como o conhecemos hoje. Se o trabalhador no chão de fábrica for substituído por robôs, os empregos irão desaparecer nesses lugares. Na verdade, uma quantidade considerável de postos de trabalho já sumiu com a reestruturação produtiva, a partir do final do século XX. Os trabalhadores migraram para outras áreas que ainda oferecem empregos, porém tais áreas, como é o caso do setor bancário, também passaram pelo mesmo fenômeno de reestruturação e automação e diminuíram significativamente o número de pessoas trabalhando. Onde iremos trabalhar então? Em contrapartida, há um incremento dos postos de trabalho no setor de serviços e num tipo de produção em que a máquina ainda não consegue desempenho semelhante ao dos humanos: o campo que exige conhecimento e criatividade. Cresce assim o emprego na produção de softwares. Diante de tanta transformação Bock, Teixeira e Furtado (2011) destacam que fica evidente que muita coisa mudou no mundo do trabalho e das organizações. Aumentou a autonomia do trabalhador, aumentou a dependência da capacidade intelectual, aumentou o controle na situação de trabalho (tanto para o empregador como para o trabalhador), aumentou o desgaste, surgiram novas formas de trabalho (como o trabalho baseado na casa do trabalhador home office). Algumas mudanças foram para melhor; outras nem tanto. Considerando que a reestruturação produtiva automatizou a produção, muitos desses operários, além de estarem desconectados daquilo que produzem, são dominados pelo ritmo da máquina que operam. Svartman (em seu doutorado intitulado “Trabalho e desenraizamento operário: um estudo de depoimentos sobre a experiência de vida na fábrica”) identificou o que ele chamou de desenraizamento, que vem a ser a desconexão entre o mundo do trabalho e a vida do trabalhador. É tão violenta a maneira como o trabalhador é submetido a uma ordem que exige plena atenção a uma atividade mecânica, que isso pode acabar embrutecendo a pessoa. Esse embrutecimento é causado pela ausência de um pensamento criativo, seja ele vinculado ao que se está produzindo, seja ele o mero devaneio de quem pensa na vida enquanto

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trabalha. Não é preciso ir muito longe para concluir que esse processo de desenraizamento incrementa o desgaste físico e mental do trabalhador e a chance de adoecimento. Não é por acaso que nos últimos tempos aumentaram as notificações de sofrimento mental no trabalho, enquanto a depressão aparece como uma das causas mais registradas. Tais problemas com a saúde do trabalhador podem inviabilizar a sua continuidade naquela determinada função e, algumas vezes, o inutilizam para o trabalho. O resultado disso é o aumento considerável da tensão no ambiente de trabalho. A demanda é por um profissional autônomo, qualificado, pronto para assumir múltiplas tarefas, criativo e capaz. É o que o mercado está chamando não mais de trabalhador, funcionário ou operador, mas de colaborador. Entretanto, sem ambiente de trabalho saudável, sem salário compatível, sem conhecimento das múltiplas tarefas, o colaborador padece e enfrenta os dissabores de uma época em que trabalhar deixou de ser uma forma de ganhar o suficiente para reproduzir a vida. Trabalhar, hoje, é enfrentar os desgastes de um admirável, trágico e degradante mundo moderno. Conforme Bohrer (2013), a psicologia do trabalho se alinha a essa discussão com o intuito de que o trabalho possa ser objeto de reconhecimento de si, ao invés de ser um exercício penoso de se defender psiquicamente a todo o momento. O trabalhador pode ter consciência de que a imagem que ele produz para seus colegas é falsa, e, ainda assim defendê-la. Casos de sabotagem a colegas são comuns para esse tipo de pessoa, que a psiquiatria denomina de comportamento antissocial e que, quando obtém sucesso em suas investidas, pode se estabilizar em uma personalidade psicopática. Essas pessoas expõem os colegas, vistos como ameaças ao desvelamento de sua imagem; atribuem a eles responsabilidades por erros, faltas, ainda que mantenham a aparência de entrosamento com todos, ou seja, são contraditoriamente sociáveis. A pessoa, muitas vezes, não percebe o esforço que faz para manter um autoconceito, havendo uma enorme mobilização cognitiva em conservar para si uma imagem irreal de si mesmo. Com essa atenção voltada para reafirmar uma ideia de si, o trabalho fica em segundo plano e a tarefa exercida de forma desatenta pode ocasionar acidentes.

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Através desse cenário, entende-se que o trabalho não pode se restringir à execução de uma tarefa; deve ser estendido às pessoas que dele participam. Os colegas de trabalho precisam trocar entre si e cooperar mutuamente para se sentirem parte de algo maior, de uma coletividade produtiva. Assim, a identificação entre os empregados ocorrerá com maior facilidade e, aliada aos desafios comuns do trabalho, ampliará suas capacidades. Com isso, tudo o que concerne o trabalho (incluindo-se as normas de segurança, o cuidado consigo e com os outros) transforma-se em algo mais valioso, parte do que as pessoas são realmente. Para que o trabalho promova sentido deve existir comprometimento, que pode ser entendido como o vínculo positivo que se estabelece entre as pessoas e a organização. É preciso que a empresa ofereça condições para que seus funcionários atinjam seus objetivos pessoais. Um elevado nível de comprometimento contribui para o aumento do desempenho do trabalhador, porque se comprovou através de pesquisas que esse fator desencadeia comportamentos desejáveis. O comprometimento não é apenas um vínculo; envolve o desejo de manter o mesmo curso de ação, um sentimento de responsabilidade em transformar objetivos e metas em realidade. Também vai além da simples lealdade à empresa, tendo a ver com a real preocupação com o sucesso da organização onde se trabalha e com o bem-estar dos colegas. Portanto, o comprometimento organizacional consiste em atitude ou orientação para a organização, unindo a identidade da pessoa à empresa. O objetivo fundamental dos estudiosos nesta área é o de delimitar e identificar os fatores que implicam nesse comprometimento para envolver o ser humano totalmente com a organização. Todas as propostas partem da premissa que o vínculo do indivíduo com a organização existe e é inevitável; o que difere é apenas a forma com que este vínculo se desenvolve e se mantém no ambiente organizacional (BOHRER, 2013). A estrutura da organização vai filtrar as influências nos trabalhadores e em seus grupos, tirando proveito delas e gerando grupos formais em uma hierarquia que favoreça a produtividade. Entretanto, existe uma tendência atual de que as empresas construam essas estruturas com o poder distribuído mais na horizontal, o chamado empowerment, aumentando o controle dos empregados sobre a produção e também sobre as relações humanas. Isso tem ocorrido a partir do avanço em pesquisas da psicologia que comprovaram o aumento da eficiência e produtividade no trabalho quando os empregados têm maior autoestima, decorrente de seu poder e controle. O objetivo desse empowerment é simples: transmitir recursos e responsabilidades para todas as pessoas com a finalidade de se obter mais energia intelectual e criativa delas;

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incentivar a produção de lideranças dentro dos grupos que irão ajudar a empresa em suas metas. Para tanto, é necessário que se invista nessas pessoas que têm cada vez mais responsabilidade, o que acaba gerando grandes desafios aos gestores. Nesse contexto, esses gestores desenvolveram uma ferramenta para mapear o ambiente interno, com o intuito de identificar os problemas e melhorar o ambiente de trabalho. O estudo do clima organizacional realiza esse levantamento, indicando alternativas viáveis a partir de como o colaborador percebe a organização com sua cultura, seus valores, como interpreta tudo isso e reage. Esse conjunto de valores afeta a maneira pelas quais as pessoas se relacionam umas com as outras, tais como: sinceridade, padrões de autoridade, relações sociais etc. O resultado da análise do clima organizacional promove ações planejadas e coordenadas em direção à dimensão problemática, tanto no sentido de amenizar conflitos, quanto no sentido de potencializar boas relações de trabalho. O psicanalista Sigmund Freud baseou boa parte de seu pensamento num princípio válido para todo o ser humano: a busca pelo prazer na fuga do desprazer. O homem, diante de uma situação penosa ou de uma ideia de culpa, sente-se em apuros e tenta afastar os pensamentos ruins de si, se refugiando nos devaneios, nas fantasias e nos sonhos. O trabalho para este mesmo homem dificilmente representa um ganho de prazer. É cada vez maior o desgaste no enfrentamento de uma rotina de trabalho. As exigências do mercado estão muitas vezes além das capacidades humanas normais e o sofrimento consta como um dos temas mais frequentes nos congressos de psicologia do trabalho e de saúde mental. Na tentativa de evitar o desprazer do trabalho, o trabalhador inconscientemente adoece, somatizando a conflituosa relação com o seu trabalho no corpo. Nas pesquisas sobre as causas de faltas no trabalho, os motivos psicológicos representam uma grande parcela. Estudos indicam que mesmo que haja razões obscuras causando o absenteísmo, existem formas de preveni-lo e as organizações vêm investindo maciçamente nisso. Sabe-se que ele é inversamente proporcional à satisfação no trabalho, sendo a ausência no

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ambiente laboral considerada como uma forma de se afastar de pequenas situações indesejáveis. A análise de variáveis como condições de trabalho, estilos de liderança, participação na tomada de decisões, natureza da supervisão e relacionamentos entre os profissionais pode ajudar a entender o impacto do absenteísmo nas organizações. No enfrentamento desse problema, Bohrer (2013) acredita que há dois pontos críticos que precisam ser destacados, pois exigem ações contínuas de gestão que envolvem exatamente a melhoria nas condições de trabalho: ergonomia e motivação.  Ergonomia: tem como principal campo de investigação a criação de dispositivos de trabalho adaptados às características físicas e psicológicas dos trabalhadores, no sentido de promover a saúde e obter a efetividade desejável através de boas condições laborais. Os riscos à saúde do trabalhador não se resumem apenas aos acidentes, mas também à maneira com que ele exerce sua atividade laboral cujo efeito, muitas vezes, se reverte em absenteísmo.  Motivação: os fatores que levam à satisfação no trabalho são necessários, porém não suficientes para motivar os membros da organização, o que deve ser levado em conta quando se elabora uma estratégia de combate à redução do absenteísmo. A melhoria desses fatores servirá para remover empecilhos à formação de atitudes positivas, mas não leva necessariamente a atitudes positivas em relação ao trabalho, o que pode ser conseguido quando os reais fatores motivacionais são considerados pela gestão. Vincular o trabalho ao prazer nem sempre é viável. É preciso se atentar para a deterioração dos fatores higiênicos de Herzberg que tornam inviável qualquer satisfação mínima em relação ao trabalho, conduzindo ao absenteísmo nas formas mais variadas possíveis. Entretanto, o esforço laboral pode ser transformado em força de motivação quando a atividade permitir a liberdade criativa. Assim, aquilo que se configura como desprazer, converte-se em ganho, desde que a organização crie condições para que isso aconteça. O prazer, assim, não se resumirá à fuga do desprazer (como preconizou Freud), mas em ampliação da capacidade criativa, que é análogo à produção dos sonhos, mas que pode se realizar na atividade laboral. Então, quando o trabalho passa a ser realizador, no amplo sentido da palavra, reduzem-se os motivos ocultos por trás de grande parte das causas do absenteísmo. Conforme o célebre psicanalista francês Cristophe Dejours: “A saúde mental é uma responsabilidade organizacional”.

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Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

4.2.1 ASPECTOS COMPORTAMENTAIS ASSOCIADOS AO USO DE EPI Os acidentes de trabalho são resultados da interação sistêmica de diversos fatores que agregam aspectos técnicos, ambientais e humanos, sendo assim um fenômeno de natureza multifacetada. Tais fatores atuam de forma integrada, gerando as condições favoráveis para a ocorrência dos acidentes. Um desses é a presença e intervenção do homem no ambiente de trabalho, pois esta interação altera o meio, da mesma forma que provoca mudanças no indivíduo que nele atua. A grande dificuldade em conhecer e controlar esse fator é que o ser humano é único em sua essência e seu comportamento é resultado de um complexo conjunto de fatores intrínsecos e extrínsecos. A forma mais simplista é associar as causas primárias dos acidentes e atribuí-las a dois fatores: erros humanos e/ou condições perigosas no ambiente. Quando identificadas essas características do meio, as ações tomadas normalmente estão ligadas às providências técnicas ou administrativas para tentar eliminar as condições perigosas ou colocar controles. No caso da identificação dos erros humanos, costuma-se tentar uma mudança de comportamento do colaborador e/ou investir em treinamento. Esta é uma visão limitada, pois não considera a multicausalidade do acidente de trabalho. De acordo com o que estabelece a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o Equipamento de Proteção Individual (EPI) deverá ser adotado “sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra riscos de acidentes e danos à saúde dos empregados”. Do ponto de vista prevencionista, sabe-se que o EPI não evita o acidente; ele existe para evitar a lesão ou para atenuar sua gravidade, além de proteger o organismo contra os efeitos dos agentes físicos e químicos. Antes de adotar o uso de EPIs, a empresa deve implantar medidas de proteção coletiva que possam eliminar ou neutralizar a ação dos agentes presentes no ambiente de trabalho. Caso não haja condições técnicas de adotar tais medidas, cabe ao empregador prover medidas de proteção individual. Uma das queixas mais frequentes dos profissionais que atuam na área de segurança do trabalho tem sido a dificuldade de convencer os trabalhadores da necessidade do uso do EPI. É bastante comum o comportamento do

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trabalhador de usar sua proteção individual apenas quando sabe que há alguém fiscalizando ou quando sente o desconforto pela presença de algum agente físico ou químico no ambiente. Olhando sob a ótica do trabalhador (e usuário do EPI), a psicóloga Maria Luiza Sampaio Góes menciona algumas razões que favorecem o não uso, o uso descontinuado ou ainda o uso inadequado são:  Os EPIs devem ser a última opção de proteção para o trabalhador: por razões culturais, muitos empresários acreditam que controles de engenharia ou administrativos (que promovem a proteção coletiva) são mais caros e difíceis do que o uso de EPI. Com essa mentalidade, sobra para o colaborador a responsabilidade de utilizar um equipamento que muitas vezes é desconfortável, quando na verdade esta deveria ser uma responsabilidade do empregador, de criar um ambiente de trabalho livre (dentro dos limites técnicos), de agentes nocivos à saúde humana. Sabe-se que uma grande parcela dos EPIs utilizados poderia ser dispensada caso as medidas de proteção coletiva estivessem adequadamente implantadas.  Alguns EPIs são desenvolvidos em outros países: isso significa que o formato do corpo do trabalhador alemão, francês ou americano, por exemplo, é diferente do corpo do trabalhador brasileiro. Isso gera um desconforto adicional, pois há dificuldades de adaptação anatômica.  Trocar o conforto de agora pela saúde de depois: o trabalhador é convidado a utilizar o EPI com a expectativa de que sua saúde seja preservada. A maioria dos sintomas de danos à saúde por exposição a agentes físicos, químicos, biológicos e ergonômicos presentes no ambiente de trabalho serão sentidos dentro de muitos anos. Por conta disso, o trabalhador é convidado a trocar o conforto de agora para evitar um possível adoecimento futuro. Muitas vezes, por razões culturais ou por estratégias de defesa, há uma crença de imunidade com relação aos riscos e decorrente desse pensamento, o colaborador não estabelece uma relação vantajosa em relação ao uso dos EPIs.  Cultura e clima organizacionais são determinantes nas ações realizadas pelos trabalhadores: cultura e clima são elementos da vivência organizacional que interferem nas pessoas. Caso seja observado um comportamento generalizado de desobediência aos procedimentos (como por exemplo, a recusa ao uso de EPIs), deve-se analisar quais são as crenças e valores em relação à SST. Há uma grande chance de encontrar aí as razões do não uso de EPIs. Que tipo de mensagem a empresa está transmitindo aos funcionários? Apenas foco na produção? O que é eST-601 - Psicologia na Engenharia de Segurança do Trabalho, Comunicação e Treinamento / PECE, 2° ciclo de 2020

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enfatizado como importante? Esses fatores ajudam a entender a cultura organizacional.  Relações com a liderança influenciam as ações dos trabalhadores: outro fator que possui um grande peso nas ações das pessoas dentro de uma organização é a relação com o líder. Lideranças despóticas provocam em seus grupos de trabalho comportamentos infantilizados (como sabotagens, mentiras, ocultações, delações etc.). Caso o problema seja localizado, é possível trabalhar o desenvolvimento através de coaching, mas se o problema for generalizado, caracteriza um elemento cultural da empresa.  Cumprimento de normas ou manutenção da saúde do trabalhador: existe significativa diferença entre solicitar que o trabalhador utilize EPIs apenas para o cumprimento de uma legislação e estar realmente interessado na manutenção de sua saúde. Empresas que estão interessadas na saúde do trabalhador, além de disponibilizarem EPIs, possuem também políticas de Qualidade de Vida no Trabalho e estão preocupadas com o desenvolvimento humano. As pessoas percebem a diferença e, na medida em que a empresa oferece informação sobre saúde (física, emocional e social), disponibiliza programas que a promovam e integra o universo social do trabalhador. Como consequência, o colaborador aumenta seu grau de consciência sobre sua saúde e sua segurança e verá valor no uso de EPIs ou no cumprimento dos procedimentos de segurança. O adequado uso de EPIs por parte dos trabalhadores é resultado de um conjunto de situações, onde a responsabilidade está situada na gestão organizacional, na cultura e na relação com a liderança. O engenheiro de SST deve manter um olhar amplo e sistêmico sobre essas questões. Integrar legislação, possibilidades técnicas, disponibilidade de recursos, conhecimento sobre o ser humano em situações de trabalho, estilos de liderança (dentre outros conhecimentos), conduzirá este profissional a resultados mais concretos tanto no aspecto objetivo quanto no que se refere à satisfação das pessoas e de suas relações.

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Capítulo 4. Noções de Psicologia: Social e Organizacional

4.3 POST-IT® Insira nesse post-it os pontos mais importantes referentes a esse capítulo: Quais foram os conceitos que você mais gostou? Qual assunto mais te chamou a atenção? Algum ponto específico que você se identificou? Depois de tantas coisas vistas e discutidas, do que você se lembra? De nada? Ops!

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Capítulo 4. Noções de Psicologia: Social e Organizacional

4.4 TESTES 1) O que mudou profundamente com a chegada do capitalismo? a) A base de crenças e valores no ambiente de trabalho. b) A invenção do tear manual e da disseminação da mão de obra. c) O método de trabalho, que priorizou a organização das tarefas. d) A quantidade reduzida de trabalhadores no chão de fábrica. e) Os complexos fabris perderam seu significado e se dissolveram. Feedback: item 4.2.

2) A psicologia do trabalho tem qual intuito? a) O trabalho possa ser objeto de reconhecimento de si, ao invés de ser um exercício penoso de se defender psiquicamente a todo o momento. b) Mapear o clima organizacional a fim de identificar as fontes de discórdia no ambiente laboral. c) Entender a cultura da organização para implantar meios de aumentar a produção. d) O trabalho como forma de gratificação financeira, tanto do ponto de vista do trabalhador, quanto da liderança. e) Avaliar o ambiente de trabalho no que diz respeitos aos aspectos ergonômicos e das relações interpessoais. Feedback: item 4.2.

3) Assinale a alternativa que NÃO inclui uma das razões que favorecem algum tipo de problema no uso de EPIs, de acordo com a psicóloga Maria Luiza Sampaio Góes. a) Os EPIs normalmente não combinam com o restante da vestimenta. b) Alguns EPIs são desenvolvidos em outros países. c) Cumprimento de normas ou manutenção da saúde do trabalhador. d) Relações com a liderança influenciam as ações dos trabalhadores. e) Trocar o conforto de agora pela saúde de depois. Feedback: item 4.2.1.

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Capítulo 5. Características de Personalidade

CAPÍTULO 5. CARACTERÍSTICAS DE PERSONALIDADE

OBJETIVOS DO ESTUDO Apresentar as características de personalidade Entender os requisitos de aptidão na seleção de pessoal Ao término deste capítulo o aluno deverá estar apto a:  Conhecer a contribuição de Carl Jung para o desenvolvimento das características de personalidade e sua classificação;  Entender as funções psíquicas;  Ter conhecimento básico sobre o teste MBTI.

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Capítulo 5. Características de Personalidade

5.1 CARACTERÍSTICAS DE PERSONALIDADE Stratton e Hayes (1994) tratam o termo “personalidade” dentro do seguinte contexto: aqueles traços de um indivíduo que explicam suas maneiras características de se comportar. Alguns usos do termo personalidade referemse aos padrões de comportamento e não os papéis sociais que a pessoa adota. Algumas abordagens enfatizam a personalidade como um todo integrado e não como a soma das suas partes. O filósofo espanhol Ortega y Gasset disse: “O homem é ele e suas circunstâncias”. Essa afirmação mostra a complexidade do desafio da compreensão do humano, porque a frase indica que é preciso conhecer aquilo que produz o modo de ser – sentir – agir de cada um, que pode ter aspectos comuns ou diferentes para várias pessoas do planeta (religião), de um mesmo país (a língua) ou localidade (bairros) ou classes sociais (pobres e ricos) e, ao mesmo tempo, lembra que “cada um é um”. De acordo com Bock, Teixeira e Furtado (2011), esses exemplos reforçam que as circunstâncias ou condições (demográficas, econômicas, sociais, culturais, políticas etc.) em que o ser humano vive podem determinar modos de ser, pensar e agir característicos de grupos ou setores da população ou de todo um povo de um país, o que lhe dá uma identidade. Ao mesmo tempo, essas condições atingem cada pessoa de modo bastante peculiar. Um exemplo simples de condições semelhantes de vida que produzem diferenças são os irmãos de uma mesma família (que muitas vezes têm personalidades bem distintas). E um exemplo de condições diferentes de vida que provocam modos de sentir, pensar e se comportar de modo semelhante é o desejo de consumo de dois adolescentes com poder aquisitivo bastante diferente, diante da mesma propaganda de tênis ou celular. Kleinman (2015) comenta que, ao discutir sobre personalidade, os psicólogos olham para pensamentos, comportamentos e emoções que um indivíduo tem que o tornam único. A personalidade é individualizada e, em sua maior parte, permanecerá consistente ao longo da vida. Embora existam muitas interpretações sobre o que constitui a personalidade, algumas características fundamentais são comuns. A primeira delas é que há consistência no comportamento. As pessoas se comportam de forma igual ou semelhante em diferentes tipos de situações. Além dessa consistência, outra

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Capítulo 5. Características de Personalidade

característica comum é que embora a personalidade seja um conceito psicológico, processos biológicos têm grande influência e impacto (ex.: Tensão Pré Menstrual - TPM). Adicionado a esses, pode-se dizer que além do comportamento, a personalidade também pode ser percebida nas intenções com outras pessoas, nos relacionamentos, nos pensamentos e nas emoções. Existem várias teorias que tentam entender como a personalidade se desenvolve. Nelas, pode-se incluir a abordagem humanista (como a hierarquia de necessidades de Maslow), que enfatizam o papel do livre-arbítrio e da experiência do indivíduo; a abordagem psicanalítica (como o trabalho de Freud), que enfatiza as primeiras experiências e o inconsciente; a abordagem comportamental (como a interface estímulo – resposta – consequência), que sugere que o indivíduo e suas interações com o ambiente levam ao desenvolvimento da personalidade e outras. Embora haja diversas linhas que tratam desse tema da personalidade de maneira bem diferente, um ponto é comum entre todas elas: a personalidade geralmente permanece coerente ao longo da vida de uma pessoa e é responsável por fazer cada indivíduo pensar, comportar-se e sentir-se de maneira única e individualizada. A psicóloga Maria Luiza Sampaio Góes discute que, na área de SST, há uma questão muito delicada nesse âmbito da personalidade: é possível definir um perfil que esteja menos propenso ao acidente de trabalho? Esta é uma pergunta que não possui uma resposta simples. De forma geral, pode-se dizer “não” e isso se deve a alguns fatores. Primeiramente é preciso lembrar que a ocorrência de um acidente é multicausal. Assim sendo, atribuir apenas ao funcionário a responsabilidade pelo evento indesejado é apoiar-se na teoria da culpa exclusiva (erro humano intencional) e desconsiderar o universo onde o indivíduo está inserido e onde seu trabalho é realizado. Mas mesmo considerando a possível parcela de responsabilidade do trabalhador sobre a ocorrência do acidente de trabalho, é muito difícil estabelecer uma relação direta entre a personalidade e o fato. Em segundo lugar, a personalidade como a somatória dos traços internos do indivíduo e sua expressão no mundo é algo dinâmico, em constante movimento, sendo alterada pelo mundo real. Portanto, caso o indivíduo fosse classificado como possuidor de uma personalidade pouco propensa a acidentes de trabalho, no minuto seguinte essa condição poderia estar alterada, em razão de algum acontecimento interno ou externo. Como terceiro fator, há a impossibilidade de mapear tão profundamente a personalidade humana a ponto de definir o grau de “acidentalidade” de um indivíduo. Tal dificuldade se deve ao fato de que toda análise de personalidade

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e seus traços possuem uma parcela de subjetividade, seja pelos instrumentos utilizados, ou pela presença da subjetividade do observador. Desta forma, é muito arriscado falar em “personalidade acidentária”, entretanto é possível observar alguns traços que facilitam ou propiciam maiores oportunidades para a ocorrência de acidentes de trabalho. Não seria adequado, por exemplo, indicar um indivíduo hiperativo para uma atividade que exigisse concentração e atenção, pois certamente ele teria grande dificuldade em manter a atenção necessária pelo tempo necessário. Seria pouco cauteloso indicar uma pessoa com elevado grau de ansiedade para um trabalho em espaço confinado. Um indivíduo portador de transtorno bipolar deveria ser afastado de qualquer atividade onde exista riscos considerados altos, visto que em sua fase maníaca ele poderia acreditar ser imune a qualquer ameaça e em sua fase depressiva, a menor condição perigosa poderia lhe parecer uma ameaça extrema, deixando-o paralisado. Esses simples exemplos mostram que há aspectos da personalidade que devem ser observados, estudados, pesquisados e tratados em todos os trabalhadores, com especial atenção naqueles que lidam com situações de risco classificados como não desprezíveis / baixos. Uma boa ideia é conversar com a equipe de psicólogos da empresa sobre os traços que foram identificados nos trabalhadores que estão na ativa, bem como discutir a forma de manter um acompanhamento preventivo periódico. Outro cuidado recomendado é o devido tratamento dos trabalhadores que sofreram algum tipo de trauma no exercício da profissão, como vítimas de acidente ou por terem assistido a algum acidente. Estes profissionais, ao retomarem suas atividades (nas mesmas funções ou em outras funções em decorrência de sequelas dos acidentes), necessitam de apoio emocional e de um acompanhamento, para identificação da abrangência do trauma em sua estrutura psíquica e suas possíveis consequências. É bastante comum o aumento da ansiedade, o surgimento da depressão e o rebaixamento da autoestima em situações como essas. Um bom gerenciamento desses recursos humanos torna-se imprescindível por parte das organizações.

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O ser humano não é algo definido, ou seja, sua atuação em relação ao ambiente (incluindo o de trabalho) é dinâmica e dialética. Por dinâmica entende-se que a cada momento sua resposta pode variar, de acordo com os estímulos externos, seu equilíbrio interno e a inter-relação entre os elementos internos e externos. Assim sendo, não é possível estabelecer com uma previsão confiável como o indivíduo irá se comportar no ambiente de trabalho, no que se refere ao seu potencial de promover acidentes. Por dialética, entende-se que sua ação em seu ambiente é alterada pelo próprio ambiente; logo, ambientes que facilitem a ocorrência de acidentes de trabalho contribuirão para que o indivíduo promova ações nessa direção. Essa ideia é fácil de compreender quando nos sentimos intimidados de jogar algo no chão de um local limpo. O contrário também é verdadeiro, ou seja, em um local desorganizado e sujo talvez não nos sintamos culpados de jogar apenas mais um pequeno papel no chão. O ambiente de trabalho também não é estável e sua mutabilidade natural altera a relação do “perfil acidentário” com os riscos reais. Maria Luiza Sampaio Góes discorda da ideia de verificação de aspectos de aptidão do trabalhador para a ocorrência de acidentes. De acordo com ela, uma coisa é clara: excluindo-se indivíduos que sofram de estímulos suicidas ou outros distúrbios patológicos, o ser humano tende a preservar sua própria vida e a daqueles a quem ama. Assim, em princípio todos nós estamos aptos à adoção de procedimentos que preservem nossa integridade física, moral e emocional. O engenheiro de SST deve estar atento ao perfil emocional daqueles que desempenham atividades ligadas a riscos considerados “não desprezíveis” no ambiente de trabalho. Caso tenha dúvidas, deve contatar a área de RH da empresa e solicitar a documentação de contratação do funcionário e a devida análise psicológica que suportou tal contratação, e/ou solicitar uma avaliação atual e acompanhamento do funcionário. Se a empresa não dispuser de conhecimento ou metodologia necessária para esta tarefa, empresas ou profissionais externos podem ser acionados.

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5.2 CARL G. JUNG Nesse contexto de discussão sobre as características de personalidade, é fundamental falar de Jung e de suas contribuições para essa área. Carl Gustav nasceu em 26 de julho de 1875, em Kesswil (Suíça). Entrou na Universidade de Basel em 1895 para estudar medicina. Um dia, descobriu um livro sobre fenômenos espíritas. Jung ficou tão intrigado com o assunto e a psiquiatria, que nos últimos meses de seus estudos desviou a atenção da medicina para essa especialidade. Para ele, a psiquiatria era a combinação perfeita da medicina com a espiritualidade. Jung acreditava que o propósito de todas as pessoas na vida era ter o consciente e o inconsciente plenamente integrados, de modo que pudessem se transformar no seu “verdadeiro eu”. Ele chamou esse processo de “individuação”. (KLEINMAN, 2015). Ele é considerado o fundador da psicologia analítica e suas ideias sobre extroversão, introversão, sonhos e símbolos foram extremamente influentes para a psicologia da personalidade. Segundo Jung, dentro do inconsciente de cada um há imagens primordiais, que ele chamou de “arquétipos”, que são reflexos de temas e padrões universais. Essas imagens primordiais não são aprendidas e atuam de modo semelhante aos instintos e ajudam a organizar nossas experiências. Os arquétipos podem ser percebidos através das chamadas “imagens arquetípicas”, tais como o pai (representativo de autoridade e poder); a mãe (representativo de conforto e carinho); o filho (representativo de um desejo por inocência e salvação); o velho sábio (representativo da sabedoria, orientação e conhecimento); o herói. Os arquétipos também são percebidos em comportamentos externos, especialmente aqueles que se aglomeram em torno de experiências básicas e universais da vida, tais como nascimento, casamento, maternidade, morte e separação. Também se aderem à estrutura da própria psique humana e são observáveis na relação com as pessoas, como delineadoras do modo

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pelo qual percebemos e nos relacionamos com o mundo. Os arquétipos podem cegar o indivíduo para a realidade. Comportamentos arquetípicos ocorrem com maior frequência em tempos de crise, quando o ego está vulnerável ao máximo.

Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

Nesse contexto de discussão de características de personalidade, Jung apresentou, em 1921, uma contribuição fundamental para o entendimento dessas características, ao escrever um de seus mais importantes trabalhos: “Tipos Psicológicos”, fruto de mais de vinte anos de observação e do exercício da medicina psiquiátrica e da psicologia prática. A teoria dos tipos psicológicos de Jung parte do princípio de que indivíduos se engajam em dois processos mentais: percepção e julgamento. A percepção toma a forma de sensação ou intuição; o julgamento tem seu foco no pensamento ou sentimento. Cada uma das quatro funções em estudo (sensação, intuição, pensamento e sentimento), tem ainda o caráter de se dividir em “extrovertida” ou “introvertida”. Na extroversão, a energia da pessoa flui de maneira natural para o mundo externo, fatos e pessoas. Observa-se uma atenção para a ação, impulsividade (ação antes de pensar), comunicabilidade, sociabilidade e facilidade de expressão oral. Na introversão, o indivíduo direciona a atenção para o seu mundo interno de impressões, emoções e pensamentos. Assim, observa-se uma ação voltada para o interior, o pensar antes de agir, postura reservada, retraimento social, retenção das emoções, discrição e facilidade de expressão no campo da escrita. Segundo Jung, nenhum ser humano é exclusivamente introvertido nem extrovertido: “ambas as atitudes existem dentro dele, mas só uma delas foi desenvolvida como função de adaptação”. Logo, podemos supor que a extroversão cochila no fundo do introvertido e vice-versa. Essa teoria de tipos psicológicos de Jung é utilizada para identificar as preferências e define os tipos em termos de funções dicotômicas. Existem duas funções dicotômicas categorizadas como “irracional” e “racional”. Os tipos que Jung classificou como irracional (sensação e intuição) são utilizados para descrever métodos dicotômicos para experiência e percepção da informação. Indivíduos com categoria predominantemente de sensação tendem a ser

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pragmáticos, ao passo que os tipos intuitivos têm base nas ações e comportamentos primariamente embasados em experiências inconscientes e percepções. Em contraste, os tipos racionais (pensamento e sentimento) são utilizados no processo de decisão. A função pensamento recorre primariamente aos dados, à avaliação desses dados e à lógica, enquanto a função sentimento acredita no feeling e nos valores como critérios principais para o processo de decisão. Quadro 5.1: Funções psíquicas de Jung Jung identificou quatro funções psíquicas que a consciência usa para fazer o reconhecimento do mundo e orientar-se. Ele as definiu como:  Sensação;  Intuição;  Pensamento;  Sentimento. Existem duas maneiras opostas através das quais percebemos as coisas: sensação e intuição. Existem outras duas que usamos para julgar os fatos: pensamento e sentimento. As pessoas utilizam diariamente esses quatro processos.

A função “sensação” é a função do real, aquela que traz as informações (percepções) do mundo através dos sentidos. Pessoas do tipo sensação acreditam nos fatos, têm facilidade para lembrar-se deles e dão atenção ao presente. Essas pessoas têm enfoque no real e no concreto, são voltadas para o aqui e agora e costumam ser práticas e realistas. Preocupam-se mais em manter as coisas funcionando do que em criar novos caminhos. O oposto da função sensação é a função “intuição”, onde a percepção se dá através do inconsciente e a compreensão do ambiente geralmente acontece por meio de pressentimentos, palpites ou inspirações. Os sonhos premonitórios e as comunicações telepáticas via inconsciente são algumas das propriedades da intuição. Pessoas do tipo intuição tendem a ver o todo e não as partes e por isso, costumam apresentar dificuldades na percepção de detalhes. A função “pensamento” estabelece a conexão lógica e conceitual entre os fatos percebidos. As pessoas que utilizam o pensamento fazem uma análise lógica e racional dos fatos: julgam, classificam e discriminam uma coisa da outra sem interesse pelo seu valor afetivo. Procuram se orientar por leis gerais

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aplicáveis às situações, sem levar em conta a interferência de valores pessoais. Naturalmente voltadas para a razão, procuram ser imparciais em seus julgamentos. A função “sentimento” julga o valor intrínseco das coisas, tende a valorizar os sentimentos em suas avaliações, preocupa-se com a harmonia do ambiente e incentiva movimentos sociais. Utilizam-se de valores pessoais na tomada de decisões, mesmo que essas decisões não tenham lógica do ponto de vista da causalidade. Pelo que foi apresentado, percebe-se que mapear e classificar o comportamento humano em toda a sua imensa diversidade é uma missão ambiciosa. Mesmo assim, cada vez mais empresas têm usado testes psicológicos para encontrar padrões de personalidade e assim recrutar e treinar profissionais de acordo com suas características pessoais. A classificação Myers-Briggs Type Indicator (MBTI) é um desses recursos (e uma das mais famosas). Criada pelas estudiosas norte-americanas Isabel Myers e Katherine Briggs, a teoria se baseia nos tipos psicológicos descritos pelo psiquiatra suíço Carl Jung. Segundo essa classificação, os indivíduos adotam quatro eixos de preferências psicológicas, chamados de dicotomias. Essas preferências são indicadas por letras maiúsculas e cada par dicotômico representa uma dimensão de comportamento dominante. O primeiro eixo está ligado ao “mundo favorito” de cada pessoa: se ela se concentra no exterior, sua característica é a extroversão (E); se favorece sua vida interior, é a introversão (I). A segunda divisão é entre sensação (S) e intuição (N). No primeiro caso, o foco está na informação básica que se recebe do mundo. Já os intuitivos acrescentam interpretações e significados subjetivos a suas percepções. Na hora de tomar uma decisão você prefere a lógica e a consistência ou dá atenção ao aspecto humano e pessoal da questão? Dependendo da resposta, o seu tipo psicológico conterá pensamento (T) ou sentimento (F). Por fim, você pode ter traços de julgamento (J), tendência ligada à tomada categórica de decisões, ou percepção (P), relacionada à abertura a novas informações e opções antes de “bater o martelo”. Todas as combinações possíveis entre essas características resultam num universo de 16 tipos psicológicos, descritos a seguir: 1. INTP: os “engenheiros” – Este grupo costuma ser reservado, independente e estratégico. São pessoas com necessidade de dominar competências, conhecimentos e conceitos que valorizam a consistência e a lógica. Por conta de seu pragmatismo, inteligência espacial e análise estratégica, aqueles que se

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encaixam neste tipo são chamados de “engenheiros”. Na vida profissional, o grupo se dá bem em funções que permitam propor e criar novos conceitos que sejam úteis. Exemplos de carreira: engenharia, arquitetura, urbanismo, desenvolvimento de sistemas, TI, ciências da computação. 2. ENTP: os “inventores” – Quem se encaixa nesse grupo se destaca por ser criativo, analítico e adaptável. Sua principal motivação é inovar. São profissionais persistentes e enxergam com facilidade oportunidades para criar e recriar processos. Graças ao seu apetite pelo novo, são conhecidos como “inventores”. A visão estratégica e a capacidade de analisar riscos também são marca registrada do grupo. No trabalho, estes profissionais precisam de espaço para fazer experimentos com novos produtos, serviços e soluções. Também é importante que eles possam liderar grupos em torno de suas ideias. Exemplos de carreira: arquitetura, design, criação, administração, física, química, farmácia. 3. ENTJ: os “marechais” – Curiosos, lógicos e críticos, profissionais com este perfil adoram liderar. São sociáveis e confiantes e por isso conseguem vender bem suas ideias. Além disso, costumam ser estrategistas, valorizam a lógica e gostam de jogar com vários cenários, como num jogo de xadrez. Pela sua visão complexa e estratégica, é chamado de “marechal de campo”. As atividades profissionais que privilegiam suas qualidades são aquelas que permitam liderar grupos e estabelecer alianças estratégicas. Exemplos de carreira: engenharia, economia, direito, vendas, publicidade, edição. 4. INTJ: as “mentes brilhantes” – Autoconfiantes, lógicos e independentes, são bons construtores de sistemas complexos e aplicadores de modelos teóricos. São pessoas ágeis, que enxergam a curto e longo prazo e têm poder de decisão. A visão global e a capacidade de fazer análises complexas deram ao grupo o apelido de “mentes brilhantes”. Na vida profissional, é preciso haver independência e tempo para imersão nas tarefas. Preferem trabalhar sozinhos ou em grupos mais reservados. Exemplos de carreira: engenharia, direito, redação, pesquisa e consultoria. 5. ESFP: os “performáticos” – O grupo se destaca pela simpatia e pela necessidade de agradar outras pessoas. São sociáveis, bem-humorados,

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divertidos, cooperativos e tolerantes. A habilidade para os relacionamentos e os dons artísticos são características importantes. Em síntese, adoram o palco, razão pela qual são conhecidos como “performáticos”. Rotina e sistemas prédefinidos não combinam com este perfil. O trabalho pode ser muito estimulante se envolver a liderança de grandes grupos graças a sua simpatia e sociabilidade. Exemplos de carreira: política, vendas, artes, relações públicas. 6. ISFP: os “compositores” – O grupo costuma ser sensível, modesto e perfeccionista. A inteligência cinestésica também é típica do perfil. Além disso, se motivam por expressões não verbais. Imagine um quadro com canetas, pincéis e tinta: essa é a forma como eles traduzem o que a fala não consegue expressar. Graças ao seu dom artístico, representantes deste grupo são chamados de “compositores”. Eles costumam trabalhar no nível instrumental e de forma independente ou com poucas interferências. Exemplos de carreira: artes plásticas, teatro, música, gastronomia, química. 7. ISTP: os “perfeccionistas” – Sua natureza é prática, impulsiva e adaptável. São pessoas com comportamento desbravador, que se motivam pela perspectiva de superar limites. Sua obstinação faz com que recebam a alcunha de “perfeccionistas”. Profissionais com esse perfil trabalham arduamente para fazer mais com menos. Mas tudo sem alarde: como outros tipos introvertidos, eles são discretos e preferem o contato em pequenos grupos. Combinam com o perfil atividades profissionais que permitam desbravar caminhos desconhecidos. Também é importante que a rotina de trabalho esteja conectada à busca pela melhoria de desempenho. Exemplos de carreira: esportes, educação física, pilotagem, artes, saúde. 8. ESTP: os “empreendedores” – São autoconfiantes, negociadores e competitivos. Graças a essas características, enxergam boas oportunidades com facilidade. Hábeis em explorar recursos de forma criativa para alcançar seus objetivos, são conhecidos como “empreendedores”. No trabalho, costumam fazer bom uso de sua influência e sociabilidade. Se dão bem quando podem realizar novos empreendimentos e negociar ideias, produtos ou serviços. Exemplos de carreira: administração de novos negócios, empreendedorismo, gestão, relações públicas.

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9. ENFP: os “campeões” – São pessoas diplomáticas por excelência. Eles se diferenciam pela necessidade de agregar e motivar grupos com propósitos e significado do bem maior. Entusiasmados e sociáveis, são profissionais que enxergam com facilidade os talentos dos outros. Pela sua habilidade em gerenciar conflitos e unir equipes em torno de um propósito, são conhecidos como “campeões”. Enquanto profissionais, seu grande valor está na inteligência interpessoal. São pessoas que conseguem melhorar o clima nos ambientes de trabalho, fortalecer as relações e liderar grupos de forma entusiasmada. Exemplos de carreira: direito, diplomacia, esportes, política, trabalho voluntário. 10. INFP: os “curadores” – A marca registrada do grupo é a empatia. São pessoas compreensivas, discretas e sensíveis, capazes de identificar facilmente as necessidades dos outros. Graças ao seu talento em ajudar e curar os demais de suas dores e problemas, o representante típico desse grupo é chamado de “curador”. No trabalho, tais profissionais se dão bem em funções que permitam estabelecer laços afetivos com outras pessoas. Exemplos de carreira: diplomacia, direito, jornalismo, psicologia, trabalho voluntário, política. 11. ENFJ: os “professores” – Entusiasmados, idealistas, prestativos e envolventes, são especialistas em desenvolver outras pessoas. São pessoas capazes de perceber talentos alheios e trabalhar fortemente para potencializálos. Por isso, são chamados de “professores”. Combinam com o perfil atividades profissionais que possibilitem o desenvolvimento de indivíduos, equipes e organizações. Têm facilidade para liderar grandes grupos em torno de um propósito, com muito entusiasmo. Exemplos de carreira: educação, coaching, mentoria, educação física, diplomacia, trabalho voluntário. 12. INFJ: os “conselheiros” – São reservados, idealistas e profundos, capazes de orientar outras pessoas a lidar com suas inquietações e questões pessoais. Hábeis em conquistar a confiança e simpatia dos outros, conseguem mobilizar equipes para extrair o seu melhor desempenho. A facilidade para orientar e ajudar outras pessoas e até, eventualmente, colocá-las no divã, deu aos representantes do grupo a alcunha de “conselheiros”. Pela sua capacidade de orientar o potencial humano, costumam se dar bem no desenvolvimento de indivíduos e equipes, seja do ponto de vista profissional ou pessoal.

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Exemplos de carreira: psicologia, terapia, educação, coaching, mentoria, assessoria de imprensa. 13. ESTJ: os “supervisores” – Representantes deste grupo são eficientes, objetivos e decididos. Sentem-se motivados pelas responsabilidades que lhes são atribuídas. Conservador, valorizam a segurança e a estabilidade. Graças à sua preocupação com a logística do mundo e a manutenção das tradições, é chamado de “supervisor”. O perfil se dá bem em funções que permitam criar processos e rotinas para a melhoria de produtividade. São profissionais que gostam de assumir responsabilidade e liderar grupos em torno de metas préestabelecidas. Exemplos de carreira: administração de empresas, vendas, finanças, contabilidade, gestão pública. 14. ISTJ: os “inspetores” – São organizados, sistemáticos, realistas e práticos, marcados pela fidelidade e pelo “pé no chão”, assim como pela necessidade de pertencer a grupos, instituições ou empresas. Conservadores e reservados, trabalham para a manutenção dos valores e tradições do grupo do qual fazem parte. No ambiente profissional, sentem-se à vontade em posições de liderança e gostam de ter autoridade. Podem liderar grupos pequenos em torno de um propósito comum e conseguem ter boa influência por conta da clareza de seus argumentos. Exemplos de carreira: contabilidade, finanças, auditoria, administração pública, gestão de projetos, pesquisa, saúde. 15. ISFJ: os “protetores” – Pacientes, detalhistas e humildes, se destacam pela motivação em servir ao próximo. Suas decisões tendem a levar em consideração a missão que têm no mundo. São chamados de “protetores” graças à sua preocupação com o bem-estar comunitário. São pessoas que agem como mãe de todos, que colocam sua energia para cuidar dos outros. Combinam com o perfil atividades profissionais que envolvam o bem-estar e melhoria do ambiente para as pessoas. Exemplos de carreira: assistência social, liderança comunitária ou religiosa, gestão ambiental, política, trabalho voluntário. 16. ESFJ: os “provedores” – Pessoas deste grupo costumam ser sociáveis, cooperativas e afetivas. Suas decisões colocam as pessoas em primeiro lugar. Eles se sentem motivados quando conseguem estabelecer e nutrir bons

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Capítulo 5. Características de Personalidade

relacionamentos. A tendência a agir como o paizão do time faz com que levem o apelido de “provedor”. São pessoas calorosas, que cuidam dos outros e promovem um ambiente amigável. No mundo do trabalho, sua especialidade é criar relações e eventos para a melhoria do clima organizacional. Além disso, são líderes por natureza: graças ao seu carisma e simpatia, conseguem ter grande influência sobre o grupo. Exemplos de carreira: consultoria, assessoria, relações públicas, educação física, comunicação com o mercado, política (GASPARINI, 2015). Os estudiosos dessa área ajudam a definir qual tipo de personalidade é mais adequado a cada profissão. Algumas características peculiares de personalidade, associadas a determinadas tarefas, podem contribuir para a ocorrência de erros que resultam em acidentes. Pessoas agitadas, ditas “elétricas”, têm dificuldades para executar tarefas onde a monotonia é uma constante, o que pode ser um facilitador para indução ao erro. Da mesma forma, pessoas dispersas não devem executar tarefas que requeiram atenção e concentração por períodos prolongados. As características e as preferências de cada tipo de personalidade (principalmente aqueles referentes ao processamento de informações e tomada de decisão) podem ser fatores determinantes na alavancagem ou na diminuição de erros humanos, quando associados ao tipo e à natureza do trabalho, seja ele rotineiro ou não rotineiro.

Qual a relação desse assunto com o ambiente de trabalho de um engenheiro de SST? Como isso pode ser útil?

A título de curiosidade para quem quiser se aprofundar um pouco mais nessa área, uma boa fonte de pesquisa é o DSM-V (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders – Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), que está na sua quinta edição, da Associação de Psiquiatria Americana. Esse manual está disponível para download gratuito e aborda os transtornos de personalidade, como o Transtorno de Personalidade Borderline, o Transtorno de Personalidade Antissocial e o Transtorno de Personalidade Narcisista, dentre vários outros.

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Capítulo 5. Características de Personalidade

5.3 REQUISITOS DE APTIDÃO NA SELEÇÃO DE PESSOAL A avaliação psicológica é o processo de apreciação do estado psicológico que atesta a sanidade mental e o equilíbrio psicoemocional de um indivíduo, de forma a assegurar a inexistência de transtornos psíquicos e distúrbios de personalidade que possam comprometer seu desempenho no trabalho. São apreciações de enfoque clínico ou pericial, com o propósito de atestar aptidão que lhe permitam um desempenho satisfatório das atribuições a que se propõe. Avaliações como essa compreendem: equilíbrio psicoemocional compatível com um desempenho profissional satisfatório; ausência de transtornos psíquicos e distúrbios de personalidade; capacidade atual ou potencial. A avaliação psicológica pode ser também entendida como um estudo baseado nas atividades que o ocupante de uma função executa, cuja finalidade é identificar, dentre outras, as características psicológicas indispensáveis para o seu desempenho. Um policial exerce sua função portando arma de fogo, portanto ele não pode ter comportamento impulsivo e nem agressivo. Se o examinador avaliar o candidato como “agressivo acima do limite determinado”, ele é classificado como inadequado para o cargo. No caso de um motorista, por exemplo, é analisado o grau de atenção e de concentração. Outra característica avaliada pelos examinadores é a resistência a frustrações. Certos cargos exigem que o profissional trabalhe em ambientes muito quentes, frios ou ruidosos. Nesses casos, é importante ter estabilidade emocional para essas funções. Os psicólogos têm autonomia para definir como será o teste e como será aplicado, no entanto só podem ser utilizados testes psicológicos autorizados pelo Conselho Federal de Psicologia, que auxilia os recrutadores a tornarem os testes menos vulneráveis a recursos dos candidatos e às críticas. Os psicólogos são os profissionais responsáveis pela execução e emissão de pareceres relativos às avaliações psicológicas. De acordo com eles, constituem-se causas de incapacidade psicológica:  Psicose atual ou história de antecedente psicótico;  Transtornos neuróticos que tenham exigido hospitalização, absenteísmo frequente e prejuízo no rendimento escolar e/ou ocupacional;  Personalidades psicopáticas em geral;  Reações de imaturidade emocional e afetiva;  Alcoolismo e toxicomania em geral;  História de tentativa de suicídio;  Deficiência mental em geral.

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Capítulo 5. Características de Personalidade

Os distúrbios psicológicos acima relacionados, quando evidenciados na avaliação psicológica, necessitam do aval da avaliação psiquiátrica para constituírem-se causas de incapacidade. De acordo com o Ministério da Defesa e Comando da Aeronáutica (2004), o exame de aptidão psicológica é o processo que visa estabelecer um prognóstico de adaptação de candidatos a uma atividade, cargo ou função de militares e civis, através da avaliação de aspectos motivacionais, características de personalidade, aptidões específicas e potencial geral, com base no perfil de exigências psicológicas estabelecido. Esses exames implicam na análise de três áreas distintas:  Personalidade: conjunto de características herdadas e adquiridas que determinam o comportamento do indivíduo no meio que o cerca; maneira como o indivíduo vivencia, elabora e controla seus sentimentos e emoções; habilidade de interagir, conviver e se relacionar com as demais pessoas, em todos os níveis da organização; capacidade de transmitir e expressar ideias, pensamentos e emoções;  Aptidão: conjunto de características que expressam a habilidade com que um indivíduo, mediante treinamento, pode adquirir conhecimentos e destrezas;  Interesse: gosto, tendência ou inclinação pelas atividades e formação relativa à função pretendida. Os requisitos de personalidade podem ser avaliados através dos seguintes desdobramentos:  Disposição para responder a situações novas, sabendo manejar os problemas que surgem, com o objetivo de ajustar apropriadamente o seu desempenho;  Capacidade de avaliar criteriosamente seu próprio comportamento;  Capacidade para examinar e interpretar os fatores envolvidos em determinada situação, a fim de chegar a uma compreensão global da mesma;  Predisposição para ajustar-se a métodos e regras pré-estabelecidas, assim como a situações de rotina;  Capacidade de escolher e assumir uma posição frente a várias opções e sob circunstâncias diversas;  Capacidade de organizar uma ideia ou fato de forma clara, lógica e precisa, selecionando meios apropriados que possam ser entendidos e decodificados pelo receptor;

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Capítulo 5. Características de Personalidade

 Disposição para colaborar com outros durante a realização de trabalhos em equipe;  Grau de maturidade e controle sobre suas reações emocionais diante de situações mobilizadoras;  Capacidade para antecipar providências que se façam necessárias, independentemente de procedimentos previamente estabelecidos;  Capacidade de conduzir e obter confiança, respeito e cooperação do grupo para a realização dos objetivos comuns;  Capacidade para agir de modo criterioso e cauteloso na realização de suas tarefas, atendo-se aos detalhes para a sua realização;  Capacidade de expressar-se de maneira clara, direta e precisa, selecionando o essencial e necessário para atingir determinada meta;  Capacidade para realizar tarefas, com o propósito de atingir um objetivo, a despeito de qualquer dificuldade encontrada;  Capacidade para assumir e cumprir as tarefas que lhes são atribuídas;  Habilidade para agir de modo a favorecer o estabelecimento de contatos e a integração no grupo;  Capacidade de apresentar comportamento e atitude que demonstram firmeza e autoconfiança frente a situações adversas. Os requisitos de aptidão podem ser avaliados através dos seguintes desdobramentos:  Capacidade de aprender e compreender conceitos abstratos, utilizando-os na solução de problemas;  Capacidade de manter a atenção voltada para determinado objetivo, bem como para identificar estímulos diferentes numa mesma situação;  Capacidade de manipular objetos tridimensionalmente, visualizar formas e estruturas, organizando-os e estabelecendo relações de forma correta;  Capacidade de perceber e reter certa quantidade de dados, instruções e informações fornecidas através de estímulos sonoros;  Capacidade para perceber, reter e evocar certa quantidade de dados, instruções e informações fornecidos através de estímulos visuais;  Capacidade para aprender e lidar com princípios de funcionamento e conceitos de mecanismos complexos;  Capacidade de compreender conceitos expressos em palavras, podendo abstrair, generalizar e fazer reflexões;  Capacidade de perceber determinados elementos com rapidez, retê-los momentaneamente e emitir pronta-resposta;

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 Capacidade para resolver problemas que envolvam conceitos numéricos. Os requisitos de interesse referem-se à demonstração ou expressão de motivação para a formação e desempenho futuro na atividade para a qual se candidata. Para a avaliação dessa área, são utilizadas técnicas de entrevista, inventários e questionários (específicos para cada propósito seletivo), levandose em consideração todas as informações expressas e declaradas pelo candidato. A realização do exame de aptidão psicológica prevê a utilização das seguintes técnicas e instrumentos psicológicos:  Inventários e testes de personalidade;    

Provas situacionais; Entrevistas com dinâmica de grupo ou individuais; Testes psicométricos de inteligência geral e aptidões específicas; Questionários específicos.

Bohrer (2013) destaca como essencial os formulários sobre condições físicas e de saúde (capacidade de esforço físico; capacidade de trabalho; necessidade de movimentos rápidos; acuidade visual e auditiva; resistência à poeira, temperaturas extremas, altitude, tóxicos etc.). Nem sempre, entretanto, o psicólogo responsável dispõe de testes e provas psicológicas específicas, o que pode dificultar a implantação de métodos adequados de seleção. Esse último critério se fundamenta na proposição de que as pessoas não são sistematicamente boas ou más: elas possuem diferentes capacidades, atividades, preferências e atributos pessoais, o que as torna mais adequadas para um número limitado de funções. Incorrem em grande erro aqueles que, por exemplo, escolhem os mais inteligentes para trabalhos mais simples, pois, inadvertidamente, estão contribuindo para a inadaptação do indivíduo no emprego (ocorrência de fadiga psicológica, desvalorização pessoal) e consequente rotatividade na organização. Deve-se ressaltar o que interessa à área de SST: a eficiência no que se refere ao índice de acidentes de trabalho apresentado por um empregado recém-admitido. O engenheiro de SST pode contribuir para o aperfeiçoamento do programa de seleção da empresa, na medida em que avalia a atuação do

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Capítulo 5. Características de Personalidade

indivíduo com relação à segurança do trabalho, verificando deficiências que podem significar falhas ocorridas em uma ou mais das etapas do processo de seleção de pessoal. Por exemplo: um prensista recém-admitido em uma indústria metalúrgica, apesar de se mostrar eficiente na produção, já sofreu dois acidentes de trabalho. O profissional de SST, ao constatar e analisar ambas as situações, verifica que o empregado em questão não possui boa coordenação motora, o que dificulta a operação da prensa. Um alerta deve ser feito para o departamento que realizou a seleção de pessoal, esclarecendolhes a situação, pois, provavelmente, houve falhas durante o processo de escolha desse funcionário: talvez tenha havido falta de exatidão na descrição do cargo de prensista, principalmente porque há diversos tipos de prensa; pode ter havido falha na determinação de requisitos dos candidatos (quando faltou apontar a característica X como pré-requisito para aquela função); pode ter havido engano na escolha de testes adequados para o objetivo pretendido; pode ter sucedido um equívoco na escolha do melhor candidato para a vaga. Seja qual for o problema, é bastante válida a colaboração do engenheiro de segurança para a orientação dos programas de seleção de pessoal que, além de focarem na adequação do empregado à empresa, visam também à redução e/ou eliminação dos índices de acidentes trabalhistas.

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5.4 POST-IT® Insira nesse post-it os pontos mais importantes referentes a esse capítulo: Quais foram os conceitos que você mais gostou? Qual assunto mais te chamou a atenção? Algum ponto específico que você se identificou? Depois de tantas coisas vistas e discutidas, do que você se lembra? De nada? Ops!

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5.5 TESTES 1) Qual das alternativas a seguir representa uma das características fundamentais comum às diferentes interpretações sobre o termo personalidade? a) As pessoas se comportam de forma igual ou semelhante em diferentes tipos de situações. b) As pessoas se comportam de forma diferente para cada tipo de situação. c) Não é possível prever o tipo de comportamento de um indivíduo perante uma situação. d) É impossível prever o tipo de comportamento de alguém, porque cada personalidade é única. e) Os traços relativamente duradouros de um indivíduo passam pelo processo de mutação em função das diferentes fases da vida. Feedback: item 5.1.

2) De acordo com Jung, a teoria dos tipos psicológicos parte de qual princípio? a) Indivíduos se engajam em dois processos mentais: percepção e julgamento. b) Há funções psíquicas e características de interesse. c) A personalidade é influenciada indiretamente pelas funções psíquicas e habilidades motoras e mentais. d) O comportamento é fruto de características de interesse e habilidades mentais e cognitivas. e) As referências e habilidades englobam os principais processos do indivíduo. Feedback: item 5.2.

3) O exame de aptidão psicológica implica na análise de quais áreas? a) Personalidade, aptidão e interesse. b) Personalidade, aptidão e transtornos psíquicos. c) Aptidão, psicoses e tendências por atividades. d) Aptidão, habilidades e conhecimentos. e) Interesse, formação e discernimento. Feedback: item 5.3.

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